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Estado de Minas BBC

Sob Bolsonaro, comunidades religiosas viram terapia de dependentes qu�micos

Mesmo privadas, as comunidades terap�uticas viraram prioridade do governo Bolsonaro e recebem cada vez mais dinheiro p�blico para internar pessoas


25/04/2022 22:23 - atualizado 25/04/2022 22:22

Portas abertas em corredor
O governo federal vai custear mais de 10 mil vagas em comunidades terap�uticas nesse ano (foto: Getty Images)
As comunidades terap�uticas se transformaram nos �ltimos anos nas principais operadoras das pol�ticas p�blicas do Brasil para tratamento de pessoas que sofrem com o uso problem�tico de drogas - os chamados dependentes qu�micos, em jarg�o popular.

 

Embora sejam entidades privadas, essas institui��es recebem cada vez mais financiamento do Estado, mesmo que n�o existam dados ou indicadores para avaliar se a estrat�gia est� funcionando ou n�o.

 

Essa � uma das conclus�es de um estudo do Centro Brasileiro de An�lise e Planejamento (Cebrap) e da ONG Conectas Direitos Humanos, lan�ado nesta segunda-feira.

 

Com dados oriundos da Lei de Acesso � Informa��o (LAI), a pesquisa analisou o financiamento p�blico �s chamadas CTs, principalmente pelo governo federal, mas tamb�m a verba investida por prefeituras, governos estaduais e emendas parlamentares.

 

Esses centros de acolhida s�o um dos v�rios modelos de aten��o a dependentes oferecidos pela sa�de p�blica. Em geral, s�o resid�ncias coletivas que promovem o modo de vida em abstin�ncia, com tratamento tocado por egressos.

 

As comunidades s� podem internar de maneira volunt�ria, e o interno pode deixar o local a qualquer momento, embora haja muitos relatos de pessoas que passam at� anos isoladas. Cada vaga custa por volta de R$ 1.100 por m�s aos cofres p�blicos.

 

Entre 2017 e 2020, per�odo analisado pelo levantamento, o Brasil investiu R$ 560 milh�es para financiar vagas de interna��o nesses locais - desse valor, R$ 300 milh�es sa�ram dos cofres do governo federal. Foram 593 entidades financiadas no per�odo.

 

Em 2017 e 2018, ainda na gest�o de Michel Temer (MDB), o governo federal destinou R$ 44,2 milh�es e R$ 39,3 milh�es, respectivamente.

 

Em 2019, primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro (PL), o valor saltou 169%, para R$ 104,8 milh�es e no ano seguinte, se manteve no mesmo patamar, de R$ 105,2 milh�es.

 

E a tend�ncia � que os valores aumentem nos pr�ximos anos, como vem ocorrendo desde a incorpora��o das CTs pelo governo Dilma Rousseff (PT), em 2011.

 

J� a gest�o Bolsonaro (PL) adotou o servi�o como o principal eixo de cuidados � popula��o que enfrenta esse problema - estima-se que 80 mil pessoas estejam internadas em comunidades terap�uticas no Brasil, 11 mil delas com financiamento federal.

 

O estudo aponta, ainda, uma s�rie de problemas na implementa��o da pol�tica: concentra��o de verbas de maneira desproporcional em alguns Estados, CTs que recebem recursos de v�rias esferas do poder p�blico e falta de clareza sobre qual � o servi�o contratado e os resultados obtidos.

 

"O financiamento de CTs pode ser considerado uma pol�tica com d�ficit de planejamento, de controle e de avalia��o. N�o h� clareza sobre o tipo de servi�o contratado, sobre a composi��o de seu custo, dos seus insumos, dos produtos esperados e, principalmente, de seu impacto e de sua efetividade", diz o documento.

 

A contrata��o de CTs � feita sem licita��o ou outro tipo de concorr�ncia p�blica.

 

Para passar nos editais de financiamento, aponta a pesquisa, o interessado precisa cumprir exig�ncias de resolu��es da Anvisa e da Senapred (Secretaria Nacional de Cuidados e Preven��o �s Drogas), como aprova��o da vigil�ncia sanit�ria local, treinamento de pessoal e estrutura f�sica adequada.

 

"Hoje, se voc� quiser abrir uma Comunidade Terap�utica para receber pessoas e conseguir financiamento p�blico, basicamente precisa cumprir requisitos burocr�ticos e preencher formul�rios. N�o h� an�lise do servi�o que ser� oferecido, do p�blico-alvo ou da demanda do local onde a comunidade est� localizada", explica Maur�cio Fiore, pesquisador do Cebrap e um dos respons�veis pelo estudo.

