
A decis�o, que vai revogar uma s�rie de regulamenta��es e leis que marcaram os �ltimos dois anos, gerou controv�rsia entre especialistas.
"Me preocupa o fim da emerg�ncia nacional num momento em que a Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) ainda entende que estamos diante de uma pandemia, ou uma emerg�ncia de sa�de p�blica internacional", critica a epidemiologista Ethel Maciel, professora da Universidade Federal do Esp�rito Santo (Ufes).
- O que se sabe sobre o fim da emerg�ncia em sa�de da covid-19 no Brasil
- ‘Covid zero’: China for�a moradores de Xangai a se mudar para abrir centros de quarentena em suas casas
"E ainda n�o est� claro o que isso vai significar na pr�tica e qual ser� o plano se as coisas voltarem a piorar", chama a aten��o Leonardo Bastos, pesquisador da Funda��o Oswaldo Cruz (FioCruz).
O an�ncio do Minist�rio da Sa�de acontece num momento em que as m�dias m�veis de casos e mortes por covid-19 est�o em queda no pa�s — e o relaxamento das pol�ticas preventivas, como o uso de m�scaras e a preven��o de aglomera��es, j� estava em pr�tica h� semanas em diversas cidades e Estados.
Vale destacar que a revoga��o da Emerg�ncia em Sa�de P�blica de Interesse Nacional (Espin) n�o significa o fim da pandemia, como explicado pelo pr�prio ministro Queiroga.
"Continuaremos a conviver com o v�rus. O Minist�rio da Sa�de permanece vigilante e preparado para adotar todas as a��es necess�rias para garantir a sa�de dos brasileiros em total respeito � Constitui��o Federal", afirmou.
Mas e se os casos, as hospitaliza��es e as mortes por covid-19 voltarem a subir em alguma parte do pa�s? Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil listam os cinco fatores que podem amea�ar o fim da emerg�ncia de sa�de p�blica anunciada pelo governo — e o que deveria ser feito para combat�-los.
1. Temporada de frio
Todos os anos, a chegada do outono e do inverno costuma vir acompanhada de um aumento nos casos de infec��es respirat�rias, como gripe e resfriado.
E isso est� mais relacionado ao comportamento das pessoas do que aos v�rus em si: no frio, costumamos ficar mais tempo em lugares fechados, com pouca circula��o de ar, e pr�ximos uns dos outros.
Esse � o cen�rio perfeito para a transmiss�o de pat�genos como o influenza, o causador da gripe, e do v�rus sincicial respirat�rio, do bocav�rus ou do rinov�rus, que est�o por tr�s do resfriado.
A flutua��o de casos de doen�as respirat�rias de acordo com a esta��o do ano, ali�s, � um fator determinante nas pol�ticas p�blicas de sa�de.
A campanha de vacina��o contra a gripe, por exemplo, sempre come�a no in�cio de outono na maioria das regi�es brasileiras. O objetivo � garantir, antes de o influenza circular com mais intensidade, uma maior prote��o contra os casos graves da doen�a, especialmente nos grupos vulner�veis.
Em rela��o � covid-19, ainda n�o foi poss�vel estabelecer quando ocorrer�o os aumentos e as diminui��es na taxa de infec��o — como estamos no meio de uma pandemia de um v�rus absolutamente novo, para o qual n�o t�nhamos imunidade alguma, essas curvas sobem e descem em qualquer esta��o do ano.
"N�o temos uma resposta muito clara se o coronav�rus vai ter esse padr�o parecido com o que vemos em outras infec��es respirat�rias", entende Bastos.
"Mas � natural pensar que algo similar, com aumento de casos em �pocas de frio, tamb�m venha a acontecer com a covid", complementa.
E boa parte do Brasil est� entrando justamente agora neste per�odo de queda nas temperaturas. Ser� que isso influenciar� na transmiss�o do coronav�rus? S� o acompanhamento das estat�sticas nas pr�ximas semanas poder� responder essa quest�o.

2. Surtos em outros lugares
Como fen�meno global, a pandemia tem repercuss�es em todos os continentes — e o que acontece do outro lado do mundo pode respingar aqui de alguma maneira.
