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Estado de Minas PROJETO COMPROVA

Para exaltar Bolsonaro, v�deo ignora que transposi��o � de diversas gest�es

Transposi��o do S�o Francisco n�o � legado exclusivos de Bolsonaro; empreendimento come�ou em 2007, j� passou por quatro governos e n�o foi conclu�do


15/07/2021 08:20

(foto: Projeto Comprova)
(foto: Projeto Comprova)
Conte�do verificado: V�deo publicado em um site que enfatiza a atua��o do governo Bolsonaro na execu��o da transposi��o do Rio S�o Francisco, mas ignora o quanto da obra j� estava conclu�do quando a atual gest�o assumiu. A publica��o d� a entender que, com isso, Bolsonaro acabou com a seca no Nordeste e com a "m�fia dos carros-pipas"

� enganoso o conte�do de um v�deo produzido pelo Jornal da Cidade Online sobre a transposi��o do Rio S�o Francisco e a participa��o do governo Jair Bolsonaro (sem partido) na execu��o das obras. O v�deo exalta o m�rito do atual governo nos resultados do empreendimento e d� a entender que apenas por conta desta gest�o o projeto, executado desde 2007, passou a caminhar para uma conclus�o, o que n�o � verdade.

A obra ocorre desde o segundo mandato de Lula (PT) e atravessou os governos Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), seguindo na gest�o Bolsonaro. Michel Temer, em 2017, inaugurou o come�o do Eixo Leste. Em 2020, Bolsonaro deu in�cio ao funcionamento de uma parte do Eixo Norte. A obra segue em curso, com 97,58% de conclus�o. Quando Bolsonaro assumiu, a execu��o f�sica j� estava acima de 90%, como mostra esta verifica��o do Comprova.

A possibilidade de canalizar as �guas do S�o Francisco foi pensada ainda no Imp�rio. Mas, diferentemente do que sugere o argumento do v�deo de que "Bolsonaro consegue o que muitos tentaram por mais de um s�culo e n�o conseguiram", o projeto executado n�o � o mesmo da �poca de D. Pedro II.

Outro equ�voco do v�deo � afirmar que a transposi��o pode "acabar de vez com a seca no Nordeste". Ainda que seja comum nos discursos relativos � obra a men��o a um suposto "fim da seca", a ideia � inadequada, pois a obra pode garantir seguran�a h�drica para que os habitantes da regi�o possam conviver com o semi�rido, mas, como a estiagem � um fen�meno natural, n�o � poss�vel dar um fim a ela. Tampouco a transposi��o, que beneficia 4 dos 10 estados do semi�rido do Brasil, tem essa pretens�o.

Tamb�m n�o � poss�vel afirmar categoricamente, como faz o v�deo, que Bolsonaro "acabou com a m�fia dos carros-pipa no Nordeste". Na pr�tica, � plaus�vel dizer que a obra ajuda a reduzir a depend�ncia desse tipo de medida. A Opera��o Carro-Pipa, cujo intuito � auxiliar popula��es atingidas pela falta de �gua, desde 1998, � mantida pelo pr�prio Minist�rio do Desenvolvimento Regional (MDR). De 99 munic�pios da Para�ba, Pernambuco e Cear� j� beneficiados com a transposi��o, 46 anteriormente dependiam integralmente de carros-pipa.

Como verificamos?

As informa��es que constam no v�deo foram sistematizadas e o Comprova, inicialmente, procurou o Minist�rio do Desenvolvimento Regional (MDR) para saber sobre o andamento das obras da Transposi��o do Rio S�o Francisco, os investimentos feitos no atual governo e as entregas asseguradas ou previstas para a gest�o de Jair Bolsonaro. N�o houve resposta, ent�o foi recuperado um e-mail enviado entre o final de maio e o in�cio de junho, no contexto de outra verifica��o, com dados referentes ao m�s de abril.

Em seguida, foram consultadas checagens anteriores publicadas pelo Comprova sobre o mesmo assunto (aqui e aqui) e reportagens que tratavam de obras deste projeto.

Tamb�m foi feita uma busca em documentos hist�ricos no setor imperial da Biblioteca Nacional, digitalizados e disponibilizados por meio de consulta na Hemeroteca Digital, a fim de encontrar registros anteriores sobre a inten��o de se canalizar as �guas do Rio S�o Francisco para combater a seca no Nordeste desde Dom Pedro II, como diz o v�deo.