 

"Parte-se do pressuposto de que � um servi�o ben�fico. Mas, do ponto de vista de pol�tica p�blica, o que exatamente est� sendo contratado com dinheiro p�blico? Quais s�o os tratamentos oferecidos? � um tratamento de sa�de ou assist�ncia social? Quais s�o os resultados do investimento? As respostas n�o s�o claras. O problema � que hoje as CTs atendem a uma demanda enorme da sociedade, principalmente entre os mais pobres. O rico pode pagar uma cl�nica m�dica. O pobre tem a comunidade terap�utica", diz.

 

A reportagem da BBC News Brasil enviou, no dia 11 de abril, uma s�rie perguntas ao Minist�rio da Cidadania, respons�vel pelo financiamento das CTs, sobre o estudo e todos os pontos desta reportagem. Tamb�m fez com contatos telef�nicos e enviou outros dois e-mails, em 19 e 22 de abril. Por�m, at� a publica��o desta reportagem, a pasta n�o respondeu aos questionamentos.


Mãos seguram dois copos de cerveja gelada
CTs tamb�m recebem pessoas que sofrem com alcoolismo (foto: Getty Images)

Verba desproporcional

Entre 2017 e 2020, Alagoas foi o Estado que proporcionalmente recebeu o maior volume de recursos federais para as CTs. Foram R$ 465 mil por grupo de 100 mil habitantes, enquanto Estados mais populosos, como S�o Paulo e Rio de Janeiro, receberam R$ 97 mil e R$ 33 mil, respectivamente.

 

Santa Catarina (R$ 337 mil), Rio Grande do Sul (R$ 299 mil) e Roraima (R$ 295 mil) completam a lista de entes federativos que mais receberam verbas.

 

N�o existem dados ou estimativas que apontem que Alagoas tenha quase cinco vezes mais pessoas que fazem uso problem�ticos de drogas por 100 mil habitantes do que S�o Paulo, ou 14 vezes mais que o Rio de Janeiro - o que poderia explicar a disparidade dos recursos aplicados.

 

As CTs de Alagoas s�o tamb�m as que mais conseguem verbas estaduais no pa�s. Entre 2017 e 2020, o governo alagoano desembolsou R$ 938 mil por grupo de 100 habitantes para financiar vagas de interna��o.

 

Para Fiore e outros especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, a concentra��o em alguns Estados pode ter a ver com a quantidade de CTs em cada um deles - e n�o com o tamanho do p�blico-alvo. "Uma poss�vel explica��o � que Alagoas e Rio Grande do Sul concentrem mais comunidades do que outros, e tenham uma rede mais estruturada e com melhor conhecimento sobre como conseguir acessar financiamentos p�blicos", diz.

 

Para Lu�s Fernando T�foli, professor de Psiquiatria e coordenador do Laborat�rio de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos da Unicamp, n�o h� crit�rios claros para explicar a distribui��o do financiamento. "O relat�rio mostra que n�o h� l�gica nenhuma. O dinheiro vai para regi�es com CTs mais estruturadas, pois os dados sobre preval�ncia do uso problem�tico s�o poucos e muito espa�ados", afirma.

Fazenda da Esperan�a

Segundo o estudo do Cebrap e Conectas, algumas CTs tamb�m recebem grande volume de verbas p�blicas, �s vezes financiadas ao mesmo tempo por v�rias esferas do poder: federal, estadual, municipal e emendas parlamentares.

 

A Obra Social Fazenda da Esperan�a, entidade privada, � um desses exemplos.

 

Entre 2017 e 2020, a institui��o recebeu R$ 51,8 milh�es em diferentes linhas de financiamento p�blico. Houve tr�s fontes de recursos: R$ 35,6 milh�es do governo federal e R$ 7,4 milh�es de governos estaduais, al�m de R$ 8,8 milh�es de emendas parlamentares federais.


Praça Princesa Isabel
Usu�rios de drogas se re�nem para fumar crack na regi�o conhecida como cracol�ndia, em S�o Paulo (foto: AFP)

 

A entidade foi criada em 1983 em Guaratinguet�, interior de S�o Paulo, pelo frei alem�o Hans Stapel. Em 2007, a sede recebeu uma visita do ent�o papa Bento 16. Hoje, � a maior do pa�s, al�m de atuar em outros 24 pa�ses - diz empregar 600 pessoas, al�m de ter 1.800 volunt�rios.

