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Estado de Minas

O pre�o da falta de 'jogo de cintura' de Dilma


postado em 12/05/2016 10:49 / atualizado em 12/05/2016 11:02

Bras�lia - A dist�ncia mantida por Dilma Rousseff em rela��o a setores desgastados do Congresso foi uma tentativa da presidente de deixar uma marca durante sua passagem pelo Planalto e, ao mesmo tempo, uma das raz�es de seu drama pol�tico. O estilo insular da primeira mulher a ocupar a Presid�ncia da Rep�blica - somado � fama de gestora eficiente e que combatia a corrup��o - garantiu �ndices elevados de popularidade nos primeiros anos de mandato, mas depois resultou no derretimento da coaliz�o de partidos aliados e de sua capacidade de sobreviver �s crises econ�mica e pol�tica.

Em cinco anos e quatro meses de poder, Dilma fez desse distanciamento uma caracter�stica de quase todas as suas rela��es como presidente. Uma queixa inclusive do PT antes mesmo de ela comandar pela primeira vez o Pa�s. Foi o PMDB, no entanto, o partido que deixou mais claro o desconforto pelo comportamento centralizador e autossuficiente, visto por muitos como prepot�ncia. Em 2008, os deputados peemedebistas Michel Temer (SP), Eduardo Cunha (RJ) e Henrique Eduardo Alves (RN) procuraram a ent�o ministra-chefe da Casa Civil. No encontro, Alves lhe ofereceu um bambol�. O presente inusitado era uma cr�tica � falta de "jogo de cintura" da ministra em liberar cargos no setor el�trico. A gargalhada solta por Dilma n�o deixou clara a postura que adotaria no comando do Executivo, tr�s anos depois. Naquela �poca, a rela��o com o PMDB n�o preocupava a futura candidata indicada ao posto pelo ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva, que vivia o auge de sua popularidade.

Nas conversas com aliados, Dilma nunca escondeu que enxergava o exerc�cio do poder como um peso e n�o um prazer. A Presid�ncia era uma miss�o recebida. Mas a necessidade de iniciar um governo que tivesse caracter�sticas pr�prias ficou evidenciada dias antes de Lula lhe entregar a faixa. Dilma saiu em defesa da iraniana Sakineh Ashtiani, condenada ao apedrejamento. A manifesta��o ia al�m de uma postura contr�ria � pr�tica medieval de assassinar mulheres. A presidente eleita rejeitava em p�blico a pol�tica externa do antecessor, que costurava neg�cios de mineradoras com regimes de viola��es de direitos humanos. Nas semanas seguintes, Dilma surgia como uma presidente t�cnica, que fugia dos extremismos e recebia para jantar at� o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Na festa de 31 anos do PT, dois meses depois da primeira posse de Dilma, Lula discursou para negar que estava com ci�mes da sucessora e reclamar que a imprensa tentava distinguir o governo dela do projeto petista. "O sucesso de Dilma � o meu sucesso, o fracasso de Dilma � o meu fracasso", esbravejou. Ele levou para a festa o ex-ministro Jos� Dirceu e outros envolvidos no mensal�o. Lula sugeriu que o PT n�o daria apoio para um poss�vel desejo de Dilma de impor uma marca pr�pria e afirmava que a presidente lhe seria fiel. "Essa gente metida a formadora de opini�o p�blica n�o entende nada de psicologia. Minha rela��o com Dilma � indissoci�vel", disse. A presidente, por sua vez, tentava vender a mesma imagem de uni�o umbilical entre criador e criatura: "N�o adianta, ningu�m vai me indispor com Lula e � por isso que digo que ele pode falar o que quiser". Mas a realidade era distante dos discursos. Em muitas ocasi�es, ela tamb�m se afastava de Lula.

