
Expoente da ala garantista, Gilmar reconhece que a corre��o de rumos imposta pelo STF coincide com o momento em que a Lava Jato caiu em desgra�a, mas afirma que isso se deve � "estrutura hier�rquica do Judici�rio", em que o Supremo � o �ltimo a se manifestar.
O ministro ressalta que o Supremo anulou as condena��es contra o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva por quest�es meramente processuais, ao concluir que os casos n�o deveriam ter ficado em Curitiba. O STF n�o entrou no m�rito se o petista cometeu corrup��o passiva e lavagem de dinheiro. "N�o foi uma absolvi��o", observou.
Gilmar j� fez duras cr�ticas a posi��es adotadas pelo novato Kassio Nunes Marques que coincidem com os interesses do presidente Jair Bolsonaro, respons�vel por sua indica��o. Mesmo assim, disse n�o ver riscos de uma Corte "bolsonarista" e afirmou que os v�nculos pol�ticos dos magistrados v�o se "esmaecendo com o tempo".
Anular as condena��es de Lula legitima o discurso do PT de que ele n�o praticou corrup��o?
N�o. O que o tribunal est� mandando � para o juiz competente processar e julgar as den�ncias. � isso. N�o foi uma absolvi��o. Claro que cancela as condena��es, mas manda que o juiz competente prossiga no seu julgamento.
Lula ainda tem um novo encontro com a Justi�a?
Com certeza. Voc� viu que surgiu a d�vida sobre a vara competente, S�o Paulo ou Distrito Federal. Definida a compet�ncia, essa vara vai prosseguir (o trabalho).
O sr. v� espa�o para o plen�rio derrubar a suspei��o do Moro?
Essa quest�o est� resolvida. Porque, de fato, n�s julgamos o habeas corpus (da suspei��o de Moro na Segunda Turma). N�s temos que ser rigorosos com as regras processuais. N�o podemos fazer casu�smo com o processo, por se tratar de A ou de B.
O julgamento de Lula pode provocar um efeito cascata e beneficiar outros r�us?
N�o vejo assim. O caso do Lula, no que diz respeito � suspei��o, � muito delimitado. � uma situa��o muito personalista.
Lula ficou 580 dias preso, acabou afastado das elei��es de 2018 e s� agora o plen�rio do STF decidiu que Curitiba n�o tinha compet�ncia para julg�-lo. O Supremo dormiu no ponto?
Acho que n�o. Na verdade, o processo judicial � muito complexo. E ele segue toda essa escala: o juiz de primeiro grau; o tribunal intermedi�rio, no caso deles, o TRF-4; o STJ; e o Supremo. Desde 2015, o STF vem afirmando que a compet�ncia de Curitiba n�o � universal.
Como explicar � sociedade que o Judici�rio cometeu um erro que levou � pris�o de uma pessoa?
Isso � fruto, primeiro, dessa estrutura hier�rquica do Judici�rio. O Supremo s� fala por �ltimo. Essa quest�o do Lula (da compet�ncia de Curitiba) s� aportou no Supremo em novembro. Agora, o Supremo, no caso do "quadrilh�o do MDB", j� tinha decis�o. O caso da Gleisi (Hoffmann, presidente do PT) e do Paulo Bernardo � um antecedente, de 2015, e ali se assentaram balizas muito interessantes. Dizendo, por exemplo, que n�o bastava que um delator informasse v�rios fatos para justificar a compet�ncia de Curitiba.
Por que inst�ncias inferiores n�o foram na mesma linha?
Havia uma �nsia de decidir rapidamente, de acordo com aquilo que a Lava Jato tinha estabelecido. Se n�s formos olhar, havia uma certa opress�o dos tribunais que eram suscet�veis de serem oprimidos. O STJ, nesse per�odo, foi submetido a uma press�o pol�tico-judicial. Uma persegui��o judicial. Por conta daqueles epis�dios ligados � nomea��o do Marcelo Navarro (alvo de acusa��o na dela��o de Delc�dio Amaral). O tribunal, ele pr�prio, perdeu a ossatura. Ele n�o cumpriu, adequadamente, seu papel.
O STF imp�s uma corre��o de rumos � Lava Jato?
