
N�o vai ter golpe - pelo menos n�o uma quartelada cl�ssica, como as do passado -, mas a ofensiva autorit�ria do presidente Jair Bolsonaro, tendo as For�as Armadas como guarda pretoriana, pode em tese ser vitoriosa.
"Bolsonaro s� colou nos militares para poder us�-los como guarda pretoriana contra o impeachment, intimidando o Congresso", afirma Lynch. Abaixo, os principais trechos da entrevista concedida ao Estad�o.
Quando Bolsonaro foi eleito presidente, dizia-se que os militares o enquadrariam ou conteriam seus arroubos. Por que isso, aparentemente, n�o aconteceu?
N�o foi por falta de vontade. Bolsonaro n�o � propriamente um militar; ele � um pol�tico de baixo clero que, tendo sido tenente, formou sua clientela eleitoral representando os interesses de seus antigos companheiros de farda e de outras corpora��es armadas. Os filhos ampliaram a clientela do pai explorando um eleitorado de direita radical na base do populismo, seguindo t�cnicas de manipula��o digital sofisticadas. Ent�o, enquanto os generais palacianos se orientam mais conforme uma l�gica de caserna, fechada, hier�rquica e disciplinada, imaginando um "bom governo" ordeiro e harmonioso, a fam�lia Bolsonaro se orienta por uma l�gica de "guerra cultural" que mantenha o Pa�s em estado de permanente polariza��o e inquieta��o. Da� as tens�es frequentes entre o n�cleo conservador reacion�rio, "lacrador" e radical, a quem Bolsonaro deve a sua elei��o, e o n�cleo dos generais palacianos, mais moderado e tradicional. A alian�a com os primeiros � estrat�gica, e com os segundos, apenas t�tica.
Como o Centr�o entra na equa��o? No que resultar� a mistura de militares com deputados fisiol�gicos e algumas vezes processados por corrup��o?
Dispor de uma base parlamentar � condi��o de viabilidade de qualquer governo normal, e essa discuss�o s� parece bizarra porque se trata do governo Bolsonaro. Ao buscarem o apoio dos conservadores do Centr�o, os generais foram pragm�ticos, recorrendo ao presidencialismo de coaliz�o, respeitando a "estrat�gia" de n�o os colocar na cabe�a dos minist�rios, e sob promessa da n�o reitera��o de pr�ticas de corrup��o. � evidente que a entrada do Centr�o rompe com a narrativa antissistema do radicalismo reacion�rio, mas os generais n�o pertencem a esse grupo.
Bolsonaro, ao longo do governo, tem oscilado entre a ala militar e a ala ideol�gica. Agora, parece estar fechado com os ex-colegas de farda, mas j� esteve assim no passado e mudou de lado. A atual posi��o pr�-militar, na sua avalia��o, � definitiva?
Claro que n�o. � t�tica. Bolsonaro s� colou nos militares para poder us�-los como guarda pretoriana contra o impeachment, intimidando o Congresso. Alguns dos generais se incomodaram, o Alto Comando tamb�m, fizeram declara��es moderadas, e afastaram a possibilidade de golpe com que o presidente flertava junto ao seu p�blico de radicais. Afinal, em �ltimo caso, os generais palacianos sempre ter�o o general Mour�o, para ser acionado em caso de emerg�ncia. N�o est�o amarrados ao mesmo mastro que Bolsonaro na tempestade. Se hoje parece haver maior comunh�o entre eles � porque o inqu�rito das fake news no STF elevou a possibilidade de cassa��o da chapa pelo TSE, o que liquidaria a solu��o Mour�o. Fato � que, alguma hora, os generais palacianos ter�o de se sentar com os congressistas e os ju�zes para dar uma solu��o mais definitiva a essa crise infind�vel que, come�ada em 2013, n�o termina gra�as ao radicalismo do "n�cleo ideol�gico".
Invertendo o slogan que marcou o ocaso do governo Dilma: vai ter golpe?
J� n�o se fazem mais golpes como antigamente. Se o Congresso e o Supremo Tribunal cederem � intimida��o da fam�lia Bolsonaro, renunciando ao livre exerc�cio de suas prerrogativas constitucionais, o golpe estar� consumado e ser� o primeiro de v�rios outros. Mas, sinceramente, creio que, com seu agu�ado senso de sobreviv�ncia corporativa, os militares n�o cair�o nesse truque. Perceber�o a inutilidade de seus esfor�os e contribuir�o, no momento oportuno, para a costura da �nica sa�da constitucional aceit�vel para todos, que passa pela assun��o da Presid�ncia da Rep�blica pelo general Hamilton Mour�o.
As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.