
Bolsonaro viajar� na segunda-feira. Ele deve encontrar Putin em ao menos duas ocasi�es: em reuni�o bilateral e durante um almo�o.
Em meio � crise internacional, o Minist�rio das Rela��es Exteriores fez um afago � Ucr�nia. Emitiu nota oficial, ontem, para celebrar o anivers�rio de 30 anos das rela��es diplom�ticas entre o pa�s europeu e o Brasil. O comunicado ressalta o que chama de "m�ltiplos contatos de alto n�vel" entre os chefes de Estado brasileiros e ucranianos.
A nota � emitida em meio �s cr�ticas de que a viagem de Bolsonaro pode ser interpretada como um apoio � R�ssia em detrimento da Ucr�nia e do Ocidente.
O ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos Rubens Barbosa destacou que a viagem estava marcada desde outubro e que h� interesses bilaterais comerciais, sobretudo na quest�o de fertilizantes, estrat�gico para o agroneg�cio. Ele observou que, dificilmente, Bolsonaro ceder� � press�o de auxiliares ou parceiros para desistir da agenda.
"Isso pareceria uma fraqueza do lado dele e que estaria cedendo a press�es americanas, quando justamente est� querendo mostrar que o Brasil n�o est� isolado. E falando isso para sua base. O presidente deve saber que a viagem tem um risco de haver uma a��o militar russa na Ucr�nia enquanto ele estiver l�. Outro risco � de ele falar alguma coisa que possa ser interpretada como apoio a Putin", frisou.
Em rela��o aos Estados Unidos, Barbosa afirmou que a viagem n�o deve atrapalhar, uma vez que o Brasil j� se manifestou de maneira clara a favor da paz, da negocia��o e de uma solu��o pac�fica para a crise. "A posi��o oficial do Brasil foi colocada nas Na��es Unidas a favor da modera��o e de evitar o conflito armado", disse. "O presidente argentino (Alberto Fern�ndez) esteve l�, e n�o houve nenhuma repercuss�o al�m de no pr�prio pa�s. Caso n�o ocorra nenhum dos riscos mencionados, n�o vejo repercuss�es maiores fora do Brasil."
Diplomata e professor, Paulo Roberto de Almeida enfatizou ser necess�rio distinguir a ideia da visita e da oportunidade na qual ocorre. "A ideia foi tra�ada antes, num momento em que n�o havia uma tens�o maior", lembrou. "� uma reuni�o bilateral com objetivos econ�micos. A R�ssia tem mais ou menos o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil, especializa��o em energia, importa muita carne do Brasil, e n�s importamos defensivos agr�colas da R�ssia. H� espa�o para ampliar rela��es comerciais."
Ele afirmou, no entanto, que, nas atuais circunst�ncias, a visita se torna "inadequada, inoportuna e indevida". "N�s dever�amos tomar decis�es com base nos valores da nossa diplomacia da n�o interven��o. Estamos num contexto em que o presidente Bolsonaro est� isolado por conta de suas pr�prias atitudes", argumentou. "Isso porque a imagem dele no mundo � a pior poss�vel, de destruidor da Amaz�nia, violador da democracia brasileira e pelo negacionismo em meio � pandemia. Tornou-se persona non grata e, ent�o, procura se cercar de seus �nicos interlocutores, os poucos representantes da extrema direita europeia e de Putin."
Para ele, Bolsonaro envia o "pior sinal poss�vel" diante da diplomacia internacional. "Sinal de que ele despreza o direito internacional, despreza o sinal das democracias internacionais. Isso em fun��o de uma vontade pessoal de fazer uma visita", disse. "A viagem, at� o ano passado, seria normal, mas, hoje, � inadequada. Avalio como uma teimosia. Quer provar que faz as coisas segundo sua vontade. O Itamaraty, provavelmente, recomendou que n�o fosse agora, assim como seus pr�prios auxiliares", acrescentou.
G�nther Richter Mros, professor de rela��es internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), avaliou como "perigoso" o movimento de Bolsonaro, citando que o Brasil faz parte do Conselho de Seguran�a da Organiza��o das Na��es Unidas (ONU).
"O Brasil tem tido sinais d�bios. Bolsonaro tenta fazer um jogo que o aproxima da Otan (Organiza��o do Tratado do Atl�ntico Norte) e dos pa�ses ocidentais, mas, ao mesmo tempo, tenta demonstrar aproxima��o com Putin. Parece-me perigoso o jogo que ele est� fazendo, inconsequente", frisou. "O que est� errado na hist�ria � o timing, n�o � nem a ideia de fazer uma pol�tica pendular. Est� com possibilidade iminente de conflito. Parece que Bolsonaro est� brincando com fogo e pode arrumar problemas tanto com a R�ssia como com os EUA."
Ricardo Mendes — s�cio da Prospectiva e respons�vel pelas opera��es internacionais da consultoria — corroborou que o timing n�o � o ideal, mas que a R�ssia � um parceiro estrat�gico para o Brasil. "Sempre interessou do ponto de vista econ�mico e tecnol�gico n�o depender de um �nico pa�s. No meu entender, a aproxima��o pode at� gerar uma resposta de mais interesse pol�tico do lado americano, come�ar a prestar mais aten��o no Brasil e oferecer condi��es interessantes de investimentos em termos de inser��o geopol�tica", afirmou.
De acordo com ele, "essa visita tem sido retratada como uma viagem ideol�gica, mas o presidente argentino, de vi�s diferente, esteve em reuni�o com ele tamb�m". "Fator negativo sempre tem, vai ter press�o, mas n�o acredito que provoque dano mais permanente. Pelo contr�rio, pode colocar o pa�s em uma posi��o diferente de acordos com Europa, al�m de abrir mercados para setores importantes da economia. Acho que, se bem conduzida, a viagem, a longo prazo, pode trazer benef�cios para o pa�s", concluiu.
Eleitorado
No dia 17, Bolsonaro passar� pela Hungria, do primeiro-ministro Viktor Orb�n, outro avesso aos interesses ocidentais e � democracia — valores opostos ao que se espera de um pa�s que planeja entrar na Organiza��o para a Coopera��o e Desenvolvimento Econ�mico (OCDE). Segundo Flavia Loss de Ara�jo, professora de rela��es internacionais da Unicsul, o problema da viagem � o contexto atual e a imprevisibilidade de uma eventual declara��o de Bolsonaro. "O Brasil est� isolado, e a ida � R�ssia e � Hungria � um aceno ao eleitorado e n�o � comunidade internacional", frisou.
Para o pesquisador do N�cleo de Intelig�ncia Internacional da Funda��o Getulio Vargas (FGV) Leonardo Paz Neves, h� um imbr�glio diplom�tico que o Brasil n�o avaliou ao aceitar o convite. "Se n�o for, o governo vai se indispor com Vladimir Putin", alertou.
O consultor de An�lise Pol�tica da BMJ Consultores Associados, Bernardo Nigri, refor�ou que o governo busca demonstrar o n�o isolamento no cen�rio internacional. "Um dos principais apelos para Bolsonaro visitar Putin � o conservadorismo do l�der russo. Nesse sentido, busca acenar para sua base eleitoral, que v� no presidente da R�ssia uma outra figura conservadora em posi��o de destaque no cen�rio internacional", explicou. (Com D�borah Hana Cardoso)
