O juiz Diego Paes Moreira, da 6� Vara Criminal Federal de S�o Paulo, arquivou investiga��o aberta contra o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT) e seu filho, Lu�s Cl�udio, a partir de dela��es da Odebrecht. O magistrado apontou em despacho na segunda, 7, que n�o foram apresentados ind�cios suficientes dos crimes imputados ao petista no caso.
O criminalista Cristiano Zanin Martins, que defende Lula, afirmou que a decis�o � "muito relevante". "Al�m de arquivar uma investiga��o baseada em dela��es mentirosas, tamb�m reconhece alguns fundamentos t�cnicos que sempre sustentamos e que foram utilizados pela 'Lava Jato' para acusar sistem�tica e indevidamente o ex-presidente Lula", afirmou.
Lula e Lu�s Cl�udio foram indiciados em mar�o do ano passado por lavagem de dinheiro e tr�fico de influ�ncia por supostos pagamentos da Odebrecht � empresa esportiva Touchdown, do filho do petista, em 2011. As investiga��es come�aram a partir das dela��es de Em�lio Odebrecht e Alexandrino Alencar.
Os empres�rios relataram que, em troca de influ�ncia no governo federal, a empreiteira investiria nos projetos de Lu�s Cl�udio. A PF afirmou que a Touchdown teria recebido R$ 10 milh�es em alguns anos "apesar de seu capital social de R$ 1 mil".
A "troca de favores", por�m, n�o teria sido suficientemente documentada, segundo a Justi�a. No despacho, o juiz Moreira afirma que a suposta corrup��o n�o poderia ficar configurada, uma vez que Lula j� n�o era presidente na �poca dos fatos - o petista deixou a presid�ncia em 2010.
Al�m disso, a alega��o de que Lula teria atuado para intermediar as rela��es da Odebrecht com o governo Dilma tamb�m seriam "gen�ricas", segundo o juiz.
"Segundo se deduz dos depoimentos dos colaboradores Em�lio Alves Odebrecht e Alexandrino de Salles Ramos Alencar, tanto Dilma Rousseff como Marcelo Odebrecht seriam supostamente pessoas com personalidade 'forte' e opini�es 'incisivas', das quais inicialmente resultaram constantes diverg�ncias", narrou Moreira. "O suposto papel do investigado Luiz In�cio Lula da Silva seria conciliador, de forma a facilitar o di�logo entre ambos, o que consistiria em uma atua��o gen�rica".
Moreira afirmou que Alexandrino Alencar e Em�lio Odebrecht "n�o indicaram nenhum ato espec�fico, como a assinatura de contratos ou decis�es em licita��es do governo Rousseff, que poderiam qualificar suposto tr�fico de influ�ncia de Lula.
A posi��o do juiz seguiu manifesta��o do pr�prio Minist�rio P�blico Federal, que pediu o arquivamento do caso. Para a Procuradoria, embora os fatos sejam "reprov�veis do ponto de vista �tico" e correspondam a uma forma de venda de influ�ncia pol�tica, "n�o � suficiente para a configura��o penal".
COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA CRISTIANO ZANIN MARTINS, QUE DEFENDE LULA:
Essa decis�o � muito relevante porque al�m de arquivar uma investiga��o baseada em dela��es mentirosas, tamb�m reconhece alguns fundamentos t�cnicos que sempre sustentamos e que foram utilizados pela "Lava Jato" para acusar sistem�tica e indevidamente o ex-presidente Lula, em clara pr�tica de lawfare - que � o uso estrat�gico do Direito para fins ileg�timos".
LEIA A �NTEGRA DA DECIS�O:
Trata-se de inqu�rito policial instaurado a partir da remessa, pelo Supremo Tribunal Federal, da Peti��o n. 6.842-DF, veiculando numerosos fatos noticiados em acordos de colabora��o premiada celebrados por EM�LIO ALVES ODEBRECHT e ALEXANDRINO DE SALLES RAMOS ALENCAR, ambos do Grupo ODEBRECHT, com o Minist�rio P�blico Federal, homologados no �mbito da chamada "Opera��o Lava Jato".Dos referidos acordos, constam dezenas de termos de declara��o ando conta da suposta pr�tica de distintos crimes, por parte de diversas pessoas.
