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Estado de Minas GERAL

Sob Bolsonaro, n�mero de multas pagas por crimes ambientais na Amaz�nia cai 93%


19/07/2021 13:00

Os entraves � fiscaliza��o ambiental da Amaz�nia na gest�o Jair Bolsonaro alcan�am n�o s� quem monitora infra��es no campo, como aqueles que est�o nos gabinetes de �rg�os federais, julgando esses processos. Em 2019 e 2020, a m�dia de processos com multas pagas por crimes que envolvem a vegeta��o nos Estados da Amaz�nia Legal despencou 93% na compara��o com a m�dia dos quatro anos anteriores. A centraliza��o de decis�es e a burocratiza��o de processos ajudam a explicar o mau desempenho.

O dado faz parte de levantamento do Centro de Sensoriamento Remoto e do Laborat�rio de Gest�o de Servi�os Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Os pesquisadores mostram que mudan�as em regras internas do Minist�rio do Meio Ambiente e na legisla��o entre 2019 e 2020 dificultaram o trabalho de campo dos fiscais e o andamento interno de processos ligados � apura��o de infra��es ambientais, como desmate e extra��o de madeira irregulares.

Desde 2019, Bolsonaro tem sido alvo de cr�ticas no Brasil e no exterior diante da explos�o de queimadas e do desmatamento na Amaz�nia. Para combater crimes ambientais, o governo aposta em opera��es militares - as For�as Armadas, por�m, n�o aplicam san��es a quem desmata ou faz queimadas irregulares. Apesar das tropas, a devasta��o da floresta segue alta, com a maior taxa em 12 anos.

Segundo o estudo da UFMG, a m�dia anual era de 688 processos com multas pagas entre 2014 e 2018 no Ibama, autarquia ligada ao minist�rio. Em 2019 e 2020, sob o comando do ex-ministro Ricardo Salles, os balan�os foram 74 e 13 multas pagas (m�dia de 44). Desde que assumiu, Bolsonaro tem declarado seu prop�sito de parar a "ind�stria da multa" e se posicionou contra medidas de fiscais.

O n�mero de processos relacionados a infra��es que envolvem a vegeta��o julgados em 1� e 2� inst�ncia tamb�m recuou: de 5,3 mil anuais entre 2014 e 2018 para somente 113 julgamentos em 2019 e 17 no ano passado. Os dados foram obtidos pelos pesquisadores via Lei de Acesso � Informa��o. O grupo diz que pedidos chegaram a ser negados e, depois houve envio de dados. Para especialistas, eventuais defasagens de registros s�o pequenas e n�o mudam o cen�rio. Procurado pelo Estad�o desde segunda-feira, o minist�rio n�o se manifestou.

Para o bi�logo da UFMG Felipe Nunes, um dos autores do estudo, o risco da aus�ncia de responsabiliza��o por crimes ambientais � a desmoraliza��o institucional e sensa��o maior de impunidade. Essa responsabiliza��o come�a com o fiscal em campo, que expede autos de infra��o quando v� irregularidades. Mas, para a puni��o valer, � preciso ter julgamento do processo. Em 2019 e 2020, a queda de autos de infra��o, que j� ocorria desde 2017, se acentuou.

Autos de infra��o s�o julgados administrativamente pelo Ibama ou Instituto Chico Mendes (ICMBio) em duas inst�ncias. Em alguns casos, saem da esfera administrativa para a judicial. Em 2019, um decreto obrigou Ibama e ICMBio (que cuida de �reas protegidas federais) a fazerem audi�ncias de concilia��o com os autuados. Antes dessa audi�ncia, a multa n�o � cobrada nem passa por julgamento. Na pr�tica, travou o andamento dos processos.

N�o havia recursos - nem de pessoal nem tecnol�gico - para fazer audi�ncias, que acabavam replicando informa��es j� repassadas pelos fiscais. "Toda a explica��o que o fiscal dava em campo, de que podia parcelar a multa, optar pela recupera��o do dano, agora tem de ser feita tamb�m em audi�ncia de concilia��o", diz Alex Lacerda, servidor do Ibama e diretor executivo da Associa��o Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente.

Ele, analista no Par� e ex-superintendente do Estado, v� risco de prescri��o de milhares de processos. Hoje, na �rea em que trabalha, � feita uma audi�ncia de concilia��o por semana. Mas, para dar conta dos cerca de 1,8 mil autos de infra��o por ano, seria preciso ter 30 vezes mais audi�ncias, diz o servidor.

Em maio, o Tribunal de Contas da Uni�o (TCU) j� indicou paralisia na gest�o de multas ambientais. Para especialistas, as restri��es impostas pela pandemia n�o s�o a causa, j� que � poss�vel condu��o remota do processo. "Antes, (o autuado) recebia o auto e uma guia para pagar. Agora, o que recebe � comunica��o para reuni�o que vai ocorrer meses depois. Ent�o ningu�m paga e espera a reuni�o", diz Suely Ara�jo, especialista s�nior em pol�ticas p�blicas do Observat�rio do Clima e presidente do Ibama na gest�o Michel Temer (2016-2018).

Historicamente � baixo o n�mero de multas ambientais pagas, j� que boa parte dos autuados prefere usar todos os recursos antes de admitir a infra��o - mas agora o cen�rio "piorou muito", diz Suely. O intervalo entre o auto de infra��o e a audi�ncia pode passar de dois anos. H� casos de autos de 2018, por exemplo, que s� passaram por audi�ncia de concilia��o em maio deste ano.

