Uma carta escrita por presos pol�ticos do Pres�dio Barro Branco, em S�o Paulo, em 1975, e que trazia nomes e codinomes de 233 torturadores do regime militar no pa�s foi revista e virou um livro, lan�ado hoje (16) na Assembleia Legislativa Paulista pela Comiss�o Estadual da Verdade de S�o Paulo.
O livro Bagulh�o: A Voz dos Presos Pol�ticos Contra os Torturadores traz a carta que foi enviada ao presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (na �poca) Caio M�rio da Silva Pereira. Segundo a comiss�o, foi a primeira den�ncia p�blica de presos pol�ticos sobre torturas e torturadores, embora outros documentos tenham sido elaborados na �poca e divulgados, mas de forma clandestina.
O documento, explicou Morano Filho, consistia em um calhama�o de 28 folhas com as assinaturas de 35 presos. Al�m da identifica��o dos torturadores, o documento descrevia tamb�m os principais m�todos e instrumentos de tortura que eram empregados pelos �rg�os de repress�o e as condi��es carcer�rias. O texto dessa carta foi encerrado pelos presos no dia 23 de outubro de 1975, mas ganhou um post-scriptum dois dias depois para incluir a not�cia da morte, sob tortura, do jornalista Vladimir Herzog.
Morano Filho, que militava pela A��o Libertadora Nacional (ALN), ficou preso entre agosto de 1970 e mar�o de 1977, em diversos pres�dios, entre eles, o de Barro Branco, o Tiradentes e no DOI-Codi. Ele foi um dos que assinou e elaborou o documento. “Como sobreviventes, nos colocamos como testemunhas de assassinatos e de persegui��o pol�tica que se fazia naquele momento. Da� resultou nessa carta”, falou ele.
Para que o documento chegasse �s m�os de Caio M�rio, sem ser interceptada pelos militares, os presos decidiram por uma sa�da clandestina: eles montaram um compartimento no interior de uma garrafa t�rmica, entre as partes de vidro e de pl�stico da garrafa, onde o calhama�o foi alojado. A garrafa foi ent�o usada para servir caf� aos advogados que visitariam seus clientes no pres�dio. Com isso, pelas m�os de um advogado, o documento chegou a Caio M�rio. “E sem preju�zo do caf�”, disse Reinaldo Morano Filho.
A carta foi enviada ao dirigente da OAB porque, em agosto daquele ano, Caio M�rio deu uma declara��o ao jornal Folha de S.Paulo em que dizia que n�o tinha conhecimento de den�ncias concretas de pris�es irregulares e de arbitrariedades policiais e de que precisava de mais informa��es sobre o que estava ocorrendo no pa�s. “N�s, presos pol�ticos abaixo-assinados, recolhidos no pres�dio da Justi�a Militar Federal, S�o Paulo, tomamos conhecimento das declara��es emitidas por Vossa Senhoria lamentando n�o haver conseguido 'especifica��es objetivas' por parte de pessoas v�timas de pris�o irregular e de arbitrariedades policiais. (…) Embora cientes das muitas den�ncias concretas j� havidas – in�meras delas inclusive divulgadas mais recentemente por jornais brasileiros – vimo-nos na obriga��o, como v�timas, sobreviventes e testemunhas de grav�ssimas viola��es aos direitos humanos no Brasil, de encaminhar a Vossa Senhoria um relato objetivo e pormenorizado de tudo o que nos tem sido infligido, nos �ltimos seis anos, bem como daquilo que presenciamos ou acompanhamos pessoalmente dentro da hist�ria recente do pa�s”, diz o trecho inicial da carta.
De acordo com Morano Filho, quando o documento foi tornado p�blico, ainda em 1975, nenhuma a��o legal ou a��o judicial o contestou. Nenhuma contesta��o ao documento ocorreu at� hoje, ressaltou ele.
Um dos ex-presos pol�ticos que tamb�m assinou e ajudou a elaborar a carta foi o ex-ministro da Secretaria de Direitos Humanos da Presid�ncia da Rep�blica e atual membro da Comiss�o Interamericana de Direitos Humano Paulo Vannuchi. Segundo ele, este documento � uma “prova cabal” da exist�ncia de tortura e de viola��es no per�odo. “Esta � mais uma evid�ncia, muito importante para o relat�rio final, para que n�o pairem d�vidas de que houve excessos e de que houve d�zias de torturadores s�dicos e de que o regime criou uma estrutura [de viola��es] e a apoiou”, falou. “Este � um documento curto, f�cil de ler e que precisa ser multiplicado para que todos o conhe�am”, acrescentou.
Para Vannuchi, os relat�rios das comiss�es da verdade de todo o pa�s dever�o abordar, entre outras quest�es, a responsabiliza��o do Estado pelas viola��es ocorridos no per�odo. “Os pouqu�ssimos participantes da ditadura militar que admitem que ocorreram torturas - e o Ustra nega taxativamente – o admitem como exce��o. A exce��o ter� que ser abordada no relat�rio das comiss�es, sobretudo da nacional, para dizer que n�o foi o excesso de uma meia d�zia [de torturadores]. Essa meia d�zia [de torturadores] ou 233 nomes ou 400 precisam ser identificados. Os altos escal�es sabiam o que se passava”, disse ele.
Com Ag�ncia Brasil