De Cabo Daciolo a Bolsonaro: a hist�ria por tr�s do Patriota, partido 'familiar' com brigas internas que pode abrigar o presidente

No perfis das redes sociais do presidente do Patriota, Adilson Barroso, abundam imagens de natureza. Fotos de cavalos, flores e frutas com legendas simples, como "que linda, hem?" e "que maravilha" s�o curtidas por milhares de pessoas. Nenhuma das postagens mencionam pol�tica.

Barroso � fundador do Patriota, originalmente PEN (Partido Ecol�gico Brasileiro), um partido supostamente pr�-meio-ambiente fundado em 2011 e registrado no ano seguinte que tinha um trevo de quatro folhas como logo.

Hoje, o Patriota repudia "a histeria propagada pelo obscurecimento da causa ambiental", segundo seu estatuto, al�m de defender o "respeito � doutrina conservadora crist�" e a "valoriza��o da p�tria".

"Nosso foco � sustentabilidade, n�o � plantar �rvore e comer folha. Sem radicalismo ambiental", diz Barroso � BBC News Brasil.

Nas �ltimas elei��es presidenciais, a legenda lan�ou Cabo Daciolo ï¿½ presid�ncia. O candidato finalizou a disputa como sexto mais votado, com 1,26% dos votos, � frente de Marina Silva e Henrique Meirelles. Hoje, o partido tem uma bancada de seis parlamentares na C�mara.

Essa � a nova casa do senador Fl�vio Bolsonaro e talvez o futuro partido de seu pai, o presidente Jair Bolsonaro.

Bolsonaro est� sem partido h� mais de um ano, desde que se desfiliou do PSL. Para concorrer a um cargo eletivo nas elei��es de 2022, ele precisa se filiar a uma nova legenda no m�nimo seis meses antes do pleito, previsto para outubro do ano que vem.

Sua primeira op��o, a de fundar um partido pr�prio, n�o deu certo. A segunda op��o era filiar-se a um partido pequeno e ser seu "dono", como ele pr�prio j� declarou, comandando diret�rios da agremia��o nos estados.

"Estou namorando outro partido, t�? Onde eu seria dono dele como alternativa se n�o sair o Alian�a [partido que queria fundar]", disse o presidente a apoiadores em frente ao Pal�cio do Alvorada em mar�o.

O Patriota estava entre as legendas cogitadas - e a tese de que ser� o partido escolhido pelo presidente ganhou tra��o quando o presidente da sigla, Adilson Barroso, anunciou a filia��o de Fl�vio Bolsonaro na semana passada em uma conven��o nacional convocada dias antes. Segundo Barroso, Bolsonaro ficou de dar uma resposta sobre sua filia��o em "dez, doze dias".

Mas com a poss�vel filia��o do presidente, a c�pula do Patriota rachou.

O vice-presidente do partido, Ovasco Resende, e outros integrantes acusam Barroso de "golpe" para mudar o estatuto e facilitar a incorpora��o dos Bolsonaro � legenda. Nesta semana, o grupo acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) questionando mudan�as de Barroso no diret�rio e na executiva do Patriota.

O vice-presidente do TSE, Edson Fachin, rejeitou a a��o, indicando que o tema tem que ser resolvido na Justi�a comum, e n�o na Justi�a eleitoral.

"Est� no estatuto o direito de trocar delegados. N�o s�o s� tr�s, cinco pessoas que definem uma conven��o", defende Barroso. "N�o � um racha, acontece em todo lugar democr�tico."

Hist�ria e fam�lia

Barrinha � uma cidade de 32 mil habitantes da regi�o metropolitana de Ribeir�o Preto, em S�o Paulo. Foi ali que Adilson Barroso, um ex-cortador de cana fiel da Assembleia de Deus, se elegeu vereador em dois mandatos consecutivos - o primeiro em 1988. Depois, foi vice-prefeito tamb�m duas vezes. Barroso � mineiro nascido em Leme do Prado, no Vale do Jequitinhonha.

Passou pelo PRONA (eleito deputado estadual com os votos para Havanir Nimtz), PSC (Partido Social Crist�o) e o PSL at� fundar seu pr�prio partido, o PEN (Partido Ecol�gico Nacional) em 2011. Aprovada pelo TSE no ano seguinte, foi a 30ª sigla registrada no pa�s.

