
"O n�mero de mortes entre beb�s � absurdo, um massacre", diz a epidemiologista F�tima Marinho, consultora da Vital Strategies e respons�vel pelo levantamento. "N�o houve nenhum protocolo para atendimento de gestantes e rec�m-nascidos, n�o houve alerta para obstetras, pediatras, n�o se separou hospitais de refer�ncia para gestantes com COVID-19, n�o houve nada para organizar e orientar os atendimentos", afirma. "Teve casos de parto em gestantes intubadas na UTI."
Assim como ocorre com a maior parte das v�timas adultas, o comprometimento dos pulm�es causado pelo v�rus leva os beb�s � morte.
O n�mero de beb�s mortos no Brasil em decorr�ncia do novo coronav�rus � baixo quando comparado ao total de �bitos em outras faixas et�rias. J� est� estabelecido pela ci�ncia que crian�as s�o menos vulner�veis � covid, e os mais velhos est�o entre os mais suscet�veis. O dado, por�m, se destaca quando comparado aos da mesma faixa et�ria em outros pa�ses, revelando mortes que seriam evit�veis.
O n�mero brasileiro � quase 10 vezes o registrado, por exemplo, para o grupo de zero a 18 anos nos Estados Unidos, pa�s com mais mortes pela COVID-19 (com cerca de 544 mil v�timas, ante quase 318 mil no Brasil). Dados do Centro de Controle e Preven��o de Doen�as dos EUA (CDC, na sigla em ingl�s), registram s� 103 mortes pela doen�a naquela faixa et�ria (inclu�dos beb�s) em 2020. O Brasil tamb�m apresenta excesso de interna��es de beb�s (at� 1 ano) pela COVID. No ano passado, foram 11.996.
Estudo de julho da International Journal of Gynecology and Obstetrics j� tinha mostrado que o total de gr�vidas mortas no Brasil por covid tamb�m era um dos mais altos do mundo. Das 160 mortes de gestantes em todo o mundo entre o in�cio da pandemia e junho, 124 foram no Brasil. O 2.º lugar era dos EUA, com 16 �bitos.
Estrutura prec�ria
Especialistas ouvidos pelo Estad�o dizem que uma s�rie de vari�veis contribui para o quadro. A falta de pr�-natal, a alta taxa de nascimentos de prematuros, a dificuldade de diagn�stico em crian�as pequenas e vulnerabilidades socioecon�micas s�o algumas das causas apontadas. "O n�mero (de beb�s mortos) � chocante", afirmou a dem�grafa M�rcia Castro, coordenadora do Departamento de Sa�de Global e Popula��o da Escola de Sa�de P�blica da Universidade de Harvard (EUA). "Seria interessante saber o que aconteceu com as m�es dessas crian�as, porque j� sab�amos que o n�mero de gr�vidas infectadas no Brasil era alto."
Para o infectologista pedi�trico Fl�vio Cczernocha, que integra o grupo t�cnico de imuniza��es da Sociedade de Pediatria do Rio, n�o h� ind�cio de que haja predisposi��o gen�tica que pudesse levar � morte dos beb�s. A assist�ncia prec�ria � gestante, � parturiente e ao rec�m-nascido explicam os n�meros, segundo ele. "O n�mero n�o chega a ser t�o surpreendente assim", diz Cczernocha.
"Nossa assist�ncia pr�-natal � muito inadequada. A s�filis cong�nita � o que chamamos de sentinela da m� assist�ncia pr�-natal. Porque � f�cil de diagnosticar na gr�vida e de tratar. Para se ter ideia, o Brasil � um dos campe�es mundiais de beb�s nascidos com s�filis e o problema vem aumentando assustadoramente nos �ltimos anos; � uma calamidade p�blica."
A falta de pr�-natal adequado leva tamb�m a mais partos de prematuros - beb�s ainda mais vulner�veis a infec��es em geral. E os sintomas de covid em beb�s s�o diferentes dos apresentados por adultos, o que leva a subdiagn�stico. "Quanto mais novo o beb�, menos espec�ficos os sintomas de qualquer doen�a. Vale para a covid tamb�m", diz o especialista. "Manifesta��es respirat�rias comuns nos adultos com a doen�a n�o s�o t�o frequentes nos beb�s. Les�es na pele e diarreia s�o os sintomas mais comuns."
G�meos
A vida da estudante de Enfermagem Carla Vit�ria Pereira, de 22 anos, mudou em maio de 2020. Nessa �poca fez ultrassonografia de rotina para investigar a causa de aus�ncia de menstrua��o. A surpresa veio quando o m�dico lhe disse que eram g�meos. Sem planejamento, a gesta��o foi um choque para quem ainda tentava entender a pandemia. Resignada, Carla Vit�ria come�ou a preparar o enxoval das crian�as - Benjamim e Jo�o Marcelo. Aos 7 meses de gravidez, por�m, ela foi diagnosticada com o coronav�rus, e, por complica��es da doen�a, os beb�s nasceram prematuros.
Dois dias depois de nascido, Benjamim n�o resistiu e morreu em decorr�ncia da covid-19. "Foi um turbilh�o de sensa��es", relembra Carla Vit�ria, que se recuperou da doen�a dias depois do parto. Em casa, estava tudo organizado para receber os g�meos. "Enxoval igual para os dois e um quarto planejado para eles", conta a jovem, que divide sua vida entre estudo, trabalho e cuidados com Jo�o Marcelo, de 11 meses.
Para atenuar a saudade, Carla Vit�ria guarda sobre a c�moda do quarto do filho uma foto do beb� Benjamin tirada na UTI neonatal, em Macei�. L�, ele lutou pela vida durante 48 horas.
Acre
Any Gabrielly Lima, de apenas 1 ano e 5 meses, morreu em Feij� (AC). De in�cio, ela foi diagnosticada com anemia, mas um exame - cinco dias ap�s o primeiro atendimento - mostrou que a crian�a tinha covid-19. "O m�dico colocou-a no oxig�nio, porque ela estava muito fraca, cansada", conta a m�e, Maria da Concei��o Pereira, de 25 anos. "Estamos muito abalados ainda", afirma a jovem. "A gente n�o achava que fosse covid porque ela n�o sa�a de casa comigo." Desde o in�cio da pandemia, o Acre teve cinco mortes de beb�s com menos de 1 ano por coronav�rus.