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Estado de Minas GERAL

Al�m da covid, Brasil teve 55 mil mortes por outras doen�as acima do previsto


20/04/2021 12:42

Em 2020, o Brasil registrou 275.587 �bitos a mais que o previsto para o ano. Desse total, 220.469 foram v�timas da covid-19, mas outros 55.117 morreram por outras doen�as. Os dados constam de levantamento feito com base em n�meros do estudo Excesso de �bitos no Brasil, da organiza��o em sa�de Vital Strategies, no painel do Conselho Nacional de Secret�rios de Sa�de (Conass). As estat�sticas indicam que, al�m das perdas pelo v�rus, a crise sanit�ria causou mortes de quem poderia sobreviver em outra situa��o.

Com o isolamento social, necess�rio para frear o novo coronav�rus, houve dificuldade de atender pacientes cr�nicos, realizar exames e fazer diagn�sticos precoces de doen�as graves. A extens�o desse problema no sistema de sa�de brasileiro assusta a popula��o e preocupa m�dicos e especialistas em outras enfermidades, que j� trabalham com proje��es de at� 50 mil casos de c�ncer para este ano por causa do abandono de tratamento ou atraso na identifica��o da enfermidade.

"A gente atribui isso, em parte, ao cancelamento ou adiamento dos procedimentos m�dicos que deveriam ter sido feitos, como exames", afirma a coordenadora do estudo e professora da UFMG, Fatima Marinho. "Quando os pacientes chegam ao hospital, j� est�o em situa��o mais grave". Segundo ela, as pessoas t�m receio de ir ao hospital com medo de se infectarem com o coronav�rus.

A pesquisadora explica que o pico at� dezembro ocorreu na semana epidemiol�gica 20, virada de maio para junho, com 33.569 mortes, ante as 23.727 esperadas conforme o balan�o dos anos anteriores. Foi um aumento de 46% das mortes esperadas naquela semana. Durante todo o ano, a linha da curva das mortes esteve acima da curva de dados projetados com base nas m�dias de anos anteriores.

Casos de c�ncer

Para oncologistas que acompanham a evolu��o da pandemia, a preocupa��o agora � com proje��es que apontam 50 mil novos casos de c�ncer que deixaram de ser detectados no ano passado por causa da escassez de diagn�sticos no per�odo. Segundo Daniela Dornelles Rosa, diretora da Sociedade Brasileira de Oncologia Cl�nica (SBOC) e oncologista do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre, houve forte queda nas consultas. S� no centro de oncologia do hospital, houve desist�ncia de 720 pacientes e mais 264 do centro de mama. "Se formos computar com fevereiro e mar�o, s�o 3.436 desist�ncias de consulta em tr�s meses", argumenta a diretora da SBOC.

"O quanto isso vai acabar resultando em mais mortes, a gente ainda n�o sabe mensurar", afirma a oncologista. "Mas quando a gente pensa em outras doen�as, como as cardiovasculares, existem publica��es mostrando que h�, sim, um maior n�mero de casos de pacientes que podem, inclusive, acabar morrendo em casa", diz Daniela Rosa.

A proje��o nacional de novos casos de c�ncer apontava, segundo estat�sticas de 2019, para a ocorr�ncia de 625 mil diagn�sticos anuais no tri�nio 2020-2022. Para Daniela Rosa, o importante agora � que as pessoas procurem o m�dico para identificar a doen�a no est�gio que ainda permite a cura. "Nossa recomenda��o � que n�o se cancelem exames", afirma a oncologista.

"Talvez se eu tivesse esperado um pouco mais n�o teria a sorte que eu tive", conta a advogada Mariana Peirano, de 40 anos, que descobriu um c�ncer em outubro e passou por cirurgia em novembro. Segundo ela, os protocolos do hospital a deixaram segura. "Convivi l� com pessoas na qu�mio que sentiram o n�dulo no seio e ficaram com medo de fazer o exame. Quando foram fazer, descobriram que j� estavam com met�stase. Vamos lembrar que � uma doen�a em que meses podem fazer diferen�a", completa.

O cirurgi�o oncol�gico Alexandre Ferreira de Oliveira, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncol�gica (SBCO), n�o tem d�vidas do impacto da covid sobre as doen�as cr�nicas. Ele cita levantamento da Sociedade Brasileira de Radioterapia que mostra redu��o de 46% nas radioterapias para mama no Pa�s. "Houve tamb�m queda de 47% na detec��o de novos casos no Hospital AC Camargo, de S�o Paulo", afirma. S�o dados de pacientes de c�ncer de colorretal entre mar�o e julho do ano passado, em compara��o com o mesmo per�odo de 2019.

Oliveira avalia que o principal problema � que as pessoas n�o est�o fazendo os exames necess�rios para rastrear a doen�a. "O diagn�stico precoce � fundamental", diz. Ele lembra de casos recentes, como o de um professor dele que foi encontrado morto em casa, por complica��es card�acas. E de uma paciente, que � dentista, que n�o fez os exames de acompanhamento para rastreamento de c�ncer no �ltimo ano e que acaba de detectar o avan�o da doen�a. "Isso � muito comum nos consult�rios", afirma Oliveira.