As not�cias da �poca da funda��o do partido mostram que Barroso nomeou diversos familiares para membros do diret�rio nacional da legenda. "Quando eu criei o partido, criei com uns 20% de parentes mais ou menos", admitiu Barroso ao jornal O Globo em 2017.

Na semana passada, reportagem do jornal Folha de S.Paulo revelou que presta��es de contas do Patriota entre 2017 e 2020 mostravam que Barroso destinou dinheiro p�blico do partido ao pr�prio bolso e para ao menos dez familiares, incluindo a atual mulher, ex-mulher, irm�os, filha, cunhada e sobrinhos.

� BBC News Brasil, Barroso diz que "n�o existe distribui��o de fundo a parente", e que ele fundou o partido com "mais de 200 parentes ajudando com todas as for�as". Mas ele emprega "menos de meia d�zia" de familiares. "Se tiver tr�s ou quatro" � muito, diz ele.

Para a professora do departamento de ci�ncia pol�tica da Unicamp Andr�a Freitas, esse � um dos fatores que mostram que o PEN "era um partido de dono". "H� um controle muito grande, tanto que fez essa movimenta��o para abrigar o filho do Bolsonaro e provavelmente o pr�prio Bolsonaro com uma canetada", diz ela.

A filia��o de um presidenci�vel a seu partido � um sonho antigo. Em 2013, Barroso afirmou que aceitaria at� mudar o nome da sigla para "Rede" para abrigar a candidatura de Marina Silva.

"Convidei Marina Silva. Ela � uma pessoa que defendia a sustentabilidade. Claro que ela talvez teria um 'radical' do lado ambiental um pouquinho mais forte do que quer�amos", diz o presidente da legenda.

Em 2018, sua agremia��o mudou de nome de PEN para Patriota a pedido de Bolsonaro, segundo Barroso, justamente para abrigar o ent�o deputado federal. Mas Bolsonaro acabou se filiando ao PSL.

Vantagens para Bolsonaro

Assim como em 2018, o que o presidente procura agora � controle, mesmo que seja de uma legenda pequena, diz Freitas. Com isso, Bolsonaro consegue controlar tr�s tipos de recursos - financeiros, simb�licos e ideol�gicos, explica.

Primeiro, recursos financeiros. O fundo partid�rio, fornecido aos partidos para fazerem campanha de filia��o, forma��o pol�tica, material de divulga��o do partido, entre outros. E o fundo eleitoral, que financia as campanhas - em 2022, para governador, deputado, senador e presidente da Rep�blica.

Em segundo lugar, recursos relativos a cargos internos do partido e aos candidatos. "� Bolsonaro quem vai decidir quem v�o ser os candidatos a governador, deputado estadual e assim vai. Embora n�o seja recurso financeiro, � muito importante, porque ele consegue decidir que tipo de apoio ele quer e manter controle do partido para n�o entrar algum outro l�der que n�o v� subjugar o controle que ele tem. � muito poder dentro do partido", diz Freitas.

O terceiro recurso ser� decidir com quem o partido se alia. E o presidente acaba definindo tamb�m qual � a ideologia do partido, finaliza a cientista pol�tica.

A "estrutura" de um partido maior, inclusive com maior tempo de hor�rio de televis�o gratuita, Bolsonaro conseguir� por meio destas alian�as. Assim, ele consegue as vantagens de um partido maior estando em um partido menor. "Ele vai equilibrar o melhor dos dois mundos. Melhor ter controle sobre poucos recursos do que n�o ter controle nenhum sobre muitos recursos", diz Freitas.

Com sua filia��o, o n�mero do presidente nas urnas passar� de 17 para 51. Para Freitas, uma vez que o 17 "pegou de forma muito forte como sendo associado ao Bolsonaro", a mudan�a poder� ser um problema para ele.

Racha na c�pula

O Patriota engordou em 2018, com a fus�o do partido ao PRP (Partido Republicano Progressista). A uni�o entre as siglas, com preval�ncia do 51 do Patriota, se deu para que elas pudessem cumprir a cl�usula de barreira e ter acesso ao fundo partid�rio.

