
Como em um tabuleiro de xadrez, o sub-relator da Comiss�o Parlamentar de Inqu�rito (CPI) que investiga a gest�o da Companhia Energ�tica de Minas Gerais (Cemig), Professor Cleiton (PSB), evita dar nomes, mas garante que, se a apura��o terminasse neste momento, o comit� j� seria capaz de pedir �s autoridades o indiciamento de algumas pessoas. Segundo o parlamentar, h� ind�cios de crime. “Sobretudo, de falsidade ideol�gica na altera��o de datas e contratos para mascarar processos que n�o condizem com a legalidade e a transpar�ncia exigidas na administra��o p�blica”, diz ao Estado de Minas o deputado, que tamb�m ocupa a vice-presid�ncia do colegiado.
"Crit�rios t�cnicos t�m sido implodidos nos editais. A implos�o � para estabelecer um direcionamento a empresas"
A an�lise de acordos firmados pela estatal � ponto central da primeira etapa da CPI. Os deputados estaduais se debru�am sobre tratos sem licita��o. Alguns deles, inclusive, foram assinados ap�s a presta��o do servi�o — a chamada convalida��o. No rol de pactos convalidados est� opera��o com a Exec, respons�vel por conduzir o processo de recrutamento de Reynaldo Passanezi Filho para a presid�ncia da companhia. Professor Cleiton afirma que n�o existiu processo seletivo.
“� uma indica��o pol�tica, mascarada com um processo de inexigibilidade licitat�ria, feita por uma empresa de hist�rica liga��o com o partido do atual governo.” A empresa, que recebeu R$ 170 mil em um dos contratos, foi a respons�vel pelo processo de escolha dos secret�rios do governo de Romeu Zema. A rela��o da Exec com o Novo � um dos t�picos que fazem o pessebista crer na utiliza��o indevida da companhia energ�tica. Na mira da CPI est�o, ainda, as tentativas da Cemig de vender fatias de subsidi�rias.
"Colocando pessoas do mercado, isso facilitaria que a empresa fosse sucateada para ter o valor diminu�do. E justificar a privatiza��o"
Quais s�o as principais conclus�es �s quais a CPI da Cemig j� chegou?
Estamos em uma primeira fase. Acreditamos que teremos outras duas. A primeira se concentra na an�lise dos contratos com inexigibilidade (de licita��o), em torno de 16, que se tornaram uma constante na companhia a partir da atual diretoria. Alguns, com valores menores, para headhunters e escrit�rios de advocacia. E, tamb�m, para a contrata��o do call center, o que mais chama a nossa aten��o. � o maior e mais longo acordo j� firmado na hist�ria da companhia. As oitivas, at� aqui, demonstram uma s�rie de irregularidades e contratos firmados depois que as empresas j� prestavam o servi�o. Detectamos uma s�rie de conflitos de interesse. A inexigibilidade � subterf�gio para estabelecer formalmente o que tinha sido estabelecido verbalmente. De todas as oitivas, a mais bomb�stica foi a do Leandro (Corr�a), ex-diretor de Suprimentos, que trouxe � luz den�ncias que levaram ao seu afastamento por n�o querer assinar acordos de inexigibilidade, por entender que n�o se encontravam dentro das exig�ncias de compliance e da Lei das Estatais. E, tamb�m, por entender que n�o trabalharia sob press�o de alguns superintendentes e da presid�ncia, que direcionou contratos para algumas empresas de clar�ssima liga��o com o Novo. Percebemos a opera��o, por parte do Novo, na Cemig. � algo que nos preocupa.
O que estar� em pauta na pr�xima etapa da CPI?
A contrata��o de terceirizadas, pr�tica hist�rica da Cemig: as empreiteiras. H� den�ncias de empreiteiras que est�o operando na Cemig sem condi��o nenhuma de prestar o servi�o. Empresas de coleta de lixo, de S�o Paulo, prestando servi�o para a Cemig. Existe uma s�rie de exig�ncias t�cnicas que n�o est�o sendo consideradas pela diretoria. Crit�rios t�cnicos t�m sido implodidos nos editais. A implos�o � para, exatamente, estabelecer um direcionamento a determinadas empresas — sobretudo as que v�m de SP.
Depois, a CPI chegar� �s vendas — e tentativas de venda — de subsidi�rias da Cemig. As aliena��es s�o estrat�gia para acelerar a privatiza��o?
