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Estado de Minas HIST�RIA

Livro conta a hist�ria das primeiras-damas do Brasil

Trajet�ria pouco conhecida, livro destaca a participa��o dessas mulheres ao longo de 130 anos de Rep�blica. Salvo exce��es, elas foram ofuscadas por uma sociedade machista e conservadora


postado em 09/02/2020 04:00 / atualizado em 09/02/2020 08:51

“Filha de um senador, fui esposa de um presidente e m�e de um ministro de Estado.” Trinta e oito anos depois de encerrado o mandato de Arthur Bernardes – na Primeira Rep�blica, entre 1922 e 1926 –, assim se definiu sua esposa, Cl�lia Vaz de Melo (1876-1972), em entrevista concedida � revista Manchete em 1964. Natural de Vi�osa, de tradicional fam�lia de pol�ticos mineiros, Cl�lia, a mais longeva primeira-dama em 130 anos de Rep�blica – morreu l�cida aos 96 anos – forjou a pr�pria identidade na trajet�ria pol�tica dos homens de sua fam�lia, muitas vezes influenciando decis�es � sombra. A hist�ria de Cl�lia, mulher dedicada ao lar e discreta, traduz o itiner�rio da maioria das primeiras-damas em 130 anos de Rep�blica.

E se � inequ�voco que os postos-chave da pol�tica no Brasil foram e continuam ocupados por homens – apenas uma mulher, Dilma Rousseff, foi eleita presidente da Rep�blica –, � fato que a maior parte das primeiras-damas que orbitaram o poder durante o exerc�cio do mandato de seus respectivos maridos fizeram vistas grossas aos casos extraconjugais e n�o cultivaram a carreira profissional.

Nesse sentido, a antrop�loga, pesquisadora e p�s-doutora Ruth Cardoso foi ponto fora da curva. Ser “do lar”, a “retaguarda” dos homens de poder, foi o padr�o esperado, assim expresso por Scylla Gaffr� Nogueira (1907-2003), mulher de Em�lio Garrastazu M�dici, presidente entre 1969 e 1974, auge do per�odo da repress�o da ditadura militar: “Sou e serei sempre o que fui: a esposa de meu marido, duas vezes m�e. Ao longo de minha vida, n�o me tem feito maior diferen�a a fun��o que ele exerce, desde que permitido me seja estar ao seu lado. Minha valia � t�o pouca, minha miss�o � t�o f�cil e t�o suave. A mim, toca fazer-lhe a casa amiga e serena (…)”.


''Apesar dos avan�os da luta pelos direitos das mulheres, a esposa do principal l�der do pa�s continua sendo coadjuvante - quanto mais bela, recatada e do lar for, mais feliz estar� a na��o''

Ci�a Guedes e Murilo Fiuza, trecho do livro Todas as mulheres dos presidentes




A hist�ria n�o contada das primeiras-damas brasileiras est� registrada no �leo sobre tela de Gustavo Hastoy, que retrata, no Pal�cio do Itamaraty, no Rio de Janeiro, o momento em que o marechal Deodoro da Fonseca, chefe do Governo Provis�rio, rodeado por 18 homens, assina em 20 de junho de 1890 o projeto da primeira Constitui��o da Rep�blica do Brasil. “A mulher que inauguraria o cargo de primeira-dama no Brasil � a �nica figura de costas na pintura; imposs�vel ver seu rosto.

A cena explicita uma contradi��o que vai se repetir ao longo dos 130 anos de Rep�blica: o Brasil teve muitas primeiras-damas marcantes, mas suas hist�rias, quando n�o foram apagadas, s�o como Mariana Cec�lia de Sousa Meireles, esposa de Deodoro da Fonseca, na pintura de Hastoy: sem rosto, sem que se possa ao menos adivinhar seus sentimentos, mas presentes, mesmo que �s sombras”, escrevem os jornalistas Ci�a Guedes e Murilo Fi�za de Melo, autores do livro Todas as mulheres dos presidentes – A hist�ria pouco conhecida das primeiras-damas do Brasil desde o in�cio da Rep�blica (Editora M�quina de Livros).

“Todas as primeiras-damas, at� mesmo Ruth Cardoso, uma acad�mica reconhecida, cuja trajet�ria profissional se destaca como exce��o entre a maioria das primeiras-damas que n�o cultivaram carreira profissional, tiveram vidas regidas por op��o pol�tica do homem com o qual se casaram”, avalia Ci�a Guedes. “Com raras exce��es, essas mulheres invis�veis passaram � hist�ria como cita��es nas biografias de homens fortes”, acrescentam. “Sobre os presidentes da Rep�blica h� grande volume e variedade de biografias, perfis, ensaios e trabalhos. Mas sobre as primeiras-damas h� pouca informa��o. Quisemos contar a hist�ria da Rep�blica com esse vi�s feminino”, diz Murilo Fi�za de Melo, lembrando que para a historiografia nacional – narrada sobretudo por homens – elas s�o ignoradas, praticamente “n�o existem”.

