
Regina Reis, de 36 anos, descreve o que passou por causa do coronav�rus. "Como se, a cada segundo, estivesse perdendo um pouquinho de vida." Hoje, a diarista se recupera bem, mas pensou que n�o resistiria.
De Santo Ant�nio do Descoberto (GO), a 50 quil�metros de Bras�lia, ela notou os primeiros sintomas h� duas semanas. Junto com o marido, foi a dois postos de sa�de e dois hospitais - em um deles recebeu atendimento. "Doze horas em um banco duro, com o soro na m�o. Por volta das 6 horas da tarde, falaram que poderia permanecer ali (sentada) ou ir para casa, que n�o tinha leito." Regina repetiu o procedimento nos dias seguintes. "Tinha pessoas em macas, cadeiras, gente debilitada e sem ter nem onde sentar."
O quadro se agravou com o passar dos dias e ela n�o tinha mais for�as para ficar sentada. Regina conta ter falado com algu�m do hospital, chorando, que n�o poderia morrer, pois tem tr�s filhos. "Ela falou: ‘n�o � s� voc�, s�o muitos’", narra.
Em casa, Regina disse n�o se lembrar dos tr�s dias seguintes, "at� que um anjo ouviu minhas preces e conseguiu um m�dico". A chefe de sua irm� havia encontrado um m�dico particular, que topou teleconsulta. Ele deu orienta��es de rem�dios, monitoramento com ox�metro e tratamento com oxig�nio medicinal "imediatamente".
Um dos filhos de Regina criou vaquinha para juntar R$ 3 mil, mas as empresas alegavam falta de cilindro. "Foram dois dias de ang�stia, sem ar, numa cama. Toda vez que levantava, achava que n�o voltaria", diz ela. Conseguiram R$ 1,9 mil e o oxig�nio chegou, al�m de doa��es de alimentos e outros itens. "Se n�o fosse o oxig�nio e o m�dico, n�o estaria aqui", diz.
Parentes tamb�m se mobilizaram para apoiar o aposentado Francisco Xavier, de 92 anos, de Teresina. Ele foi diagnosticado com a covid no dia 1º de mar�o, em um teste feito na rede privada. "Precis�vamos saber o mais r�pido poss�vel, pela preocupa��o de ser um idoso", conta a neta , a pedagoga Erica Souza, de 31 anos.
Seu Francisco foi levado ao hospital, onde foi avaliado e mandado para casa. Dias depois, piorou. "A m�dica disse que precisaria ser internado, precisava de oxig�nio, mas n�o tinha leito. Disse que ele poderia ficar na cadeira tomando oxig�nio. Ficou o dia todo." Depois, a fam�lia o levou para casa. Alugou cilindro de oxig�nio e continuou com as medica��es.
"Dia 16, ele acordou muito cansado. Chamamos o Samu, que disse n�o ter aonde levar meu av�, porque n�o tinha leito. S� se colocasse em uma cadeira e aguardasse. Ficamos desesperados", conta Erica.
Um socorrista sugeriu buscar atendimento domiciliar privado. Dois m�dicos confirmaram a necessidade de UTI. Ap�s novo chamado ao Samu, ele foi internado em leito improvisado na sala de curativos. Por orienta��o m�dica, a fam�lia comprou equipamentos para auxiliar na respira��o e contratou fisioterapeuta. A transfer�ncia para a UTI nunca ocorreu - seu Francisco morreu dias depois. Os custos complementares, pagos em v�rios cart�es de cr�dito de parentes, s�o de R$ 10 mil.
Viagem de 4 horas
O vendedor Gabriel Motta, de 20 anos, acredita ter contra�do covid no trabalho, mas n�o teve sintomas graves. J� a m�e, Hebe, de 54 anos, teve no dia 25 um mal-estar, confundido pelos m�dicos com uma crise de asma. O quadro piorou dia 28, quando foi confirmado o diagn�stico de covid. Por ter diabete e hipertens�o, ela foi internada, mas o leito cl�nico n�o foi suficiente.
"Trataram muito bem dela, mas faltavam recursos", conta. Como havia fila de espera por transfer�ncia para a UTI, Motta n�o quis aguardar e, junto da fam�lia, telefonou para v�rios hospitais de S�o Paulo, p�blicos e privados. Depois de horas, a �nica alternativa foi uma institui��o privada, mas no Paran�, a quase quatro horas de onde vive, em Piraju (SP).
Um tio pagou a cau��o do hospital e, para as demais despesas, foi criada uma vaquinha virtual, que obteve R$ 8 mil. Hebe foi transferida de ambul�ncia. "A gente n�o � fam�lia rica, � de classe m�dia. Se precisar vende casa, carro. A sa�de em primeiro lugar", destaca o filho. Para evitar custos adicionais, os parentes de Hebe seguem em S�o Paulo. "� uma ang�stia pra fam�lia. � duro estar longe", diz.
A Secretaria de Sa�de de S�o Paulo justificou a espera por transfer�ncia na central de regula��o � alta de 117% em pedidos de transfer�ncia, ante junho de 2020. "A regula��o depende da disponibilidade de leitos e de condi��o cl�nica adequada para que o paciente seja deslocado com seguran�a at� o hospital de destino", destacou, em nota.