
A hist�ria de Juma Marru�, Jove e Jos� Le�ncio foi ao ar pela primeira vez na TV Manchete h� 32 anos e fez um enorme sucesso.
A nova edi��o vai contar mais uma vez essa hist�ria, com um novo elenco - mas n�o foram s� os atores que mudaram.
O Pantanal, que � a maior plan�cie alagada do mundo, vai aparecer mais seco na Globo do que na Manchete.
"Eu nunca tinha visto t�o seco assim", diz a bi�loga Edna Scremin-Dias, que � professora da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e trabalha ali desde 1982.
Ela conta que os meses de janeiro e fevereiro s�o �poca da cheia e que os campos do Passo do Lontra, regi�o que ela mais frequenta, ao sul, deveriam estar alagados e salpicados de lagoas.
"As lagoas est�o secas em pleno mar�o, quando o pico da seca costuma ser em julho, agosto. A maioria dos campos n�o alagaram."
Ela tamb�m tomou um susto ao ver o rio Abobral ficar sem �gua. "O rio est� parcialmente interrompido. J� tinha visto as �guas baixas, mas, desse jeito, foi a primeira vez."
Dados e imagens de sat�lite mostram que a superf�cie coberta pela �gua est� diminuindo significativamente no Pantanal.
A imagem acima � esquerda mostra em diferentes tons de azul as partes do Pantanal que estavam em algum momento cobertas por �gua (sua �rea inundada) em 1990, quando a novela foi ao ar pela primeira vez.
� direita, a �rea inundada em 2020 - ano mais recente do monitoramento feito pelo projeto MapBiomas.
A iniciativa, uma coopera��o entre universidades, empresas e ONGs, mapeia as mudan�as no uso do solo no Brasil a partir da an�lise computadorizada de imagens de sat�lite.
Esses dados mostram que a m�dia hist�rica da �rea inundada do Pantanal caiu 26% nos �ltimos 30 anos.
A m�dia foi calculada pela BBC News Brasil com base nos dados da s�rie hist�rica do MapBiomas, que come�a em 1985.
Foi levada em conta a soma da �rea coberta por rios e lagoas e tamb�m os campos alagados e p�ntanos. Os dois juntos representam a �rea inundada do Pantanal.

Eduardo Rosa, respons�vel no MapBiomas pelo monitoramento do Pantanal, explica que analisar essa �rea de inunda��o toda, em vez de apenas um dos dois elementos sozinhos, mostra melhor como a superf�cie de �gua variou na regi�o.
Por sua vez, a escolha pela m�dia amenizou as oscila��es anuais da �rea de inunda��o que s�o naturais do ciclo do Pantanal.
H� anos em que ele enche mais e em outros, menos. Por isso, comparar dois anos isolados n�o reflete o quanto o Pantanal perdeu de �gua ao longo desse tempo.

Mas a tend�ncia de queda fica clara na evolu��o tanto da �rea de inunda��o total quanto da m�dia ao longo dos �ltimos 30 anos.
"A �gua devolve a vida ao Pantanal. A fauna e a flora se desenvolvem, se renovam, mas o Pantanal alaga cada vez menos", diz Rosa.
Ao mesmo tempo que a �rea m�xima coberta pela �gua registrada a cada ano est� diminuindo, a �rea m�nima tamb�m est� ficando cada vez menor.

Em alguns dos anos mais recentes no gr�fico acima, o n�vel m�ximo de inunda��o chegou a ficar abaixo do m�nimo registrado no come�o dos anos 1990.
O rio Paraguai atingiu em outubro do ano passado o segundo menor n�vel em 121 anos de medi��o na cidade de Lad�rio, no Mato Grosso do Sul - esse �ndice tem inclusive nome pr�prio: r�gua de Lad�rio.
As cheias tamb�m est�o ficando mais curtas, diz Felipe Dias, diretor-executivo do Instituto SOS Pantanal, uma organiza��o sem fins lucrativos dedicada � prote��o do bioma.
"No passado, o Pantanal ficava tr�s, quatro, at� cinco meses inundado, hoje diminuiu para um, dois meses", afirma Dias.

