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Estado de Minas CORONAV�RUS

COVID-19: muta��o brasileira desafia a ci�ncia e a estrutura de sa�de

Estudos sobre variante P1, que surgiu no Amazonas, mostram que ela se alastrou em 3 meses com alto potencial de cont�gio, e indicam que pode driblar anticorpos


15/03/2021 04:00 - atualizado 14/03/2021 18:08

Trabalhadores na linha de produção da Fundação Oswaldo Cruz: uma das missões dos cientistas é identificar de que maneira ocorre a proteção das vacinas(foto: André Coelho/AFP)
Trabalhadores na linha de produ��o da Funda��o Oswaldo Cruz: uma das miss�es dos cientistas � identificar de que maneira ocorre a prote��o das vacinas (foto: Andr� Coelho/AFP)

Com recordes de mortes batidos diariamente e UTIs de quase todo o pa�s � beira do colapso, o Brasil protagoniza aos olhos do mundo um mergulho no caos, em �guas prop�cias para a COVID-19. O v�rus se transformou e se fortaleceu.

Estudos indicam que uma de suas variantes no pa�s pode ter capacidade de transmiss�o de at� 2,2 vezes maior, com potencial para escapar inclusive de anticorpos produzidos de forma natural no organismo. 

Com origem no Amazonas, a chamada P1 se disseminou por outros estados em apenas tr�s meses. Seus efeitos s�o revelados em tr�s estudos, cujos primeiros resultados foram publicados nas �ltimas semanas em plataformas cient�ficas internacionais. Eles ajudam a apontar o que est� por tr�s dessa muta��o, que em quest�o de dias ajudou a levar ao esgotamento o sistema hospitalar na maior parte do pa�s.

Os primeiros dados sobre a variante amaz�nica s�o fundamentais para indicar que a segunda onda no Brasil � seu reflexo e, acreditam cientistas, tende a se agravar. “Surgiu em novembro de 2020 no Amazonas e, em tr�s meses, se tornou n�o s� predominante, mas onipresente”, afirma o pesquisador do Laborat�rio de Virologia do Instituto de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da Universidade de S�o Paulo (IMT/FMUSP) Jos� Eduardo Levi, virologista dos Laborat�rios Dasa.

Amostras de cidades no interior de S�o Paulo revelam a P1 em mais de 90% dos casos. O Dasa divulgou no fim de semana dados mostrando que ela estava presente em 80% das contamina��es na primeira semana de mar�o na Grande S�o Paulo.

Estudo do Projeto Cadde (Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagn�stico, Gen�mica e Epidemiologia de Arbov�rus) estima que a P1 pode ser de 1,4 a 2,2 vezes mais transmiss�vel que a cepa anteriormente em circula��o.

Al�m disso, h� probabilidade de 25% a 61% de escapar da prote��o imunit�ria dada por uma infec��o anterior. Traduzindo: a cada 100 pessoas que foram contaminadas por outra variante do novo coronav�rus, de 25 a 61 correriam risco de reinfec��o pela P1.

O estudo do Cadde “Genomics and epidemiology of a novel SARS-CoV-2 lineage in Manaus, Brazil” (“Genomas e epidemiologia de uma nova linhagem de SARS-CoV-2 em Manaus, Brasil”) foi publicado no in�cio de mar�o no MedRxiv, uma plataforma dedicada ao armazenamento e distribui��o de relat�rios da �rea de sa�de que ainda est�o em avalia��o por cientistas antes de serem validados no meio.

No texto, os autores advertem que os dados do comportamento da P1 em Manaus n�o podem ser generalizados para outras regi�es e popula��es – embora, na pr�tica, muitas das situa��es estejam se repetindo no territ�rio nacional.

O trabalho calculou ainda a quantidade de passageiros e voos internacionais e dom�sticos partindo de Manaus entre novembro e dezembro. “Os pacientes transferidos para outros estados o foram com todos os cuidados. O problema s�o as pessoas que est�o embarcando sem qualquer tipo de teste ou acompanhamento”, destaca Jos� Eduardo Levi.

Ele ressalta que, do ponto de vista molecular, j� se sabe que h� a chamada converg�ncia evolutiva, ou seja, as mesmas muta��es aparecem nas variantes de Manaus, na inglesa e na da �frica do Sul. Assim como nas outras, algumas muta��es que a P1 carrega t�m associa��o com o aumento da taxa de transmiss�o. A brasileira e a sul-africana t�m ainda um segundo ponto em comum: escape � resposta imune natural. “N�o podemos afirmar que ocorre tamb�m com a vacina”, pondera.

O virologista esclarece que os dados s�o frutos de testes em laborat�rios. “Valorizamos esse resultado, mas n�o � o definitivo. Definitivo � o comportamento do v�rus depois que as pessoas s�o vacinadas”, ressalta. “Na �frica do Sul, estudos da Novavax e Astrazeneca (fabricantes de vacinas contra COVID-19) mostraram resultado da efic�cia da vacina muito pior que nos Estados Unidos ou na Inglaterra. N�o sabiam o motivo, depois viram que todos os casos do estudo foram causados pela variante”, relata.