 

Atualmente, 6.275 mil pessoas est�o internadas nas 113 unidades da Fazenda da Esperan�a no Brasil - 72 delas com conv�nios com o governo federal. O tempo m�dio de interna��o � de 12 meses.

 

Para Adalberto Calmon, diretor de rela��es institucionais da obra, o volume dos recursos pode parecer grande. "Mas se voc� dividir pelo tamanho da nossa rede, � uma merreca para cada filial", diz. Segundo ele, cada unidade � aut�noma para a pleitear verbas - 50% das vagas s�o financiadas pelo Estado, diz. "N�s seguimos o contrato e temos uma equipe de presta��o de contas. Se der algum problema em alguma filial, pode atrapalhar toda a rede. S� recebemos se a vaga (de interna��o) estiver ocupada", afirma.

 

Ele diz que a Igreja Cat�lica n�o participa da administra��o da rede como alguns afirmam. "A liga��o � a cren�a", afirma. Padres rezam missas nas unidades, diz, e o bispo local precisa aprovar e aben�oar a abertura de uma nova filial. Esses espa�os, segundo Calmon, normalmente s�o doados por empresas e simpatizantes. "N�s nunca procuramos o lugar, eles � que nos procuram. � um movimento da sociedade civil", diz.

 

Calmon afirma que a entidade j� "recuperou 30 mil pessoas ao longo desses anos", e que � "admirada" por parlamentares tanto de direita como de esquerda - s�o eles que destinam verbas de emendas a ela. "O senador Humberto Costa (PT-PE), por exemplo, j� fez emendas para n�s para nossa unidade em Garanhuns. A deputada (federal) Luiza Erundina (PSOL), tamb�m, aqui em S�o Paulo", diz.

 

A liga��o das comunidades com parlamentares � uma das constata��es do estudo divulgado nesta segunda. Ele cita as emendas como uma das principais fontes de recursos das CTs. Elas financiam a compra de "carros, ve�culos e micro-�nibus, capacita��o de profissionais e material para oficinas, como kits para a constru��o de cozinhas industriais."

 

No per�odo analisado, o deputado federal Eros Biondini (PROS-MG) foi quem mais destinou recursos de emendas - R$ 3,3 milh�es. Defensor do modelo, Biondini � o l�der da Frente Parlamentar Mista de Apoio �s Comunidades Terap�uticas, lan�ada em 2019. Cantor, o deputado faz parte da Renova��o Carism�tica Cat�lica e � idealizador do "Cristo � o Show", um dos maiores eventos musicais cat�licos do pa�s.

Como as CTs cresceram?

As comunidades terap�uticas chegaram ao Brasil nos anos 1950, importadas dos Estados Unidos. Por muitos anos elas atuaram sem liga��o ou regula��o do poder p�blico, at� que, no in�cio dos anos 2000, o consumo de drogas passou a receber maior aten��o do Estado, segundo especialistas. Um estudo do Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada (Ipea) mostrou que 79% das quase 2 mil CTs foram criadas entre 1996 e 2015.

 

Foi a gest�o da presidente Dilma quem as incorporou na rede de aten��o, em 2011. Tr�s anos depois, foi criada uma linha de financiamento para elas dentro do programa "Crack � poss�vel vencer", quando o consumo de crack foi classificado pelo governo como uma "epidemia".


Cachimbo de crack usado
Comunidades ganharam financiamento em programa de combate ao crack, no governo Dilma (foto: IanMcD/Getty Images)

 

Inicialmente, as CTs deveriam fazer parte da Raps (Rede de Aten��o Psicossocial), do SUS, que tem servi�os como o Centro de Aten��o Psicossocial �lcool e Drogas (Caps-AD). Depois, migraram para a pasta da Justi�a e, no governo Bolsonaro, para o Minist�rio da Cidadania. Na �poca, o �rg�o era comandado pelo deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), um defensor do modelo, e que aumentou o financiamento federal.

 

Em mar�o de 2019, Terra aumentou em 78% o n�mero de entidades do tipo contratadas (de 280 para 497).

 

"Quando as CTs saem do SUS, o que est� sendo dito � que elas n�o s�o equipamentos de sa�de, mas um servi�o de assist�ncia social. Com isso, elas n�o precisam passar pelo controle, fiscaliza��o e an�lise feitos pelo SUS. Hoje n�o existem indicadores nem para comparar o servi�o delas com qualquer outro", diz T�foli.