Isso foi observado diversas vezes ao longo dos �ltimos dois anos. � s� lembrar que os primeiros casos de covid foram observados na China e logo apareceram na Europa. Na sequ�ncia, o coronav�rus foi detectado na Am�rica do Norte e, depois, no Brasil.
Entre 2020 e 2021, esse fluxo se repetiu algumas vezes: ondas de casos e mortes que come�aram em alguma parte da Europa logo se repetiram nos Estados Unidos ou na Am�rica Latina (e vice-versa).
A pr�pria variante �micron, detectada originalmente na �frica do Sul em novembro do ano passado, se espalhou com uma velocidade sem precedentes e provocou recordes de infec��es nos meses seguintes em v�rias partes do mundo.
Vale notar que, com o avan�o da vacina��o e o alto n�mero de indiv�duos que tiveram covid, a influ�ncia da situa��o internacional no contexto de cada pa�s se torna menos relevante — uma popula��o com alto grau de imunidade tende a sofrer menos com novos surtos do que os moradores de um local que n�o experimentou grandes ondas recentemente.
Mesmo assim, os especialistas consideram prematuro ignorar completamente uma piora dos n�meros em qualquer parte do mundo, ainda mais num momento de abandono das medidas restritivas e de aumento na circula��o de pessoas.
Maciel explica que, dentro de uma pandemia, existem alguns momentos de crise e outros de calmaria.
"N�s temos as ondas e per�odos interpand�micos, marcados pela diminui��o de casos, hospitaliza��es e mortes", diz.
"E ainda � cedo para dizer se o que vivemos agora � justamente esse per�odo interpand�mico, e logo veremos um novo aumento nos n�meros, ou vamos passar realmente para a endemia, com uma estabiliza��o do cen�rio", continua a epidemiologista.
O caminho para determinar onde estamos atualmente envolve monitorar o que acontece em todo o mundo, especialmente nos pa�ses com os quais os brasileiros t�m mais contato e um fluxo constante de viagens.
Caso a situa��o aperte nesses locais, pode ser necess�rio fazer novas restri��es e aprimorar o controle de casos positivos de covid em portos, aeroportos e fronteiras.
3. Desestrutura��o do sistema
Maciel tamb�m teme que o fim da emerg�ncia de sa�de p�blica nacional desmonte servi�os de vigil�ncia e de atendimento aos pacientes que foram criados nesses �ltimos dois anos.
"O decreto de Espin permite uma s�rie de compras, licita��es e normas para responder � crise sanit�ria que envolve a remessa de vacinas, a amplia��o de leitos hospitalares, a distribui��o de insumos…", lista.
"O Governo Federal n�o pode acabar com o decreto sem fazer um per�odo de transi��o, para que Estados e munic�pios planejem as a��es dali em diante."
A professora da Ufes ressalta que � hora de manter os servi�os de sa�de e at� refor�ar o sistema de vigil�ncia de casos e hospitaliza��es por covid.
� justamente esse monitoramento cont�nuo que permite identificar um crescimento nas infec��es de forma prematura, antes que o problema se espalhe, e tomar as a��es para cont�-lo.
"E se passarmos por uma nova mudan�a de cen�rio, em que os casos, hospitaliza��es e mortes por covid voltem a aumentar?", questiona Bastos.
"� preciso deixar claro o que ser� feito se a situa��o da covid piorar novamente", completa o pesquisador.

4. Aparecimento de novas variantes
Um dos grandes temores dos especialistas � o surgimento de uma nova vers�o do coronav�rus ainda mais transmiss�vel, agressiva ou com capacidade de "driblar" a imunidade obtida com a vacina��o ou com as infec��es pr�vias.
"Esse � um risco que est� posto e com o qual j� lidamos algumas vezes nesta pandemia", aponta o virologista Fernando Spilki, professor da Universidade Feevale, no Rio Grande do Sul.
As variantes de preocupa��o registradas at� o momento apareceram em locais onde havia uma alta taxa de transmiss�o do pat�geno. Foi o caso da variante alfa, no Reino Unido, da gama, no Brasil, da delta, na �ndia e da �micron, na �frica do Sul.
