Sentado nos degraus da entrada do Memorial Minas Gerais Vale, na Pra�a da Liberdade, diante de seu caminh�o, um transportador aut�nomo mostra o celular e comenta: “� por aqui que a gente se organiza e fica sabendo da verdade, n�o � pelo que eles dizem na televis�o depois das reuni�es em Bras�lia. Aquilo � tudo fake news.”
No final da manh� desse domingo (27), o motorista, de 47 anos e morador da zona leste de BH, aceitou conversar com o Estado de Minas, sob a condi��o de anonimato, para explicar o que o fez parar de trabalhar at� conseguir o que quer.
� uma agenda pragm�tica, que come�a pela redu��o e estabilidade do pre�o do diesel. E n�o pretende, segundo ele, se misturar com os interesses de outros grupos. “Irm�o, a gente n�o vai l�, n�o. Nosso protesto n�o tem nada a ver com Pimentel”, disse o aut�nomo para um dos organizadores de manifesta��o de apoio aos caminhoneiros e de protestos contra todos os pol�ticos, que havia pedido para o motorista estacionar seu caminh�o em frente ao Pal�cio da Liberdade. “Eu s� vim aqui porque voc�s disseram que ia ter povo. N�o t� vendo povo nenhum. Cad� o gigante que ia acordar?”
Ao chegar, os ve�culos causaram frenesi e logo se tornaram cen�rio para selfies e grava��es de v�deos dos que se vestiam de verde e amarelo, entre brados de “Sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor”, “Fora Temer”, “Fora Pimentel” e “A nossa bandeira nunca ser� vermelha”.
Ao lado de outro motorista, 10 anos mais jovem e tamb�m morador da zona leste, o caminhoneiro corrige ao ser perguntado sobre a origem da greve. “N�o � greve. N�o tem sindicato. Eu n�o pago sindicato, eu pago � diesel caro. E n�o d� mais pra continuar assim”, diz.
A reuni�o realizada em Bras�lia na quinta-feira, que terminou com representantes do Planalto e de caminhoneiros sorridentes a celebrar um acordo, foi in�cua, disse o aut�nomo. “N�o tinha ningu�m nosso, eles n�o deixaram entrar o Chor�o (o goiano Wallace Landim), o �nico que podia falar e trazer as propostas deles pra gente. Desde �s quatro da tarde a gente j� sabia que n�o ia dar em nada, s� ia aumentar o movimento. Governador de S�o Paulo t� fazendo a mesma coisa, se reunindo com gente que n�o nos representa e indo pra televis�o anunciar acordo.”
O uso do WhatsApp � intenso e tornou-se a principal ferramenta de comunica��o entre os aut�nomos. � pela rede que eles planejam a��es, acompanham a movimenta��o das For�as Armadas e desmentem ministros: “V� se a gente pode confiar num sujeito como aquele Marun? S� com o papel assinado”.
H� uma restri��o, segundo o motorista, no grupo de WhatsApp: pol�tico n�o entra. “Hoje mesmo apareceu um no grupo se dizendo do PT, queria negociar de o partido entrar com for�a para nos apoiar em troca dos caminhoneiros reconhecerem que foi golpe na Dilma, fazer um mea culpa. Tem base? Tiramos a figura na hora”.
Quanto tempo vai durar a paralisa��o? “Depende deles aceitarem o que a gente quer. Mas � bom o pessoal saber: depois que acabar, vai demorar muito pra voltar ao normal. Cada dia parado, pode botar tr�s, quatro dias para recuperar.” No fim da conversa, o mais velho comenta com o aut�nomo mais novo: “Voc� viu como o pessoal ficou quando eu toquei a buzina? Buzina forte, parece buzina de trem, mo�o! Faz um barulho...” E � prov�vel que haja mais barulho. Abaixo, trechos da conversa com o motorista aut�nomo mineiro.

N�o tem nada disso. A gente n�o fez uma assembleia e resolveu parar. Foi pela indigna��o. Foi trocando ideias pelas redes sociais que fomos ficando indignados com mais de 11 aumentos de combust�veis seguidos. N�o temos nenhuma rela��o com sindicatos, partidos ou movimentos. A coisa foi espont�nea e a popula��o enxergou isso e comprou a briga. No whatsapp a gente fechou com gente de Pernambuco, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, S�o Paulo, Rio de Janeiro, Alagoas. Foi de todo o Brasil. Uma rede enorme e que todo mundo conversa e decide.
E quanto � negocia��o conduzida pelo governo federal?
Reconhecemos apenas a Abcam (Associa��o Brasileira dos Caminhoneiros), que foi uma esp�cie de porta-voz. Levaram nossas demandas, mas n�o nos organizaram. Se fizerem algo que n�o nos deixe satisfeitos, a gente cruza os bra�os do mesmo jeito. A gente � aut�nomo, em maioria. N�o pago sindicato. Mas era preciso ter algu�m para encaminhar as nossas demandas. Mas se n�o fizerem isso como queremos, a gente simplesmente n�o aceita.
Voc�s tiveram medo de a popula��o n�o concordar com a sua paralisa��o?
Combust�vel � o que encarece tudo no Brasil. Porque n�s, caminhoneiros, trazemos tudo que as pessoas consomem. Ent�o, n�o tem como as pessoas n�o estarem a favor dessa luta. At� porque eles compram combust�vel para trabalhar, para estudar, para viver. E tudo aquilo que consomem j� chega encarecido pelo pre�o exorbitante dos combust�veis. N�o duvidamos em nenhum momento que os brasileiros iriam nos apoiar.
Outros manifestantes tentaram vincular o movimento de voc�s �s causas deles?
Demais. Aqui na pra�a (da Liberdade) queriam que a gente estacionasse os caminh�es na frente do Pal�cio (da Liberdade) para pedir o impeachment do (governador Fernando) Pimentel. Sai fora. N�o tem nada a ver com o que estamos precisando. Houve, tamb�m, petistas que quiseram se infiltrar e conduzir do jeito deles o movimento trazendo outras quest�es e pedidos. Condenar o impeachment da (ex-presidente) Dilma (Rousseff) ou a pris�o do (ex-presidente Luiz In�cio) Lula. N�o tem nada, absolutamente nada a ver com isso. A gente identificou essas pessoas e simplesmente tiramos das nossas redes sociais.
Como voc�s descrevem a situa��o dos caminhoneiros brasileiros?
A gente estava quase pagando para trabalhar. Se um pneu estourasse, se tivesse de trocar �leo para conseguir que os freios e mec�nica do caminh�o funcionasse, a gente quase n�o tirava dinheiro do frete. Era uma situa��o sem sustenta��o. Uma hora ia estourar e a gente n�o aguentou e estourou. Agora, s� com uma garantia de que podemos trabalhar com justi�a. S� queremos trabalhar e ganhar nosso sustento.
Quando a paralisa��o vai acabar?
Quando o pre�o do �leo diesel baixar e se garantir que n�o ser� aumentado de novo. Quando nos possibilitarem passar pelas balan�as com os eixos levantados e pagar um pre�o justo. Tem que retirar a Cide (Contribui��o de Interven��o no Dom�nio Econ�mico), o PIS (Programas de Integra��o Social e de Forma��o do Patrim�nio do Servidor P�blico) e o COFINS (Contribui��o para Financiamento da Seguridade Social) do diesel. S� assim a gente vai ter um impacto positivo para todos, n�o apenas para os caminhoneiros. E toda a sociedade vai sentir isso.