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Estado de Minas VIDA NO EXTERIOR

'Gosto daqui pela seguran�a': como vivem brasileiros no Iraque 20 anos ap�s invas�o

Brasileiros contam � BBC News Brasil como � a vida no Iraque, que ainda exibe cicatrizes da invas�o pelos EUA e aliados h� duas d�cadas.


20/03/2023 08:33 - atualizado 20/03/2023 08:57


Vista de parte da cidade de Sulaymaniyah, no Curdistão
Vista de parte da cidade de Sulaymaniyah, no Curdist�o iraquiano (foto: Getty Images)

No dia 20 de mar�o de 2003, uma coaliz�o liderada pelos Estados Unidos invadiu o Iraque. Com o apoio de tropas brit�nicas, italianas, espanholas, australianas e polonesas, os americanos conseguiram em pouco tempo derrubar o regime de Saddam Hussein (1937-2006) e instituir um governo provis�rio.

Exatos 20 anos depois, o pa�s ainda exibe as cicatrizes do conflito e est� longe da estabilidade econ�mica e democr�tica que se prometia na �poca da invas�o.

Mesmo com a retirada das tropas ocidentais, a viol�ncia n�o desapareceu. Segundo a organiza��o de monitoramento Action on Armed Violence (A��o para a Viol�ncia Armada, em tradu��o livre para o portugu�s), entre 2012 e 2022, o Iraque foi o segundo pa�s que mais registrou v�timas civis deixadas por armas explosivas no mundo, atr�s apenas da S�ria.

Ao todo, a entidade contabilizou 52.106 civis mortos e feridos em 4.627 epis�dios de uso de armas explosivas no per�odo.

Apesar disso, muitos iraquianos e iraquianas tentam deixar o passado para tr�s e seguir com suas vidas.

Esse mesmo sentimento est� presente no dia a dia dos milhares de estrangeiros que vivem no pa�s atualmente — entre eles, cerca de 130 brasileiros, segundo o Minist�rio das Rela��es Exteriores.

De forma geral, os nacionais que vivem no pa�s s�o pessoas que se mudaram para trabalhar, como jogadores de futebol e outros atletas. H� tamb�m brasileiros ou brasileiras que t�m algum outro tipo de liga��o familiar com o pa�s ou que trabalham com ajuda humanit�ria ou organiza��es religiosas.

A paulista Raquel Chaves, 40, � casada com um curdo e mora desde 2018 na cidade de Sulaymaniyah, que fica na regi�o aut�noma do Curdist�o.

O casal se conheceu pelas redes sociais quando ela ainda estava no Brasil e, depois de muitos meses conversando, iniciaram um relacionamento. Hoje, os dois t�m um filho de 3 anos juntos.


Raquel, o marido Osman e o filho Davi
Raquel, o marido Osman e o filho Davi (foto: Arquivo pessoal)

Natural de S�o Bernardo do Campo (SP), Raquel afirma n�o ser afetada pelos resqu�cios do conflito.

Ela diz ter ficado surpresa ao desembarcar no Curdist�o e descobrir que muitas de suas concep��es sobre a regi�o estavam equivocadas.

"A cultura aqui � realmente muito diferente da brasileira. Mas algumas coisas me surpreenderam, por exemplo, o fato de que nem todas as mulheres s�o obrigadas a usar hijab ou burca", diz ela, em alus�o aos v�us isl�micos.

"Eu tamb�m me sinto segura para sair na rua, pegar t�xi e fazer tudo sozinha. N�o achei que seria assim."

A brasileira diz, inclusive, que muitas vezes se sente mais protegida em Sulaymaniyah do que no Brasil.

"Quando eu falo que moro no Iraque todo mundo pensa que sou louca, mas eu gosto daqui justamente pela seguran�a. Andamos � noite ou ficamos do lado de fora de casa com tranquilidade, coisa que infelizmente n�o fazia no Brasil", diz.

'Dizem que estou mudando a vis�o do Iraque'

A carioca Tatiane Ara�jo, 25, tamb�m vive no Curdist�o. Ela se mudou para Sulaymaniyah em outubro do ano passado, para acompanhar o marido que � jogador de futebol do Newroz Sports Club.

Ela conta que inicialmente estava um pouco receosa de se mudar para um pa�s com hist�rico de tantos conflitos. Mas desde que chegou, diz que se adaptou muito bem.

"Quando meu marido recebeu a proposta, ficamos com um pouco de medo, pois l� no Brasil s� ouv�amos relatos de guerra sobre o Iraque. Mas decidimos vir mesmo assim, porque era importante para o nosso futuro", afirma.

"Mas desde que cheguei nunca presenciei nenhuma situa��o de viol�ncia. Os iraquianos s�o muito amorosos e muito receptivos, ali�s. Eles amam os brasileiros."

Tatiane trabalha como influencer digital e usa suas redes sociais para compartilhar o dia a dia na vida no exterior.

"Sempre que posto sobre a cidade no meu Instagram as pessoas ficam surpresas e dizem que estou mudando sua vis�o sobre o Iraque."


Tatiane no inverno do Curdistão
Tatiane no inverno do Curdist�o (foto: Arquivo pessoal)

Tatiane e Raquel moram em regi�es mais seguras do Curdist�o, pr�ximas a comunidades de estrangeiros e de classes mais altas.