N�o tenho d�vida. Temos provas de que � uma estrat�gia iniciada em 2019. No momento certo, vamos apresent�-las. Tudo foi muito bem pensado para desidratar a companhia, retirar de postos importantes servidores de carreira, trazendo gente de S�o Paulo, para quebrar o que chamavam de “telhado de vidro”. A Cemig teria uma prote��o por parte dos servidores de carreira. E, colocando pessoas do mercado, isso facilitaria que a empresa fosse sucateada em seu entorno para, cada vez mais, ter o valor diminu�do. E, assim, justificar o processo de privatiza��o.
Quais as opera��es envolvendo subsidi�rias da Cemig na mira da CPI?
Vamos investigar a venda da participa��o da Light na Renova, o porqu� da recupera��o judicial da Renova e a venda da participa��o da Cemig na Light. Podemos estar diante do maior preju�zo financeiro da hist�ria recente do mercado corporativo brasileiro. As vendas das a��es da Light se deram em momento de retra��o econ�mica, de pandemia, em que o mercado n�o aconselhava essa venda. Por que a Cemig abre m�o de ter maioria no conselho da Light? � algo in�dito no mercado financeiro Ningu�m que tem a maioria das a��es abre m�o da maioria no conselho. Por que o �mpeto de vender a Taesa, empresa em que a Cemig � a maior acionista e � s�cia da ISA, estatal colombiana de onde veio o atual presidente. Proporcionalmente, a Taesa vale mais que a Cemig. � uma empresa de distribui��o de energia, altamente rent�vel. O super�vit da Taesa no primeiro semestre de 2021 causa grande impress�o. Para qu� vender algo t�o rent�vel?
H� cobran�as da CPI por relat�rios sobre as etapas para a escolha de Reynaldo Passanezi para a presid�ncia, em trabalho da Exec. O que foi apurado?
N�o houve processo seletivo e at� agora ningu�m consegue provar absolutamente nada sobre a Exec. H� algo que n�o podemos deixar passar: a proposta que a Exec envia a Evandro Negr�o, membro da Executiva do Novo em MG, com grande tr�nsito no Pal�cio Tiradentes e quase que amigo pessoal do governador. A Exec manda uma proposta n�o para a Cemig, mas a Evandro. O que uma pessoa estranha � companhia estava fazendo no momento em que negocia com a Exec? � uma empresa que presta servi�os ao Novo, faz as provas de sele��o dos candidatos do partido e fez, gratuitamente, a sele��o dos secret�rios deste governo. Depois, a Exec recebe contratos com a Cemig. V�rios dos s�cios est�o ligados ao Novo. Em 12 de janeiro de 2020, Reynaldo Passanezi toma posse; em 19 do mesmo m�s, ele contrata a Exec para fazer o processo de contrata��o dele pr�prio. � algo in�dito. Nenhum dos diretores ouvidos, sob investiga��o, conseguiu explicar o papel do Evandro. Ningu�m conseguiu explicar se, de fato, houve concorr�ncia. � uma indica��o pol�tica, mascarada com um processo de inexigibilidade licitat�ria, feita por uma empresa de hist�rica liga��o com o partido do atual governo.
O fato de um dirigente do Novo ter recebido a primeira proposta da empresa que recrutou o
presidente � ind�cio de que o partido tenta interferir na Cemig?
Quando a Exec envia um contrato a Evandro Negr�o, h� ind�cios de participa��o direta de algu�m que tem posto de comando do partido na companhia. Ao mesmo tempo, o contrato com a IBM, que subloca a AeC, pertencente a um falecido secret�rio de Zema, demonstra que o Novo tem interesse em fazer neg�cios dentro da Cemig. A cada dia que passa, fica mais claro que est�o usando a Cemig para fazer neg�cios, beneficiando membros ativos do partido, tanto em MG, mas principalmente em SP.
� um instrumento jur�dico adotado pela Cemig por meio, inclusive, do atual diretor jur�dico, Eduardo Soares, com o consentimento de diretores, atrav�s do servi�o interno de auditoria. Ouvimos, de D�bora (Lage), respons�vel pela auditoria interna, que alguns pareceres foram contr�rios (� convalida��o). Dentro da convalida��o, existia o que ela chamou de ‘n�o conformidade’. Temos certeza de que essa ‘n�o conformidade’ pode ser vista como irregularidade. Foi mencionado um documento da auditoria interna, que seria secreto, mas se tornou p�blico, por constar em uma a��o trabalhista, que mostrou que, por conta da auditoria interna, esses contratos n�o deveriam ter sido convalidados. A convalida��o nada mais �, a nossos olhos, que um instrumento ilegal para justificar o porque n�o da concorr�ncia p�blica, entrando, ent�o, na inexigibilidade licitat�ria. � muito preocupante. Falamos de recursos p�blicos e ind�cios de corrup��o. S�o grav�ssimos para uma empresa que tem que ter transpar�ncia, �tica e lisura. A Cemig possui participa��o na Bolsa de Nova York.
