O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu absolver uma mulher presa em flagrante e condenada a dois anos de pris�o em regime fechado por tentar furtar seis garrafas de suco de laranja avaliadas em R$ 60.
O caso aconteceu em 2018 e foi levado ao tribunal pela Defensoria P�blica de S�o Paulo depois de derrotas em todas as inst�ncias inferiores. No recurso, o defensor Felipe Busnello usou o chamado �princ�pio da insignific�ncia�. O dispositivo, reconhecido pela jurisprud�ncia do Supremo, afasta a condena��o quando o delito � considerado �minimamente ofensivo� e sem periculosidade social.
"Considerando o valor total das garrafas de suco subtra�das (R$ 60), que n�o ultrapassa quantia equivalente a 10% do sal�rio m�nimo nacional vigente � �poca do delito, verifica-se que n�o houve les�o significativa ao bem jur�dico tutelado que justifique a aplica��o da lei penal, que deve observar, dentre outros, os postulados da interven��o m�nima e da lesividade", argumentou o defensor no recurso.
"Como se sabe, o Direito Penal n�o deve se ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor - por n�o importar em les�o significativa a bens jur�dicos relevantes - n�o represente, por isso mesmo, preju�zo importante, seja ao titular do bem jur�dico ou � integridade da pr�pria ordem social", acrescentou.
Em primeiro grau, o ju�zo da 1� Vara Criminal da Comarca de Guarulhos, na Grande S�o Paulo, condenou a mulher aos dois anos de pris�o e considerou que o valor dos produtos n�o influencia na tipicidade da conduta. Ao analisar o primeiro recurso, o Tribunal de Justi�a de S�o Paulo reduziu a pena para um ano e quatro meses de reclus�o no regime semiaberto. No Superior Tribunal de Justi�a (STJ), o pedido de absolvi��o foi negado.
No Supremo Tribunal Federal, o ministro Gilmar Mendes entendeu que houve �grave ilegalidade� e absolveu a mulher.
"Como se v�, o magistrado [que proferiu a condena��o em primeiro grau] ignora, frontalmente, a necessidade de an�lise da tipicidade material, sendo restrito a afirmar que uma conduta ser� t�pica se meramente se enquadrar na descri��o do tipo formal. Segundo o magistrado, n�o h� necessidade de se proceder � valora��o da conduta e averiguar se ela, de fato, ofende o bem jur�dico tutelado pela ordem penal. N�o � o entendimento da doutrina e da jurisprud�ncia da Corte", afirmou o ministro.
O ministro tamb�m afastou a tese de que a reincid�ncia impediria a aplica��o do dispositivo.
"Se o princ�pio da insignific�ncia � causa de exclus�o da pr�pria tipicidade, resta, prima facie, irrelevante a an�lise da ficha de antecedentes criminais. (�) Para o reconhecimento de causa de exclus�o de tipicidade ou ilicitude, s�o irrelevantes, em tese, os dados da vida pregressa do acusado", observou. "Seja l� qual for a teoria adotada, a primariedade/reincid�ncia n�o � elemento da tipicidade, mas circunst�ncia afeta � individualiza��o da pena, motivo por que n�o faz qualquer sentido indagar, para o reconhecimento de atipicidade, se o r�u � prim�rio."
Na decis�o, Gilmar Mendes ainda destacou que n�o houve sequer preju�zo material ao estabelecimento, porque os sucos foram devolvidos. "Nesses termos, tenho que, a despeito de restar patente a exist�ncia da tipicidade formal (perfeita adequa��o da conduta do agente ao modelo abstrato previsto na lei penal), n�o incide, no caso, a material, que se traduz na lesividade efetiva e concreta ao bem jur�dico tutelado, sendo at�pica a conduta imputada", afirmou.
Em batalhas recentes travadas em tribunais superiores, a Defensoria de S�o Paulo conseguiu reverter condena��es de pessoas acusadas por tentativas de furto de itens de pequeno valor, como pe�as de carne, desodorante e refrigerante, todas com base no princ�pio da insignific�ncia. Embora tenha sido pacificada no STF, a tese nem sempre � reconhecida em inst�ncias inferiores. H� casos de r�us que respondem presos �s acusa��es.
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