O contraventor Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, transitou com desenvoltura impressionante do submundo dos neg�cios ilegais da jogatina no pa�s a sal�es palacianos, onde era reverenciado por governadores e pelo senador Dem�stenes Torres (sem partido-GO), um procurador de Justi�a que p�s seu mandato a servi�o do amigo. No comando da sua rede de jogo de bicho e ca�a-n�queis, Cachoeira trazia todos em r�dea curta e para suas senten�as n�o havia recurso: o mal era cortado pela raiz com a exclus�o do desleal da explora��o do jogo. O mesmo homem que decretava o fim de um ex-aliado pela manh� � noite era a figura principal de jantares para articula��es pol�ticas. Com sua habilidade, Cachoeira costurou a parceria de Dem�stenes, eleito pelo Democratas (DEM), com o governador de Goi�s, Marconi Perillo (PSDB). Desde ent�o, era paparicado por eles, em telefonemas e benesses naquele estado.
Servi�o com grife
Como n�o podia deixar de ser, em menos de 24 horas, a ordem de Cachoeira foi atendida. Lenine passou a miss�o para o sargento reformado da Aeron�utica Idalberto Matias, o Dad�, araponga e executor da organiza��o criminosa. Ele, por sua vez, convocou para a miss�o o major da Pol�cia Militar Ant�nio Carlos da Silva, o major Silva, respons�vel por arregimentar militares para o esquema criminoso. O servi�o foi feito pouco mais das 23h do dia seguinte � ordem e teve at� grife. Ironizando, Dad� determinou que Silva, ao final, colocasse um cartaz no ponto fechado com os dizeres: “Foi o Cachoeira quem mandou”. Tratando o assunto com naturalidade, o major Silva ainda ironizou: “Leva tudo: fog�o, geladeira cachorro, gato, pulga, colch�o…”.
Verdadeira autoridade
Com essa forma de administrar a jogatina, Cachoeira pretendia enquadrar at� mesmo o comandante-geral da Pol�cia Militar de Goi�s e n�o poupou palavras de baixo cal�o. Aguardando uma investida da Pol�cia Militar contra seus advers�rios na explora��o de jogo, Cachoeira perdeu a paci�ncia e a pose, em outra liga��o com Lenine: “Tem que pegar esse filho da �gua, e esse bosta desse comandante n�o fala nada?”. Se sentindo a verdadeira autoridade de Goi�s, o contraventor sentenciou: “Voc� d� um recado pra ele, que estou achando que ele est� de s�cio”, insinuando que o militar poderia estar a servi�o de seus advers�rios nos neg�cios escusos. Lenine, como fiel colaborador, refor�ou a tese do capo: “Esse voc� esquece, naquele dia que pegou ele soltou… Caga de medo!”.
Nos sal�es do poder
Para suas costuras pol�ticas, no entanto, Carlinhos Cachoeira adotava maneiras bem mais refinadas. No dia do seu anivers�rio no ano passado, foi coberto de mimos por Dem�stenes, que ofereceu ao bicheiro um jantar, e tamb�m pelo governador Marconi Perillo, um dos convidados para a comemora��o. Depois de cumprimentar pelo anivers�rio, o senador disse que abriria as portas da sua casa para ele e Perillo e, como um amigo leal, diz a Cachoeira que ele pode convidar quem ele desejar. “Quem voc� quer levar?”, indagou Dem�stenes, que sugeriu os nomes de Cl�udio Abreu, da Delta, e Edivaldo Cardoso, um ex-auxiliar do governo de Goi�s. Educado, Cachoeira disse que apenas Edivaldo iria com ele. � noite, foi a vez de Perillo cumprimentar o contraventor. Chamando o bicheiro de “lideran�a”, Perillo fez uma queixa: “Rapaz, faz festa e n�o chama os amigos?”, mas depois do rodeio deseja a ele que Deus continue o aben�oando, dando sa�de, sorte. Cachoeira demonstra gratid�o e agradece: “Obrigado pela lembran�a”. Por essas e outras que o depoimento do contraventor � o mais aguardado na Comiss�o Mista Parlamentar de Inqu�rito instalada no Congresso Nacional. Cachoeira deveria ter sido ouvido na semana passada, mas seu advogado, M�rcio Thomas Bastos, ex-ministro da Justi�a, conseguiu adiar a audi�ncia sob a alega��o de n�o ter conhecimento do inteiro teor do inqu�rito. Nova data foi marcada: ter�a-feira, dia 22, mas a defesa entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) com novo pedido de adiamento.
Ironia do destino
Carlinhos Cachoeira come�ou a ser investigado n�o por causa da explora��o do jogo, assunto alvo de vista grossa em praticamente todos os estados, mas por causa de uma den�ncia an�nima envolvendo um de seus colaboradores. Um policial militar denunciou uma tentativa de suborno feita pelo bicheiro de Goi�s Jos� Olympio Queiroga, tamb�m denunciado por execu��es de rivais no Esp�rito Santo. Em campo, a Pol�cia Federal logo percebeu que Queiroga era peixe pequeno e que quem comandava de fato a jogatina em Goi�s e no entorno do Distrito Federal era Carlos Cachoeira, figura j� conhecida e um dos principais alvos da CPI dos Bingos, em 2004, que terminou desencadeando o maior esc�ndalo do pa�s, o mensal�o.
Pelo telefone
Di�logos interceptados pela Pol�cia Federal
FECHAMENTO DE BINGO
Carlinhos Cachoeira (foto) X Lenine Ara�jo de Souza
Data: 17/12/10 – Hora: 21h45
Carlinhos: Oi, Lenine.
