Desigualdade nas salas de aula � desafio, diz OCDE
Relat�rios da organiza��o mundial alertam que aumentar n�veis de escolaridade com qualidade e equidade poder� fazer o Brasil se unir a outras economias
Desafio � impedir que jovens abandonem os estudos. No Brasil, 47% das pessoas entre 25 e 64 anos n�o conclu�ram o ensino m�dio, contra 22% na m�dia dos pa�ses da OCDE (foto: Helder Tavares/DP/D. A Press %u2013 13/10/08
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A educa��o brasileira mostra suas chagas n�o � de hoje. No cotidiano das escolas ou nos resultados escancarados por avalia��es nacionais, defici�ncias e desigualdades parecem registrar no quadro-negro tra�os t�o marcantes quanto os de n�meros e letras. Mas, agora, o Brasil se v� diante de um ultimato: seu desenvolvimento social e econ�mico no cen�rio p�s-pandemia passa pela educa��o. Essa � umas conclus�es de dois relat�rios in�ditos da Organiza��o para a Co- opera��o e o Desenvolvimento Econ�mico (OCDE), que mostram ainda que a COVID-19 deixar� uma conta ainda mais cara a pagar se o problema n�o for enfrentado de frente.
Os documentos apresentam o panorama do ensino infantil ao superior no Brasil em uma perspectiva internacional. Com apoio t�cnico do Todos pela Educa��o e do Ita� Social, elencam prioridades e recomenda��es para as pol�ticas educacionais. Segundo a OCDE, aumentar os n�veis de escolaridade com qualidade e equidade ser� vital para que o pa�s se junte a outras economias mais avan�adas. Em 2018, quase metade das pessoas com idades entre 25 e 64 anos n�o havia conclu�do o ensino m�dio (47%), mais que o dobro da m�dia da OCDE, de 22%.
A grande propor��o de jovens que n�o concluem os estudos ou n�o o fazem dentro do tempo esperado � resultado de uma s�rie de aspectos, incluindo a repet�ncia e um curr�culo pouco engajador. A organiza��o afirma ainda que outras causas de abandono dos estudos – procurar emprego ou assumir responsabilidades de sustento da casa – podem ter sido alimentadas ainda mais pelos efeitos da pandemia, especialmente entre os mais vulner�veis.
A equidade � tema abordado in�meras vezes ao longo dos relat�rios. A OCDE afirma que o contexto social e econ�mico do Brasil tem um impacto maior sobre a participa��o e os resultados de aprendizagem do que nos outros pa�ses da organiza��o. Mesmo com o aumento das taxas de matr�cula servindo para reduzir as lacunas no acesso � educa��o, as crian�as come�am a escola com n�veis j� bastante diferentes de desenvolvimento e “prontid�o para aprender”.
“As desigualdades refletem ainda a maneira como a oferta escolar de baixa qualidade e contextos familiares socialmente mais vulner�veis se combinam para que as habilidades b�sicas n�o sejam adquiridas logo no in�cio, colocando os alunos de n�vel socioecon�mico mais baixo em uma trajet�ria que leva a um desempenho escolar fraco, altas taxas de evas�o e oportunidades de vida limitadas”, ressalta a publica��o. “Para conseguir oferecer qualidade e equidade, o Brasil precisar� definir prioridades claras e garantir os recursos necess�rios para a educa��o”, afirma.
O diretor de Educa��o e assessor especial em Pol�tica Educacional da Secretaria-Geral da OCDE, Andreas Schleicher, afirma que os resultados da educa��o no Brasil ainda est�o abaixo do que o pa�s precisa atingir para aumentar seu desenvolvimento social e econ�mico. Ele ressalta que a Covid interrompeu o progresso feito nos �ltimos anos e que a pobreza e a desigualdade est�o subindo. “Os dados s�o pr�-Covid, ou seja, n�o foram causados pela pandemia, mas � algo que s� a educa��o pode resolver. O maior esfor�o que uma sociedade pode fazer para diminuir a desigualdade � investir em educa��o”, destaca.
