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Estado de Minas PADROEIRA DO BRASIL

Nossa Senhora Aparecida: Por que m�e de Jesus entrou para a Hist�ria com mais de mil nomes

Nossa Senhora Aparecida, cuja data se comemora em 12 de outubro, � uma representa��o diferente da mesma santa que tamb�m pode ser chamada de Nossa Senhora de F�tima, Nossa Senhora de Guadalupe, Nossa Senhora de Lourdes e tantas e tantas


12/10/2022 07:45 - atualizado 12/10/2022 10:39


Estátua de Nossa Senhora sob um céu multicolorido pelo por-do-dol
H� mais de mil representa��es da Virgem Maria (foto: Getty Images)

S�o muitos nomes, muitas "nossas senhoras". Mas elas todas se referem a uma mesma pessoa, uma mesma santa cat�lica?

A resposta � sim. O que significa que Nossa Senhora Aparecida, cuja data se comemora em 12 de outubro � uma representa��o diferente da mesma santa que tamb�m pode ser chamada de Nossa Senhora de F�tima, Nossa Senhora de Guadalupe, Nossa Senhora de Lourdes e tantas outras.

Trata-se de Maria, uma jovem judia nascida em Nazar� h� pouco mais de 2 mil anos, quando essas terras ao sul de Israel eram parte do Imp�rio Romano. Para o cristianismo, ela tem papel fundamental: tornou-se a m�e de Jesus Cristo.

Chamada de virgem por dois dos evangelistas, Mateus e Lucas, acredita-se que ela tinha cerca de 15 anos quando ficou gr�vida — pela doutrina crist�, por obra do Esp�rito Santo, ou seja, sem ter tido rela��es sexuais com homem algum. Na �poca, Maria j� estava prometida em casamento a Jos�, um carpinteiro da mesma cidade, mais velho, j� na casa dos 30 anos.

Fato � que desta gravidez nasceria Jesus, o pilar fundador do cristianismo. Mas por que a tradi��o cat�lica n�o rende a essa mulher apenas o t�tulo de Santa Maria, e s�o tantas as representa��es dela pelo mundo?

"Os nomes dedicados a Nossa Senhora dependem muito da forma como ela apareceu. Normalmente s�o dados pelo nome do lugar onde ela apareceu ou pelas condi��es em que se deram o aparecimento", esclarece o padre Arnaldo Rodrigues, assessor da Arquidiocese do Rio de Janeiro.


Milhares de fieis na cidade de Aparecida em 2013, para acompanhar visita do papa Francisco
Cerca de 200 mil pessoas acompanharam visita do papa Francisco � cidade de Aparecida em 2013 (foto: Marcelo Camargo/ABr)

Conforme explica a cientista da religi�o Wilma Steagall De Tommaso, coordenadora do grupo de pesquisa Arte Sacra Contempor�nea - Religi�o e Hist�ria da Pontif�cia Universidade Cat�lica de S�o Paulo (PUC-SP) e membro do Conselho da Academia Marial de Aparecida, essas nomenclaturas acabam variando a "cada povo, cada regi�o, cada cultura", por conta de "t�tulos que correspondem aos eventos decorrentes de in�meras situa��es".

Ela lembra que muitos desses t�tulos s�o os chamados dogm�ticos. � de onde vem, por exemplo, a nomenclatura de Nossa Senhora da Imaculada Concei��o — bula assinada pelo papa Pio IX "declara Maria imune da mancha do pecado original", ressalta a pesquisadora — ou mesmo a ideia de cham�-la de Virgem Maria, j� que "o Conc�lio de Latr�o, em 649, preconiza como verdade a virgindade perp�tua", da m�e de Cristo.

"H� ainda as denomina��es decorrentes dos lugares onde houve uma manifesta��o que deu origem � devo��o local, muitas vezes ampliada a outros povos e locais, como Aparecida, Guadalupe, Lourdes, F�tima, Loreto, Montserrat, etc.", complementa ela.