Mas assim como no territ�rio iraquiano, a calma n�o est� necessariamente presente no cotidiano de toda a popula��o do Curdist�o ou dos curdos que vivem em outras regi�es do Oriente M�dio.

Essa etnia n�o tem um Estado nacional reconhecido internacionalmente e, por isso, trava uma batalha contra os governos locais para estabelecer sua independ�ncia. O principal foco de viol�ncia nos �ltimos anos foi a Turquia, mas a regi�o norte do Iraque tamb�m � alvo constante de viol�ncia pol�tica.

Segundo dados de organiza��es de monitoramento, mais de 3.500 eventos de viol�ncia pol�tica envolvendo for�as militares turcas foram registrados no territ�rio iraquiano em 2022.

E apesar de n�o se considerarem parte do Iraque, os curdos tamb�m tiveram suas vidas afetadas pela guerra que come�ou h� 20 anos.

Mas diferente dos iraquianos, que lamentam muito as perdas durante a invas�o, os curdos veem esse per�odo da hist�ria como de liberta��o e alguns t�m inclusive grande estima pelos americanos.

Esse sentimento tem rela��o com a brutalidade com que o regime de Saddam Hussein tratou os curdos. Foram anos de abusos de direitos humanos que culminaram na morte de pelo menos 5 mil pessoas, no massacre de Halabja, que � considerado o pior ataque com armas qu�micas contra civis da hist�ria.


Soldados em Fallujaj, palco de batalhas sangrentas
Bombardeio do Iraque por for�as dos EUA em 2003 marcou in�cio da guerra contra regime de Saddam Hussein (foto: AFP)

'Eles acham que ficaram esquecidos'

Assim como o marido de Tatiane, Jailson Ara�jo, 32, de Jo�o Pessoa, Para�ba, tamb�m � jogador de futebol no Iraque. Ele atua no Al-Talaba, um time da capital Bagd�, e afirma que inicialmente sua fam�lia estava um pouco receosa com a mudan�a de pa�s.

Mas ele logo se adaptou, fez novos amigos e estabeleceu uma rotina. "Meus amigos e familiares ficaram em choque quando contei que viria para c�, mas aos poucos fui mostrando meu dia a dia e ficaram mais tranquilos", diz. "Mas ainda recebo mensagens diariamente perguntando se estou bem."


Jailson comendo doces típicos iraquianos
Jailson tenta experimentar a culin�ria iraquiana em seus dias de folga (foto: Arquivo pessoal)

Jailson mora na capital iraquiana desde setembro de 2022 e afirma que tem tentado usar seu tempo livre para conhecer melhor a hist�ria e cultura do Iraque.

"Nos meus dias de folga, gosto de sair para explorar, aprender e compartilhar com as pessoas no Brasil a verdadeira realidade do pa�s para que elas venham visitar", diz. "Os iraquianos sentem muita falta de receber turistas, eles acham que ficaram esquecidos no mundo."

"O pa�s tem muita coisa bonita para ser explorada."

Uma das coisas que ajudaram Ja�lson a se sentir bem longe de casa foi a receptividade do povo iraquiano, segundo ele.

"Eles adoram estrangeiros. Ter pessoas de outros pa�ses vivendo aqui � um sinal para os iraquianos de que tudo ficou para tr�s, que a guerra passou e as pessoas podem se sentir � vontade no pa�s."

O conflito

Mas apesar do desejo de deixar a guerra para tr�s, esse momento da hist�ria do Iraque que come�ou 20 anos atr�s ainda repercute no pa�s.

O conflito durou oito anos, entre a invas�o em 2003 e a sa�da das �ltimas tropas de combate dos Estados Unidos, em 2011.

A guerra facilitou o fortalecimento ou surgimento de grupos armados considerados como terroristas por pa�ses ocidentais, como o Estado Isl�mico, e afundou a na��o em um cen�rio de instabilidade pol�tica e econ�mica, segundo especialistas.

H� �reas mais e menos atingidas pelos conflitos atualmente. Al�m do Curdist�o, prov�ncias do noroeste e centro do pa�s continuam sob risco de ataques do Estado Isl�mico e a regi�o sul est� exposta a confrontos tribais, atividades criminosas e viol�ncia pol�tica.

A frustra��o com a corrup��o, os servi�os p�blicos prec�rios e a falta de empregos levaram ainda a protestos generalizados nos �ltimos anos, principalmente em Bagd�, que muitas vezes acabaram em viol�ncia.


Veículos militares americanos deixando o Iraque
For�as americanas deixaram o Iraque em 2011, encerrando guerra iniciada oito anos antes (foto: Getty Images)

A guerra que come�ou em 2003 tamb�m deixou uma m�cula na pol�tica externa americana. Ainda restam muitas d�vidas sobre os motivos reais que levaram a coaliz�o ocidental a invadir o territ�rio iraquiano.

Estados Unidos e Reino Unido diziam que seu principal objetivo era tomar e destruir armas de destrui��o em massa do regime de Saddam Hussein. Mas essas armas nunca foram encontradas. H� inclusive quem diga que foi uma guerra sem motivo.

Mas o conflito deixou cerca de 100 mil iraquianos mortos, al�m de mais de 4,8 mil militares da coaliz�o ocidental e outras v�timas de outros pa�ses, como o brasileiro S�rgio Vieira de Mello, que trabalhava na ONU e foi v�tima de um atentado � sede da organiza��o em Bagd�.


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