Dia 6 de dezembro de 1976 morreu Jo�o Goulart, o presidente destitu�do pelo golpe de 1964. Doze anos depois ainda era an�tema para o regime militar. Tanto assim que as not�cias de sua morte, na Argentina, sa�ram truncadas na imprensa.
Trilhando caminho original, o filme enriquece a reconstru��o trabalhosa dos anos da ditadura (1964-1985). Procura, em sua parte inicial, contextualizar a �poca e dispor em seus lugares os atores em jogo.
Avan�a, no entanto, ao centrar foco, em sua segunda parte, apenas em Jango e em seu controverso desaparecimento. Mas � preciso dizer que a primeira parte, ao estabelecer a alian�a entre civis e militares para a produ��o do golpe, e a presen�a dos EUA na desestabiliza��o do governo, � precisa e did�tica.
Por ocasi�o da morte de Jango, vivia-se, ainda, a Guerra Fria e atentados a inimigos pol�ticos n�o eram incomuns. Carlos Prats e Orlando Letelier, ligados ao presidente chileno deposto Salvador Allende, foram assassinados, assim como os uruguaios Zelmar Michelini e Gutierrez Ruiz, amigos de Jango, mortos na Argentina.
As suspeitas de assassinato de Goulart come�aram a surgir logo ap�s a sua morte. A tese era de envenenamento, pois o presidente deposto tomava tr�s medicamentos para o cora��o. Os rem�dios, que vinham da Fran�a, teriam sido adulterados em opera��o conjunta da CIA e governos do Brasil e da Argentina. Goulart era presen�a inc�moda na Argentina, j� tamb�m sob regime militar. Tudo faz sentido. Mas n�o existem provas.
O fato, relembrado por Fontenelle atrav�s de documentos e depoimentos, � que as d�vidas sempre existiram. Um empres�rio amigo de Jango, Enrique Foch D�az, escreveu um livro chamado "Jo�o Goulart: O Crime Perfeito". Foch chegou a denunciar a vi�va, Maria Thereza Goulart, de tomar parte no compl�, segundo se l� em "Jo�o Goulart - uma Biografia", do historiador Jorge Ferreira, da Universidade Federal Fluminense.
Em 2006, o caso voltou � tona com o depoimento do uruguaio M�rio Barreiro Neira, que afirmava ter participado de uma certa Opera��o Escorpi�o com o objetivo de matar Jango. Ao que parece, a testemunha n�o � l� muito fidedigna. Era um criminoso comum recrutado pela repress�o pol�tica no tempo da ditadura daquele pa�s. Sua vers�o apresenta contradi��es. E n�o teria sido sustentada de modo desinteressado. Neira cumpria pena no Brasil e havia contra ele um pedido de extradi��o do Uruguai para responder por crimes comuns. Era de seu interesse permanecer no Brasil alegando persegui��o pol�tica do governo uruguaio. Em 2008 o Minist�rio P�blico acatou pedido da fam�lia Goulart para investigar a morte, tendo por base o depoimento de Neira. O Minist�rio P�blico concluiu pela falta de provas, tachando o depoimento do uruguaio de "confuso e contradit�rio".
Isso encerra o caso? N�o, como indica "Dossi� Jango". Se nada prova que houve assassinato, tamb�m n�o se pode provar a morte natural. O estudo dos costumes pol�ticos das ditaduras latino-americanas n�o exclui o uso de viol�ncia na elimina��o de inimigos. A d�vida razo�vel se adensa pela aus�ncia de aut�psia e das mortes quase simult�neas de JK e Lacerda. Para esclarecer essa rede de intrigas, apenas se a investiga��o for reaberta e, desta vez, exposta � luz da democracia.