A aludida Peti��o traz, especificamente, o termo de colabora��o n. 30 de EM�LIO ODEBRECHT e o termo de colabora��o n. 19 de ALEXANDRINO ALENCAR, tornados objeto do presente inqu�rito policial, ap�s afeta��o � Justi�a Federal de S�o Paulo-SP (cf. decis�o proferida no Ag. Reg. Na Peti��o n. 6.842-DF - fls. 03-06).
Ambos, em breve s�ntese, narram supostos il�citos atribu�dos, em tese, no contexto de uma suposta "troca de favores" entre o ex-Presidente da Rep�blica LUIZ IN�CIO LULA DA SILVA ("LULA") e o ex-presidente do Grupo ODEBRECHT, EM�LIO ALVES ODEBRECHT.
Nesse quadrante, o presente inqu�rito policial foi instaurado, por requisi��o ministerial, a fim de apurar a suposta pr�tica de crimes de corrup��o passiva e ativa, tipificados nos artigos 317 e 333 do C�digo Penal.
A autoridade policial elaborou relat�rio final �s fls. 454-493, formalizando o indiciamento dos investigados LUIZ IN�CIO LULA DA SILVA e LUIS CLAUDIO LULA DA SILVA pela suposta pr�tica dos crimes previstos no artigo 332 do C�digo Penal e artigo 1� da Lei n. 9613-98, bem como o indiciamento de ADALBERTO ALCIDES VIVIANI ALVES pela suposta pr�tica do crime previsto no artigo 1� da Lei n. 9.613-98.
Em raz�o do indiciamento pela suposta pr�tica de lavagem de valores, os autos foram declinados para uma das varas federais especializadas em crimes contra o sistema financeiro e de lavagem de valores, e na sequ�ncia foram redistribu�dos por sorteio para este ju�zo (fls. 508-514).
Ap�s a remessa dos autos ao MPF, o parquet promove o arquivamento do inqu�rito policial, aduzindo que os fatos investigados s�o at�picos. Narra que n�o seria configurada a corrup��o passiva porque o investigado n�o era mais agente p�blico ao tempo dos fatos e a vantagem n�o seria decorrente da fun��o p�blica anteriormente exercida (art. 317 do C�digo Penal). Aduz ainda que n�o seria configurado o delito de tr�fico de influ�ncia (art. 332 do C�digo Penal), porque n�o houve indica��o dos atos que seriam objeto da suposta influ�ncia. Enfim, aduz que se n�o h� configura��o do crime antecedente, imposs�vel a tipifica��o da lavagem de valores (art. 1� da Lei n. 9.613-98).
� o relat�rio.
Decido.
Assiste raz�o ao MPF.Tanto o MPF como a autoridade policial afirmam em suas manifesta��es que os fatos em si teriam ocorrido, ou seja, que a empresa ODEBRECHT teria supostamente custeado despesas da TOUCHDOWN, projeto do investigado LUIS CLAUDIO LULA DA SILVA, a pedido do investigado LUIZ IN�CIO LULA DA SILVA, conforme narrado pelos colaboradores EM�LIO ALVES ODEBRECHT e ALEXANDRINO DE SALLES RAMOS ALENCAR.
A diverg�ncia consiste na qualifica��o dos fatos. Para a autoridade policial, houve configura��o de suposto tr�fico de influ�ncia (art. 332 do CP) e de suposta lavagem de valores (art. 1� da Lei n. 9.613-98). Para o MPF, os fatos s�o at�picos pois n�o se ajustam em nenhum dos mencionados tipos penais.Passo a analisar os tipos penais indicados pelo MPF.Corrup��o passiva - art. 317 do C�digo Penal" Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da fun��o ou antes de assumi-la, mas em raz�o dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena - reclus�o, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Reda��o dada pela Lei n� 10.763, de 12.11.2003) 1� - A pena � aumentada de um ter�o, se, em conseq��ncia da vantagem ou promessa, o funcion�rio retarda ou deixa de praticar qualquer ato de of�cio ou o pratica infringindo dever funcional."
Observe-se que para a configura��o de corrup��o passiva, � essencial que a vantagem seja decorrente da fun��o p�blica. Por outro lado, n�o h� necessidade de que algum ato de of�cio seja descrito, ou seja, basta a possibilidade de eventual facilidade ou suscetibilidade usufru�vel em raz�o da fun��o p�blica (STF, 1� T., Inq 4.506-DF, Dje-183, div. 03-09-2028, publ. 04-09-2018; e STJ, 6� T., REsp 1.745.410-SP, Dje 23-20-2018). A indica��o ou descri��o de um ato de of�cio ou omiss�o referente ao exerc�cio do cargo � indiferente para a configura��o da corrup��o passiva.