"Nomes diferentes s�o atribu�dos � Virgem Maria pois est�o ligados ao lugar onde ela apareceu", acrescenta a vaticanista Mirticeli Medeiros, pesquisadora de hist�ria do catolicismo na Pontif�cia Universidade Gregoriana de Roma. "N�o existe algo que determine que ela precise, necessariamente, 'ser batizada' com o nome do territ�rio da vis�o, mas como inicialmente as apari��es s�o uma manifesta��o de religiosidade popular, antes mesmo de passar por toda a an�lise can�nica de praxe, � o povo que acaba difundindo, num primeiro momento, esses t�tulos."

"Os tantos t�tulos que lhe d�o todos t�m uma raz�o. � Nossa Senhora de F�tima, porque apareceu l�. � Nossa Senhora do Bom-Parto porque auxilia espiritualmente as parturientes. � Nossa Senhora do Bom-Conselho porque tem sempre uma orienta��o a dar aos seus filhos", afirma o pesquisador Jos� Lu�s Lira, fundador da Academia Brasileira de Hagiologia e professor da Universidade Estadual Vale do Araca�, do Cear�. "E todos esses t�tulos s�o de uma s� m�e, porque � m�e de toda a humanidade e em todos os lugares, os povos a chamam e representam conforme seus costumes, suas tradi��es. � claro que para uma venera��o p�blica � necess�ria a aprova��o da Igreja."


Imagem da madona carregando Jesus em estilo de pintura coreana
A bas�lica da Anuncia��o, em Israel, tem imagens de Maria enviadas por diferentes pa�ses do mundo; aqui � como ela seria representada na Coreia do Sul (foto: Getty Images)

Pedido de m�e � uma ordem

A devo��o a Nossa Senhora, contudo, remonta ao princ�pio do cristianismo. Por princ�pio, a ideia � que ela funcione como um canal direto ao pr�prio Cristo — dentro da premissa que pedido de m�e ningu�m nega.

Uma passagem importante do pr�prio evangelho refor�a essa ideia. Trata-se da narra��o do milagre das bodas de Can�, que aparece exclusivamente no texto de Jo�o, no qual Jesus faria aquele que � considerado seu primeiro milagre.

Na festa de casamento, onde ele estava junto a sua m�e como convidado, os anfitri�es notam que havia acabado a bebida. Maria chama Jesus de lado e explica o drama. Ele, ent�o, transforma �gua em vinho e garante a continua��o da celebra��o.

"Seria um esc�ndalo para o casal se acabasse a bebida antes de a festa terminar. Quando Maria pede a Jesus que tome uma provid�ncia, fica importante o papel dela como intercessora", analisa padre Rodrigues.

A devo��o mariana tamb�m se baseia em outro momento dos textos b�blicos. Quando Jesus est� agonizando na cruz, segundo o relato, ele teria dito algumas palavras para sua m�e e tamb�m para seu ap�stolo Jo�o. Ali, teria utilizado o seguidor como representante toda a humanidade, considerando Maria a m�e dele — e, por extens�o, a m�e de todos.

"Nesta a��o, Jo�o representa toda a humanidade. Maria se tornou a m�e nossa. A nova Eva, uma Eva livre do pecado, como a Igreja nos ensina. Assim, Maria Sant�ssima cuida da humanidade como m�e e m�e zelosa", analisa o hagi�logo Lira.


Velas com imagem de Nossa Senhora de Guadalupe
No M�xico, Nossa Senhora � representada com tra�os ind�genas (foto: Getty Images)

Antiguidade

Segundo estudos do padre Valdivino Guimar�es, mariologista e ex-prefeito de Igreja do Santu�rio Nacional de Aparecida, os registros mais antigos dessa cren�a no poder da m�e de Cristo remontam ao s�culo 2. "Ind�cios arqueol�gicos demonstram a venera��o dos primeiros crist�os. Nas catacumbas de Priscila, se v� pinturas marianas do segundo s�culo, em local onde os primeiros crist�os se reuniam", afirma ele.

"Nas catacumbas, encontramos o afresco considerado, at� agora, a mais antiga imagem da Virgem Maria com o Menino Jesus", comenta De Tommaso. "Esse afresco deixa evidente que os primeiros crist�os entendiam que a vinda de Jesus fora prenunciada nos livros sagrados do povo hebreu. E Maria, a mulher que disse o sim e que tece em seu ventre o corpo do Salvador. H� um �cone muito antigo conhecido como Maria, a tecel�."