Leandro Corr�a, afastado em fun��o de uma den�ncia do Minist�rio P�blico, contou ter sofrido press�o para aprovar contratos que, na vis�o dele, continham irregularidades. O que a CPI far� a partir dessa declara��o?
Leandro come�ou a desenrolar parte desse grande novelo. Tivemos acesso ao inqu�rito aberto no Minist�rio P�blico contra seis diretores. Leandro n�o � mencionado em nenhum minuto. A oitiva demonstrou que ali estava um servidor de carreira que, por n�o querer compactuar com a ilegalidade desses processos, acabou afastado. Inclusive, pediu que seu sigilo banc�rio e fiscal fosse quebrado pela CPI para demonstrar que tem vida profissional ilibada e, assim, moral para falar das press�es. A partir do que ele disse sobre essas press�es, analisamos outros contratos e conclu�mos que tudo estava sendo feito a toque de caixa, fora das regras exigidas pelos processos legais e do rigor que a auditoria interna e a diretoria jur�dica sempre tive- ram. Temos muita coisa para investigar, mas se a CPI terminasse hoje, j� ter�amos algumas pessoas indiciadas e, inclusive, alguns ind�cios de crime. Sobretudo, de falsidade ideol�gica na altera��o de datas e na altera��o de contratos para mascarar processos que n�o condizem com a legalidade, a juridicidade e a transpar�ncia exigidas na administra��o p�blica.
A CPI ouvir� depoentes que v�o falar sobre o contrato de R$ 1,1 bilh�o com a IBM, empresa de
tecnologia. O que se sabe sobre esse acordo?
� o mais dif�cil, complexo e maior de todos os contratos. Envolve um ex-membro do Novo e ex-secret�rio do governo, que faleceu recentemente: C�ssio Azevedo. A AeC prestava servi�o de call center para a Cemig. Publica-se, ent�o, edital. Aparece a ganhadora, Audac, que leva o contrato por diferen�a de R$ 500. A AeC ficou em segundo. Na Cemig, faz-se um processo de inger�ncia no setor de suprimentos para desclassificar a Audac e entregar o contrato � AeC. A Audac venceu como melhor proposta p�blica dentro das regras. Depois disso, todo o setor de suprimentos foi demitido. Uma estrutura interna foi montada e um cen�rio criado para chamar a IBM com o pretexto de digitaliza��o do atendimento. A Audac, contratada, n�o foi mobilizada. A IBM passa a ser conveniada da Cemig e leva o backoffice para S�o Paulo. A IBM subcontratou a AeC. O contrato com a IBM acontece por inexigibilidade. � um contrato robusto, sem controle e metodologia adequada, por 10 anos. A Cemig nunca contratou uma empresa de tecnologia por 10 anos. � o maior contrato da hist�ria da Cemig, em valor e em prazo. � praticamente um contrato vital�cio.
O senhor relatou ter tido o celular grampeado. A Assembleia fez varreduras nos gabinetes dos componentes da CPI em busca de poss�veis escutas, mas n�o encontrou nada. O que o senhor pode dizer sobre esse processo?
N�o encontrou ‘entre aspas’. Grampos n�o foram encontrados, mas as pol�cias Civil e Legislativa se depararam com algo in�dito, que constar� no relat�rio (das varreduras). H�, em cada gabinete, um alto-falante onde podemos ouvir a r�dio da Assembleia. Mas os alto-falantes s�o (de) entrada e sa�da de �udio. Ent�o, o que se conversava nos gabinetes poderia ser ouvido em algum lugar. Queremos saber que lugar � esse. Os alto-falantes foram desligados pela pol�cia.
O senhor j� sabe de onde veio o grampo que interceptou o seu telefone?
Est� sob investiga��o. Quem me trouxe a informa��o � ligado � Pol�cia Federal. Est�o investigando de onde veio o grampo, mas n�o estou mais grampeado. Isso me traz tranquilidade.
