
Para o arquiteto e urbanista Lucio Gomes Machado, professor da Universidade de S�o Paulo, Rocha foi "o mais importante arquiteto brasileiro da atualidade, seja pelo conjunto da obra, seja pelo enorme contingente de disc�pulos".
"Suas obras destinam-se a um amplo espectro de programas e escalas de interven��o e apresentam solu��es que as unificam em torno de princ�pios evidentes em toda sua carreira", completa Machado. "� primeira vista, seria o concreto armado aparente sua caracter�stica maior, mas � claro que um simples material n�o poderia explicar sua obra. As formas geom�tricas poderiam vincul�-lo ao brutalismo que alguns especificam como ‘paulista’ - muitos o colocam como o principal ator desse movimento. Mas um exame mais apurado permite o reconhecimento de detalhes construtivos de requintada simplicidade, associados a uma arquitetura elaborada com a s�ntese perfeita de um conjunto de inten��es formais e simb�licas e expressa com clara parcim�nia de elementos construtivos. A estrutura tem papel relevante e � o fio condutor para a solu��o do programa e sua implanta��o no s�tio."
Nascido em Vit�ria, no Esp�rito Santo, em 1928, Paulo Mendes da Rocha formou-se em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, em S�o Paulo, em 1954. Desta �poca, tornou-se pr�ximo de colegas como Jorge Wilheim (1928-2014) e Carlos Millan (1927-1964) e, juntos, passaram a pensar - e, mais tarde, produzir - a arquitetura moderna paulista.
"Paulo Mendes da Rocha pertenceu � primeira gera��o de arquitetos formados nas escolas de arquitetura que se tornaram independentes de escolas de engenharia em S�o Paulo", contextualiza Machado. "O ensino no Mackenzie, onde se formou em 1954, era ent�o orientado pela arquitetura vinculada � Beaux-Arts, revisada pelo filtro da Escola da Filad�lfia, onde seu mentor, Cristiano Stockler das Neves havia se formado d�cadas antes. Muitos dos alunos reagiram a essa orienta��o e passaram a estudar a arquitetura moderna e a pratic�-la dentro e fora da escola, ampliando a o papel relevante que a arquitetura moderna adquiria naquela �poca no contexto da cultura brasileira."
Foi influenciado pelas propostas de Jo�o Batista Vilanova Vilanova Artigas (1915-1985) que Rocha passou a conceber suas primeiras obras, como o gin�sio do Clube Atlhetico Paulistano. Rocha, ent�o, torna-se um representante da chamada Escola Paulista, isto �, passa a lan�ar m�o de concreto armado aparente estruturas racionais e amplos espa�os abertos. O projeto do Paulistano foi premiado na Bienal de S�o Paulo - e isso rendeu notoriedade ao ent�o jovem arquiteto.
Tornou-se professor na Universidade de S�o Paulo em 1961, como assistente de Artigas. Anos mais tarde, durante o regime militar acabou sendo compulsoriamente afastado pela ditadura. Machado pontua que o trabalho acad�mico de Paulo Mendes da Rocha foi "prof�cuo", contribuindo para a "renova��o do ensino de projeto" e para a "forma��o, de forma decisiva, de sucessivas gera��es de arquitetos pautados por sua obra e de Artigas". "Lamentavelmente o governo militar o afastou da atividade docente, a qual somente seria retomada com o restabelecimento da democracia", comenta ele.

E � ap�s a redemocratiza��o que o arquiteto passou a desenvolver suas mais importantes obras p�blicas. Foi a partir de sua prancheta que a Pinacoteca do Estado, em S�o Paulo, por exemplo, assumiu a configura��o que a consolidaria como um dos mais importantes museus de arte do Pa�s. Ele tamb�m concebeu o Museu Brasileiro da Escultura (MuBE), em S�o Paulo, a reforma do Centro Cultural da Fiesp, tamb�m em S�o Paulo, e a Capela de S�o Pedro Ap�stolo, em anexo ao Pal�cio Boa Vista, em Campos do Jord�o.
O Pr�dio Rosa da Pra�a da Liberdade, que foi inaugurado em 1897, juntamente com Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, � tombado pelo Instituto Estadual do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico (IEPHA). O edif�cio passou por um grande trabalho de restauro e o projeto arquitet�nico foi feito por Paulo Mendes da Rocha, e tornou-se o Museu das Artes e do Metal.

