
Enquanto ainda � comum ver turistas retirando conchas, pedras e areia das praias brasileiras, assim como o com�rcio de artesanato com esses materiais, em alguns pa�ses isso � crime ambiental.
Nos Estados Unidos, por exemplo, uma turista foi condenada a 15 dias de pris�o e multada em cerca de US$ 800 (o equivalente a mais de R$ 3 mil na �poca) ao ser flagrada coletando conchas de uma praia do Sul da Fl�rida em 2018, segundo o jornal Miami Herald.
Na It�lia, um casal franc�s foi detido pela guarda costeira ao tentar embarcar com 40 quilos de areia branca retirada das praias da Sardenha em 2019.
Retirar areia, pedras e conchas das praias italianas pode resultar em pena de um a seis anos de pris�o. Os turistas alegaram � ag�ncia RFI na �poca que queriam levar uma "lembran�a" das f�rias para a casa.
"Se uma concha for retirada para fins pedag�gicos, cient�ficos ou para ser encaminhada ao museu, isso n�o � um problema", afirma o ocean�grafo Maikon Di Domenico, coordenador do curso de Oceanografia da Universidade Federal do Paran� (UFPR).
"O problema � quando todos querem levar uma 'lembran�a'. Se pensarmos em uma praia com milhares de pessoas, em que todos retiram conchas, essa escala de interfer�ncia humana passa a ser um problema", diz o ocean�grafo.
No Brasil, o site do Minist�rio do Meio Ambiente informa que � proibido pela Lei de Crime Ambiental o com�rcio de corais e artesanato com corais (Art.33 da Lei nº 9605/98), com pena de um a tr�s anos de deten��o.
A pasta tamb�m orienta que n�o se deve coletar de nenhuma praia do pa�s conchas, pedras, estrelas do mar e ouri�os.
Mas por que retirar as conchas da praia � algo nocivo ao meio ambiente a ponto de ser crime ambiental?
A resposta est� na principal subst�ncia que comp�e a concha, o carbonato de c�lcio (CaCO3), vital para a manuten��o de todo o ecossistema marinho.
"O carbonato de c�lcio � essencial na forma��o de esqueletos, conchas e diversas outras estruturas de v�rios seres vivos, como mand�bulas em minhocas marinhas, entre outros exemplos", explica Di Domenico.
As conchas tamb�m servem de abrigo para animais e algas, acrescenta a pesquisadora em Sistemas Costeiros e Oce�nicos da UFPR, Larissa Regina Pinto.
"Uma concha pode atuar como a pr�pria areia, ou seja, servir de substrato para algas, al�m de �ncoras para animais e plantas, que podem se aderir a elas. Tamb�m servem de abrigo ou mesmo de casa para outros animais", diz Pinto.
Concha de 500 anos
As conchas que encontramos na areia s�o formadas pelos moluscos, animais invertebrados de corpo mole.
"Conchas s�o estruturas que protegem o corpo 'mole' da maioria dos moluscos. Elas surgem ainda na forma de protoconchas, assim que os moluscos nascem", afirma a doutora em Sistemas Costeiros e Oce�nicos, Ana Luiza Gandara-Martins.

A ocean�grafa explica que as conchas est�o em constante constru��o durante a vida do molusco.
"Conforme o molusco cresce, as camadas de carbonato de c�lcio s�o depositadas na concha", diz.
As camadas de carbonato de c�lcio formam an�is nas conchas. Assim, para estimar a idade de um molusco, contam-se os an�is.
"O molusco mais antigo j� encontrado foi um indiv�duo da esp�cie Arctica islandica, coletado durante uma expedi��o em 2006. Sua idade foi estimada em 507 anos", conta Gandara-Martins.
Quando os moluscos morrem, suas conchas ficam � deriva no mar, sendo transportadas at� a praia por meio das correntezas e ondas.
Na praia, os compostos org�nicos que mantinham os cristais minerais unidos come�am a se decompor e as conchas entram em processo de desmineraliza��o, fazendo com que o carbonato de c�lcio seja absorvido pelo ecossistema.
Sequestro de CO2
Apesar das florestas serem consideradas o pulm�o do mundo, cerca de 90% do g�s carb�nico emitido pelas atividades humanas — principal vil�o do efeito estufa e das mudan�as clim�ticas — � sequestrado pelos mares por meio dos organismos e seres vivos marinhos.
Por isso, as conchas tamb�m s�o importantes contra as mudan�as clim�ticas, pois elas participam, de maneira indireta, do processo de sequestro de g�s carb�nico pelos ambientes marinhos.
"Organismos como estrelas-do-mar, ouri�os, corais, gastr�podes, algas rodof�ceas, foramin�feros e minhocas-marinhas fazem o processo de calcifica��o [para formarem seus esqueletos]", explica Di Domenico.
O processo de calcifica��o �, de acordo com o ocean�grafo, "uma verdadeira bomba biol�gica do ciclo biogeoqu�mico do carbono", uma vez que auxilia tanto na manuten��o do pH da �gua — essencial para a manuten��o do ecossistema marinho —, quanto no sequestro de g�s carb�nico atmosf�rico.
Contudo, para fazer o processo de calcifica��o, os seres vivos precisam absorver do meio ambiente o c�lcio, vindo da desmineraliza��o das conchas.
"Ao manter as conchas no oceano, garantimos que estes compostos estar�o dispon�veis no ambiente para dar continuidade aos ciclos biogeoqu�micos", explica a ocean�grafa Gandara-Martins.
Corais: se mergulhar, n�o toque
O processo de desmineraliza��o das conchas tamb�m � importante para os corais, seres vivos formados h� milhares de anos. Considerado o mais biodiverso habitat marinho, os recifes de coral s�o um dos mais importantes ecossistemas do mundo.
Segundo um documento do Minist�rio do Meio Ambiente de 2018, "mais de 500 milh�es de pessoas em todo o mundo dependem de recifes para seu sustento, seguran�a alimentar e prote��o costeira".