No Brasil, ainda n�o h� dados que comprovem essa rela��o. “O mais importante � vacinar o mais r�pido poss�vel a maior quantidade de pessoas. Se a P1 vai escapar, n�o sabemos. Mesmo tendo resposta pior no sentido de n�o proteger, a vacina ao menos evita que pessoas morram de COVID-19”, destaca.

“A variante � mais transmiss�vel, mas n�o fura m�scara, por isso, a import�ncia de continuar lavando bem as m�os, usando �lcool em gel e outras medidas de higiene e prote��o. Muita gente imagina que depois de vacinar poderia tirar m�scara e fazer festa, mas, enquanto n�o entendermos a prote��o que a vacina promove na P1 n�o poderemos.”

VIGIL�NCIA 

A USP est� lan�ando projeto de vigil�ncia gen�mica para se antecipar � emerg�ncia de variantes perigosas, por meio de sequenciamento aleat�rio no pa�s, a exemplo do que fazem Inglaterra, EUA, Dinamarca e Holanda. “O que fazemos hoje n�o � ideal: um retrato de casos que ocorreram 15 dias atr�s para confirmar e estimar a presen�a de variantes no Brasil”, diz Levi.

O virologista lembra que o Reino Unido faz 10 mil sequenciamentos por semana (7% dos casos). Os Estados Unidos subiram para 6 mil semanais (0,3%), enquanto o Brasil, que amarga a m�dia di�ria de 60 mil casos, sequenciou menos de 4 mil genomas desde o in�cio da pandemia (0,03%). “A vigil�ncia � importante, pois h� chance de novas muta��es e derivar algo da P1. N�o esper�vamos a instala��o t�o r�pida dessa variante, fomos pegos de surpresa.”

V�rus muda e engana defesas do organismo 

Se antes o coronav�rus era prevalente em idosos ou pacientes com comorbidades, nessa nova roupagem ele indica n�o escolher idade nem condi��o f�sica. A quantidade de jovens infectados vem impressionando, mas as raz�es para isso ainda n�o est�o claras.

“Tenho uma d�vida muito grande se � da biologia do v�rus ou se � uma quest�o comportamental. Eu n�o descartaria essa possibilidade, pois quem mais abandonou as medidas de distanciamento social foram os jovens”, afirma o pesquisador em sa�de p�blica, virologista e vice-diretor de pesquisas da Fiocruz Amaz�nia, Felipe Gomes Naveca.

Ele � coordenador do estudo “COVID-19 epidemic in the Brazilian state of Amazonas was driven by long-term persistence of endemic SARS-CoV-2 lineages and the recent emergence of the new Variant of Concern P1” (“A epidemia de COVID-19 no estado brasileiro do Amazonas foi impulsionada pela persist�ncia de longo prazo de linhagens end�micas do SARS-CoV-2 e a recente emerg�ncia da nova Variante de Preocupa��o P1”). Os primeiros resultados foram disponibilizados no fim do m�s passado na Research Square, outra plataforma de estudos ainda pass�veis de publica��o.

Os pesquisadores identificaram o primeiro caso de P1 em 4 de dezembro. As an�lises mostram uma evolu��o impressionante: 0% em novembro; 4% na primeira quinzena de dezembro; 45% na segunda; e 73% de preval�ncia da nova cepa no n�mero de casos entre 1º e 15 de janeiro no Amazonas.

Naveca relata um aumento discreto de contamina��o no estado j� na �poca das elei��es e na ocasi�o do “inverno amaz�nico” (chamado assim por causa da grande quantidade de chuvas no ver�o, que reduz um pouco as temperaturas) – j� que a umidade favorece problemas respirat�rios. Aos dois eventos se somaram as festas de Natal e r�veillon. “N�o sab�amos que nesses cen�rios desfavor�veis j� t�nhamos a presen�a da P1”, afirma. “A chance de espalhar � muito grande quando h� queda de distanciamento com potencial maior de transmiss�o de v�rus.”

O papel dos anticorpos na neutraliza��o da nova variante � outro fator que intriga os pesquisadores e objeto de estudo encabe�ado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Cientistas incubaram v�rus da linhagem B (anteriormente em circula��o) e da P1 no soro de pessoas infectadas (colhido por meio de exame de sangue) na �poca em que a cepa amaz�nica n�o estava em circula��o.

Os resultados mostraram que os anticorpos impediam bem os v�rus antigos de agir, mas, em se tratando da P1, a neutraliza��o foi em m�dia seis vezes menor, levantando tamb�m alerta sobre a capacidade de essa variante escapar � resposta imunol�gica.

