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Estado de Minas ESPORTE E POL�TICA

Como Copa, Olimp�ada e Bolsonaro implodiram imagem do Brasil no exterior

Em vez de atrair aten��o, turistas e investimentos, a realiza��o dos dois megaeventos esportivos no Brasil em 2014 e 2016 serviu de 'publicidade negativa', que se agravou com atua��o do governo Bolsonaro na pandemia e no combate ao desmatamento na Amaz�nia, segundo pesquisa que avalia marca dos pa�ses no exterior.


27/07/2021 05:03 - atualizado 27/07/2021 14:57


Cerimônia de abertura da Olimpiada do Rio de Janeiro foi muito elogiada e o evento, no geral, foi um 'sucesso'. Mesmo assim, a ampla publicidade dada ao Brasil atrapalhou a imagem do país, em vez de ajudar
Cerim�nia de abertura da Olimpiada do Rio de Janeiro foi muito elogiada e o evento, no geral, foi um 'sucesso'. Mesmo assim, a ampla publicidade dada ao Brasil atrapalhou a imagem do pa�s, em vez de ajudar (foto: Getty Images)

Quando o Rio de Janeiro foi escolhido em 2009 para sediar a Ol�mpiada de 2016, o clima era de grande entusiasmo. Seria, aparentemente, uma grande oportunidade de divulgar o Brasil, atrair investimentos e turismo internacional.

Imagens do ex-presidente Lula e do ex-jogador de futebol Pel� pulando de alegria e at� chorando circularam nos meios de comunica��o. Tr�s anos antes, em 2006, o Brasil j� havia sido escolhido para ser sede da Copa do Mundo em 2014.

Com esses dois megaeventos internacionais, o pa�s seria not�cia no mundo todo. E foi. Mas, contrariamente ao senso comum, essa "ampla divulga��o" provocou efeito inverso do esperado: marcou o in�cio da derrocada da imagem do Brasil no exterior.

Pelo menos � o que revelam dados obtidos pela BBC News Brasil da pesquisa Anholt-Ipsos Nation Brands, que mede a percep��o das pessoas sobre os pa�ses em �reas como governan�a, exporta��o, cultura e popula��o.

O estudo, encomendado pelo consultor brit�nico de pol�ticas p�blicas Simon Anholt, � feito desde 2005 por uma das maiores empresas de pesquisa de opini�o p�blica do mundo, a Ipsos Mori.

Anholt, que j� atuou como conselheiro de governantes de 56 pa�ses, disse � BBC News Brasil que a Olimp�ada e a Copa do Mundo serviram de publicidade negativa ao Brasil porque o mundo passou a conhecer mais sobre a pobreza, a desigualdade social, a viol�ncia e a corrup��o existentes no pa�s.

Por quase dez anos, o Brasil vivenciou "estabilidade" na sua marca externa, ou seja, na forma como era visto pelo mundo. No entanto, justamente nos anos em que o pa�s sediou os dois grandes eventos esportivos internacionais, houve uma piora acentuada na percep��o externa em rela��o ao pa�s, conforme os dados da pesquisa Nation Brands.

Mas como isso aconteceu?

Holofote sobre o Brasil mostrou 'demais'


Brasil gastou mais de R$ 40 bilhões para sediar Jogos Olímpicos no RJ em 2016
Brasil gastou mais de R$ 40 bilh�es para sediar Jogos Ol�mpicos no RJ em 2016 (foto: Getty Images)

Simon Anholt explica que quando um pa�s sedia jogos de envergadura internacional, o notici�rio do mundo inteiro passa a fazer mat�rias sobre a na��o-sede. Nesse bojo, entra de tudo: aspectos da hist�ria, pol�tica, seguran�a, economia etc. Ou seja, no caso do Brasil, as reportagens jogaram os holofotes n�o apenas nos aspectos positivos, como cultura e belezas naturais, mas tamb�m nos problemas econ�micos e sociais.

