A fam�lia de Vanessa Gonzaga Noronha viveu horas de ang�stia naquela manh� de janeiro de 2013 para ter not�cias de seu irm�o, Odomar Gonzaga Noronha. Ela, sua irm� e seu pai pegaram o �nibus at� os hospitais de Santa Maria para ver se o encontravam, j� que na noite anterior ele era uma das centenas de pessoas que estavam na boate Kiss quando houve o inc�ndio que marcou a hist�ria do Pa�s.
Por volta das 15h daquela tarde, depois de passar pelos hospitais sem encontrar o nome de Odomar nas longas listas de feridos, seguiram rumo ao �ltimo local para obter informa��es sobre as v�timas, o Centro Desportivo Municipal (CDM) da cidade. "Todo mundo que n�o tinha mais esperan�a de encontrar seus parentes, descia aquela rua. Eram muitas pessoas em sil�ncio descendo em dire��o ao CDM. Era uma descida silenciosa", relembra Vanessa.
Odomar, ent�o com 27 anos, foi uma das 242 pessoas que morreram na trag�dia. Outras 636 ficaram feridas. Desde a �ltima quarta-feira, 1, familiares e sobreviventes acompanham o momento aguardado desde ent�o - o julgamento dos quatro r�us que respondem pelo inc�ndio. "Queremos um pouco de paz, foram oito anos de luta e de perda", desabafa a irm�.
Para Vanessa, foram anos de impot�ncia � espera de uma resposta. "Precisamos disso para acalentar nossos cora��es, para n�o deixar que isso torne a acontecer. Podemos ter esperado todo esse tempo, foi doloroso, mas chegamos at� aqui", diz.
Para o psiquiatra Vitor Crestani Calegaro, coordenador do ambulat�rio de Psiquiatria do Centro Integrado de Atendimento �s V�timas de Acidentes, em Santa Maria, o julgamento tem um simbolismo muito importante. "Nesse momento as pessoas est�o lidando com a expectativa. Quando tivermos o dado concreto, possibilita que a pessoa lide com o fato. A� podemos entender isso, do ponto de vista individual e coletivo, e entender como ser�o as pr�ximas p�ginas deste livro", resume.
Segundo o psiquiatra, que atende aos sobreviventes do inc�ndio h� oito anos, o julgamento tem, tamb�m, um aspecto de encerramento de um ciclo. "Essa hist�ria da Kiss est� sendo escrita no livro autobiogr�fico de cada pessoa envolvida. Vai ficar na mem�ria individual tanto quanto na mem�ria coletiva. � um acontecimento que vai ficar na hist�ria do Pa�s", pontua.
Uma cidade em luto
Vanessa havia acabado de ser aprovada para cursar Jornalismo na universidade, mas depois daquele 27 de janeiro preferiu tirar um tempo das not�cias: durante nove meses, n�o assistia TV, n�o ouvia r�dio e nem visitava o centro da cidade, onde ficava a boate. A cidade, em si, tamb�m se transformou, segundo Vanessa. "� bem dif�cil conversar com algu�m em Santa Maria que n�o saiba de uma pessoa que tenha falecido l�", conta. "Tudo mudou. A forma como a gente v� os nossos modos de lazer, a universidade, nada ficou como era antes".
O cotidiano de Santa Maria, que era alegre e repleto de jovens universit�rios, deu espa�o a um clima de luto coletivo. "Depois poucas pessoas sa�am � noite, poucas iam se divertir, as pessoas tinham um aspecto triste. N�o era s� a gente, parecia que toda a popula��o de Santa Maria tinha perdido um familiar", relembra a jornalista.
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