Os experimentos s�o parte do estudo “Levels of SARS-CoV-2 lineage P.1 neutralization by antibodies elicited after natural infection and vaccination” (“N�veis de neutraliza��o da linhagem P1 do SARS-CoV-2 por anticorpos provocados depois de infec��o natural e neutraliza��o”). Feito pela Unicamp em parceria com v�rias institui��es dentro e fora do Brasil, o estudo, que ainda aguarda o aval da comunidade cient�fica, foi apresentado no site da revista cient�fica “The Lancet”.

VACINA 

Experimento parecido foi feito com volunt�rios dos testes cl�nicos da CoronaVac – incuba��o com linhagem B e P1 no soro de pessoas que receberam o imunizante h� cinco meses. “Em ambos os casos n�o houve neutraliza��o. Esperaria que a vacina nos protegesse gerando esses anticorpos. No caso, n�o gerou anticorpos nem para a antiga nem para a nova cepa”, afirma o pesquisador do Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais (CNPEM) Rafael Elias Marques, professor de p�s-gradua��o no Instituto de Biologia na Unicamp e um dos respons�veis pelo trabalho, ao lado do pesquisador Jos� Luiz Fran�a M�dena, coordenador do estudo.

Ele faz quest�o de esclarecer: “N�o quer dizer que a vacina n�o funciona. Funciona bem, protege de casos graves que levam para UTI e de mortes, mas descobrimos que n�o � via anticorpos neutralizantes que a vacina protege”.

“H� outras maneiras de se proteger de infec��es. Achamos que, al�m dessa diferen�a de neutraliza��o numa infec��o natural, a vacina n�o induziu anticorpos como esperado. Detalhe importante � o tempo: cinco meses � consider�vel e os dados mostram que esses anticorpos n�o est�o l�.” Para ele, a constata��o ajuda a pensar sobre quais os mecanismos de prote��o est�o atuando com a vacina.

Uma das teses em investiga��o sobre o mecanismo de prote��o da vacina � de que estimule os linf�citos T, que atuam de maneira diferente (v�o ao local da infec��o para combate ao v�rus), em vez dos linf�citos P (respons�veis pela produ��o de anticorpos).

O Instituto Butantan informou na quarta-feira que dados iniciais apontam que a vacina CoronaVac � capaz de combater a P1 e tamb�m a P2 (encontrada no Rio de Janeiro). O estudo est� sendo feito em parceria com o Instituto de Ci�ncias Biom�dicas da Universidade de S�o Paulo (ICB-USP) e incluiu as amostras de 35 participantes vacinados na fase 3 dos testes cl�nicos. O estudo completo inclui um n�mero maior de amostras e j� est� em an�lise, acrescentou.

A favor da vacina e de medidas de prote��o 

Assim como outros cientistas, o professor da Unicamp Rafael Elias � a favor da prote��o. “Todas as vacinas desenvolvidas at� o momento foram desenhadas para que n�o tenhamos doen�a grave e n�o paremos na UTI. Para esse efeito, s�o muito boas”, ressalta.

Sem anticorpos, os indiv�duos ficam sujeitos � reinfec��o, mas, se os linf�citos n�o s�o capazes de prevenir uma contamina��o, “s�o profissionais em impedir que a infec��o avance”, garante o pesquisador. “E como existem dados dos estudos cl�nicos da vacina, no caso da CoronaVac, j� sabemos que a pessoa n�o vai desenvolver doen�a grave mesmo se pegar de novo.”

Enquanto os estudos n�o conseguem responder plenamente sobre a efic�cia dos imunizantes diante das muta��es, o conselho de Rafael Elias � o mesmo: “At� os estudos serem completados � de bom senso que pessoas apliquem todas as medidas de prote��o, porque sabemos que isso tem efic�cia �tima. Pelo menos at� entendermos o tamanho do perigo com o qual estamos lidando”.

“A vacina��o precisa andar mais r�pido e incluir outros imunizantes. E cada um de n�s precisa assumir sua parcela de responsabilidade. Se h� oferta de vacina, tenho que me vacinar pelo coletivo, sen�o, a pandemia nunca acaba. Posso usar m�scara, evitar lugares com aglomera��o, manter distanciamento, usar �lcool, lavar m�os. Estamos falando disso h� um ano e as pessoas ainda n�o entendem. V�o pagar esse pre�o?”, acrescenta o pesquisador em sa�de p�blica e virologista Felipe Naveca.

VARIANTES BRASILEIRAS 
P1 
Conhecida como a variante amaz�nica, recebeu da OMS a classifica��o de “Variante de preocupa��o”. Apresenta 20 muta��es e � apontada como causadora de reinfec��o em Manaus

P2 
Emergiu no Rio de Janeiro e j� se espalhou por diversos estados, incluindo S�o Paulo, Paran� e Bahia. Tamb�m foi detectada no Reino Unido, Canad�, Argentina, Noruega, Irlanda e SingapuraP1 
Conhecida como a variante amaz�nica, recebeu da OMS a classifica��o de “Variante de preocupa��o”. Apresenta 20 muta��es e � apontada como causadora de reinfec��o em Manaus
 


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