
A oposi��o � pol�tica externa do governo Jair Bolsonaro, comandada pelo chanceler Ernesto Ara�jo, uniu partidos pol�ticos e titulares do Itamaraty de todos os governos desde a redemocratiza��o do Pa�s. Ex-ministros das Rela��es Exteriores e embaixadores se organizaram no chamado Grupo Ricupero, que p�s lado a lado advers�rios hist�ricos na diplomacia que agora articulam apoio e defendem a��es no Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir danos � imagem do Pa�s e o desrespeito � Constitui��o que, segundo eles, s�o promovidos pela gest�o de Bolsonaro.
Na semana passada, Rubens Ricupero - embaixador, ex-assessor internacional do presidente Jos� Sarney - e Celso Amorim - chanceler de Itamar Franco e de Luiz In�cio Lula da Silva - se reuniram com representantes de funda��es de oito partidos para expor as preocupa��es do grupo. O encontro foi coordenado por Renato Rabello, ex-presidente do PCdoB. Nele havia tamb�m representantes de PT, PSDB, Rede, Cidadania, PSB, PDT e PSOL.
Na reuni�o, os diplomatas relataram aos partidos por que consideram que as a��es de Ara�jo violam a Constitui��o. Os argumentos devem servir a questionamentos das legendas no Congresso e no STF. "O Brasil est� isolado. Isso trar� consequ�ncias graves para o futuro do Pa�s", afirmou Ricupero, que d� nome ao grupo por simbolicamente representar um elo entre duas alas da diplomacia nacional.
Ap�s o encontro, o PSB decidiu, por meio do deputado Alessandro Molon (RJ), seu secret�rio de Rela��es Internacionais, encaminhar requerimento de convoca��o de Ara�jo ao Congresso para ele "apresentar e esclarecer quest�es sobre as sistem�ticas viola��es da Constitui��o na condu��o da pol�tica externa brasileira".
"A situa��o do Brasil em termos de pol�tica externa � lament�vel, deplor�vel. A imagem de uma atua��o equilibrada do Itamaraty constru�da ao longo de d�cadas de trabalho est� sendo destru�da rapidamente. Somos um pa�s que n�o merece ser levado a s�rio. Recentemente fomos criticados por Paraguai e Col�mbia em raz�o de nossa pol�tica contra o coronav�rus. Olham para n�s com incredulidade, o que traz muito preju�zos para o Brasil", disse Ricupero.
Para Molon, deve-se ainda analisar a��es no Supremo. "N�o descartamos ir ao Supremo para barrar a��es do Itamaraty como a que deixou o Brasil fora do esfor�o mundial para a busca de uma vacina contra a covid-19." O l�der do PSDB na C�mara, deputado Carlos Sampaio (SP), afirmou que "a pol�tica externa deve estar a servi�o dos interesses brasileiros e a diplomacia, como o pr�prio termo j� diz, � avessa a confrontos com parceiros comerciais de primeira grandeza do Brasil, como a China, e cr�ticas a organismos internacionais, como a OMS".
As cr�ticas feitas � China por Ara�jo e pelo bolsonarismo s�o uma das principais reclama��es contra as a��es do atual chanceler. O receio � de que elas prejudiquem as exporta��es para o pa�s asi�tico pelo agroneg�cio - a China � o principal parceiro comercial do Pa�s.
Outros pontos tamb�m mobilizaram os partidos. Um deles foi a decis�o de o Brasil retirar todos os seus diplomatas da Venezuela, deixando 12 mil brasileiros residentes naquele pa�s sem nenhuma assist�ncia consular. A representa��o do deputado Paulo Pimenta (PT-RS) pede � procuradora federal dos Direitos do Cidad�o, D�borah Duprat, que tome provid�ncias a fim de obrigar ao presidente e ao Itamaraty reabrir a embaixada ou pelo menos o consulado em Caracas para "garantir a prote��o dos cidad�o brasileiros que l� se encontrem sob qualquer pretexto ou residam naquele pa�s bem como proteger o leg�timo interesse das empresas brasileiras que comercializam com entes p�blicos e privados da Venezuela".