Al�m disso, servidores do Ibama e do ICMBio dizem ser preciso remanejar equipes da fiscaliza��o para participar de audi�ncias. Mas � comum quem recebeu a multa n�o ir. "A concilia��o, em teoria, � fant�stica. Diz que vai evitar contrata��o de advogados, morosidade e que o Estado receber� mais r�pido. Mas, na pr�tica, n�o acham o infrator e n�o tem equipe nem tecnologia para fazer a quantidade de reuni�es", diz Nunes.

J� o advogado Francisco de Godoy Bueno reclama que havia falta de crit�rios na aplica��o de multas. "Os autos est�o sendo aplicados agora com melhor crit�rio", afirma ele, s�cio do escrit�rio Bueno, Mesquita e Advogados, voltado para empresas do agroneg�cio.

Julgamentos

A centraliza��o crescente de decis�es � outro ponto de alerta. Quando n�o h� concilia��o, � feito julgamento na 1.� inst�ncia - fun��o concentrada a partir deste ano nas m�os do superintendente estadual, independentemente do valor da multa. Antes, havia uma equipe em cada Estado, al�m do pr�prio superintendente, para avaliar. E multas mais elevadas eram julgadas na sede do Ibama. Nos �ltimos anos, as superintend�ncias t�m sido ocupadas por indica��o pol�tica e boa parte s�o militares.

"Al�m de poder haver conflito de interesses, a maioria dos indicados n�o possui experi�ncia ou conhecimento no assunto", dizem os pesquisadores da UFMG. Bueno, por sua vez, acredita que a centraliza��o d� uniformidade ao entendimento de v�rios setores do Ibama.

J� processos de 2.� inst�ncia ficam todos com o presidente do Ibama - no �ltimo ano, s� quatro foram julgados nesta esfera. Na sexta, o comando do �rg�o passou para Jonatas Trindade, servidor federal de carreira.

Antes, era ocupado pelo tenente-coronel da Pol�cia Militar de S�o Paulo, Luis Carlos Nagao. Quando Salles assumiu, nomeou Eduardo Bim, afastado do cargo em maio deste ano e inclu�do no inqu�rito que investiga Salles por supostas irregularidades na exporta��o de madeira. O Estad�o tamb�m procurou o Ibama e o ICMBio, mas n�o obteve nenhuma resposta.

Impunidade

"O presidente disse que voc�s n�o podem mais fazer isso". � o que escutam com frequ�ncia fiscais do Ibama quando v�o a campo fazer autua��es, segundo Alex Lacerda, servidor do �rg�o. A fala �s vezes vem acompanhada de v�deos de Jair Bolsonaro contra os trabalhos de fiscaliza��o. Tamb�m � comum ouvir de propriet�rios de terra j� autuados que os processos n�o andam, afirma. "Isso empodera o pessoal", diz o agente, que atua no Par�, um dos Estados mais pressionados pelo desmate.

A baixa convers�o dos crimes ambientais em multas efetivamente pagas cria uma sensa��o de impunidade e prejudica at� os trabalhos de fiscaliza��o. "Os sinais s�o muito importantes. Quando um l�der fala mal do Ibama, fala em 'ind�stria da multa', passa um sinal p�ssimo para o campo de que pode invadir, desmatar, minerar", afirma Suely Ara�jo, especialista s�nior em pol�ticas p�blicas do Observat�rio do Clima e ex-presidente do Ibama.

Uma servidora do ICMBio, que preferiu n�o se identificar, relatou ao Estad�o haver uma percep��o entre os infratores de que a fiscaliza��o est� paralisada. A sensa��o entre os colegas, de acordo com ela, � de medo. E a agressividade com os fiscais tamb�m aumentou.

Para Suely, um dos mecanismos para resolver o baixo pagamento de multas ambientais � a convers�o das san��es em servi�os ambientais. Outro ponto � descentralizar o poder dado a superintendentes nos julgamentos - em cada Estado, o superintendente � o �nico que pode julgar processos em 1� inst�ncia. Hoje, h� cerca de 99 mil processos de infra��o ambiental pendentes de julgamento no Ibama, em 1� ou 2� inst�ncias, diz o levantamento da UFMG.

In�dito

O estudo aponta ainda que houve redu��o nos embargos ambientais, de 2.589 em 2018 para 385 em 2020. Quando uma �rea � embargada, a produ��o obtida � considerada irregular, entra em uma lista compartilhada internacionalmente e n�o pode ser comercializada. Em 2020, pela primeira vez, o n�mero de desembargos pelo Ibama foi superior ao de embargos.

Na Europa, autoridades e empresas t�m apertado o cerco contra mercadorias brasileiras cuja cadeia de produ��o envolva desmatamento. Por aqui, exportadores pressionam o governo Bolsonaro para melhorar as pol�ticas nesse setor e recuperar a reputa��o internacional.

Para os pesquisadores, a redu��o de embargos � preocupante, "pois indica a ado��o de uma estrat�gia de fiscaliza��o que evita causar san��es econ�micas imediatas para os infratores". Al�m de Felipe Nunes, o levantamento � assinado pelos pesquisadores Raoni Raj�o, Jair Schmitt e Britaldo Soares-Filho, todos ligados � UFMG.

Na opini�o do advogado Francisco de Godoy Bueno, que atende clientes do agroneg�cio, o n�mero de embargos era excessivo. "� uma medida preventiva que causava grande preju�zo porque o sujeito ficava sem poder colher sua lavoura." As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.


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