Isso � especialmente cr�tico em um ecossistema que tem sua ess�ncia nesse vai-e-vem das �guas - e que depende disso para sua preserva��o.
A �gua tem no Pantanal um papel que vai al�m de regenerar o ecossistema. A inunda��o tamb�m � uma barreira natural para o homem.
As �reas que ficam alagadas por muito tempo n�o servem para a pecu�ria ou a agricultura e mant�m essas atividades econ�micas nas bordas da regi�o.
Um Pantanal mais seco �, portanto, um Pantanal mais prop�cio � expans�o da agropecu�ria - e tamb�m mais vulner�vel ao desmatamento e aos inc�ndios, que causaram em 2020 a maior trag�dia ambiental em d�cadas, quando 30% do Pantanal queimou.
A imagem acima � esquerda mostra em amarelo a �rea do Pantanal que era ocupada pelo homem em 1990, ao lado da mesma imagem em 2020.
� poss�vel ver o avan�o do homem sobre a natureza no Pantanal.
Embora o Pantanal seja considerado um dos biomas mais conservados do pa�s, Felipe Dias, da SOS Pantanal, ressalta que a �rea desmatada no Pantanal dobrou nos �ltimos 30 anos.
"Os 16% que temos hoje eram 8% nos anos 1990", afirma Dias.
Desmatamento inclui aqui n�o s� �rvores derrubadas, mas tamb�m os lugares onde a grama nativa dos campos da regi�o foi substitu�da por outra mais prop�cia para a cria��o de gado.
O �ndice est� estacionado mais ou menos neste patamar nos �ltimos dez anos, diz o pesquisador, mas isso deve mudar porque a �ltima cheia do Pantanal foi h� quatro anos.
"Com esta seca dos �ltimos anos, acredito que o desmatamento voltou a aumentar. Est�o plantando muitas plantas ex�ticas no lugar das nativas, e a soja, que ainda est� fora dos limites do pantanal, est� chegando perto das bordas", avalia Dias.
A �gua que abastece o Pantanal
Para entender o que est� acontecendo no Pantanal, os cientistas dizem que � preciso olhar para fora dele, especialmente para a Amaz�nia e o Cerrado, de onde vem a maioria da �gua que alaga o Pantanal.
"Os n�veis de chuva s�o baixos no Pantanal, de 70% a 80% da �gua vem de fora", afirma Dias - e tem chegado menos �gua ali.

Eduardo Rosa, do MapBiomas, aponta que um dos motivos est� nos rios que descem do planalto do Cerrado.
"Diminuiu a quantidade de �gua que eles trazem porque teve uma perda muito grande de vegeta��o no planalto, e isso deixa os rios assoreados. Houve muito rio e nascente que passaram por cima para fazer campo e pasto", diz Rosa.
Outra parte da �gua chega ao Pantanal pelo ar. Ela � lan�ada no ar pelas �rvores da Amaz�nia e � carregada pelos ventos, formando um corredor de umidade conhecido como rio voador, que passa sobre o Pantanal a caminho do sul do Brasil.
Os sinais n�o s�o bons tamb�m nesse caso, diz a meteorologista Renata Lisbonati dos Santos, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde coordena o Laborat�rio de Aplica��es de Sat�lites Ambientais.
A pesquisadora destaca que a umidade do ar no Pantanal caiu 25% desde 1980.
"V�rios estudos apontam que o desmatamento na Amaz�nia alterou o ciclo de �gua da floresta e afetou esse fluxo de umidade. Pode estar vindo menos umidade ou essa umidade pode estar sendo direcionada para outro lugar", afirma a cientista.
Por outro lado, tudo isso pode ser parte do ciclo natural do Pantanal.
Enquanto os monitoramentos mais modernos datam dos anos 1980, os dados da r�gua de Lad�rio percorrem mais de um s�culo.

Eles mostram que j� houve per�odos de seca t�o intensa quanto agora - o �ltimo deles na d�cada de 1960.
Mas tem uma diferen�a importante a�: o clima mudou nos �ltimos anos. O Pantanal ficou n�o s� mais seco, mas tamb�m mais quente
Lisbonati aponta que a temperatura m�dia na regi�o aumentou pouco mais de 2ºC nos �ltimos 30 anos. "Foi mais do que a m�dia global", diz a meteorologista, "mas a gente ainda n�o sabe o porqu� disso".
Ao mesmo tempo, as chuvas est�o ficando mais esparsas e intensas, o que n�o � ideal. Porque o calor faz mais �gua evaporar do solo, e para que ele volte a alagar as chuvas precisam ser mais constantes.
"Se tem uma chuva hoje e outra s� daqui a 20 dias, vai demorar a encharcar ou nem chega a isso", diz Felipe Dias.
Assim, tudo vai ficando mais seco - e, a cada peda�o que seca, o Pantanal perde um pouco daquilo que faz dele o Pantanal.
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