Em 2014, ano da Copa do Mundo, o Brasil vivia o in�cio de uma prolongada crise econ�mica. Em 2016, ano da Olimp�ada do Rio de Janeiro, a Opera��o Lava Jato avan�ava, implicando pol�ticos de peso no esquema de corrup��o da Petrobras. Enquanto isso, o Senado estava prestes a confirmar o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

A ampla divulga��o do Brasil durante os dois campeonatos internacionais ajudou a derrubar, segundo Anholt, uma imagem "mistificada e irreal" que grande parte do mundo tinha do pa�s — de aberto, tolerante, alegre e voltado � m�sica e ao futebol.

"A Copa do Mundo e a Olimp�ada foram, de certa maneira, um despertar para a realidade das ideias afetivas que as pessoas tinham do Brasil", disse � BBC News Brasil.

"Havia, pelo menos fora da Am�rica, uma ideia rom�ntica equivocada do tipo de pa�s que o Brasil �, focado no futebol, samba, cacha�a."

Anholt diz que o fato de a Copa do Mundo de 2014 e a Olimp�ada de 2016 terem sido eventos bem-sucedidos, sem intercorr�ncias graves, n�o mudou em nada o impacto negativo que os holofotes provocaram.

O Brasil gastou mais de R$ 41 bilh�es para fazer a Olimp�ada do Rio de Janeiro e outros R$ 26 bilh�es para a Copa do Mundo.

"As pessoas j� esperam que os eventos sejam bem-sucedidos. O que surpreendeu as pessoas foram as evid�ncias da pobreza, desigualdade, viol�ncia, corrup��o. E elas meio que n�o estavam esperando por isso", diz Anholt, que � autor de seis livros sobre marca e imagem internacional dos pa�ses. "O mito do Brasil era o de que ele seria um pa�s muito mais desenvolvido e progressista. Eu me refiro � percep��o fora da Am�rica Latina."

O que mostram os dados

O Brasil figura na posi��o 30 do ranking Nation Brands, que mede a percep��o no exterior de 50 pa�ses, entre os quais Estados Unidos, Canad�, Reino Unido, Brasil e Argentina. A Alemanha � o pa�s mais bem avaliado, seguido pelo Reino Unido.

Para fazer a lista, s�o ouvidas mais de 20 mil pessoas de todas as faixas et�rias, poder econ�mico e nacionalidades. Elas respondem a 50 perguntas sobre diferentes aspectos de um pa�s — de qualidade do governo a belezas naturais e turismo. O recorte representa 70% da popula��o mundial e 80% da economia global.

Os resultados n�o s�o divulgados ao p�blico — s�o vendidos a governos e grandes empresas. Mas Anholt compartilhou com a BBC News Brasil dados relativos ao Brasil.


Durante a Olimpíada do RJ, dois ônibus que levavam jornalistas foram atingidos por pedras. Num dos incidentes, uma jornalista americana levantou a dúvida sobre a possibilidade do veículo ter sido atingido por tiros
Durante a Olimp�ada do RJ, dois �nibus que levavam jornalistas foram atingidos por pedras. Num dos incidentes, uma jornalista americana levantou a d�vida sobre a possibilidade do ve�culo ter sido atingido por tiros (foto: Getty Images)

Desde 2008, o pa�s possu�a uma "nota geral" est�vel, mas no ano da Copa do Mundo houve uma queda forte na percep��o das pessoas sobre o Brasil em todos os aspectos, inclusive "cultura", que � a �rea de melhor pontua��o.

Em 2015, houve uma leve recupera��o, mas a Olimp�ada de 2016 provocou uma deteriora��o ainda maior na imagem do Brasil no exterior, principalmente no quesito "governan�a", que avalia a compet�ncia de um governo nacional e a percep��o internacional sobre o seu comprometimento com quest�es globais, como paz, seguran�a, desigualdade e meio ambiente.