A presidente-executiva do Todos Pela Educa��o, Priscila Cruz, lembra que para a OCDE o momento atual � de mitigar os efeitos imediatos do prolongado per�odo de fechamento das escolas e, em paralelo, retomar a vis�o de m�dio e longo prazos para as pol�ticas educacionais do pa�s. “E para avan�armos nesses dois caminhos, o relat�rio traz an�lises detalhadas e recomenda��es espec�ficas, algo razoavelmente in�dito nas publica��es da OCDE para o Brasil”, diz.
"Para conseguir oferecer qualidade e equidade, o Brasil precisar� definir prioridades claras e garantir os recursos necess�rios para a educa��o"
Trecho de relat�rio da OCDE
PISA
O relat�rio “A educa��o no Brasil: Uma perspectiva internacional” traz um olhar especial ao Programa Internacional de Avalia��o de Estudantes (Pisa) em rela��o a pa�ses comparativamente relevantes, incluindo os da Am�rica Latina e os membros da OCDE. “Muitos jovens n�o atingem os n�veis mais b�sicos de capacidade de leitura. O Pisa avaliou ainda um n�vel abaixo do que esperamos de profici�ncia para a faixa et�ria de alunos. Por exemplo, h� uma taxa alt�ssima de estudantes com 15 anos com dificuldade de distinguir fatos de opini�es. � uma realidade que precisa mudar”, ressalta Andreas Schleicher.
De acordo com a OCDE, no Brasil, a reprova��o � mais comum entre alunos de fam�lias mais pobres e rurais e entre alunos do sexo masculino. Essas disparidades s�o maiores no Brasil do que em muitos pa�ses compar�veis. Os alunos de n�vel socioecon�mico mais baixo t�m pelo menos duas vezes mais probabilidade de ter repetido pelo menos um dos anos finais do ensino fundamental do que os alunos de n�vel mais alto (28% em oposi��o a 13%, respectivamente). J� nos pa�ses da OCDE, a diferen�a absoluta � muito menor, em torno de 9% e 3%, respectivamente. Ainda segundo o relat�rio, uma das consequ�ncias da repet�ncia � que os estudantes encerram a jornada escolar mais tarde do que o normal: 26% de todos os alunos do ensino m�dio, no Brasil, s�o dois ou mais anos mais velhos do que a idade esperada para seu ano escolar.
J� a publica��o “Education policy outlook: Brazil” (“Panorama das pol�ticas educacionais: Brasil”) tra�ou um panorama das respostas do sistema de ensino, incluindo a��es do Minist�rio da Educa��o, sociedade civil e exemplos bem-sucedidos em estados. A superintendente do Ita� Social, Angela Dannemann, ressalta que o Brasil obteve muitas conquistas no campo da educa��o nas �ltimas d�cadas e suas pol�ticas p�blicas foram exemplo para outras economias emergentes. “Mas, as taxas de realiza��o do ensino m�dio e superior s�o insuficientes comparadas a outros pa�ses e metade dos jovens de 15 anos n�o t�m n�vel b�sico de profici�ncia em leitura, segundo o Pisa. O aperfei�oamento, continuidade e investimentos em pol�ticas p�blicas s�o urgentes para oferecer qualidade e equidade aos estudantes brasileiros”, afirma.
Para o futuro, a OCDE sugere priorizar uma resposta nacional mais coerente de recupera��o da aprendizagem; apoio a educadores no desenvolvimento de novas habilidades e conhecimentos; e tratamento das lacunas de aprendizagem com urg�ncia para minimizar a interrup��o das jornadas educacionais dos estudantes.