"No Reino Unido, uma prospec��o aponta que haver� 18 mil casos a mais de mortes por c�ncer neste ano devido � falta de diagn�stico precoce", diz o m�dico. "O nosso medo � que as doen�as cr�nicas matem mais do que o covid", alerta.

Registro Civil

"� uma situa��o grav�ssima, porque h� forte impacto direto e indireto da covid sobre o sistema de sa�de, e isso vai provocar altera��o at� no perfil da popula��o e na economia", diz Gustavo Renato Fiscarelli, presidente da Associa��o Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil). A entidade � parceira do grupo que trabalhou no estudo Excesso de �bitos no Brasil, da Vital Strategies.

Segundo Fiscarelli, que dirige um cart�rio civil em Cotia, na Grande S�o Paulo, "verifica-se acr�scimo absurdo no n�mero de �bitos". Ele explica que a m�dia anual de �bitos, desde 2003, era de 1,1 milh�o de pessoas. No ano passado, por conta da pandemia, subiu para quase 1,5 milh�o. "E a� fica claro que, mesmo somados os cerca de 250 mil da covid registrados at� dezembro, h� excesso de �bitos de pessoas que n�o tinham covid, mortos por outras doen�as". Para ele, "isso � reflexo da covid, porque h� o isolamento das pessoas, falta de tratamento,de leitos, hospitais lotados, abandono e adiamento de tratamentos regulares", enumera

Para a m�dica Clarissa Mathias, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Cl�nica (SBOC), as pessoas t�m deixado tamb�m de fazer controles essenciais para a sa�de. "E isso aumenta os fatores de risco de adoecer. As pessoas est�o dormindo mais, voltando a fumar, ganhando peso", alerta. Ela explica que os dados do ano passado apontam que mais de 74% dos profissionais entrevistados relataram ter tido ao menos um paciente que interrompeu ou adiou tratamentos por mais de um m�s na pandemia. E que, para 22,5% dos oncologistas, houve obst�culos para a realiza��o de exames. S� 1% disse n�o ter notado resist�ncia aos procedimentos.

O ator Tom Veiga, int�rprete do papagaio Louro Jos� na televis�o, foi encontrado morto em casa, em novembro, v�tima de um AVC. Pessoas pr�ximas, por�m, acreditam que a covid-19, doen�a que o artista contraiu em mar�o do ano passado, pode ter contribu�do para a piora na sa�de do artista, que tamb�m era fumante. "Ele tinha s� 40% da fun��o pulmonar, mas estava tratando disso", contou Edson Sobrinho, advogado da fam�lia de Veiga.

Sudeste (38%), Nordeste (32%) e Norte (12%) s�o as regi�es com mais excesso de mortalidade. O Centro-Oeste (10%) e o Sul (9%) tiveram menor impacto em 2020. As capitais foram mais duramente atingidas pelo excesso de �bitos, especialmente Manaus, Bel�m, S�o Lu�s, Fortaleza, Recife, Salvador, Rio e S�o Paulo. "O Amazonas, com aumento de 52% das mortes esperadas, � o mais impressionante, mostrando exterm�nio de parte da popula��o do Estado, que continuou em 2021", afirma Fatima Marinho, coordenadora do grupo de estudos.

Ela destaca que o Estado de S�o Paulo � afetado pelo alto n�mero de mortes, mas n�o tem o excesso de mortes encontrado, por exemplo, em Estados como Amazonas e Rio. "S�o Paulo teve excesso de �bitos de 41.986, mas isso � 15%. No Rio, o excesso de mortes foi de 25%, acima da m�dia nacional (22%). J� o Amazonas tem 52% de excesso de mortes", explica. "E isso vai se repetir em 2021" alerta.

Luiz Fernando Ferraz da Silva, professor da Faculdade de Medicina da USP, tamb�m prev� piora este ano. Ele usa o colapso da rede de sa�de em Manaus, em janeiro, para exemplificar as causas e consequ�ncias da alta de mortes por falhas de assist�ncia. "O indiv�duo tem enfarte em casa, chama o Samu, que o leva a um hospital. Mas, chegando l�, n�o tem leito. E o Samu n�o pode deixar o paciente se n�o houver leito. Ele, ent�o, fica dentro da ambul�ncia. Da�, outro paciente precisa da ambul�ncia e j� n�o tem carro suficiente, demora mais para chegar. E sabemos que a demora diminui a chance de sobrevida", diz ele, que � ainda diretor do Servi�o de Verifica��o de �bitos da capital paulista.

"� preciso que governo federal, estadual e municipal, e autoridades em geral, trabalhem para reduzir mortes e hospitaliza��es. Usar das li��es aprendidas em 2020 poderia salvar milhares de vidas e muito sofrimento. O que estamos vendo no Pa�s � uma morte anunciada, uma crise humanit�ria sem precedentes", afirma a pesquisadora da UFMG.


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