Lenine: Rapaz, o careca abriu o trem l�, rapaz, bicho peitudo!
C.: Manda fechar, agora.
L.: Rapaz, ontem ele virou pra mim, n�? Me ajuda a�. A�, eu falei: �, ent�o vamos conversar, empurrando com a barriga, n�? A� eu virei pra ele �, a� ele me ligou � noite, n�? Vamos peitar n�s dois esse trem, a� eu falei: � sem a ordem dele eu n�o fa�o n�o.
C.: N�o, eu ia at� em Goi�nia hoje, ele t� louquinho pra falar comigo. A�, eu n�o atendi ele n�o. A� n�o deu pra atender ele, mas ele t� l� em Goi�nia. Eu preciso falar com voc� hoje, a� eu n�o atendi n�o.
L.: Ainda bem, hein? Pois �, era pra isso, rapaz. E outra coisa a�: n�o tem ningu�m nosso l�. N�o tem ningu�m nosso. N�o d� satisfa��o nem nada, n�o combinou. Ah, rapaz, como � que peita? � peitar mesmo, n�?
C.: N�o, manda l� hoje. Hoje, Lenine, tem gente l�?
L.: N�o, eu acho que tem. Eu falei com o Chico aqui pra ele acionar o de preto, de preto da civil.
C.: T� bom, ent�o, beleza!
L.: Cai pra dentro, ent�o. Pode mandar o pau?
C.: Arrebenta, arrebenta!
A OPERA��O
Major Ant�nio Carlos da Silva X sargento da Aeron�utica Idalberto Matias (Dad�) (foto)
Data: 18/12/10 – Hora: 23h21
Silva: Chico, a TV fofoca j� come�ou! A TV fofoca j� come�ou. J� me ligaram aqui falando que o povo de Goi�nia junto com a Genarc.
Dad�: Maravilha. (...)
S: Porque um chegou, o outro n�o.
D.: O caminh�o (...).
S.: H�, ent�o t�. Ok, ent�o t� ok. Fala pra esse motorista ir em 44 e 45, a� �, onde t� pintado!
D.: N�o, n�s tamos na rua aqui, entrou um e o outro ficou dando um tempo a�. Depois entrou agora, entrou os dois.
S.: N�o, ok, ok. O buchicho j� rolou j�, que a Genarc e o pessoal de Goi�nia.
D.: Beleza.
S.: Tem uma barca a�, o Leonan, o Leonan est� rodando perto de voc�s a�, certo! (...) T� o Leonan e o Cabral. Eles est�o rodando perto de voc�s a�!
(...)
D.: Bota um cartaz na porta: “Foi o Cachoeira que mandou!”.
S.: �, pede pro Marcos sair da�. Pede pro Marcos sair da�. D� um voo com o Marcos, depois voc�s voltam.
D.: Falou pros caras levarem as tomadas, os neg�cios, a�?
S.: Leva tudo! Fog�o, geladeira, cachorro, gato, pulga, colch�o. (...)
O PODER
Carlinhos Cachoeira X Lenine Ara�jo de Souza
C.: .... O que deu a�?
L.: At� agora nada. Ele estava indo nas salas hoje e filmando a�. Liguei pro amigo a�... Passa um pouquinho, o amigo liga e fala pra deixar � vontade, porque tem tr�s pessoas minha a�....
C.: Tem que pegar esse filho da �gua, e esse bosta desse comandante n�o fala nada?
L.: Esse voc� esquece, naquele dia que pegou ele soltou. Caga de medo.
C.: Voc� deu o recado pra ele que estou achando que ele que t� de s�cio?
L.: Dei, mas n�o � n�o. Boi sonso!!
O ANIVERS�RIO
Carlinhos Cachoeira X senador Dem�stenes Torres (sem partido-GO)
Dia: 3/5/11 – Hora: 17h59
Dem�stenes: Combinei com o Marconi um jantar l� em casa, ent�o, na quinta-feira, falou?
Carlinhos: T� fechado, ent�o. Estaremos, estaremos l�, viu?
D.: Beleza! Quem voc� quer levar? Cl�udio, Edivaldo, quem, quem que voc� t� pensando?
C.: S� o Edivaldo. Bom que a gente fala aquilo, t�?
D.: Ent�o beleza, ok. O Cl�udio n�o quer levar, n�o? Porque a� j� comemora o seu anivers�rio, u�.
C.: Eu vou ver com ele. Obrigado, viu?
D.: Falou, professor, um abra�o.
A B�N��O
Carlinhos Cachoeira X Marconi Perillo (PSDB), governador de Goi�s (foto)
Dia 3/5/11 – Hora: 20h48
Marconi: Lideran�a!
Carlinhos: Fala, amigo! Tudo bem?
M.: Rapaz, faz festa e n�o chama os amigos?
C.: O que que � isso?
M.: Parab�ns!
C.: Tudo bem? Obrigado pela lembran�a, viu, governador?
M.: Que Deus continue te aben�oando a�, te dando sa�de, sorte.
C.: Muito obrigado, viu?
M.: Um grande abra�o pra voc�, viu?
C.: Obrigado a�, viu?
M.: Eu vou falar com o Edivaldo pra gente marcar uma conversa, viu?
C.: Exatamente. T� esperando, viu?
M.: J� t� marcado, quinta-feira, n�o tem?
C.: � quinta-feira. O senador me ligou, t�? Obrigado pela lembran�a.
M.: T� bom! Um abra�o, tchau.