 

Para Priscila Farfan, doutora em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), a chave para entender o crescimento do setor � a organiza��o pol�tica. "Elas souberam se mobilizar muito bem politicamente nas �ltimas d�cadas, ganhando for�a e influ�ncia, al�m de entender melhor como funciona a m�quina p�blica", explica.

 

Em seu doutorado, Farfan estudou a atua��o das federa��es de CTs, que re�nem grupos de comunidades - at� 2016, havia 53 dessas federa��es no pa�s. "Essas entidades se organizam para defender as CTs das cr�ticas, por exemplo. Criaram cursos e diretrizes para definir o que � comunidade terap�utica e como ela trabalha. Elas podem dizer que algu�m que n�o segue aquelas regras n�o � uma CT."

Religi�o e den�ncias de tortura

Com o crescimento do setor, uma das principais cr�ticas a ele passa pela rela��o entre o tratamento e proselitismo religioso, pois a maior parte das CTs exigem do interno uma rotina religiosa durante o tratamento.

 

Para os cr�ticos, o Estado deveria prezar pela laicidade e pela liberdade de culto, e n�o financiar entidades cujo eixo do tratamento � voltado a pr�ticas religiosas.

 

Segundo o estudo do Ipea, 82% das CTs disseram ter liga��o com igrejas e organiza��es religiosas - 40% pentecostais e 27% cat�licas. A leitura da B�blia � uma atividade di�ria em 89% dos locais, e a participa��o em cultos e cerim�nias religiosas � obrigat�ria em 55%.


Close nas mãos de pessoas segurando biblias em uma roda de conversa
Leitura da B�blia � obrigat�ria em boa parte das comunidades terap�uticas (foto: Getty Images)

 

Nas unidades da Fazenda Esperan�a, por exemplo, a rotina inclui "ora��o do ter�o, medita��o do Evangelho, missa, trabalho e comunh�o de almas". E o m�todo "contempla tr�s aspectos determinantes: o trabalho como processo pedag�gico; a conviv�ncia em fam�lia; e a espiritualidade para encontrar o sentido da vida."

 

As CTs negam fazer proselitismo e alegam que a religiosidade � um dos fatores do tratamento, mas que h� garantia de liberdade para o interno.

 

"Em nossas unidades temos pessoas de todas as religi�es e tamb�m ateus. A pessoa n�o precisar rezar o ter�o como um cat�lico, ela participa das reuni�es para estar em unidade com os outros. Quando entra, ela � informada que tem missa e que a espiritualidade faz parte do tratamento. Se ela n�o concordar, n�o precisa entrar", diz Adalberto Calmon, diretor da Fazenda Esperan�a.

 

Mas nem sempre � assim. Uma fiscaliza��o do Minist�rio P�blico Federal, Conselhos Federal e Regional de Psicologia e Mecanismo Nacional de Preven��o e Combate � Tortura, ouviu internos de 28 comunidades em 2018. Segundo a pesquisa, n�o havia liberdade religiosa em grande parte dessas institui��es - algumas pessoas relataram puni��es e expuls�es caso n�o participassem de cultos.

 

O relat�rio tamb�m recebeu den�ncias de tortura, maus-tratos, preconceito de g�nero, c�rcere privado e outras viola��es de direitos nas CTs fiscalizadas. Em 2019, a BBC News Brasil mostrou que cinco das entidades acusadas pelo relat�rio continuaram a ser financiadas pelo governo Bolsonaro.

 

A fiscaliza��o das CTs do Rio Grande do Sul foi o tema de um estudo de campo do antrop�logo Jardel Fischer Loeck, p�s-doutor em Sa�de Coletiva e membro da Associa��o Brasileira Multidisciplinar de Estudos sobre Drogas. Sua conclus�o � que ela � pouca e inadequada.

 

"Qualquer pessoa pode abrir um espa�o para receber pessoas. Depois, existe fiscaliza��o da vigil�ncia sanit�ria, a mesma feita em est�dios de tatuagem e cabeleireiro", explica.

 

"A vigil�ncia n�o olha para o tratamento, pois parte do pressuposto de que a terapia � a conviv�ncia entre pares, mas n�o se sabe o que seria uma boa conviv�ncia entre pares. Por isso h� muitos problemas, e a gente s� fica sabendo de viola��es quando algu�m resolve denunciar", diz.

 

Para Loeck, as comunidades terap�uticas s�o um "mundo ainda a ser desbravado". "Elas s�o muitas e diferentes entre si, com v�rios m�todos e tipos de acolhimento. A verdade � que sabemos muito pouco do que acontece dentro delas. As CTs acabaram virando uma dep�sito de pessoas indesejadas, de gente que a sociedade n�o quer ver andando por a�", afirma.


