
De acordo com o �ltimo boletim epidemiol�gico publicado pelo Minist�rio da Sa�de, os casos de chikungunya aumentaram 31% no Brasil na compara��o entre 2020 e 2021.
At� o dia 4 de dezembro deste ano, foram registrados 93,4 mil casos prov�veis da doen�a, causada por um v�rus e transmitida pela picada do mosquito Aedes aegypti.
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A regi�o Nordeste segue como a mais afetada, com uma incid�ncia de 111,7 casos a cada 100 mil habitantes. Mas chama a aten��o tamb�m o aumento de afetados em outras partes do pa�s, como o Sudeste, que reportou 29,1 casos por 100 mil indiv�duos.
S� em S�o Paulo, o n�mero de afetados por chikungunya saltou de 281 em 2020 para 18,2 mil em 2021, o que representa um aumento de mais de 6.000%.A t�tulo de compara��o, as outras duas enfermidades que tamb�m dependem da a��o deste mesmo mosquito tiveram uma queda: o n�mero de pacientes com dengue caiu 45,7%, enquanto o de zika se reduziu em 15,4% no mesmo per�odo analisado.
Entre as poss�veis explica��es para essa diferen�a, especialistas ouvidos pela BBC News Brasil destacam a forma menos intensa de como a chikungunya se espalhou pelo territ�rio brasileiro desde que foi introduzida por aqui, em 2014, al�m da enorme quantidade de pessoas suscet�veis em v�rias regi�es do pa�s.
Eles tamb�m temem que a chegada do ver�o e de dias mais quentes representem uma eleva��o ainda maior nos casos da doen�a ao longo das pr�ximas semanas.
"Os v�rus transmitidos pelo Aedes t�m uma caracter�stica sazonal, e h� um aumento na frequ�ncia de casos no per�odo das chuvas e do calor, que costuma propiciar um ambiente favor�vel � prolifera��o desses mosquitos", explica a m�dica Melissa Falc�o, da Sociedade Brasileira de Infectologia.
"Esperamos, portanto, um aumento de casos de chikungunya para os pr�ximos meses", completa.

Uma doen�a onde as sequelas s�o regra, n�o exce��o
Os m�dicos costumam dividir a chikungunya em tr�s fases.
A primeira � a aguda, que dura at� dez dias e costuma ser marcada por febre, fadiga e dores no corpo.
Na sequ�ncia, vem a fase subaguda, que se estende por at� tr�s meses. Nela, a febre deixa de ser uma preocupa��o, mas as dores podem se intensificar e atingir principalmente as articula��es das m�os, dos p�s, dos tornozelos e dos joelhos.
Por fim, mais da metade dos acometidos progride para a fase cr�nica, que tamb�m � marcada pelos inc�modos nas juntas do corpo.
"Pesquisas feitas na �ndia, que tamb�m apresenta muitos casos de chikungunya, mostram que essa fase cr�nica pode persistir em alguns pacientes por at� cinco anos", calcula o virologista R�mulo Neris, doutor em imunologia e pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
E isso, claro, representa um tormento para os pr�prios indiv�duos e para todo o sistema de sa�de.
"Durante os surtos, o impacto da chikungunya � muito grande. As unidades ficam superlotadas, com aumento da demanda de atendimento em mais de 100% nas unidades de pronto-atendimento", relata Falc�o.
"E uma epidemia de chikungunya agora pode ter impactos ainda mais negativos, pois estamos com os profissionais de sa�de saturados pelo trabalho extenuante da pandemia de Covid-19", acrescenta.
Como voc� deve ter percebido nos �ltimos par�grafos, a dor � a principal complica��o da doen�a. O pr�prio nome dela, ali�s, vem do maconde, uma das l�nguas faladas na Tanz�nia, onde a primeira epidemia foi registrada no ano de 1953.
Neste idioma, a palavra chikungunya remete a "contorcer-se" ou "dobrar-se", numa refer�ncia direta aos fortes inc�modos que afetam as articula��es e os m�sculos e fazem os pacientes ficarem encolhidos e prostrados.