Pimenta obteve recentemente uma vit�ria no Supremo. O ministro Lu�s Roberto Barroso concedeu liminar suspendendo decis�o de Bolsonaro que expulsava os diplomatas da Venezuela. Para o professor e ex-chanceler Celso Lafer - governos Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso -, "est�o em andamento e podem crescer no Congresso Nacional o controle pol�tico e a fiscaliza��o da pol�tica exterior do governo Bolsonaro".
De acordo com Lafer, o grupo de chanceleres foi constru�do "por pessoas de distintas orienta��es e vis�es pol�ticas". Para ele, trata-se de "um esfor�o para viabilizar um centro vital voltado para agregar - e n�o para fragmentar - a sociedade brasileira, o que � t�o necess�rio para uma apropriada governan�a".
A a��o dos chanceleres provocou rea��o do governo. Em artigo publicado no Estad�o, o vice-presidente Hamilton Mour�o afirmou que o grupo usa seu prest�gio "para fazer apressadas ila��es e apontar o Pa�s ‘como amea�a a si mesmo e aos demais na destrui��o da Amaz�nia e no agravamento do aquecimento global’, uma acusa��o leviana".
Al�m de Ricupero, Lafer e Amorim, fazem parte do grupo de ex-chanceleres o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso - chanceler de Itamar Franco -, Aloysio Nunes Ferreira (Michel Temer), Jos� Serra (Michel Temer), Francisco Rezek (Fernando Collor de Mello) e o ex-secret�rio de Assuntos Estrat�gicos Hussein Kalout (Michel Temer). Eles publicaram um artigo no Estad�o e em outros jornais do Pa�s com o t�tulo A Reconstru��o da Pol�tica Externa Brasileira.
Exemplo
Para FHC, o documento deve ser o embri�o de novas iniciativas. "No que depender de mim, sem partidarismos ou sectarismos, a resposta �: sim." Ele afirmou acreditar em a��es pontuais que unam os partidos. No mesmo sentido, Amorim disse esperar a "rea��o de outros setores, que talvez n�o tenham percebido que, embora seja loucura, h� m�todo no governo Bolsonaro".
"Cabe aos congressistas tomar uma atitude mais direta", disse. "Criamos uma converg�ncia entre n�s em torno da democracia e da defesa da Constitui��o, um di�logo entre for�as que v�o do DEM ao PSDB e ao PT", disse Aloysio Nunes Ferreira. Para o articulador do grupo, o cientista pol�tico e professor da Universidade de Harvard Hussein Kalout, a a��o est� "apenas come�ando".
A cr�tica fundamental dos ex-chanceleres � de que o governo Bolsonaro viola com sua pol�tica externa os princ�pios do artigo 4º da Constitui��o. "O Executivo tem uma certa margem de aprecia��o na sua interpreta��o e aplica��o. Esta margem no entanto, tem limites. O que argumentamos no nosso artigo � que a diplomacia do governo Bolsonaro extrapolou estes limites, que s�o um marco normativo a ser seguido", afirmou Lafer.
O grupo denuncia a submiss�o do Brasil � pol�tica externa do governo de Donald Trump bem como o "apoio a medidas coercitivas em pa�ses vizinhos, violando os princ�pios de autodetermina��o e n�o interven��o". Para Amorim, o Brasil hoje "se converteu em um p�ria internacional".
O Estad�o procurou o Itamaraty sobre a a��o dos ex-chanceleres e dos partidos, mas a pasta n�o se manifestou. Pelo Twitter, ap�s a divulga��o do artigo, Ara�jo chamou Fernando Henrique, Ricupero e Amorim de "paladinos da hipocrisia".