Para ele, o Pronatec n�o pode dar cursos "�s cegas" para os desempregados e os crit�rios de concess�o do Bolsa Fam�lia precisam ser ampliados, para que seja poss�vel identificar quem usa mal o benef�cio, e abrir espa�o para quem precisa. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Qual foi a sua participa��o no plano do PMDB para a �rea social?
O Moreira Franco, do Instituto Ulysses Guimar�es, com quem trabalhei quando estava na SAE (Secretaria de Assuntos Estrat�gicos da Presid�ncia da Rep�blica), ligou dizendo que estava escrevendo um documento e queria me ouvir. Tivemos um par de reuni�es e ele perguntou se eu podia escrever algo naquela linha. Ent�o, existe um documento b�sico, que a gente fez, e tem a espinha dorsal do que a gente pensa sobre pol�tica social, e que foi repassado ao Moreira. Foi no fim do ano passado.
Foi um pouco depois da reda��o do Ponte para o Futuro, do PMDB?
Sim. Moreira usou como um insumo. A gente deu toda a liberdade para ele adaptar. Ele disse que fez mudan�as. Provavelmente, porque considera algumas coisas politicamente imposs�veis. Mas l� tem um racioc�nio para a quest�o social. Se o vice-presidente quiser usar isso, vou ficar orgulhoso, contente e querendo ajudar.
Qual � o racioc�nio?
A gente ainda � muito desigual. � assim: 100 milh�es de pessoas t�m menos de 10% da renda nacional. A outra metade, 90%. Isso d� uma aritm�tica muito gozada: se a renda da metade mais rica cair 4,4% e a renda da metade mais pobre n�o cair, a renda do Pa�s cai 4%. Porque a metade mais rica tem peso 9 e a outra metade, peso 1. � a coisa do primo pobre. Numa fam�lia desigual, na crise, fica f�cil ajudar o primo pobre. Numa fam�lia muito igual, voc� n�o consegue porque todo mundo � pobre meio igual. Aritmeticamente, � rid�culo o Brasil n�o ser solid�rio com os pobres, seja na crise ou no crescimento. Na crise, eles n�o podem perder; no crescimento, precisam crescer mais r�pido. E � f�cil fazer isso: eles s� t�m 10% da renda nacional. Um Estado organizado protege com facilidade uma quantidade grande de pessoas. Foi essa aritm�tica boba que levou a programas como o Bolsa Fam�lia.
Moreira disse que o PMDB quer focar nos 40% mais pobres. Quem s�o eles?
� isso. Mas deixa eu falar outro ponto. Se eu tivesse uma pol�tica p�blica super eficiente, s� haveria um jeito de proteger mais o pobre: aumentar o gasto. Mas, como essa pol�tica � muito ineficiente, posso at� dar mais prote��o se conseguir ser eficiente. Para corrigir a inefici�ncia, precisa mudar a pol�tica para alcan�ar os mesmos resultados ou at� mais, por�m gastando menos.
O sr. pode dar um exemplo?
O cadastro �nico do Bolsa Fam�lia � um livrinho com p�ginas que n�o acabam mais. Tem mais de 100 perguntas. E o que voc� usa para dar o benef�cio? A renda declarada. Voc� descarta todas as outras informa��es. A gente tem um estudo, junto com o pessoal da secretaria de Desenvolvimento Humano, do Rio de Janeiro, mostrando que se eu usar todas as informa��es do cadastro, em vez de s� a renda declarada, consigo, com 15% de dinheiro a menos, ter o mesmo 100% de impacto na redu��o da pobreza.
Por qu�?
Com todas as informa��es do cadastro, eu tenho uma melhor avalia��o da renda real das fam�lias. Portanto, eu consigo identificar melhor quem � pobre e precisa realmente do Bolsa Fam�lia e tamb�m identificar quem diz que � pobre, mas n�o � t�o pobre assim. Hoje, a renda que voc� declarar faz uma enorme diferen�a. Numa fam�lia de cinco pessoas, se voc� declarar que ganha R$ 10 a menos do que de fato ganha, voc� recebe no Bolsa Fam�lia, todo m�s, R$ 50 reais a mais. Ou seja: R$ 600 a mais por ano. � claro que eu posso ver melhor ainda se eu refinar o cadastro ou criar outro sistema, mas j� � evidente que o Brasil n�o tem tantos pobres assim quanto tenho hoje no Bolsa Fam�lia. � claro que o Bolsa Fam�lia est� inchado. Isso quer dizer que quero reduzir os gastos com o Bolsa Fam�lia? N�o. Eu quero manter ou at� aumentar.
A ideia � que chegue a quem precisa?