Faxina

Em menos de dois anos de governo, Dilma perdeu sete ministros por corrup��o, muitos demitidos em meio � press�o. Mas a chamada "faxina" s� refor�ou a imagem da presidente. Ela chegou a aprova��o pessoal de 78% na pesquisa do Ibope. A limpeza no governo, por�m, causou sangria interna na coaliz�o liderada por PT e PMDB. Wagner Rossi, ministro da Agricultura indicado pelo agora vice-presidente Michel Temer, foi demitido em meio � acusa��o da Pol�cia Federal de que liderava uma organiza��o criminosa. Alfredo Nascimento, dos Transportes (hoje, deputado federal pelo PR, do Amazonas), e Luiz Antonio Pagot, diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit), ligado ao senador Blairo Maggi (PP-MT), ca�ram sob suspeita de esquemas no setor rodovi�rio. A faxina chegou � Conab. O presidente do �rg�o, Evangevaldo Moreira dos Santos, irm�o do deputado Jovair Arantes (PTB-GO), saiu disparando contra Temer. Mais tarde, Arantes foi o relator da proposta de admissibilidade do impeachment de Dilma na C�mara. O governo sofreu impacto maior nas demiss�es dos ministros Antonio Palocci, da Casa Civil, sob suspeita de aumento ilegal do patrim�nio, e Nelson Jobim, da Defesa, por cr�ticas a colegas.

A decis�o de Dilma de desmontar esquemas do PR, PT e PMDB nos Transportes resultou em melhoria nas pesquisas e, ao mesmo tempo, no problema de uma m�quina de obras que deixava de funcionar. O PAC come�ou a desandar. A presidente foi criticada ainda por n�o ter jogo de cintura na rela��o com as empreiteiras, protagonistas desde o governo de Juscelino Kubitschek.

Lula deixou o Pal�cio do Planalto em 2010 como novo "pai dos pobres". Dilma, formada no brizolismo, encarnou a "m�e dos pobres", personagem que Lula lhe deu, mas ignorou que a realidade econ�mica do Pa�s mudou. A presidente adotou pol�ticas populistas, segurando o pre�o da gasolina e da energia, al�m de manter os gastos p�blicos em patamares insustent�veis. Sua aprova��o pessoal atingiu 79% em mar�o de 2013, outro recorde. Mas metade desse porcentual se perdeu em junho e julho daquele ano, quando protestos contra o aumento da tarifa de �nibus e metr� em S�o Paulo - de R$ 3 para R$ 3,20 -, concedido pelo prefeito Fernando Haddad (PT), e a repress�o violenta da pol�cia sob o controle do governador Geraldo Alckmin (PSDB) foram o estopim de manifesta��es que se alastraram pelo Pa�s em uma esp�cie de catarse nacional.

Num curto espa�o de tempo, a gestora eficiente atraiu a ira das ruas. Quando Haddad e Alckmin anunciaram, no Pal�cio Bandeirantes, que a passagem voltaria ao pre�o anterior, milhares de pessoas continuaram nas ruas para pedir mudan�as na qualidade dos servi�os p�blicos e criticar a realiza��o da Copa do Mundo.

Dilma n�o recuperou mais os �ndices de popularidade. Ela s� tinha 34% de aprova��o quando foi deflagrada a Opera��o Lava Jato, que jogou no colo do governo a corrup��o na Petrobr�s, estatal que teve a ent�o ministra da Casa Civil como presidente do Conselho Administrativo. Os defensores do impeachment n�o apontaram sinais de enriquecimento il�cito de Dilma, mas destacavam que o projeto dela era o de Lula e do PT. As decis�es do juiz S�rgio Moro e as a��es da for�a-tarefa de procuradores e agentes federais da Lava Jato minariam tentativas da presidente de se desvencilhar da crise pol�tica e econ�mica.

Na campanha para o segundo mandato, Dilma fez mais promessas nas �reas social e econ�mica do que o j� deficit�rio Or�amento permitiria. Antes mesmo da sua segunda posse, o discurso do Planalto mudou e a presidente foi acusada pela oposi��o de ter cometido "estelionato eleitoral", algo que acabou sendo admitido pelo pr�prio Lula. Em outubro de 2015, um ano depois da reelei��o, durante reuni�o do Diret�rio Nacional do PT em Bras�lia, Lula afirmou: "Tivemos um problema pol�tico s�rio, porque ganhamos a elei��o com um discurso e depois das elei��es tivemos que mudar o nosso discurso e fazer aquilo que a gente dizia que n�o ia fazer".