A Lava Jato sofreu in�meras derrotas ao longo desse tempo. Mas por seus pr�prios m�ritos. Ou dem�ritos. Ela causou isso, na medida em que avan�avam sobre compet�ncias que n�o tinham. A pergunta b�sica �: como que se deu tanto poder a uma for�a-tarefa? Em que lugar do mundo haveria isso? � alguma coisa que precisa ser explicada. Virou um esquadr�o.
O sr. utilizou as mensagens de hackers como refor�o para declarar Moro parcial.
Isso sugere uma subvers�o institucional. Houve, de alguma forma, um colapso a�, em termos de gest�o administrativa. Esses problemas se multiplicam. De alguma forma, est�o ocorrendo epis�dios semelhantes na 7.ª Vara do Rio de Janeiro. Em que aparece um super advogado (Nythalmar Filho, alvo de mandados de busca da PF), que teria relacionamento com o juiz (Marcelo Bretas), que teria tr�nsito com os procuradores, que faziam todas as dela��es... E tudo mais. Nesse mundo obscuro que � o Rio de Janeiro. O combate � corrup��o n�o pode ser instrumento de corrup��o.
No julgamento da suspei��o de Moro, o sr. ficou frustrado com o voto de Nunes Marques, que foi contra declarar o ex-juiz parcial?
Eu saio do julgamento, o tema se encerra, e a vida segue com a mesma normalidade. Sou bastante enf�tico, como voc�s sabem. Posso at� ter advers�rios, mas n�o tenho inimigos, n�o.
O sr. destacou que "n�o h� salva��o para o juiz covarde". O voto dele foi covarde?
N�o estava falando sobre isso. � um artigo de Ruy Barbosa, que diz: "O bom ladr�o salvou-se. Mas n�o h� salva��o para o juiz covarde". � uma express�o cl�ssica. Estimula-se muito a t�cnica do n�o conhecimento (rejei��o do processo por quest�es t�cnicas), para evitar enfrentar determinadas quest�es, especialmente em mat�ria criminal. Eu sou cr�tico disso, porque depois n�s acabamos por chancelar brutais injusti�as.
Ap�s a indica��o para o STF, qual deve ser a rela��o do ministro com o chefe do Executivo?
Tenho a impress�o de que esses v�nculos pol�ticos v�o se esmaecendo com o tempo. � natural e surge at� um distanciamento...
Bolsonaro riu ao ser informado por um apoiador de que uma a��o contra Alexandre de Moraes ficou nas m�os de Nunes Marques. Essa "bancada bolsonarista" que pode se formar dentro do STF n�o preocupa?
Acho que n�o. A vida � t�o din�mica, e as pessoas v�o se conscientizando do seu papel. O que acontece � que talvez o momento pol�tico est� t�o crispado e acaba acontecendo que muitos pol�ticos ficam falando para os seus convertidos: ‘Ah, estou atuando nisso’, mas o ministro Kassio simplesmente encaminhou para o arquivo essa mat�ria. Portanto, aqui n�o sinaliza nenhuma subordina��o hier�rquica ao presidente da Rep�blica. Ao rev�s, mostra que simplesmente ele est� seguindo a jurisprud�ncia do STF.
O sr. v� risco de um "Supremo bolsonarista"?
N�o vejo, acho que as pessoas (os indicados) come�am a fazer uma autocr�tica do seu papel.
O senador Jorge Kajuru (Podemos-GO) divulgou �udio de uma conversa reservada com Bolsonaro. O sr. v� crime nesse tipo de conduta?
Tudo isso � muito estranho. De fato, a gente tem de resguardar a figura do presidente da Rep�blica. A impress�o que ficou � de que um �rg�o que det�m um tipo de soberania est� muito vulner�vel. A interdi��o do debate p�blico e a criminaliza��o da pol�tica estimularam aventureiros, que hoje comp�em bancadas no Congresso, mas que n�o t�m cultura pol�tica parlamentar. Espero que esses aventureiros n�o renovem mandato.
A Lei de Seguran�a Nacional � uma heran�a maldita da ditadura?
N�s temos muitas leis de ditadura. O pr�prio C�digo Penal e o C�digo de Processo Penal s�o de uma ditadura hoje considerada mais "soft", do Estado Novo, per�odo Vargas. Mas eu tor�o para que, de fato, haja a substitui��o da Lei de Seguran�a Nacional. Que o Congresso fa�a um novo projeto, e a previs�o expressa de uma lei de defesa do estado democr�tico direito.
As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.