Eduardo Henrique Accioly Campos acalentava o sonho de quebrar a polariza��o entre o PT de Dilma Rousseff e o PSDB de A�cio Neves sem criticar o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva. Embora sua candidatura ao Pal�cio do Planalto estivesse estagnada nas pesquisas, o ex-governador de Pernambuco apostava no in�cio da propaganda eleitoral na TV, na ter�a-feira, para alcan�ar a marca de 15% das inten��es de voto e se mostrar competitivo na disputa.
Campos tinha pressa. "Mas n�o me pe�am para falar mal do Lula, que n�o vou", dizia, em resposta � press�o de correligion�rios para atacar o petista. "Gosto do Lula e nunca neguei isso em canto nenhum."
Na manh� de quarta-feira, Lula gravava para o programa de Alexandre Padilha, candidato do PT ao governo de S�o Paulo, quando soube do acidente a�reo que matou Campos. N�o conteve a tristeza e chorou. Por uma tr�gica coincid�ncia, o ex-ministro de Ci�ncia e Tecnologia do governo Lula, chamado de Dudu pelos mais pr�ximos, teve a trajet�ria interrompida no mesmo dia da morte do av�, Miguel Arraes, seu mentor pol�tico, que morreu em 13 de agosto de 2005.
Economista, herdeiro pol�tico de Arraes, presidente nacional do PSB e governador de Pernambuco por dois mandatos (de 2007 a 2014), Campos renunciou em abril para se dedicar � campanha nacional, ap�s selar a surpreendente alian�a com a ex-ministra Marina Silva.
Sem berro
Dilma e Lula bem que tentaram demov�-lo da ideia de romper com o governo petista, mas n�o obtiveram sucesso. "Eu n�o quero briga, mas tenho natureza", afirmava Campos. Em conversas reservadas, dizia resistir firme e calado � ofensiva do PT para minar o plano presidencial. "O bom cabrito n�o berra", brincava.
Uma s�rie de petistas procurou Campos para falar sobre seu futuro pol�tico, como o ent�o governador de Sergipe, Marcelo D�da, morto em dezembro, v�tima de c�ncer. Lula tamb�m tentou. Tamanha proximidade entre o ex-presidente e o neto de Arraes chegava a provocar ci�mes no PT.
Em janeiro de 2013, Dilma chamou o ent�o governador para uma conversa na Base Naval de Aratu, em Salvador, onde passava f�rias. Pediu apoio � sua candidatura � reelei��o e sugeriu que ele poderia ser o vice na chapa. O pernambucano nada falou. A t�tica de ficar em sil�ncio quando n�o queria dizer "n�o" fora herdada de Arraes.
Dilma percebeu que a proposta n�o ia vingar. Oito meses depois daquele di�logo, Campos entregou os cargos que o PSB mantinha no governo.
Nem o argumento de que o PT poderia apoi�-lo numa candidatura ao Planalto em 2018 convencia o governador a mudar de ideia. Campos tinha pressa. N�o queria ser vice e tampouco acreditava nas promessas do PT. "Eu l� sou homem de ser vice? Sou um fura gol", respondia a amigos, numa refer�ncia ao handebol, esporte que praticou na juventude, quando era questionado sobre o assunto. O l�der PSB na C�mara, Beto Albuquerque (RS), foi um dos que ouviram as queixas do ex-governador em rela��o ao PT. "Fal�vamos que ningu�m estaria vivo politicamente em 2018 se n�o participasse da disputa de 2014", disse Albuquerque.
Nos �ltimos tempos, Campos vinha sofrendo press�o dos presidentes estaduais do PSB, como o paulista M�rcio Fran�a, o mineiro J�lio Delgado e o catarinense Paulo Bornhausen, para que come�asse a atacar Lula e para que n�o acatasse tudo o que Marina falava sobre o agroneg�cio. O candidato ao Planalto n�o aceitou.
Apesar de diverg�ncias com Marina, Campos defendia sua vice. Foi assim na sabatina da Confedera��o Nacional da Agricultura (CNA), no dia 6, quando chamou a aten��o dos empres�rios do agroneg�cio para o respeito ao meio ambiente, e na entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, na noite de ter�a-feira, 12, ao lembrar que ficara ao lado da ex-ministra na vota��o do C�digo Florestal.
Pragm�tico
Aos 49 anos, pai de cinco filhos e casado com a economista Renata Campos - sobrinha do escritor Ariano Suassuna, morto h� 16 dias -, Campos era visto pelos advers�rios como um homem duro e pragm�tico. Em 2011, fez campanha para eleger a m�e, Ana Arraes, ministra no Tribunal de Contas da Uni�o (TCU), mas n�o considerava a pr�tica como "nepotismo". Ao Jornal Nacional, disse que s� havia torcido por ela e respondeu apenas "n�o" ao ser questionado se n�o via nada de errado na indica��o da m�e.
Foi Ana quem fez o caf�, na casa do Recife, quando Lula visitou Arraes na volta do ex�lio, em 1979. Campos tinha 13 anos quando viu o l�der sindical pela primeira vez. A m�e contou que os olhos do filho brilhavam. "Minha av� paterna, Maria Benigna, disse assim: 'Minha filha, prepare-se! Voc� vai ter a mesma sina que eu: ser m�e de pol�tico'."
Campos chamava o av� materno de "Doutor Arraes". Al�m de deputado estadual e federal, ele foi secret�rio de Arraes no governo de Pernambuco. No comando da Secretaria da Fazenda, em 1996, teve o nome envolvido no esc�ndalo dos precat�rios. Dois anos depois, foi reeleito deputado e virou l�der do PSB na C�mara. Foi inocentado pelo Supremo Tribunal Federal em 2003 e, no ano seguinte, Lula o chamou para o Minist�rio da Ci�ncia e Tecnologia.
Em 2005, veio o esc�ndalo do mensal�o. "Doutor Arraes, os meninos do PT est�o querendo aprovar a CPI dos Correios", avisou Campos ao av�-conselheiro. Arraes, ent�o deputado, previu um desfecho tr�gico para o Planalto. "Doutor Eduardo, esses meninos do PT t�m a m�o muito lisa para segurar touro bravo", respondeu. "Fique esperto!"
Campos tinha pressa. Ainda no minist�rio, atuava na articula��o do governo Lula, mas j� sonhava em construir, no futuro, uma terceira via na pol�tica. Um sonho que resumia assim: "Damos a seta para a direita, mas ultrapassamos pela esquerda."