Simon Anholt explica que o mesmo fen�meno ocorreu na �frica do Sul, que sofreu queda acentuada na sua "marca internacional" ap�s a Copa do Mundo de 2010. O evento, assim como a Copa e a Olimp�ada realizados no Brasil, foi um "sucesso". Mas as horas e horas de reportagens sobre o pa�s africano deterioraram a sua imagem, em vez de promov�-lo no imagin�rio mundial.

"Quando tem Olimp�ada e Copa do Mundo, a imprensa internacional vai a esse pa�s e tem que preencher a grade de not�cias entre os jogos. E o que eles fazem � mostrar o pa�s-sede e a cidade-sede. S�o horas e horas de v�deos sobre o pa�s, e as pessoas assistem", destaca Anholt, que tamb�m � professor de Ci�ncia Pol�tica da Universidade de East Anglia, no Reino Unido.

"O conhecimento sobre Brasil e �frica do Sul era limitado e, em alguns casos, romantizado, entre o p�blico internacional. Mas agora elas est�o vendo o Brasil e a �frica do Sul e pensam: 'meu Deus, esses s�o pa�ses em desenvolvimento, com pobreza, viol�ncia e corrup��o'. E a imagem se deteriora em fun��o disso."

Queda ainda maior com o governo Bolsonaro

Desde a �ltima queda acentuada na sua imagem internacional em 2016, o Brasil iniciou uma recupera��o. Mas, de 2019 em diante, ap�s o in�cio do governo Jair Bolsonaro, a "marca" ou imagem externa do pa�s parece ter entrado em queda livre, conforme os dados do Nation Brands.

"A derrocada na imagem partir de 2019 � a mais significativamente negativa j� registrada pelo Nation Brands Index. Isso tem correla��o com o governo Bolsonaro, rea��o do governo � pandemia e ao furor internacional diante das queimadas na Amaz�nia", explica Anholt.

O pior desempenho do Brasil � no quesito governan�a, que mede a percep��o sobre a compet�ncia do governo — o Brasil figura em 44º no ranking nesse t�pico. O melhor desempenho � em "cultura", que mede a aprecia��o do mundo � m�sica, filme, esporte, arte e literatura de um pa�s. Nessa �rea, o Brasil aparece na d�cima posi��o no ranking.


A partir de 2019, imagem do Brasil passa a sofrer queda ainda pior que a vivenciada na Copa do Mundo e Olimpíada. Para Simon Anholt, posição do presidente sobre Amazônia e pandemia influenciaram
A partir de 2019, imagem do Brasil passa a sofrer queda ainda pior que a vivenciada na Copa do Mundo e Olimp�ada. Para Simon Anholt, posi��o do presidente sobre Amaz�nia e pandemia influenciaram (foto: REUTERS/Adriano Machado)

Segundo o consultor de pol�ticas p�blicas brit�nico, l�deres nacionalistas como Donald Trump, Bolsonaro ou Viktor �rban, da Hungria, podem ser populares em seus pa�ses, mas n�o costumam gozar de boa imagem internacional.

"Em geral, pessoas n�o gostam de l�deres com o estilo do presidente Bolsonaro. Domesticamente, pode haver um apelo, mas internacionalmente eles n�o costumam ser populares", diz.

"Se formos comparar com Trump, ambos os l�deres usavam o mesmo 'manual' e Trump era dramaticamente impopular no exterior, embora fosse muito popular entre parte da popula��o americana."

A BBC News Brasil encaminhou e-mail para o Itamaraty pedindo coment�rio sobre essas declara��es e sobre o resultado do Brasil no ranking e aguarda resposta.

Efeito pandemia

A postura negacionista do governo federal brasileiro diante da gravidade da pandemia tamb�m contribuiu, segundo Anholt, para prejudicar a "marca Brasil" em 2020.

"Em geral, as pessoas n�o est�o t�o interessadas assim em como outros pa�ses lidam com a pandemia, elas querem saber da pandemia no pr�prio pa�s. A n�o ser que haja algo que chame muita aten��o. E, nesse caso, novamente h� o fator Bolsonaro", diz o professor de pol�tica.

