Ao mesmo tempo em que governo brasileiro e produtores rurais fazem proje��es otimistas para a safra 2022/2023 – a soja, por exemplo, tem perspectiva de recorde na produ��o, com estimativa de 150,36 milh�es de toneladas e aumento de 3,54% na �rea cultivada, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) –, uma equa��o n�o fecha no pa�s do agroneg�cio. Parafraseando a constata��o de um dos presidentes da ditadura militar ao avaliar o contraste de ent�o entre os bons indicadores da economia e a m� situa��o da popula��o, no cen�rio atual a agropecu�ria vai bem, mas a terra e os biomas que a sustentam v�o mal.
� o que aponta a iniciativa MapBiomas, formada por uma rede de universidades, startups de tecnologia e ONGs, ao lan�ar nova edi��o dos mapas anuais de cobertura e uso da terra do Brasil, feita a partir de imagens de sat�lite. Mapeando um per�odo de 37 anos, os estudos demonstram que o espa�o ocupado pela agropecu�ria aumentou no per�odo de 21% para 31% do territ�rio nacional, com avan�o de 228% das zonas de agricultura, representado pelo acr�scimo de 43,6 milh�es de hectares de cultivo.
Quando se considera o avan�o das pastagens para gado de leite e de corte, o acr�scimo em todo o pa�s entre 1985 e 2021 foi de 42,2 milh�es de hectares, o que representou avan�o de 39% da �rea destinada � pecu�ria, aponta o MapBiomas. Vale destacar que, embora o avan�o da agricultura tenha sido percentualmente muito mais significativo e os aumentos de territ�rios usados para plantio e para cria��o tenham sido parecidos em n�meros absolutos, a �rea ocupada por rebanhos no pa�s ainda � incomparavelmente maior: s�o 151 milh�es de hectares (17,77% do territ�rio nacional), contra 62,7 milh�es de hectares de plantio (7,4% do mapa do Brasil).
Observados desse ponto de vista, os n�meros n�o parecem ruins. Afinal, o crescimento da popula��o, n�o apenas no pa�s, mas em n�vel planet�rio, justifica a necessidade de avan�o da produ��o, e ele s� ocorre com o aumento do cultivo e da cria��o de gado. De outro lado, mais lavouras e pastagens significam aumento das exporta��es, suporte para a balan�a comercial e incremento no Produto Interno Bruto.
O lado mais preocupante do estudo, no entanto, aparece no momento em que o MapBiomas verifica o resultado de todo o avan�o do agroneg�cio – somado, claro, �s demais atividades econ�micas – sobre um elemento que � fundamental tanto para o plantio, quanto para a cria��o, sem contar a manuten��o de todas as esp�cies, incluindo a humana: a �gua. Considerados apenas os �ltimos 30 anos, a constata��o foi que a superf�cie de �gua no pa�s recuou assustadores 17,1%. N�o � preciso ser especialista para intuir que � imposs�vel equacionar de forma sustent�vel a multiplica��o das lavouras e das cabe�as de gado, associada ao recuo na disponibilidade de recursos h�dricos. A conta, � evidente, n�o fecha.
O encolhimento da superf�cie alagada e o avan�o da agropecu�ria coincidem ainda com a constata��o de que o Brasil perdeu 13,1% de vegeta��o nativa, entre florestas, savanas e outras forma��es n�o florestais, apenas entre 1985 e o ano passado, segundo o estudo. Nessas menos de quatro d�cadas, apontam os dados, as altera��es causadas pelas a��es humanas correspondem a um ter�o de toda �rea modificada pelo homem ao longo de toda a hist�ria do pa�s. Foi um tempo em que 23 estados perderam �reas naturais, enquanto apenas tr�s se mantiveram est�veis e somente um, o Rio de Janeiro, teve recupera��o.
Enquanto se observa no mapa o avan�o n�tido na degrada��o do Sul em dire��o ao Norte ao longo das d�cadas, um alento do estudo do MapBiomas vem da constata��o de que o pa�s ainda conserva 66% de cobertura vegetal nativa. Ainda que 37 anos atr�s essa cobertura fosse de 76%, os dados mostram que h� muito a se preservar, e que � urgente avaliar como a ocupa��o e uso do solo avan�ou nos �ltimos anos para fazer frente ao desafio urgente de compatibilizar o avan�o da produ��o, que � necess�rio, com a conserva��o de biomas, que j� n�o � apenas indispens�vel – � quest�o de sobreviv�ncia.