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Estado de Minas

Cidad�os pedem combate � corrup��o, mas cedem nas pequenas atitudes do dia a dia

Antes de ler esta reportagem, por favor, confira se voc� j� cometeu alguma destas a��es:


postado em 22/03/2015 06:00 / atualizado em 22/03/2015 12:00


O combate � corrup��o tem aparecido como uma das principais bandeiras nesta nov�ssima hist�ria da Rep�blica que brasileiros come�am a escrever. Se, por um lado, o pedido por honestidade toma as ruas desde a press�o pela aprova��o da Lei da Ficha Limpa, em 2010, e, mais intensamente, a partir dos protestos de junho de 2013, por outro, cidad�os ainda encontram dificuldade de vencer seus pr�prios v�cios. � raro verificar algu�m que nunca tenha cometido pequenos desvios de conduta no cotidiano, como os listados acima. Esses comportamentos n�o deslegitimam o grito contra a corrup��o e est�o longe de ser a origem dos roubos aos cofres do governo, mas tamb�m atropelam o interesse p�blico e mostram que o problema vai muito al�m dos tr�s poderes.


“A corrup��o tem dois significados: algo que se quebra e se degrada. Ela quebra o princ�pio da confian�a, que permite a cada um de n�s associar para poder viver em sociedade. Tamb�m degrada o que � p�blico”, explica a professora do Departamento de Hist�ria da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Helo�sa Starling uma das organizadoras e coautoras do livro Corrup��o – ensaios e cr�ticas. “Quando voc� para em fila dupla, est� degradando o sentido do p�blico. Esses desvios de conduta s�o uma reitera��o desse fen�meno complexo da corrup��o”, completa.


J� que o exemplo s�o as infra��es de tr�nsito, vale lembrar que, apenas no ano passado, foram emitidas 3.980.707 multas em todo o estado, de acordo com o Departamento de Tr�nsito de Minas Gerais (Detran-MG). � como se 42% da frota de Minas, estimada em 9,3 milh�es de ve�culos, fosse flagrada em atos fora da lei. “S�o pequenas corrup��es em que o privado se sobrep�e ao p�blico. A corrup��o n�o se d� s� na rela��o com o Estado, mas tamb�m com a sociedade”, acrescenta o professor de �tica e filosofia pol�tica da Universidade de S�o Paulo (USP), Renato Janine Ribeiro.
Mas o fil�sofo alerta: “A pequena corrup��o n�o � a causa da grande corrup��o. N�o � porque a pessoa n�o aprendeu a ser honesta que ela rouba a Petrobras. � porque � bandida mesmo”. Mas, de pouco em pouco, pequenos desvios de conduta podem representar preju�zos robustos. Por causa de “gatos” na rede el�trica, a Cemig calcula preju�zo de R$ 600 milh�es nos �ltimos dois anos. Estimativa do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) revela que, de 1º de janeiro at� a �ltima quarta-feira, a sonega��o fiscal no pa�s atingiu a marca de R$ 105 bilh�es.


A circula��o em massa de carteirinhas estudantis falsas levou � mudan�a na legisla��o relacionada � meia-entrada. Em vez de documentos emitidos pelas institui��es de ensino, uma carteira de padr�o nacional com seguran�a f�sica e digital passou a ser exigida desde 2013. “Isso tudo para que o estudante de verdade possa ter esse documento”, informam a Uni�o Nacional dos Estudantes (UNE), a Associa��o Nacional de P�s-Graduandos (ANPG) e a Uni�o Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), respons�veis pela emiss�o.

Fora do cinema e do teatro, as pequenas corrup��es tamb�m est�o dentro de casa. Do total de 22,7 milh�es de domic�lios com TV por assinatura, 4,2 milh�es – o equivalente a 18,4% – t�m liga��es clandestinas. Os dados s�o da Associa��o Brasileira de Televis�o por Assinatura (ABTA), em pesquisa in�dita feita em agosto sobre furto de sinal. Segundo o levantamento, possuir TV a cabo clandestina n�o parece uma contraven��o para 38% dos clandestinos, o que torna maior o risco que este comportamento cres�a.

A pr�tica disseminada desses desvios de conduta levou a Controladoria-Geral da Uni�o a lan�ar a campanha “Pequenas Corrup��es – Diga n�o”, sucesso na internet, com 10 milh�es de usu�rios alcan�ados no Facebook. A tentativa � combater atitudes anti�ticas ou ilegais, mas culturalmente aceitas. “No Brasil, temos uma democracia s�lida do ponto de vista das institui��es, mas falta uma cultura mais republicana, que se preocupe com a coisa p�blica”, destaca Helo�sa.

PRAGA DISSEMINADA O professor do Departamento de Ci�ncia Pol�tica da UFMG, Fernando Filgueiras, autor de Corrup��o, democracia e legitimidade, defende que h� um elemento cultural envolvido na corrup��o. “N�o que esteja ligado a uma disposi��o de car�ter dos cidad�os. Mas na forma como eles a percebem e agem frente a ela”, afirma. Segundo professor, se a sociedade percebe a corrup��o como negativa, logo cria san��es morais contra ela, ao contr�rio dos casos em que “os custos morais para a corrup��o s�o baixos”.


Furar fila, n�o declarar compras na alf�ndega e estacionar em local proibido s�o, segundo Filgueiras, pequenas formas de corrup��o que se proliferam em sociedades onde h� maior toler�ncia em rela��o ao problema. Para o cientista pol�tico, a sociedade brasileira tem mudado significativamente desde o processo de redemocratiza��o, que tem a Constitui��o Federal de 1988 como um de seus marcos. “As pessoas hoje aderem mais �s normas, est�o mais convictas da import�ncia da democracia e lutam contra a corrup��o”, refor�a.


Helo�sa Starling destaca que a corrup��o n�o se trata de um mal exclusivo do Brasil, mas v�cio que ocorre em todos pa�ses, democr�ticos ou n�o. “A ideia de se associar ao ‘jeitinho brasileiro’ cria justificativa de que o Brasil � corrupto em fun��o da sua identidade”, questiona a historiadora. A literatura, entretanto, n�o cansou de associar a ideia de burlar as normas com o pa�s. O livro mais c�lebre � Macuna�ma, em que o autor, M�rio de Andrade, apresenta um retrato do povo brasileiro a partir da hist�ria do �ndio que d� nome ao romance, um “her�i sem car�ter”.


Ao longo de sua trajet�ria, o antrop�logo Roberto da Matta se debru�ou sobre o “jeitinho brasileiro”. No livro “O que faz o Brasil, Brasil?”, ele mostra que o dilema brasileiro reside num embate entre leis universais e situa��es onde cada qual se salvava usando de rela��es pessoais. “E no meio dos dois, a malandragem, o “jeitinho” e o famoso e antip�tico “sabe com quem est� falando?” seriam modos de enfrentar essas contradi��es e paradoxos de modo tipicamente brasileiro”, escreve.


O fil�sofo Renato Janine Ribeiro considera que isso se deve ao fato de que a via da lei, por muito tempo, n�o deu a certeza de que o resultado pretendido seria alcan�ado. “Isso est� diminuindo, � uma mudan�a que corresponde � democracia e a maior seguran�a de que a via institucional funcione”.


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