Por fim, foram acionadas por e-mail e por telefone a Secretaria de Infraestrutura, dos Recursos H�dricos e do Meio Ambiente da Para�ba, a Secretaria de Recursos H�dricos do Cear�, a Secretaria de Infraestrutura e Recursos H�dricos de Pernambuco e a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos H�dricos do Rio Grande do Norte - todos estados inclu�dos no projeto -, para saber quantas e quais as cidades beneficiadas pela transposi��o, bem como a depend�ncia delas de carros-pipa.

O Comprova tamb�m entrevistou, por e-mail, a representante da Associa��o Brasileira de Engenharia Sanit�ria e Ambiental (ABES) para a regi�o Nordeste para analisar o prop�sito e os resultados do que j� foi entregue da transposi��o. Por fim, a reportagem buscou o Jornal da Cidade Online, site que publicou o v�deo, mas n�o obteve resposta at� a publica��o deste texto.

Verifica��o

O que � a transposi��o?

Com 477 quil�metros de extens�o, o Projeto de Integra��o do Rio S�o Francisco com Bacias Hidrogr�ficas do Nordeste Setentrional (PISF), popularmente conhecido como "transposi��o do S�o Francisco", � a maior obra de infraestrutura h�drica do pa�s, segundo o MDR.

Iniciada em 2007, no segundo governo Lula, a constru��o do empreendimento atravessou os governos Lula e Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), seguindo na gest�o Bolsonaro. Em abril de 2021, segundo o governo federal, estava com 97,58% de execu��o. O atual Governo recebeu a obra com mais de 90% da execu��o, como mostra uma publica��o de 2018 do Minist�rio da Integra��o Nacional, n�o mais dispon�vel, mas recuperada atrav�s da ferramenta WayBack Machine.

A previs�o, quando a transposi��o foi iniciada, em 2007, era de que o empreendimento ficaria pronto at� 2012, mas o processo, conforme j� mostrado em verifica��o do Comprova, tem sido marcado por aditivos e atrasos, bem como diversos problemas de planejamento, verba e execu��o.

Dividida em dois eixos (Leste e Norte), a transposi��o capta �gua no Rio S�o Francisco - um dos mais importantes do Brasil - e a transporta por meio de t�neis, adutoras, esta��es de bombeamento e barragens para bacias hidrogr�ficas do Cear�, da Para�ba, de Pernambuco e do Rio Grande do Norte.

(foto: Projeto Comprova)
(foto: Projeto Comprova)

Fonte: Relat�rio de Impacto Ambiental (RIMA) do Projeto de Integra��o do Rio S�o Francisco

Assim, ao interligar a�udes estrat�gicos ao S�o Francisco - que nasce em Minas Gerais e passa por Bahia, Pernambuco, Sergipe e termina em Alagoas - conseguiria garantir seguran�a h�drica �s regi�es que sofrem historicamente com a escassez e a irregularidade das chuvas.

No Eixo Norte, com 260 km de extens�o, o empreendimento tem in�cio em Cabrob� (PE) e passa por Salgueiro, Terranova, Verdejante (PE), Penaforte, Jati, Brejo Santo, Mauriti, Barro (CE), S�o Jos� de Piranhas, Monte Horebe e Cajazeiras (PB).

J� o Eixo Leste, com 217 km, atravessa as cidades de Floresta, Cust�dia, Bet�nia, Sert�nia (PE) e Monteiro (PB).

A entrega mais recente aconteceu em 2020, quando Bolsonaro inaugurou um dos trechos finais do Eixo Norte, em Penaforte, no Cear�, que j� tinha 92,5% das obras conclu�das em 2017, como mostrou o Comprova no dia 1º de junho.

O governo federal estima que, ao ser conclu�da, a transposi��o ser� capaz de assegurar abastecimento a 12 milh�es de habitantes de, pelo menos, 390 munic�pios dos quatro estados citados.

At� o momento, com o que j� est� conclu�do da obra, dentre os quatro estados, somente cidades do Rio Grande do Norte ainda n�o s�o beneficiadas com a chegada das �guas do "Velho Chico".

Conforme informa��es fornecidas ao Comprova pelas secretarias da gest�o h�drica na Para�ba, em Pernambuco e no Cear�, at� o momento, 99 cidades s�o beneficiadas nas tr�s unidades pela transposi��o.