A Opera��o Lava Jato n�o foi o argumento oficial da pe�a do impeachment de Dilma aprovada pela C�mara, mas a decis�o da presidente de usar recursos de bancos oficiais para equilibrar o rombo das contas - as pedaladas fiscais. A �rea que a diplomou - ela � formada em economia - foi justamente o motivo de sua impopularidade.

Com o aumento de problemas no setor de infraestrutura e da pol�tica fiscal, Dilma n�o contava nem mesmo com a m�quina de claques montada por Lula. No come�o de seu governo, a presidente isolou a equipe que organizava solenidades no Planalto e nas cidades dos grot�es, deixada pelo ex-ministro da Secretaria-Geral Luiz Dulci. O sucessor de Dulci no cargo, Gilberto Carvalho, amigo pessoal de Lula, foi afastado depois. Nada de MST e CUT no Sal�o Nobre do Planalto e no gramado do Alvorada. Durante seu governo, a presidente evitou a pauta de temas tradicionais de movimentos de esquerda, como a reforma agr�ria, a demarca��o de terras ind�genas, a aplica��o de investimentos mais robustos na educa��o e a melhoria da sa�de. No campo, ela manteve a alian�a com o agroneg�cio constru�da por Lula. Os ruralistas, por�m, deixaram a alian�a em 2016 e apoiaram o impeachment. Por ironia do destino, a claque sempre muito explorada por Lula foi a que se fez presente no apoio nas ruas nestes momentos finais de seu governo.

12 dias

A fase mais cr�tica e decisiva que selou a sorte da presidente come�ou em 4 de mar�o deste ano, quando Lula foi conduzido de forma coercitiva para depor na Pol�cia Federal, e terminou 12 dias depois, em 16 do mesmo m�s, data em que o ex-presidente tomou posse no cargo de ministro-chefe da Casa Civil. Logo ap�s o an�ncio de que Lula entraria para o governo, S�rgio Moro divulgou �udios de telefonemas dos dois. Trechos desses �udios foram avaliados como conversas de Lula sobre uma suposta estrat�gia de ganhar foro privilegiado com a posse. O homem que conquistou multid�es trazia a crise ainda mais para dentro do Planalto. Esse epis�dio abalou tanto a presidente que, no fim de semana seguinte, ela pegou o avi�o presidencial e foi buscar conforto na fam�lia, em Porto Alegre.

Mesmo com mais de 60% de rejei��o nas pesquisas, Dilma n�o deixou de, praticamente todas as manh�s, pegar sua bicicleta e pedalar nas pistas pr�ximas ao Pal�cio da Alvorada, por cerca de uma hora. "Isso me revigora", confidenciou ela. Disciplinada, apesar das ang�stias e percal�os, manteve sob r�gido controle o peso e a sa�de, evitando at� mesmo uso de rem�dios para controlar a ansiedade.

Por causa das press�es, Dilma se viu obrigada a substituir muitos dos seus fi�is aliados. Manteve ao seu lado, por�m, o assessor especial Giles Azevedo e desenvolveu uma liga��o muito pr�xima a Jos� Eduardo Cardozo, ex-Justi�a e agora advogado-geral da Uni�o. O ex-ministro da Casa Civil, que ocupa hoje a Educa��o, Aloizio Mercadante, foi substitu�do por Jaques Wagner, que, agora, n�o sai de seu lado. Mas Dilma mant�m momentos de isolamento no poder. Seus �ltimos discursos fizeram travessia para seu passado. "Eu tenho a disposi��o da resist�ncia e resistirei at� o �ltimo dia", disse Dilma, na sexta-feira passada, pouco antes de a Comiss�o Especial do Senado aprovar a admissibilidade de abertura para o processo de impeachment.

Dilma n�o fala em erros, mas, al�m de ignorar os movimentos populares t�o valiosos para a gest�o do padrinho Lula, seu pouco apetite para a rela��o com o Congresso foi fatal. O vice-presidente Michel Temer, pol�tico tradicional, que ela desprezava, foi tratado como algoz. Apesar da disposi��o apregoada nos discursos de continuar lutando pelo seu mandato, auxiliares pr�ximos � presidente relatam que ela tamb�m j� demonstrou vontade de se livrar do fardo do poder.


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