No caso concreto o investigado LUIZ IN�CIO LULA DA SILVA n�o era mais agente p�blico e a suposta solicita��o de vantagem n�o decorreu da condi��o de agente p�blico. Ou seja, a suposta "troca de favores" n�o tinha por pressuposto a sua presen�a ou atua��o na condi��o de Presidente da Rep�blica.
Assim sendo, os fatos n�o se enquadram no tipo penal da corrup��o.
Tr�fico de influ�ncia - art. 332 do C�digo Penal"Art. 332 - Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcion�rio p�blico no exerc�cio da fun��o: (Reda��o dada pela Lei n� 9.127, de 1995) Pena - reclus�o, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Reda��o dada pela Lei n� 9.127, de 1995) Par�grafo �nico - A pena � aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem � tamb�m destinada ao funcion�rio. (Reda��o dada pela Lei n� 9.127, de 1995)"Para a configura��o do crime de tr�fico de influ�ncia, � essencial que o agente sugira a capacidade de exercer influ�ncia sobre um agente p�blico, bem como haja a defini��o do ato a ser objeto da influ�ncia ("a pretexto de influir em ato praticado por funcion�rio p�blico no exerc�cio da fun��o").
No caso concreto o objetivo da influ�ncia seria aperfei�oar as rela��es entre a ent�o Presidente da Rep�blica Dilma Roussef e Marcelo Odebrecht, dirigente da ODEBRECHT. Segundo se deduz dos depoimentos dos colaboradores EM�LIO ALVES ODEBRECHT e ALEXANDRINO DE SALLES RAMOS ALENCAR, tanto Dilma Roussef como Marcelo Odebrecht seriam supostamente pessoas com personalidade "forte" e opini�es "incisivas", das quais inicialmente resultaram constantes diverg�ncias. O suposto papel do investigado LUIZ IN�CIO LULA DA SILVA seria conciliador, de forma a facilitar o di�logo entre ambos, o que consistiria em uma atua��o gen�rica.
Portanto n�o h� indica��o dos atos de of�cio praticados pela agente p�blica que seriam objeto de influ�ncia do investigado. Os colaboradores n�o indicaram nenhum ato espec�fico, como a assinatura de contratos, decis�es em licita��es, realiza��o de pagamentos ou quaisquer outros atos concretos que poderiam qualificar a conduta no tipo penal do tr�fico de influ�ncia.
O MPF pondera que os fatos em si, embora at�picos, s�o reprov�veis do ponto de vista �tico, eis que correspondem a uma forma de venda de influ�ncia pol�tica. Entretanto a reprova��o �tica n�o � suficiente para a configura��o do tipo penal, consoante a reda��o do artigo 332 do C�digo Penal.
Conforme ressaltado acima, a indica��o do ato de of�cio n�o � exigida para a configura��o do crime de corrup��o passiva (art. 317 do C�digo Penal). Logo, a ideia gen�rica de "venda de favores" � abrangida no tipo penal da corrup��o passiva. Entretanto no caso concreto o investigado n�o era mais agente p�blico, bem como n�o h� nexo entre os fatos e o exerc�cio de sua pret�rita fun��o p�blica. No caso concreto sua atua��o se daria como agente privado, de forma a afastar a incid�ncia do tipo penal da corrup��o (art. 317 do C�digo Penal). Enfim, se n�o h� tipicidade do crime antecedente, por consequ�ncia n�o h� lavagem de valores.
Assim os fatos s�o tamb�m at�picos quanto � lavagem, por inexist�ncia de prova ou ind�cio de pr�tica de crime antecedente.
Diante do exposto, acolho a manifesta��o ministerial e determino o arquivamento do presente feito, tendo em vista que os fatos narrados s�o at�picos, ressalvada a hip�tese do artigo 18 do C�digo de Processo Penal.
D�-se ci�ncia ao Minist�rio P�blico Federal.
S�o Paulo, 07 de dezembro de 2020.
DIEGO PAES MOREIRA
Juiz Federal Substituto.
POL�TICA