Isso. Eu quero que o dinheiro chegue a quem realmente precisa. O curioso � que o cadastro �nico mostra que aqueles que s�o realmente pobres, orgulhosamente e, em certo sentido, timidamente, declaram de forma fidedigna a renda deles. Mas tem um monte de gente que n�o � t�o pobre e, na maior cara de pau, declara ter renda zero. Mas eu tenho as informa��es no cadastro: vejo l� que o cara tem um certo n�vel educacional, mora numa casa boa, num lugar com qualidade de vida. Espera a�: acho que ele n�o tem essa renda, n�o. Para chegar a essa conclus�o, a gente foi entrevistar 8 mil fam�lias e bater com os dados do cadastro. D� para melhorar v�rias outras coisas da pol�tica social apenas focando.
Tem outro exemplo?
Creches. A gente expandiu o n�mero de vagas para ningu�m botar defeito. Dobrou a cobertura. Mas as vagas n�o foram para m�es pobres que precisam trabalhar.
Por que n�o?
Porque a gente inventou essa ideia de que creche � um direito de todos e o Judici�rio entra contra as prefeituras. Uma m�e que n�o trabalha e n�o � pobre tem tanto direito quanto uma m�e que � pobre e trabalha. A maioria da cobertura de creche hoje n�o est� entre os mais pobres. Atende a classe m�dia. Ou seja, a gente expandiu a pol�tica p�blica, alcan�amos resultados fant�sticos, mas fizemos isso sem nos preocupar com restri��o or�ament�ria, com a efici�ncia. Expandir de uma maneira generosa, mas sem preocupa��o com a efici�ncia, at� traz resultados, mas a um custo acima do necess�rio.
Pelo que o sr. diz, tem gente que vai sair dos programas sociais?
Evidentemente, tem gente que vai sofrer. Na hora que a gente fizer isso no Bolsa Fam�lia, tem gente que est� recebendo o benef�cio, e talvez n�o fosse para receber tanto assim. Vai perder. Nesse trabalho de arrumar a pol�tica p�blica, e pol�tica social em particular, o pobre vai sair ileso, ganhando. Mas aquele que j� n�o � t�o pobre - n�o pertence aos 40%, at� 50% mais pobres - vai ter de ouvir a verdade: cara, n�o adianta reclamar, voc� j� n�o pertence mais a esse grupo, segue em frente, toca a tua vida a�. Obviamente, vai ter um monte de gente reclamando. Mas voc� n�o vai arrumar as coisas se n�o mudar a �tica.
Qual a proposta para o Pronatec?
A quest�o do Pronatec � a seguinte: qualifica o desempregado de uma maneira cega. � mais inteligente se voc� chegar para cada trabalhador e der para ele um cart�o qualifica��o. Com o cart�o, ele procura emprego. A� ele se d� bem na entrevista: tem postura, agrada, mas n�o tem a qualifica��o esperada. Mas ele tem um cart�o do governo dizendo que ele tem direito a uma forma��o. Primeiro voc� acha um empregador que queira se relacionar com o desempregado - e ele e o empregador, juntos, v�o buscar uma qualifica��o que aquele empregador precisa. O que acontece hoje: o cara est� no meio do Pronatec, fazendo o curso, e desiste porque conseguiu emprego em outra coisa. � muito grande o risco de perder dinheiro com a coisa maluca de formar desempregados, em grande escala, sem saber que emprego v�o ter.
Precisa inverter a ponta: do empregado para o empregador?
Do jeito que est� hoje, � como comprar os m�veis e depois a casa. Primeiro voc� precisa comprar a casa, medir a sala e s� a� comprar o sof�. Com essa simples mudan�a na l�gica, eu evito a evas�o do curso, elevo a produtividade da empresa e reduzo a rotatividade no trabalho, porque as rela��es v�o se tornar mais dur�veis.
E os 40% mais pobres? Quem s�o?
Vou dizer quem n�o est� entre eles. O aposentado n�o est�. Quem ganha aposentadoria de sal�rio m�nimo j� est� acima desses caras. Mas na hora em que voc� define em que grupos essa gente pode estar, fica bom para os lobistas. A gente precisa � de um conjunto de crit�rios, para seguir � risca, n�o da defini��o de um perfil. N�o d� para dizer que o cara � agricultor, da ind�stria, branco ou preto. Bom, foi mais ou menos isso que eu dei para o Moreira.
Voc�s conversaram recentemente?
Eu tendo a ter n�veis de comunica��o baixos. N�o estou muito conectado com o mundo.
O sr. recebeu convite para ser ministro da �rea social?
Quem diz isso est� meio fora de rota. N�o sei de onde tiraram. Talvez fa�a parte de uma estrat�gia qualquer, que eu desconhe�a.