Veja a lista completa de cidades beneficiadas com as �guas da transposi��o do Rio S�o Francisco

Na lista de 390 munic�pios do governo federal constam todos os territ�rios nos quais, segundo a Uni�o, h� a possibilidade de �gua aduzida chegar at� o abastecimento p�blico do munic�pio em quest�o, mesmo que para isso tenha que percorrer outros sistemas e ser armazenada em reservat�rios n�o constru�dos diretamente no projeto da transposi��o.

Isso porque a transposi��o tem eixos estruturantes, mas tamb�m associados - que s�o complementares e podem ser ou ter sido executados em parceria com as gest�es estaduais -, como o Cintur�o das �guas no Cear�, que faz com que a �gua chegue a cidades distantes daquelas com obras f�sicas da transposi��o, como, por exemplo, Fortaleza, que j� � beneficiada pelo empreendimento.

(foto: Projeto Comprova)
(foto: Projeto Comprova)

Durante todos esses anos, atrasos e problemas de planejamento t�m marcado a estrutura��o do empreendimento, or�ado inicialmente em R$ 4,5 bilh�es, mas que j� consumiu, at� o momento, mais de R$ 12 bilh�es.

Devido � relev�ncia e ao volume de recursos para a implanta��o, o Tribunal de Contas da Uni�o fiscaliza as a��es ligadas � transposi��o desde 2005. O Comprova contatou a assessoria de imprensa do TCU por email para saber informa��es sobre a execu��o peri�dica da obra, mas n�o obteve resposta at� a publica��o desta verifica��o.

Divis�o da obra

Os dois eixos da transposi��o come�am em Pernambuco.

Em 2007, coube ao Ex�rcito come�ar a construir canais de aproxima��o, para ligar o Rio S�o Francisco �s primeiras esta��es de bombeamento.

O restante da execu��o do empreendimento foi dividida em 14 lotes, todos licitados em 2007. Mas, em 2011 e 2012, os lotes 5 e 8 passaram por nova licita��o.

A partir de 2012, o governo deixou de usar a divis�o de lotes e os transformou em seis metas de execu��o - tr�s em cada um dos eixos.

Eixo Leste - 217 km

Quando foi entregue e qual a situa��o atual?

O Eixo Leste foi inaugurado no dia 10 de mar�o de 2017, pelo ex-presidente Michel Temer em Monteiro, na Para�ba. Na �poca, ao participar, na cidade pernambucana de Sert�nia, do acionamento da comporta que libera as �guas para a Para�ba, conforme mat�ria da Ag�ncia Brasil, Temer disse que "esta � uma obra pensada desde o tempo do Imp�rio e executada nos �ltimos governos, por isso que eles, com a delicadeza e a civilidade que devem presidir as rela��es pol�ticas, disseram que quem terminou a obra foi o Temer, mas isto passou por v�rios governos. V�rios governos merecem o aplauso de todos".

O Comprova questionou, no dia 8 de julho, ao Minist�rio do Desenvolvimento Regional, a atual execu��o de cada trecho da obra. O pedido foi refor�ado no dia 12, mas n�o obteve retorno at� esta publica��o. No in�cio de junho, em resposta a outra verifica��o do Comprova tamb�m sobre a transposi��o, o Minist�rio informou que at� abril o Eixo Leste apresentava 97,13% de execu��o.

Conforme o governo federal, os principais avan�os se deram nesse Eixo, que est� em fase de enchimento (teste e comissionamento).

O que falta fazer?
Nesse trecho, segundo o Minist�rio, a atual gest�o precisou "concentrar esfor�os na recupera��o de etapas que j� apresentavam 100% de execu��o f�sica, mas que exigiram interven��es e reparos nos sistemas".

Eixo Norte - 260 km
Quando foi entregue e qual a situa��o atual?

A inaugura��o do Eixo Norte ocorreu em 26 de junho de 2020 e foi feita por Bolsonaro, quando a comporta que libera as �guas da transposi��o para o Cear� foi acionada.

Na resposta enviada ao Comprova no come�o de junho, o minist�rio informou que o Eixo estava com 97,84% de execu��o f�sica.

O que falta fazer?

Conforme registro no site do MDR, "todas as estruturas respons�veis pela passagem de �gua at� o Reservat�rio Cai�ara (no Rio Grande do Norte) est�o conclu�das, restando apenas a recupera��o da tubula��o em atalho e outros servi�os complementares que n�o comprometem a pr�-opera��o".