Por outro lado, os recifes tamb�m s�o um dos ecossistemas mais vulner�veis � a��o humana, podendo morrer com um simples toque.
"Podemos machucar os corais ou at� mat�-los com nosso toque, pois podemos transmitir doen�as ou ajudar a dissemin�-las no ambiente. Al�m disso, alguns corais s�o estruturas afiadas e cortantes, que podem queimar quem os toca", explica Di Domenico.
O Minist�rio do Meio Ambiente orienta que nunca se deve tocar nos corais durante um passeio por piscinas naturais ou um turismo de mergulho marinho, assim como n�o se deve alimentar os peixes durante o passeio.
"Nunca alimente peixes com sobras, ra��o ou p�o, pois isso prejudica a sa�de deles e dos corais", orienta o minist�rio.
Afinal, o que pode ou n�o na praia?
Apesar de o Brasil n�o ter uma legisla��o espec�fica sobre o que se pode ou n�o fazer no turismo costeiro, a ilha de Fernando de Noronha, em Pernambuco, tem suas pr�prias normas.
O site do governo local informa que � proibida a retirada de "conchas, pedras, corais ou partes de animais ou vegetais da ilha"; "alimentar, matar, capturar, perseguir, tocar ou nadar intencionalmente com os animais silvestres";
"transportar sementes, plantas ou seus fragmentos e/ou animais" para Fernando de Noronha. A multa para quem cometer tais infra��es pode chegar a R$ 5 mil.
Cachorros na praia
Al�m de Fernando de Noronha, os animais de estima��o s�o proibidos de frequentarem quase todas as praias brasileiras, aponta o professor do Instituto Oceanogr�fico da Universidade de S�o Paulo (USP), Alexander Turra.
"A praia � um ambiente de transmiss�o do bicho geogr�fico, um parasita comum em c�es e gatos e nocivo �s pessoas. Por isso, em praticamente todo o Brasil, existem leis municipais que impedem a visita��o de cachorros nas praias", explica o professor.
Levar o animal de estima��o para a praia tamb�m pode ser prejudicial aos seres vivos que habitam a faixa de areia.
"Existe um caranguejo que vive na parte de areia seca, conhecido como maria-farinha, que tem sido bastante afetado pela presen�a dos cachorros, que cavam a areia para fazerem buracos e acabam matando esses caranguejos", aponta Turra.
Alimentar peixes
Gandara-Martins explica que alimentar peixes durante um passeio no mar ou um mergulho provoca altera��es no comportamento das esp�cies locais.
"Estas esp�cies passam a ficar condicionadas � oferta de comida por humanos e deixam de consumir seus alimentos naturais. Se a alimenta��o recreativa for interrompida, muitos peixes podem morrer at� que a popula��o estabele�a seu equil�brio", explica a ocean�grafa.
Os peixes que se acostumam com o alimento dado pelas pessoas tamb�m podem se tornar mais agressivos.
"Os peixes ficam habituados � presen�a humana e � alimenta��o recreativa se aproximam muito das pessoas, o que aumenta o risco de captura desses organismos e promove o aumento da agressividade nesses peixes", diz a pesquisadora.
Com isso, al�m de promoverem ataques aos humanos, os peixes das �reas de alimenta��o podem excluir as esp�cies menos agressivas.
Urinar no mar
A quest�o � pol�mica, mas, segundo os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, urinar no mar n�o costuma causar danos � fauna e � flora local.

"O ideal � urinar em um local apropriado para isso. Mas, do ponto de vista biol�gico, o xixi feito no mar n�o � um grande problema, porque ele vai se diluir e servir de nutrientes para o ambiente marinho", afirma Turra.
"A urina � composta de 95% de �gua e 5% de sais. O pouco de sais liberado no xixi � rapidamente dilu�do pela �gua do mar. Por�m, uma praia muito lotada e com pouca circula��o de �gua (como as piscinas naturais), o xixi pode vir a se tornar um problema", pondera Di Domi.
Os pesquisadores ressaltam, contudo, que o descarte de esgoto no mar � proibido, uma vez que a concentra��o dos excrementos humanos no ambiente marinho � fatal � fauna e � flora.
Ve�culos motorizados
Um guia do Minist�rio do Meio Ambiente de 2018 orienta que n�o se transite com ve�culos motorizados na praia. O documento tamb�m pede que as pessoas n�o pisem nas plantas e demais vegeta��o de restinga presente na areia.
Protetor solar
O guia do Minist�rio da Sa�de recomenda protetor solar � prova d´ï¿½gua "para n�o contaminar a �gua com produtos qu�micos prejudiciais ao meio ambiente".
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