"Se a nossa sigla PRP n�o se incorporasse ao Patriota, o partido Patriota tamb�m teria falecido", diz � BBC News Brasil Ovasco Resende, l�der do PRP e hoje na primeira vice-presid�ncia do Patriota.

O racha na c�pula do partido se deu na semana passada justamente entre esses dois grupos pol�ticos. Sem votos internamente, Barroso trocou membros do diret�rio nacional para conseguir aprovar um novo estatuto da sigla que favoreceria a entrada dos Bolsonaro, sem comunicar aos correligion�rios.

Um v�deo gravado ao vivo da conven��o nacional do Patriota mostra confus�o e gritaria entre os pol�ticos do Patriota em uma sala com cerca de 25 pessoas, alguns sem m�scara.

"Na calada da noite, de modo sorrateiro ele [Barroso] tirou quatro delegados nacionais que foram eleitos pelo diret�rio nacional com mandatos de quatro anos, terminando no final do ano que vem. Acrescentou-se mais dois cargos sem fundamento nenhum. N�o est� no estatuto", o vice-presidente Resende aparece dizendo na conven��o.

"O que eu quero � que ningu�m aqui seja instrumento das suas articula��es individualistas. Estou abrindo o olho de todo mundo aqui dentro", afirma o vice-presidente, referindo-se a Barroso.

Apesar dos questionamentos, Barroso anunciou a filia��o de Fl�vio Bolsonaro no final da conven��o. Por teleconfer�ncia, o filho do presidente aparece e diz: "N�o adianta a gente come�ar com a rela��o rachada, dividida, por coisas pequenas, por algumas coloca��es talvez dentro do partido."

� BBC News Brasil, Resende afirmou que as atitudes de Barroso s�o "grotescas e golpistas". "Nunca vimos isso em partido nenhum e com certeza se eu soubesse que ele era isso n�o ter�amos incorporado. Dei baixa no PRP, uma hist�ria de 40 anos."

Desembarque do MBL

Outro desdobramento da poss�vel filia��o de Bolsonaro ao partido � a sa�da do MBL, o Movimento Brasil Livre.

"O Adilson Barroso j� dava sinais de que queria juntar a gente [Bolsonaro e MBL]. A gente sempre falou que era �gua e �leo - ele entrando, a gente vai sair", diz � BBC News Brasil Arthur do Val, o "Mam�e Falei", deputado estadual de S�o Paulo eleito pelo DEM. Expulso por esta legenda em 2019, ele se filiou ao Patriota em fevereiro de 2020 para concorrer � prefeitura de S�o Paulo.

Sua filia��o foi "por conveni�ncia", diz ele. "Eu queria disputar a prefeitura de S�o Paulo e diversos partidos fecharam com o Bruno Covas. O Patriota foi o �nico que n�o se deixou levar por isso", diz. "A gente exigiu que n�s fiz�ssemos a chapa, que n�o deix�ssemos nenhuma 'tranqueira' entrar e o Patriota nos deu toda a liberdade."

Do Val recebeu 522.210 votos, ou 9,79%, na disputa pela prefeitura no ano passado, o que o credenciaria a se candidatar ao governo do estado de S�o Paulo pelo Patriota - plano que n�o poderia ser levado adiante com Bolsonaro no partido.

A debandada do partido e os rachas com a entrada de Bolsonaro repetem a hist�ria: foi assim quando ele se filiou ao min�sculo PSL em 2018.

"O partido tamb�m deu muito poder a Bolsonaro e se dividiu na �poca que ele entrou. Teve muita briga interna que levou � sa�da de v�rios dos filiados ao PSL", diz Freitas.

Com a entrada de Bolsonaro, o partido saiu de um deputado eleito em 2014 para 52 em 2018. "Com isso, passou a ter um volume de recursos infinitamente maior do que tinha, e a briga come�a a ficar mais complicada. Se acontecer com o Patriota o que aconteceu com o PSL, esse movimento vai ser seguido de sucessivas disputas", avalia.

Se o Patriota sobrevive gra�as a parte dos recursos do PRP, que pode sair em peso, diz Freitas, � prov�vel que haja brigas na Justi�a - talvez at� com batalhas no Supremo pedindo a anula��o da fus�o entre os partidos.

Por outro lado, pode ser que o partido que come�ou como o nanico PEN cres�a de maneira surpreendente.

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