Um projeto hist�rico

O v�deo verificado afirma ainda que "Bolsonaro consegue o que muitos tentaram por mais de um s�culo e n�o conseguiram" e faz uma retrospectiva at� o Imp�rio, indicando que Dom Pedro II teria tentado "convencer o parlamento a abra�ar a causa [de garantir �gua para as regi�es secas], mas n�o convenceu as lideran�as das prov�ncias nordestinas".

Em 2017, ao inaugurar um trecho do Eixo Leste, o ent�o presidente Michel Temer tamb�m destacou que a obra era pensada desde o Imp�rio, mas isso n�o significa que o projeto executado a partir do segundo governo Lula (PT) � o mesmo idealizado h� mais de 160 anos.

O Brasil sofre com as secas h� s�culos e, em 1877, um desses epis�dios, conhecido como A Grande Seca, conforme registro em documentos hist�ricos, motivou o imperador Dom Pedro II a montar uma comiss�o imperial para pensar solu��es para enfrentar o problema.

Sobre a Grande Seca, h� uma s�rie de documentos e fotografias na Biblioteca Nacional, entre eles um mapa das regi�es afetadas, feito pelo engenheiro Andr� Rebou�as, em 1878. Antes disso, entre o final da d�cada de 1840 e o in�cio dos anos 1850, Dom Pedro II encomendou ao engenheiro Henrique Guilherme Halfeld um relat�rio sobre a explora��o do Rio S�o Francisco. O documento, de mais de 100 p�ginas, foi publicado em 1860 e inclui mapas, textos e planilhas sobre, por exemplo, como navegar pelo rio.

Halfeld tamb�m menciona a primeira proposta de canalizar as �guas do S�o Francisco para outros rios da regi�o. A canaliza��o foi concebida em 1847 pelo ent�o intendente da comarca do Crato, no Cear�, Marcos Ant�nio de Macedo.

(foto: Projeto Comprova)
(foto: Projeto Comprova)

Um artigo publicado no portal Brasiliana Iconogr�fica afirma que o projeto nunca saiu do papel, nem mesmo ap�s a cria��o da comiss�o imperial, depois da seca de 1877, "principalmente por conta das limita��es t�cnicas da �poca".

Em 1886, mesmo ano em que foi produzido um mapa hidrogr�fico para navega��o e irriga��o pelo S�o Francisco, os estudos do engenheiro Teodoro Sampaio, integrante da Comiss�o Hidr�ulica do Imp�rio, complementaram os trabalhos de Halfeld, mas a obra n�o foi feita, apenas a retirada de algumas pedras do leito do rio, ainda no final dos anos 1800. O projeto voltou a ser lembrado em 1909 e 1919, mas foi arquivado.

Um relat�rio da autoria de C�sar Nunes de Castro, especialista em Pol�ticas P�blicas e Gest�o Governamental do Minist�rio do Planejamento, Or�amento e Gest�o (MPOG), publicado pelo Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada (Ipea), em fevereiro de 2011, aponta que a ideia da transposi��o do S�o Francisco voltou a ser estudada durante o governo de Get�lio Vargas, com a cria��o em 1943 do Departamento Nacional de Obras contra as Secas (DNOCS). Em 1981, os t�cnicos do DNOCS elaboraram um novo plano, tamb�m arquivado.

J� em 1993, durante o governo de Itamar Franco, o ent�o ministro da Integra��o Nacional, Alu�sio Alves, prop�s a constru��o de um canal em Cabrob� (PE) para retirar �gua do S�o Francisco e canaliz�-la, beneficiando o Cear� e o Rio Grande do Norte. A proposta era iniciar o projeto em 1994, mas ele foi arquivado novamente ap�s parecer contr�rio do Tribunal de Contas da Uni�o.

Em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), tamb�m segundo o relat�rio, duas novas vers�es do projeto foram feitas, mas ambas foram arquivadas: a primeira de autoria da Secretaria Especial de Pol�ticas Regionais, do Minist�rio da Integra��o Nacional, e a segunda, da Companhia de Desenvolvimento do Vale do S�o Francisco. A transposi��o s� come�ou a sair do papel no governo Lula, quando a incumb�ncia de executar a obra foi entregue ao ent�o ministro da Integra��o Nacional, Ciro Gomes.