A invisibilidade das primeiras-damas do Brasil fala muito da trajet�ria social da mulher, numa sociedade machista e conservadora, afirma Murilo Fi�za. “O espa�o das mulheres tem sido conquistado com muito esfor�o”, afirma. Foi apenas no C�digo Civil de 2002 que as mulheres deixaram, pelo menos perante a lei, de ser subjugadas pelo homem, considerado o “chefe da sociedade conjugal”, e, inclusive, passaram a escolher se queriam ou n�o adotar o sobrenome do marido. 

Ambos lembram que no C�digo Civil de 1916 as mulheres precisavam da autoriza��o do marido para exercer uma profiss�o, o que deixou de existir apenas em 1962, com o Estatuto da Mulher Casada. 

J� o direito � participa��o pol�tica por meio do voto chegou apenas no governo de Get�lio Vargas, em fevereiro de 1932, quando, por meio de decreto, um novo C�digo Eleitoral estendeu o direito de voto �s mulheres.

“Apesar dos avan�os da luta pelos direitos das mulheres, a esposa do principal l�der do pa�s continua sendo coadjuvante – quanto mais bela, recatada e do lar for, mais feliz estar� a na��o”, destacam Ci�a Guedes e Murilo Fiuza, que lembram, em contraponto, como, nos estertores da monarquia, a princesa Isabel deixou a sua marca na hist�ria, nas tr�s oportunidades em que assumiu a reg�ncia: assinou a Lei do Ventre Livre (1871) e a Lei �urea (1888).

Oito eram mineiras



Ci�a Guedes e Murilo Fi�za fizeram a pesquisa bibliogr�fica de 34 primeiras-damas, inclusive de Risoleta Neves (1917-2003) – esposa de Tancredo Neves, que morreu em 1985, antes de assumir o primeiro governo civil ap�s a ditadura militar –, e Antonieta Castelo Branco (1922-2010), filha do marechal Castelo Branco (1897-1967), que era vi�vo, o primeiro presidente militar a assumir ap�s o golpe de 1964. Os autores tamb�m consideraram a biografia de Ana Guilhermina de Oliveira Borges (1855-1891), que morreu antes de Rodrigues Alves (1848-1919) chegar � Presid�ncia, cargo que exerceu entre 1902 e 1906. Ele foi eleito para um segundo mandato como presidente em 1º de mar�o de 1918, mas contraiu a gripe espanhola e morreu.

Entre as 34 primeiras-damas abordadas no livro, oito foram mineiras, com especial destaque para a trajet�ria de Sarah Lu�sa Gomes de Sousa Lemos Kubitschek (1908-1996) e Risoleta Neves. Um dos presidentes mais marcantes da hist�ria brasileira, sob Juscelino Kubitschek (1902-1976) o Brasil viveu a arrancada desenvolvimentista, expressa no slogan “50 anos em 5”. Os autores destacam, sobre o pol�tico apelidado de Presidente Bossa Nova: “Por todos os �ngulos em que se examina, parece que nunca fomos t�o felizes como no governo de JK, um homem charmoso, descendente de ciganos, que adorava dan�ar e se divertir”. Classificando Sarah como uma “das mais importantes primeiras-damas” da Rep�blica, ao lado de Darcy Vargas e Ruth Cardoso, os autores registram a forma como ela impulsionou a carreira pol�tica de Juscelino, abrindo-lhe as portas das “fam�lias poderosas de Minas”.

Mas demonstram que ela foi muito al�m do papel de coadjuvante, sendo citada pela Funda��o Oswaldo Cruz como autora das primeiras iniciativas de preven��o e tratamento de c�ncer ginecol�gico no pa�s. “A import�ncia de suas obras assistenciais resistiu ao tempo, mas ela n�o � t�o lembrada quanto outras primeiras-damas de destaque. Foi tamb�m v�tima do massacre que a ditadura militar promoveu contra a imagem de Juscelino”, afirmam Ci�a Guedes e Murilo Fiuza. Ao longo de sua carreira, Juscelino teve diversos casos amorosos.

Conhecida pela reserva e comedimento, Risoleta foi casada por 47 anos com Tancredo Neves (1910-1985), considerado articulador importante da transi��o democr�tica: costurou ampla alian�a entre o Partido do Movimento Democr�tico Brasileiro (PMDB), oposicionista, e a Frente Liberal, dissid�ncia do Partido Democr�tico Social (PDS), governista, para apoiar, a sua elei��o no Col�gio Eleitoral, em janeiro de 1985. Tancredo era considerado moderado, portanto, palat�vel pelo regime militar para consolidar a transi��o. Mas foi impedido de tomar posse em decorr�ncia de uma cirurgia, morrendo antes de assumir a Presid�ncia da Rep�blica, v�tima de sucessivos erros m�dicos.



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