Perspectiva de volta das aulas presenciais com popula��o vacinada amplia inten��o de iniciar um curso superior (foto: T�lio Santos/EM/D.A Press %u2013 3/8/11
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Previs�o de retomada nas universidades
Depois de 15 meses sob os impactos da pandemia do novo coronav�rus, o setor privado da educa��o superior, respons�vel por quase 90% das matr�culas no pa�s, come�a a ver sua luz no fim do t�nel. Sem saber ainda quantos alunos efetivamente perdeu e assistindo ao recuo de potenciais calouros nesse per�odo, pesquisa divulgada ontem mostra o aumento de inten��o de novas matr�culas no primeiro semestre de 2022. A vacina��o � o motor dessa engrenagem, que dever� encontrar ainda meios de garantir a perman�ncia dos poss�veis rec�m-chegados, face � falta de financiamento p�blico estudantil.
Segundo a terceira edi��o da pesquisa “Observat�rio da educa��o superior: An�lise dos desafios para 2021”, 39% dos entrevistados que tomaram pelo menos a primeira dose da vacina desejam come�ar a gradua��o neste segundo semestre e 41% no in�cio de 2022. Em junho do ano passado, a pesquisa mostrou que 36% pensavam iniciar em fevereiro do ano que vem, enquanto 43% decidiriam apenas quando a situa��o normalizasse.
Entre os jovens que ainda n�o foram vacinados e participaram desta terceira fase da pesquisa, apenas 16% responderam que t�m inten��o de come�ar seus cursos no meio do ano e 43% v�o aguardar o pr�ximo ano letivo. Os n�o imunizados representam o p�blico mais inseguro: 29% n�o se decidiram quando v�o se matricular. Entre os vacinados, esse percentual � de 9% – 3,2 vezes menor.
O levantamento foi feito pela empresa de pesquisas educacionais Educa Insights, em parceria com a Associa��o Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes). “� uma sinaliza��o positiva da retomada do segmento, mesmo que n�o seja a plenitude e que n�o v� resolver o dilema enfrentado pelo setor durante a pandemia”, afirma o diretor e fundador da empresa, Daniel Infante.
A retomada se anuncia para o ano que vem, mas acompanhada de v�rias interroga��es e desafios. A primeira � recuperar a base de alunos. A estimativa da Abmes � de que um dos resultados da pandemia seja a redu��o da ordem de 8% a 9% no n�mero de matr�culas no ensino presencial, n�meros que dever�o ainda ser confirmados pelo Censo da Educa��o Superior. “Esse impacto diz respeito n�o s� ao ingresso (de novos alunos), mas �queles estudantes que pararam de estudar por problemas financeiros ou de acesso tecnol�gico”, ressalta o presidente da associa��o, Celso Niskier. “Em termos gerais, o que tornou esse efeito menor foi o crescimento da EAD (educa��o a dist�ncia), seja pela op��o de menor custo diante da crise seja pela percep��o maior da sociedade das possibilidades e qualidades desse tipo de ensino)”, acrescenta.
Financiamento
Nesse quebra-cabe�a, entra ainda outro elemento: o suporte financeiro a alunos em condi��es socioecon�micas menos favorecidas. Por causa das regras mais recentes, de 100 mil vagas no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), apenas 46 mil foram preenchidas, segundo levantamento das mantenedoras. “Para retomar, tem que mudar a forma (do Fies), porque cada altera��o pela qual ele passou nos �ltimos anos piorou o crit�rio de acesso. Deixou de ter cunho social para atender ao lado fiscal do governo. Observamos que outros tipos de financiamento ficaram mais atrativos. Hoje, o aluno prefere ter bolsa na institui��o onde estuda e n�o contrair d�vida”, diz o diretor-executivo da Abmes, S�lon Caldas.
O problema � que a demanda � maior que a oferta. As institui��es afirmam n�o ter caixa para bancar e aquelas de pequeno e m�dio porte se encontram no lado delicado da balan�a. O setor defende o Fies emergencial para ajudar estudantes e linha de cr�dito para universidades e faculdades. “Nesta pandemia, elas cumpriram papel que deveria ser do governo, concedendo bolsas, descontos e atendendo �s necessidades individuais dos alunos. Eles tiveram consequ�ncias financeiras, e para manter esse aluno matriculado foi preciso dar ainda mais descontos, sen�o a evas�o tinha sido maior”, conclui o diretor. (JO)