"Voc� tem um presidente que, aparentemente copiando Trump, diz que isso n�o � nada, � um mito, � uma trapa�a. E isso � chocante. Essas s�o as quest�es que afundaram a imagem do Brasil. N�o � algo permanente, mas levar� tempo para uma recupera��o."

Imagem est� piorando entre jovens estrangeiros

Um fen�meno que o Nation Brands Index capta � que a imagem do Brasil no exterior est� se deteriorando mais rapidamente entre os jovens, principalmente por causa da posi��o atual do governo Bolsonaro em rela��o a direitos de minorias e prote��o da Amaz�nia.

O discurso do presidente de abrir a floresta para a minera��o e de minimizar desmatamento e queimadas teve um impacto forte entre o segmento de 18 a 29 anos, diz Anholt. Essa faixa et�ria � a que posiciona o Brasil pior no ranking de "governan�a", em 45º entre 50 pa�ses.

"O entendimento claro � que Bolsonaro n�o promoveria um di�logo construtivo com a comunidade internacional sobre prote��o do meio-ambiente. E, recentemente, a imprensa internacional mostrou horas e horas de imagens de �rvores na Amaz�nia queimando", lembra.

"Foram imagens poderosas. Principalmente entre os jovens a bandeira da luta contra mudan�as clim�ticas � cada vez mais forte."

Qual o impacto de ter uma imagem externa ruim?

Segundo Simon Anholt, a imagem de um pa�s no exterior tem impacto profundo em diferentes aspectos — de turismo e atra��o de investimentos externos, ao poder de influenciar decis�es pol�ticas no cen�rio internacional.

"A imagem de um pa�s afeta at� mesmo a capacidade de fechar acordos. O Reino Unido ou a Uni�o Europeia pode, por exemplo, n�o se empenhar em fechar um acordo comercial com o Brasil porque os jovens eleitores desaprovam a conduta do governo brasileiro em rela��o � Amaz�nia", exemplifica.


Proteção ambiental é uma das principais bandeiras da atual geração de adolescentes. Postura do governo brasileiro em relação à Amazônia tem reduzido a popularidade do Brasil entre os jovens, diz Anholt
Prote��o ambiental � uma das principais bandeiras da atual gera��o de adolescentes. Postura do governo brasileiro em rela��o � Amaz�nia tem reduzido a popularidade do Brasil entre os jovens, diz Anholt (foto: REUTERS/RICARDO MORAES)

� o que est� ocorrendo com o amplo acordo comercial negociado entre o Mercosul e a Uni�o Europeia. Em v�rios pa�ses europeus, a aprova��o da proposta nos parlamentos sofre resist�ncia por causa da imagem negativa da pol�tica ambiental do governo brasileiro.

Mas Anholt enxerga o "despertar" do mundo para a realidade do Brasil, iniciado na Copa do Mundo de 2014 e na Olimp�ada de 2016, como "positivo a longo prazo".

"De certa forma, ainda que seja prejudicial � imagem, � bom que as pessoas comecem a enxergar o Brasil de maneira mais complexa e adulta", diz.

"Os EUA sempre apresentaram essa imagem do Brasil como sendo de festa constante. E tudo bem para algumas coisas, mas isso n�o � bom se voc� � a Embraer e se voc� tem ambi��o de ser uma economia s�ria no cen�rio mundial."

Al�m disso, diz Anholt, a press�o internacional pode favorecer a que o Brasil "corrija rumos" em quest�es de import�ncia global, como prote��o ambiental.

"O Brasil agora est� sendo observado e julgado. E no momento est� sendo julgado severamente no governo Bolsonaro", avalia.

"Acho que a festa acabou no que diz respeito � imagem do Brasil no exterior. Embora isso seja triste e crie press�es econ�micas, no longo prazo ser� uma coisa boa. J� � hora de o mundo reconhecer o Brasil como algo mais que apenas Carnaval de rua."

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