"Acabar com a seca"

O v�deo verificado enfatiza tamb�m que a transposi��o � "outra fort�ssima candidata a ser uma das promessas para a pr�xima elei��o at� acabar de vez com a seca no Nordeste". Tal afirma��o tamb�m � incorreta, pois, ainda que historicamente seja comum nos discursos relativos � obra a men��o a uma suposta possibilidade de "fim da seca", o adequado � falar de conviv�ncia com o semi�rido, tendo em vista que a estiagem � um fen�meno natural, ao qual n�o � poss�vel dar um fim, mas sim gerar condi��es para que a popula��o possa conviver com essas caracter�sticas.

O fen�meno da seca � secular e provocado por distintos fatores. Envolve as irregularidades das chuvas nas regi�es afetadas, as temperaturas elevadas e o alto �ndice de evapora��o nos territ�rios semi�ridos. A transposi��o pode garantir o abastecimento permanente da popula��o, mas n�o tem pretens�o de reverter essas condi��es naturais.

Ainda que fosse poss�vel supor que a transposi��o pode "acabar com seca no Nordeste", � preciso considerar que embora, de fato, seja a maior obra estruturante para garantir seguran�a h�drica no pa�s atualmente, e tenha aspira��o de resultados abrangentes, ela serve � popula��o espec�fica de quatro (Cear�, Rio Grande do Norte, Para�ba, Pernambuco) dos 10 estados do semi�rido brasileiro (que ainda inclui Maranh�o, Piau�, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais). Logo, embora atenda a um p�blico significativo, n�o abrange o Nordeste inteiro.

No total, segundo o governo federal, o semi�rido brasileiro ocupa 12% do territ�rio nacional e abriga cerca de 28 milh�es de habitantes nos 10 estados. A transposi��o, quando conclu�da, dever� garantir, segundo proje��o do Governo, seguran�a h�drica a 12 milh�es de pessoas.

Al�m disso, dentre os prop�sitos do Relat�rio de Impacto Ambiental (RIMA) da transposi��o de 2004, documento p�blico no qual constam as caracter�sticas e objetivos do projeto, produzido pelo ent�o Minist�rio da Integra��o Nacional (hoje Minist�rio do Desenvolvimento Regional), n�o h� men��o a possibilidade de "acabar com a seca no Nordeste". Consta "assegurar a oferta de �gua para uma popula��o e uma regi�o que sofre com a escassez e a irregularidade das chuvas".

O documento indica ainda que os objetivos b�sicos do projeto s�o:

- aumentar a oferta de �gua, com garantia de atendimento ao Semi�rido;
- fornecer �gua de forma complementar para a�udes existentes na regi�o, viabilizando melhor gest�o da �gua;
- reduzir as diferen�as regionais causadas pela oferta desigual da �gua entre bacias e popula��es.

Ao Comprova, a diretora da Associa��o Brasileira de Engenharia Sanit�ria e Ambiental (ABES) para a regi�o Nordeste, engenheira sanitarista e ambiental Vanessa Britto Cardoso, explicou que, "de fato, a realidade para atendimento ao abastecimento humano das popula��es do semi�rido situadas fora dos limites de sua bacia hidrogr�fica � bastante cr�tica e a seguran�a h�drica � condi��o indispens�vel para o desenvolvimento social e econ�mico".

Ela acrescenta que, para os estados receptores das �guas, "o que se espera � que haja, sim, garantia de justi�a h�drica, social, ambiental e econ�mica. Que as cidades, principalmente as que se situam �s margens dos rios que receber�o as �guas, implementem a pol�tica de saneamento b�sico, em conformidade com as legisla��es vigentes, e que as �guas sejam prioritariamente para o consumo humano e dessedenta��o animal".

Um dos impasses da transposi��o � justamente a finalidade do uso, al�m do modelo de gest�o pelos estados que utilizam ou v�o utilizar o recurso. A representante da ABES refor�a: "Em algumas das nossas discuss�es, entendemos que h� impasses para o pleno funcionamento da transposi��o, tais como a defini��o do seu modelo de gest�o, a busca pelos investimentos necess�rios para as obras complementares e o equacionamento do pagamento pelos altos custos operacionais dos canais".