E, apesar de a enfermidade ser conhecida h� algumas d�cadas, ainda n�o se conhecem todos os mecanismos por tr�s de tanta dor meses ou at� anos ap�s a invas�o viral.
"Em alguns indiv�duos, at� encontramos uma infec��o residual no tecido que envolve as articula��es. Em outros, n�o observamos mais nenhum v�rus", conta Neris.
"� poss�vel que esse quadro tenha algo a ver com a resposta do sistema imunol�gico do paciente, que acaba ficando desregulado e prejudica o pr�prio corpo", especula o especialista.
Mas o que explica esse novo aumento agora?
Moradora de Feira de Santana, na Bahia, a infectologista Melissa Falc�o acompanhou de perto a primeira onda de chikungunya que varreu boa parte do pa�s a partir de 2014.
"Esse v�rus foi introduzido no Brasil de forma simult�nea em duas cidades: Feira de Santana (BA) e Oiapoque, no Amap�", lembra.
Em 2016 e 2017, grandes surtos de chikungunya foram registrados em Pernambuco, Para�ba e Cear�.
"Mas, diferentemente do que observamos com dengue e zika, a difus�o dessa terceira doen�a pelo pa�s ocorreu de maneira heterog�nea. Ela se espalhou rapidamente pelo Nordeste, mas teve uma dissemina��o mais lenta do que o esperado nas outras regi�es", analisa.
Falc�o lembra que o Brasil experimentou uma forte epidemia de dengue entre 2015 e 2019, o que faz com que muita gente tenha uma imunidade alta contra essa mol�stia agora. Algo parecido tamb�m aconteceu com o zika: o espalhamento muito r�pido e amplo da doen�a pelo pa�s a partir de 2015 reduziu o n�mero de suscet�veis mais recentemente.
Do ponto de vista da m�dica, essa diferen�a nos cen�rios epidemiol�gicos ajuda a entender por que as duas doen�as (zika e dengue) passaram por uma redu��o em 2021, enquanto a chikungunya teve um crescimento recente nos casos, j� que ainda existe um n�mero grande de brasileiros suscet�veis a essa terceira infec��o.
Vale notar que a eleva��o do numero de pacientes acontece no Nordeste, mas tamb�m come�a a avan�ar por outros locais.
"Os casos de chikungunya v�m aumentando em regi�es que foram poupadas anteriormente, como o Estado de S�o Paulo, que enfrenta desde o in�cio de 2021 a primeira transmiss�o mais importante dessa doen�a", aponta.
Falc�o observa que, em terras paulistas, a regi�o da Baixada Santista acumula cerca de 97% dos casos registrados e que isso evidencia "um potencial de dissemina��o da doen�a para as demais regi�es".
Neris acrescenta outros poss�veis fatores que ajudam a entender o atual cen�rio.
"Precisamos considerar tamb�m a grande distribui��o dos mosquitos Aedes pelas cidades brasileiras e um poss�vel aumento na capacidade de testagem e diagn�stico dessa doen�a nos �ltimos anos", lista o virologista.
"Al�m disso, tamb�m precisamos de novos estudos para verificar se o v�rus da chikungunya n�o passou por muta��es ou adquiriu uma capacidade de se transmitir mais facilmente. Essa possibilidade por enquanto n�o passa de especula��o, mas ela tamb�m precisa ser averiguada", complementa.
O que fazer agora?
Na vis�o dos especialistas, existem ao menos quatro grandes eixos estrat�gicos que podem ser refor�ados para conter os casos de chikungunya nos pr�ximos meses.
"O Governo Federal precisa incrementar ainda mais a capacidade de testagem e vigil�ncia, monitorar os indiv�duos com suspeita de infec��o e oferecer tratamento de acordo com os sintomas", cita Neris.
A BBC News Brasil entrou em contato com o Minist�rio da Sa�de para obter um posicionamento a respeito do aumento de casos de chikungunya e quais medidas est�o sendo tomadas, mas n�o foram enviadas respostas at� a publica��o desta reportagem.
"J� Estados e munic�pios devem refor�ar as medidas para controlar o vetor da doen�a, o mosquito Aedes. Isso envolve a aplica��o de larvicidas e inseticidas, a cria��o de for�as-tarefa para eliminar criadouros e o trabalho dos agentes de sa�de, que batem na casa das pessoas para passar as orienta��es de preven��o", aponta o virologista.

A ci�ncia tamb�m tem muito a contribuir com novas solu��es contra a chikungunya, como vacinas e tratamentos antivirais. Infelizmente, as pesquisas nessa �rea andam devagar: de acordo com o site ClinicalTrials.Gov, que re�ne informa��es sobre testes cl�nicos com novos produtos, existem apenas sete estudos ativos que buscam um imunizante contra essa doen�a.
A t�tulo de compara��o, ocorrem atualmente 534 pesquisas sobre vacinas contra a Covid-19.
"Nesse sentido, um campo que tem avan�ado bastante � a inocula��o da bact�ria Wolbacchia no Aedes aegypti. Quando presente dentro desse mosquito, esse micro-organismo impede que os v�rus da dengue, do zika, do chikungunya e da febre amarela urbana se desenvolvam, contribuindo para redu��o dessas doen�as", aponta Falc�o.
As pesquisas que avaliam essa estrat�gia est�o em andamento (inclusive no Brasil) e trouxeram resultados promissores nos �ltimos meses.
Por fim, existe a responsabilidade individual na preven��o de chikungunya e das outras enfermidades transmitidas pelo Aedes.
"Vale fazer o uso do repelente, que � efetivo para prevenir a picada do mosquito, que costuma estar mais ativo no in�cio da manh� e no final da tarde", sugere a infectologista.
"A popula��o tamb�m contribui ao eliminar os focos do mosquito nas resid�ncias. Basta verificar uma vez por semana todos os locais onde ocorre ac�mulo de �gua parada, que serve de criadouro", aconselha.
Entre os poss�veis dep�sitos, � importante checar desde objetos grandes, como piscinas e caixas d'�gua descobertas, at� espa�os mais apertados, como latas, tampas de garrafa pet, vasos de planta e os reservat�rios de l�quidos da geladeira e do ar condicionado.
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