A presidente Dilma Rousseff abriu uma brecha para afrouxar o controle sobre custos de obras p�blicas em 2014, ano em que tenta um novo mandato, e pretende acelerar a entrega dos servi�os antes de ser impedida pela lei eleitoral de participar de inaugura��es. A medida preocupa �rg�os de controle como o Tribunal de Contas da Uni�o (TCU) e tamb�m pode ser contestada no Legislativo.
Por se tratar de um veto, a medida pode ser derrubada pelo Congresso, em sess�o conjunta ap�s o recesso. Mas isso � considerado improv�vel: � preciso o apoio de 257 deputados e 41 senadores, em vota��o aberta, e o governo mant�m ampla maioria na C�mara e no Senado.
Com o veto na LDO, a regra � mantida pelo decreto, que pode ser revogado a qualquer momento pelo Executivo. Assim, o Planalto poderia instituir outros par�metros de custo, livrar determinadas obras das exig�ncias ou mesmo fixar margens de toler�ncia para al�m do m�ximo previsto nas tabelas oficiais.
Desde 2000, a LDO prev� o Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e �ndices da Constru��o Civil (Sinapi) - gerido pela Caixa, com base em pre�os pesquisados mensalmente pelo IBGE nas 27 unidades da Federa��o - como tabela oficial de obras desse tipo. Para as rodovias, o Dnit adota o Sistema de Custos Referenciais de Obras (Sicro), atualizado a cada dois meses, em 24 Estados.
O uso das duas bases de dados � regra, salvo em situa��es em que o gestor justifique o motivo de se abrir a exce��o. � o caso de uma instala��o nuclear, por exemplo. A flexibiliza��o dos par�metros de refer�ncia tradicionalmente previstos na LDO � um pleito antigo de grandes empreiteiras.
O veto preocupa os �rg�os de controle, que se baseiam nos dois sistemas para apurar desvios e mau uso de dinheiro p�blico. Em 2013, o Tribunal de Contas da Uni�o (TCU) achou sobrepre�o e superfaturamento em 29% das obras com verba federal que auditou por meio de seu programa de fiscaliza��o. Nos quatro anos anteriores, o porcentual variou de 34% a 56%.
Para o presidente do TCU, Augusto Nardes, a decis�o enfraquece os mecanismos de fiscaliza��o e causa surpresa. “Surpreende, porque a presidente tem tido um discurso muito favor�vel a que aconte�a um controle por parte do governo em rela��o a fraudes, desvios e irregularidades. Com somente o decreto, isso se fragiliza. � como uma portaria, que eu aprovo e, a qualquer momento, posso modificar”, afirmou.
Nardes acredita que a presidente deve ter sido “mal orientada” por sua equipe ao vetar os artigos. “O que preocupa � que o poder central tem de dar exemplo aos Estados e munic�pios, portanto tem de ser firme nessa quest�o de mostrar o caminho”, disse. Nardes vai conversar com os presidentes da C�mara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), sobre as possibilidades de reverter o quadro.
Para ele, manter a LDO como aprovada seria uma demonstra��o de “for�a” do Legislativo.
‘Abuso de poder’. O governo enviou o projeto da LDO ao Legislativo sem as refer�ncias de pre�o. A alega��o era de que o atual modelo representava um entrave � efici�ncia das obras.
O relator da LDO, deputado Danilo Forte (PMDB-CE), retomou os par�metros de custo em seu substitutivo, aprovado em plen�rio. Parecer das consultorias de Or�amento da C�mara e do Senado classifica a regulamenta��o por decreto de “abuso de poder” e sugere que o Congresso o “suste”. Forte disse que o veto deve ser alvo de cr�ticas e de disputa com o Planalto na volta do recesso. “H� algumas situa��es em que se pode usar a falta de par�metro (na LDO) para viabilizar desvios de recursos.”
Ao justificar o veto, Dilma afirmou que a LDO � revisada anualmente, mas os crit�rios para elaborar o or�amento de obras e servi�os “transcendem” um exerc�cio financeiro. Por isso, uma norma sem prazo de validade garantiria “a necess�ria seguran�a jur�dica”. O Planalto poderia ter enviado ao Congresso um projeto de lei, alheio � LDO, que tornasse as duas refer�ncias permanentes, mas alega que o decreto foi uma solu��o “mais r�pida”.
Como o decreto vale s� para o Executivo, cabe aos demais poderes criarem suas regras - s� o Judici�rio, por meio de resolu��o do Conselho Nacional de Justi�a (CNJ), adota o Sicro e o Sinapi, mas agora tem liberdade para fazer altera��es.
Permanente
Em nota, o Minist�rio do Planejamento argumentou n�o haver enfraquecimento do controle sobre obras, pois as tabelas do Sistema de Custos Referenciais de Obras (Sicro) e do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e �ndices da Constru��o Civil (Sinapi) constam do decreto editado pela presidente Dilma Rousseff.
“Sendo assim, continuam valendo como metodologia padr�o da administra��o p�blica federal na elabora��o do or�amento de refer�ncia das obras e servi�os de engenharia contratados e or�ados com recursos da Uni�o”, explicou a pasta.
Segundo o Planejamento, o Judici�rio j� tem regra pr�pria a respeito e caber� ao Legislativo editar a sua. O minist�rio alega que a supress�o dos artigos da Lei de Diretrizes Or�ament�rias visa dar ao tema “car�ter permanente, para que haja mais seguran�a jur�dica a todas as entidades p�blicas e privadas envolvidas”, pois a vig�ncia da LDO � anual. A pasta n�o informou porque n�o enviou ao Congresso um projeto de lei que perenizasse as duas refer�ncias, o que evitaria as controv�rsias com os �rg�os de controle.
O decreto foi editado em abril, m�s limite para o governo enviar a LDO ao Congresso. O primeiro foi preparado pelas pastas de Planejamento, Casa Civil, Transportes e Controladoria-Geral da Uni�o. O presidente do TCU, Augusto Nardes, diz que o �rg�o n�o foi consultado.
O secret�rio executivo da CGU, Carlos Higino Ribeiro de Alencar, que est� substituindo o ministro Jorge Hage durante suas f�rias, diz que o decreto foi uma solu��o “mais r�pida”, mas o governo n�o se op�e � aprova��o de uma lei com as mesmas regras. “Se o Congresso quiser abrir um debate, n�o h� nenhum �bice nisso.”
O secret�rio alega que o decreto tem mais detalhes que o texto aprovado pelo Congresso, disciplinando melhor, por exemplo, as regras para empreitada a pre�o global (quando se contrata a obra por valor certo e total).
Segundo ele, outra quest�o � o fato de a LDO, editada anualmente poder ser alterada e gerar “instabilidade” em rela��o a projetos executados em tempo maior. “O que o governo quer � norma perene. A gente n�o vislumbra fragiliza��o do controle.”
Higino diz que mudan�as nos par�metros de pre�o s�o improv�veis. “N�o acredito em inova��o, por uma quest�o muito clara: a gente n�o tem muitos sistemas de refer�ncia de pre�os. Esses �ndices s�o constru��es complexas. N�o h� um concorrente do Sinapi”, afirma. Questionado, ele admite, no entanto, que qualquer altera��o s� depende, agora, da caneta de Dilma: “N�o posso falar pela presidente”.