Outro ponto a ser destacado � que com a transposi��o n�o se pretende encher completamente com as �guas do S�o Francisco todos os a�udes do percurso, conforme explicou em 2019 o gerente regional da Companhia de �gua e Esgotos da Para�ba (Cagepa), Ronaldo Meneses, � imprensa da Para�ba, e em 2021, o secret�rio de Recursos H�dricos do Cear�, Francisco Teixeira, � do Cear�.

Portanto, a obra tamb�m n�o tem capacidade e nem o objetivo de encher integralmente os reservat�rios inclu�dos no caminho, mas sim garantir que eles n�o entrem no volume morto e, com o acesso � �gua transportada, a popula��o possa ter seguran�a h�drica.

Redu��o de depend�ncia de caminh�es-pipa

O v�deo verificado tamb�m faz men��o ao fim da "m�fia dos carros-pipa no sert�o" e destaca que "equipes acabaram ainda com o monop�lio da �gua por empres�rios locais propriet�rios de frotas de caminh�es-pipa que durante d�cadas foi (sic) a �nica fonte de �gua para milh�es de nordestinos".

De fato, a depend�ncia dos chamados caminh�es-pipa no semi�rido brasileiro � um problema criticado historicamente, e obras estruturantes como a Transposi��o do S�o Francisco tendem a reduzir ou eliminar esse v�nculo.

No Brasil, o governo federal realiza desde 1998, por meio do Minist�rio da Defesa, a Opera��o Carro-Pipa. Nela o Minist�rio da Defesa, por interm�dio do Comando do Ex�rcito, contrata pipeiros e outros servi�os terceirizados de m�o de obra para a opera��o. J� os governos estaduais, por meio dos �rg�os de defesa civil, devem realizar a distribui��o de �gua pot�vel em cidades ou �reas n�o atendidas pelo Comando do Ex�rcito.

Hoje, de quatro estados - Para�ba, Pernambuco, Cear� e Rio Grande do Norte -, somente o �ltimo ainda n�o recebe as �guas da transposi��o. Conforme informa��es repassadas pelas secretarias de estado da Para�ba, de Pernambuco e do Cear�, dos 99 munic�pios que j� s�o beneficiados com a transposi��o, 46 anteriormente dependiam integralmente de carros-pipa.

A Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos H�dricos do Rio Grande do Norte tamb�m foi acionada, mas n�o respondeu at� a publica��o da verifica��o.

Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conte�dos suspeitos sobre as pol�ticas p�blicas do governo federal ou sobre a pandemia de COVID-19 que tenham viralizado nas redes sociais. Como uma obra que se arrastou por v�rios governos, a paternidade sobre a transposi��o tem sido disputada pelo menos desde 2017, quando o ent�o presidente Temer inaugurou oficialmente o Eixo Leste e este foi, horas depois, visitado pelos ex-presidentes Lula e Dilma, que fizeram uma "inaugura��o simb�lica" no local.

Com a posse de Bolsonaro, seus apoiadores tamb�m passaram a reivindicar a participa��o dele no projeto, principalmente ap�s ele acionar a comporta que levou as �guas para o Cear�, na cidade de Penaforte, em junho de 2020. Desde ent�o, v�rias informa��es incorretas t�m circulado sobre o papel do atual governo na obra. O tema voltou a ganhar for�a depois que Bolsonaro inaugurou em maio um trecho do Canal do Sert�o, obra complementar da transposi��o em Alagoas.

O v�deo verificado teve 110.483 visualiza��es at� a manh� desta quarta-feira (14/7), no YouTube, al�m de outros 16.971 compartilhamentos do texto publicado no site.

O Comprova j� mostrou que postagens inflavam a responsabilidade da atual gest�o no andamento das obras; que o Ex�rcito n�o refez todo o trecho da transposi��o inaugurado por Temer e Lula; que a fam�lia do ex-ministro Ciro Gomes n�o atrasou o projeto por ser dona de empresas de carros-pipa; que n�o havia provas de que o rompimento ocorrido na barragem inaugurada por Bolsonaro fosse fruto de sabotagem; que posts faziam compara��es enganosas sobre o projeto para exaltar Bolsonaro; e que obras da transposi��o atribu�das em v�deo a Bolsonaro em Cabrob� foram inauguradas por Dilma e Temer.

Enganoso, para o Comprova, � o conte�do que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpreta��o diferente da inten��o de seu autor; ou ainda aquele que confunde, com ou sem a inten��o deliberada de causar dano.


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