
O objetivo � evitar que as pesquisas parem, em um cen�rio de restri��es para a libera��o de recursos e queda no or�amento para a ci�ncia. O dinheiro obtido at� agora pelas universidades garante s� parte dos testes e a necessidade aumentar� se estudos avan�arem para a �ltima fase.
Universidades como a Federal de Minas (UFMG), a do Rio (UFRJ) e a do Paran� (UFPR) s�o algumas das que est�o na corrida pelo desenvolvimento de um imunizante brasileiro. Segundo o Minist�rio da Sa�de, h� 16 projetos brasileiros em andamento.
As vacinas n�o devem ficar prontas este ano, mas podem representar independ�ncia em rela��o a imunizantes estrangeiros a partir do ano que vem. Hoje, s� aplicamos no Brasil vacinas desenvolvidas no exterior. O risco de que a COVID-19 seja uma doen�a end�mica, como dengue e gripe, torna a iniciativa ainda mais importante.
Em abril, o Minist�rio da Ci�ncia e Tecnologia pediu em um of�cio ao Minist�rio da Economia a edi��o de uma medida provis�ria para a abertura de cr�ditos extraordin�rios no valor de R$ 720 milh�es para as vacinas nacionais. No documento, o MCTI afirma que � preciso alavancar o desenvolvimento de imunizantes nacionais pelo risco de "mudan�as imprevis�veis no rumo da pandemia" em fun��o de muta��es virais. O documento tamb�m cita a possibilidade de ter de vacinar novamente toda a popula��o "em curto per�odo de tempo".
Os R$ 720 milh�es, segundo o MCTI, seriam destinados a quatro projetos brasileiros nas fases 1 e 2 dos estudos cl�nicos e para duas vacinas que avan�arem para a fase 3. Os estudos cl�nicos s�o aqueles em que a vacina � aplicada em seres humanos. Nas fases 1 e 2, o grupo testado � menor e a estimativa de gasto � de R$ 30 milh�es em cada projeto. J� na fase 3 o teste pode envolver at� 40 mil volunt�rios e o custo da pesquisa sobe para R$ 300 milh�es.
Em resposta no dia 7 de maio, um m�s ap�s a solicita��o, o Minist�rio da Economia condicionou a libera��o de parte da verba (R$ 415 milh�es) a um projeto de lei com cancelamento de recursos do Minist�rio da Sa�de. Outros R$ 305 milh�es dependeriam de uma portaria do secret�rio especial de Fazenda.
H� ainda restri��es para o uso de R$ 5 bilh�es do Fundo Nacional de Desenvolvimento Cient�fico e Tecnol�gico (FNDCT), o principal fundo de financiamento da ci�ncia. Na pr�tica, as exig�ncias podem tornar o processo demorado e atrasar as pesquisas este ano, segundo entidades ligadas � ci�ncia.
Na corrida contra o tempo e atr�s de viabilizar a pr�pria vacina, a UFMG conseguiu R$ 30 milh�es com a prefeitura de Belo Horizonte. O recurso vai pagar as fases 1 e 2 dos estudos cl�nicos. Mas, para a fase 3, em que mais de 30 mil volunt�rios s�o convocados, ser� necess�rio mais dinheiro, da ordem de R$ 300 milh�es.
"O Minist�rio de Ci�ncia e Tecnologia (MCTI) tem sido um grande parceiro, mas vai poder financiar apenas uma das vacinas, a que chegar primeiro, e n�s sabemos que precisaremos de todas", afirma Sandra Regina Goulart Almeida, reitora da UFMG. Segundo ela, o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), ofereceu o dinheiro ap�s assistir a uma entrevista em que Sandra manifestava temor pela paralisa��o da pesquisa.
Na UFPR, a falta de verbas mobilizou o reitor a acionar contatos locais para alavancar a pesquisa da vacina. "Estou correndo atr�s do jeito que posso. Falei com vereadores, que agora querem falar com o munic�pio para passar dinheiro para n�s", diz o reitor da UFPR, Ricardo Marcelo Fonseca.
At� o Tribunal de Contas do Estado avalia entrar no projeto, aplicando dinheiro pr�prio. Na fase pr�-cl�nica, quando a vacina � testada em animais, a universidade fechou um acordo com o governo do Paran� para repasse de R$ 995 mil. A vacina paranaense pode custar de R$ 5 a R$ 10 a dose.
Para o imunizante da UFRJ, a reitora Denise Pires de Carvalho negocia com deputados estaduais e h� expectativa de conseguir R$ 5 milh�es com a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). A UFMG tamb�m conseguiu verbas de emendas parlamentares e v� a possibilidade de receber mais recursos provenientes de um acordo de indeniza��o da Vale com o Estado de Minas Gerais pelos danos causados ap�s o rompimento da barragem de Brumadinho, em 2019.