Mas nem todas as suas obras s�o unanimidade p�blica. A reconfigura��o da Pra�a do Patriarca, em S�o Paulo, bem como a cobertura da Galeria Prestes Maia, acabaram sendo bastante criticadas quando executadas.
Nos anos 2000, Paulo Mendes da Rocha foi contratado para a interven��o que proporcionou novo programa para a Esta��o da Luz patrim�nio hist�rico de S�o Paulo, com a cria��o do contempor�neo Museu da L�ngua Portuguesa. Ele tamb�m projetou as novas instala��es do Museu Nacional dos Coches, em Lisboa.
Rocha foi reconhecido em 2001 com o pr�mio Mies Van Der Rohe, considerado o mais importante da arquitetura europeia. Cinco anos mais tarde, ganhou o Pritzker, condecora��o norte-americana reconhecida como "o Nobel da Arquitetura" - dentre os brasileiros, apenas ele e Oscar Niemeyer (em 1988) levaram o pr�mio. Ganhou ainda o Le�o de Ouro na Bienal de Arquitetura de Veneza, em 2016, o Pr�mio Imperial do Jap�o, tamb�m em 2016, e a medalha de ouro do Instituto Brit�nico de Arquitetos (2017).
"Paulo Mendes da Rocha foi um poeta da forma, da linha reta e da precis�o, contraponto complementar ao Oscar Niemeyer de curvas e informalidade", analisa o arquiteto e urbanista Henrique de Carvalho, pesquisador da Universidade de S�o Paulo, blogueiro do Portal Estad�o e propriet�rio do Ateli� Tanta. "Hoje, infelizmente, perdemos o arquiteto do concreto flutuante. � a vida nos lembrando que os g�nios da sensibilidade tamb�m partem. Paulo Mendes fez de seus edif�cios, cidade. Devemos ser gratos ao seu trabalho, seu esfor�o, sua generosidade e por sua arquitetura tamb�m generosa, que permanecer� como exemplo de um mundo melhor, mais aberto, mais justo, sem barreiras para o olhar."
Professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o arquiteto e urbanista Valter Caldana define Rocha como um "mestre dos mestres". "O que define um mestre? Sem d�vida, sua capacidade t�cnica, seu conhecimento profundo, sua compet�ncia reconhecida, sua energia criativa", comenta. "Mas o que faz dele um mestre dos mestres? Al�m disso tudo, sem a menor sombra de d�vida sua sensibilidade na percep��o do mundo � sua volta, sua capacidade de construir crit�rios claros para compreend�-lo, sua profunda sabedoria e, sobretudo, sua generosidade para com o outro. Sua sabedoria exemplar, seu profundo conhecimento, sua ampla cultura seu humanismo e sua generosidade."
"Por fim, ser reconhecido como sendo capaz de expressar a s�ntese de seu tempo, de uma forma leve, de propor��es magistrais, inigual�veis, onde todos se reconhecem", prossegue. "No caso da arquitetura brasileira, este mestre dos mestres se chama Paulo Archias Mendes da Rocha, de quem tenho a honra e o prazer de ser um disc�pulo."
Em 2020, Paulo Mendes da Rocha optou por doar seu acervo � Casa de Arquitectura, museu e centro expositivo de Matosinhos, na regi�o metropolitana do Porto, em Portugal. A decis�o dividiu opini�es, entre cr�ticos � atitude, afirmando necessidade de o Brasil conservar uma cole��o como a dele, e os que apoiaram-no.
"Essa decis�o foi tomada h� dois anos, bem antes, portanto, da crise atual. Nunca procurei ningu�m, foi o [diretor executivo Nuno] Sampaio que me fez a proposta de abrigar o acervo na Casa de Arquitectura e convidou Catherine Otondo para fazer o invent�rio da obra", contou ao Estad�o, � �poca. O acervo tinha quase 9 mil pe�as, entre maquetes, fotografias e desenhos originais.
No Facebook, Pedro Mendes da Rocha, filho do arquiteto, publicou uma homenagem ap�s a morte do pai neste domingo, 23: "Depois de tanto projetar edif�cios em concreto e a�o, meu pai foi projetar gal�xias com as estrelas!".