Cocaína
(foto: BBC)

Abstin�ncia

A abstin�ncia mediante isolamento � a meta da atual pol�tica sobre drogas do governo Bolsonaro, implementada em 2019. Quem � a favor dessa linha afirma que � preciso retirar o usu�rio do ambiente de consumo da droga e que s� a interrup��o do uso pode acabar com a depend�ncia. Durante a interna��o, que pode durar anos, o tratamento normalmente � tocado por egressos das CTs que atuam voluntariamente.

 

Elas s�o obrigadas a oferecer um Plano de Atendimento Singular (PAS), em que s�o registrados o hist�rico, os dados e o planejamento da sa�da do acolhido com a anu�ncia volunt�ria do pr�prio ou de familiares. O acolhimento pode se estender por at� 12 meses consecutivos ou intercalados, no intervalo de 24 meses.

 

Para o Conselho Federal de Psicologia, esse m�todo se assemelha ao dos manic�mios, que perderam for�a no pa�s desde a reforma psiqui�trica em 2001.

 

J� entidades de classe do SUS, psic�logos e m�dicos costumam apoiar a chamada pol�tica de redu��o de danos - conjunto de pr�ticas de sa�de adotadas em diversos pa�ses com o objetivo de diminuir os efeitos causados pelo uso problem�tico de drogas, com tratamentos essencialmente em liberdade, em conjunto com a fam�lia e sem exigir abstin�ncia completa. Para eles, a abstin�ncia pode ser uma das abordagens, mas n�o a principal pol�tica da �rea.

 

"Um dos grandes problemas das CTs � que a pessoa precisa se adaptar ao local e �s regras morais, como uma puni��o. H� uma vis�o totalizante do problema, de imposi��o da culpa, e que n�o permite meios termos. O objetivo � uma transforma��o subjetiva da pessoa, para que ela mude seus padr�es para uma moralidade religiosa", diz Loeck.

 

"Do ponto de vista do servi�o, o que � considerado um tratamento de sucesso? Digamos que a pessoa fique seis meses internada, sai e retoma � vida normal, mas tem uma reca�da. Essa pessoa seria considerada um caso bem-sucedido? Pela l�gica das CTs, n�o seria. A abstin�ncia deve ser total. Ela poderia voltar � interna��o. Por isso, � bem dif�cil analisar a efetividade. N�o h� indicadores que justifiquem priorizar as comunidades como est� acontecendo", afirma.

 

Lu�s Fernando T�foli concorda com essa avalia��o. "O isolamento pode funcionar para algumas pessoas, em casos espec�ficos. H� pessoas que precisam ser retiradas de determinados ambientes para interromper aquele ciclo de uso problem�tico, e at� para salvar a vida delas. Mas esse tipo de abordagem n�o funciona para todos. Ela pode ser uma op��o, e n�o a principal pol�tica, em detrimento da rede do SUS", diz.

 

Para Priscila Farfan, na pr�tica o SUS e as CTs j� atuam em conjunto em muitos casos. "Muitas vezes o SUS encaminha as pessoas para uma unidade. A abstin�ncia, queiramos ou n�o, � uma op��o e atende a uma enorme demanda da sociedade, principalmente entre os mais pobres. Voc� pode dizer que n�o h� estat�sticas de efic�cia. Mas para as comunidades isso n�o importa muito, porque quem faz parte vai dizer: 'tudo bem, mas eu e todas essas pessoas aqui nos recuperamos, n�s somos a estat�stica'", diz.

 

Para ela, a incorpora��o das CTs "pode ser estrat�gico" porque, sem isso, poderia ser pior. "Elas n�o v�o acabar. Elas s�o organizadas e t�m for�a pol�tica. Prefiro que sejam financiadas pelo Estado, que recebam dinheiro p�blico, pois h� mais controle e acompanhamento do que se elas atuassem sozinhas", explica a antrop�loga.

 

Ex-interno e hoje diretor da Fazenda Esperan�a, Adalberto Calmon acredita que as CTs finalmente est�o sendo reconhecidas. "Ficamos muito tempo no limbo da pol�tica de drogas, mesmo tendo um papel muito importante na recupera��o do dependente qu�mico. N�s salvamos vidas em ambientes familiares. Nos organizamos para chegar at� aqui. E pode ser qualquer governo, de esquerda ou de direita, n�s vamos bater na porta", diz.

 

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