Nada garante que esse fen�meno volte a se repetir nos meses que vir�o, ainda mais num cen�rio em que o v�rus circula livremente e sem restri��es.
A boa not�cia � que, pelo observado at� agora, as vacinas continuam a oferecer um bom n�vel de prote��o contra as formas mais graves de covid, que causam hospitaliza��o e morte.
"Vemos tamb�m que h� uma esp�cie de converg�ncia e similaridade entre as variantes que identificamos at� agora: algumas muta��es apareceram de forma simult�nea e independente em lugares diferentes", analisa Spilki, que tamb�m coordena a Rede Corona-�mica do Minist�rio de Ci�ncia, Tecnologia e Inova��es.
"A tend�ncia � que, com o passar do tempo, tenhamos cada vez menos mortes por covid. Mas tamb�m podemos sofrer surtos de propor��es elevadas, especialmente se surgirem variantes mais diversas e que consigam escapar da imunidade", complementa o especialista.
Para evitar que essa possibilidade pessimista vire realidade, o caminho � fazer a vigil�ncia gen�mica e identificar precocemente as novas variantes que surgirem.
5. Queda da prote��o
Para completar, ainda n�o est� 100% claro quanto tempo dura a imunidade ap�s a vacina��o ou a infec��o pelo coronav�rus.
Essa prote��o, inclusive, deve variar de acordo com uma s�rie de caracter�sticas. Indiv�duos mais jovens, por exemplo, podem estar bem resguardados da infec��o (ou de suas repercuss�es mais graves) ap�s tomarem tr�s doses do imunizante.
J� pessoas mais velhas, ou aquelas que passaram por um transplante ou fazem tratamento contra o c�ncer, costumam ter um sistema imunol�gico mais debilitado, que n�o responde t�o bem �s amea�as infecciosas.

E isso, por sua vez, pode impactar os n�meros da covid: se a imunidade diminui mesmo ao longo dos meses, � poss�vel que ocorra um novo aumento de casos, hospitaliza��es e at� mortes, principalmente nos grupos que s�o mais vulner�veis.
Esse fen�meno, ali�s, j� foi visto em outros momentos da pandemia: quando as primeiras vacinas foram aprovadas, preconizava-se duas doses para todo mundo. Ap�s algum tempo, os cientistas come�aram a notar uma queda nos anticorpos e um aumento nas taxas de infec��es e interna��es.
Houve um consenso, ent�o, de que era preciso ofertar uma terceira aplica��o do imunizante — primeiro em idosos e imunossuprimidos, depois para todos aqueles com mais de 18 anos.
"Pelos estudos que temos at� agora, tr�s doses s�o suficientes para proteger um adulto saud�vel de todas as variantes em circula��o", informa a imunologista Cristina Bonorino, professora da Universidade Federal de Ci�ncias da Sa�de de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.
"J� para indiv�duos com imunidade mais baixa, como idosos, pacientes oncol�gicos, e transplantados, uma quarta dose j� � necess�ria", complementa.
A especialista, que tamb�m representa a Sociedade Brasileira de Imunologia, entende que s� saberemos sobre a relev�ncia de novos refor�os vacinais a partir de estudos cient�ficos, que avaliar�o como a imunidade se comporta daqui em diante.
"� hora de monitorar, testar e acompanhar o que est� acontecendo no mundo e tamb�m no Brasil."
"Pode ser que, daqui a seis meses, apare�am tantos casos que seja preciso instituir uma quarta dose para todo mundo. Por ora, ainda n�o h� essa necessidade", conclui a imunologista.
Por fim, � preciso notar que, no caso do Brasil, a cobertura da vacina��o contra a covid segue desigual em muitas partes do pa�s: enquanto S�o Paulo, Piau�, Para�ba e Cear� apresentam mais de 80% da popula��o imunizada, Amap�, Roraima, Acre e Maranh�o n�o atingiram uma cobertura de 60%.
J� em rela��o � terceira dose, S�o Paulo � o �nico Estado a ter mais de 50% dos adultos com o refor�o contra o coronav�rus.
Sabia que a BBC est� tamb�m no Telegram? Inscreva-se no canal.
J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!