A mais remota das apari��es remontam ao ano 40 e seria um epis�dio de biloca��o, na verdade, pois Maria ainda era viva. Segundo a tradi��o crist�, ela teria aparecido ao ap�stolo Tiago na atual cidade de Zaragoza, hoje Espanha, onde ele estava pregando. Fato � que h� registros da constru��o de uma pequena capela ali, desde os prim�rdios do cristianismo.


Nossa Senhora representada com traços europeus
A bas�lica da Anuncia��o tem imagens de Maria enviadas por diversos pa�ses; na Esc�cia ela � representada como branca (foto: Getty Images)

Outro relato sempre citado por pesquisadores � o de Nossa Senhora das Neves, uma apari��o de agosto de 352, em Roma. Foi por conta desse epis�dio que foi erguida a Bas�lica de Santa Maria Maior.

"Maria � venerada desde os prim�rdios do cristianismo. Em muitos escritos, e inclusive na pr�pria iconografia primitiva, ela recebe um lugar de destaque. A mais antiga ant�fona mariana que se tem not�cia � do s�culo 2, que � chamada, em latim, de Sub tuum presidium, ou Sob tua prote��o. O Conc�lio de �feso, em 431 d.C, analisa e aprova a tese teol�gica de que Maria tamb�m era m�e de Deus, entre outras atribui��es que ocorreram mais � frente", pontua Medeiros.

"O tema de Maria est� presente em todos os per�odos da hist�ria do cristianismo. H� uma tradi��o que aponta que a primeira apari��o de Maria teria acontecido na Espanha, em 40 d.C, cujo vidente teria sido S�o Tiago, ap�stolo de Jesus, considerado o evangelizador do territ�rio", prossegue a especialista. "O t�tulo adotado foi o de Nossa Senhora do Pilar, j� que, segundo o relato, Maria teria mostrado ao ap�stolo uma coluna, pedindo que ele constru�sse um santu�rio naquele lugar."

Ao longo dos s�culos, contudo, esses relatos passariam a ser constantes. De acordo com padre Rodrigues, estima-se que hoje sejam cerca de 1,1 mil nomes pelos quais a santa � conhecida.

"Bom, falando do ponto de vista hist�rico, as apari��es acontecem em per�odos muito particulares", diz Medeiros. "N�o cabe a n�s, enquanto historiadores, julgarmos se elas s�o ver�dicas ou n�o, mas o fato est� que muitas acontecem em meio a um determinado contexto pol�tico-social. � o caso de F�tima, cuja mensagem � muito interessante, e condiz com a postura da que a Igreja vai adotar, frente ao comunismo, nos anos posteriores. Temos o caso de Aparecida, por exemplo, cuja imagem � achada em meio ao debate em torno da aboli��o da escravatura. Temos o caso de Guadalupe, onde a virgem Maria, com tra�os ind�genas, � um s�mbolo da luta contra a desigualdade. E por a� vai."

Mas nem sempre a Igreja aprova essas manifesta��es. "Nem todas as apari��es que ocorrem hoje foram oficialmente reconhecidas pelo catolicismo. H� um protocolo a ser seguido. Sem contar que algumas s�o reconhecidas totalmente e diante de outras, ainda em fase de an�lise, foi permitida somente a liberdade de culto", lembra ela. "O que a suposta Virgem Maria diz, no caso, precisa condizer totalmente com os princ�pios da Igreja Cat�lica e at� a idoneidade moral e psicol�gica dos videntes � analisada."


Estátua de Nossa Senhora segundo o menino Jesus
A devo��o � Maria � muito antiga no catolicismo (foto: Getty Images)

A padroeira do Brasil

Autora do livro 21 Nossas Senhoras que inspiram o Brasil, a jornalista Bell Kranz conta que a devo��o mariana foi trazida ao Brasil j� pelas esquadras de Pedro �lvares Cabral — em um dos barcos foi trazida uma imagem da santa. "[A tradi��o] chegou essencialmente pelos portugueses, pelos colonizadores", explica. "O Tom� de Sousa [primeiro governador-geral do Brasil] chegou � Bahia j� com uma imagem da santa na bagagem… Nossa Senhora da Concei��o! E logo erigiu uma capelinha em Salvador, que hoje � a grande catedral Concei��o da Praia [Bas�lica Nossa Senhora da Concei��o da Praia]."