'Se vira nos 30'
"A reitora est� se virando nos 30 para conseguir mais recursos", diz Fernando Peregrino, presidente do Conselho Nacional das Funda��es de Apoio �s Institui��es de Ensino Superior e de Pesquisa Cient�fica e Tecnol�gica (Confies), sobre a dirigente da UFRJ.
O Confies e outras entidades amea�am ir ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela libera��o dos R$ 5 bilh�es do FNDCT. Em audi�ncia na C�mara dos Deputados no dia 4 de maio, o ministro Paulo Guedes afirmou que seriam encaminhados R$ 5 bilh�es para o MCTI, mas os recursos n�o chegaram.
Para "vender o peixe" da vacina, at� mesmo os pesquisadores participam de reuni�es externas. O virologista Fl�vio Guimar�es da Fonseca, que coordena um centro de pesquisas da UFMG, alterna entre o cientista e o negociador na pandemia para conseguir levar adiante os estudos.
Ele tem dialogado com parlamentares e at� entidades ligadas ao com�rcio - um papel que n�o desempenhava antes da COVID-19. "� um interlocutor diferente, n�o t�cnico. Falar na mesma linguagem que ele n�o � simples. O cientista adorava falar em congresso."
Embora veja essa interlocu��o como um ganho para os cientistas na pandemia, o risco � de que outras pesquisas com menos apelo pol�tico, mas tamb�m importantes, acabem ficando � m�ngua. Estudos sobre doen�as como zika e chikungunya est�o praticamente paralisados.
"Por que a vacina brasileira est� saindo agora, um ano depois? Porque pa�ses que desenvolveram primeiro tinham pesquisas j� em andamento. A gente praticamente teve de montar a estrutura do zero", diz Fonseca. Os reitores s�o un�nimes ao dizer que, se o governo federal tivesse investido em ci�ncia antes, o Brasil j� teria suas pr�prias vacinas em est�gio mais adiantado.
Nos Estados Unidos, onde houve investimento bilion�rio para desenvolver imunizantes contra a COVID-19, j� foram aplicadas 276 milh�es de doses e outras 80 milh�es ser�o enviadas a outros pa�ses. Enquanto isso, o Brasil vacinou menos de 10% de sua popula��o com as duas doses e depende de insumos de fora para n�o paralisar a produ��o local na Fiocruz e no Instituto Butant�.
At� mesmo a Versamune, propagandeada como "a vacina 100% brasileira" pelo governo federal, sofreu cortes no fim de abril- R$ 200 milh�es foram vetados pelo presidente Jair Bolsonaro para o imunizante. O investimento inicial do governo federal foi de aproximadamente R$ 3,8 milh�es na vacina desenvolvida pela Universidade de S�o Paulo (USP) em Ribeir�o Preto.
Agora, para o ensaio cl�nico de fase 1 e 2, o cons�rcio da Versamune est� "buscando recursos com o governo federal", informou Helena Faccioli, presidente e CEO da Farmacore, empresa de biotecnologia que desenvolveu o imunizante em parceria com a USP.
Para essas duas etapas, o custo estimado � de R$ 30 milh�es e a expectativa � come�ar em julho. Na fase 3, o custo da Versamune deve ser de R$ 300 milh�es. A Butanvac, outro imunizante brasileiro em est�gio adiantado e desenvolvido pelo Instituto Butantan, recebe aporte do governo de S�o Paulo.
Sem dinheiro, o risco � de que as linhas de pesquisa acabem desmontadas. Segundo os pesquisadores das universidades brasileiras, caso os investimentos para as vacinas sejam interrompidos no meio, equipes j� treinadas para essa empreitada podem acabar buscando trabalho fora.
E, nesse caso, seria preciso formar um novo time de pesquisadores, o que, de novo, atrasa os resultados brasileiros. "Ci�ncia n�o � algo que voc� come�a, interrompe e depois retoma. � um investimento que tem de ser cont�nuo e sustent�vel. Se voc� est� fazendo uma pesquisa, falta recurso e tem de parar, depois tem de come�ar do zero", diz a reitora Sandra Goulart, da UFMG.
Governo
Procurado para comentar a distribui��o dos investimentos nas vacinas desenvolvidas pelas universidades brasileiras, o MCTI n�o respondeu. J� o Minist�rio da Economia disse que, para a execu��o dos R$ 5 bilh�es do FNDCT, "faz-se necess�ria a abertura de cr�ditos adicionais".
Segundo a pasta, est�o sendo encaminhados, por projeto de lei, cr�ditos adicionais para o FNDCT no valor de R$ 1,8 bilh�o para empr�stimos reembols�veis do fundo e de R$ 415 milh�es para viabilizar despesas com os testes cl�nicos de vacinas nacionais contra a COVID.
As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.