"Eu diria que o Brasil foi escolhido por Nossa Senhora, n�o � fanatismo dizer isso", comenta Lira. Para ele, h� uma "predile��o especial de Nossa Senhora para com esta terra".

"Nossa Senhora da Concei��o, Nossa Senhora das Dores, Nossa Senhora das Candeias (a mesma da Candel�ria e da Purifica��o), Nossa Senhora Aparecida (que � a mesma Concei��o), penso que s�o as mais importantes para o Brasil pela venera��o que o povo lhes atribui", acrescenta o hagi�logo.

"� claro que cada Estado brasileiro tem sua devo��o. Por exemplo, na Bahia h� uma forte devo��o � Nossa Senhora da Boa-Morte. Em Minas Gerais, Nossa Senhora da Piedade que � a mesma Nossa Senhora das Dores e por a� vai. No Par�, em Bel�m, temos a linda manifesta��o � Nossa Senhora de Nazar� que anualmente leva milh�es ao C�rio de Nazar�. Aqui no Cear� � interessant�ssima a devo��o a Nossa Senhora das Dores, em Juazeiro do Norte, por exemplo. E qual a raz�o? N�o d� para explicar concretamente. � algo meio que filial mesmo. Amor de filho � sua m�e e uma m�e que � m�e de todas as m�es, pais e filhos."

Kranz atenta para o fato de que, dada a religiosidade cat�lica inerente � pr�pria constru��o da na��o brasileira, "desde a coloniza��o, Nossa Senhora est� presente em todos os momentos de nossa hist�ria".

E a liga��o brasileira com a santa � umbilical. Isto porque, como bem lembra a jornalista, em 1646 o ent�o rei portugu�s dom Jo�o 4º"consagrou todo o reino, incluindo a� as col�nias, a Nossa Senhora". "A�, 217 anos depois do descobrimento do Brasil, ela apareceu l� para os pescadores [Nossa Senhora Aparecida]", acrescenta Kranz.

Nossa Senhora

Maria se tornou "Nossa Senhora", assim chamada, somente no fim do per�odo medieval. Mas, historicamente, a Igreja j� a reconhecia como "M�e de Deus" muito antes — mais precisamente a partir do s�culo 5, depois do Conc�lio de �feso, em 431. "[� quando] Maria recebe o t�tulo de Thot�kos, a M�e de Deus, dogma que define explicitamente a maternidade divina de Maria. Da� em diante, ela passa a ocupar, por exemplo, o posto principal, o conte�do da imagem do pres�pio se amplia e praticamente esse �cone resume a hist�ria da salva��o", esclarece De Tommaso.

De acordo com o mariologista Guimar�es, Maria "ganha destaque sociol�gico, cultural e religioso" no per�odo medieval. � quando ela adquire "car�ter de poder", tornando-se "aquela que destr�i o mal". Assume caracter�sticas fortes, "ganha rosto de rainha". Assim, passa a ser invocada como "guerreira", "a mulher que combate o mal e, com poder militar, destr�i as heresias".

"Maria passa da dimens�o cultural para a pol�tica", compara ele. "No per�odo feudal, diante da opress�o, Maria se torna a padroeira para os que nela buscam aux�lio, e em troca de prote��o, o fiel a louva com ora��o e atos de caridade."

A santa passa a ser invocada "como a m�e que protege diante da ira de Deus, por algum pecado cometido, n�o s� de forma individual mas tamb�m comunit�ria".

"Com o surgimento das ordens mendicantes, Maria se aproxima das pessoas, ela � tirada do trono de realeza, onde fora colocada pela teologia mon�stica, e se faz irm�, pobre e vizinha das pessoas", diz Guimar�es.

Ao fim do per�odo medieval, Maria j� era um �cone consolidado dentro do catolicismo, tema constante das prega��es e protagonista de tradi��es como medalhinhas, prociss�es, novenas e outras manifesta��es.


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