Pouco depois de instalar a bandeira do Brasil de 2,80 metros por 1,80 metro na varanda do apartamento, o t�cnico de inform�tica Julio Zanatto recebeu a informa��o de que o item poderia render a ele uma multa de R$ 600 do condom�nio em que vive em S�o Paulo –quatro vezes mais que o pre�o do item.
A ideia era postar uma foto na conta do Instagram da bandeira instalada no 23º andar com a legenda "sou brasileiro, paulista, amo verde e amarelo e ningu�m vai mexer no meu telefone celular [uma refer�ncia � proibi��o de se usar o aparelho de telefone na cabine de vota��o anunciada pelo Tribunal Superior Eleitoral nesta semana]." Por�m, a bandeira foi retirada, e o post n�o veio.
A coloca��o de bandeiras em sacadas e janelas de edif�cios s� pode ser feita se a conven��o do condom�nio permitir. Sem isso, pode ser alvo de multa por altera��o na fachada. Instalar bandeiras em varandas e janelas de resid�ncias em condom�nios � proibido, de acordo com o C�digo Civil. Por�m, de acordo com o artigo 1.336, o veto n�o est� ligado �s predile��es pol�ticas ou esportivas, mas ao fato de que o item altera a fachada de edif�cios.
O descumprimento implica multa, cuja cifra pode ser de at� cinco vezes o valor mensal do condom�nio, segundo o c�digo.
"Na primeira vez, o s�ndico, unilateralmente, pode multar o morador, que pode apelar para uma assembleia contestando a multa", explica Luciano Godoy, professor da FGV e especialista em direito privado. "Se a assembleia seguir o s�ndico e o morador infringir novamente o c�digo, ele pode ser multado mais uma vez, agora sem apela��o, em at� cinco [vezes]."
Zanatto, que se define como bairrista, diz amar a cidade, o estado e o pa�s em que mora e lamenta a proibi��o. "Sempre fui assim e pensei em colocar uma bandeira igual americano que adora a p�tria", afirma ele, que ainda n�o desistiu de colocar a bandeira para o 7 de Setembro.
Com o feriado iminente, quando o pa�s celebra 200 anos da Independ�ncia, elei��es pr�ximas e Copa do Mundo no fim do ano, o calend�rio no Brasil sugere que casos como o de Zanatto podem se tornar cada vez mais comuns nos pr�ximos meses.
Patricia Castelo, s�ndica de um condom�nio de mais de 300 casas em Pirituba, zona norte da capital paulista, tenta mediar conflitos desse tipo.
Um dos moradores do local estendeu a bandeira do Brasil e disse que s� aceita retir�-la mediante um decreto policial. Ele declarou que � patriota e, por isso, n�o vai retirar o item, segundo a s�ndica, que o considera um dos mais tranquilos do condom�nio.
"Isso j� virou pol�mica e todos sabem que vai dar problema at� porque as pessoas est�o bem descompensadas", diz a s�ndica. Ela estuda a possibilidade de permitir o uso de bandeiras s� para a Copa do Mundo e com prazo de retirada.
"N�s enfeitamos as casas para o natal, Halloween, n�o veria problemas de fazer isso com regras e para a Copa. Mas e se algu�m colocar o rosto do Bolsonaro ou do Lula? Al�m do mais, muitos partidos usam a bandeira do Brasil", afirma ela.
Nos �ltimos anos, o verde e amarelo da bandeira do pa�s vem sendo associado ao guarda-roupa de apoiadores do governo Bolsonaro (PL). Por�m, em um movimento recente, artistas antibolsonaristas tentam resgatar os s�mbolos apropriados por apoiadores do presidente.
� o caso do figurino escolhido por Anitta, no festival Coachella, nos Estados Unidos, e por Daniela Mercury, que surgiu enrolada na bandeira em um show em comemora��o ao Dia do Trabalhador, na zona oeste de S�o Paulo.
Nas ruas da capital paulista, a bandeira do Brasil ao lado da imagem de Jair Bolsonaro (PL) � vista em sacadas. Caso de um apartamento no Jardim Europa a faixa ainda conta com o lema da campanha do presidente: "Brasil Acima de Tudo e Deus Acima de Todos".
Em outras, h� apenas a frase "fora, Bolsonaro". Ou ainda a bandeira LGBTQIA+ com a imagem do ex-presidente Lula (PT), em Perdizes.
O advogado Rodrigo Karpat, da comiss�o especial de direito condominial da OAB-SP, afirma que estender uma bandeira n�o se trata, necessariamente, de um h�bito ruim, mas o C�digo Civil deve ser respeitado. "Se n�o pode pintar ou alterar esquadrilhas, n�o pode usar bandeira", diz ele.
Segundo Karpat, condom�nios j� est�o enfrentando conflitos com alguns moradores que citam liberdade de express�o quando s�ndicos tentam proibir.
Para ele, � muito dif�cil controlar o que ser� estendido, caso o condom�nio abra exce��o para bandeiras.
"O problema � que n�o se pode dizer que a bandeira do Brasil pode, mas a do Jair Bolsonaro n�o, a do PT tamb�m n�o. A partir do momento que permite, as pessoas pensam que roupas tamb�m podem ser estendidas e fica muito dif�cil de regular", avalia o advogado.
Por�m, nem todos os s�ndicos criam embates com os moradores. Karpat diz que a maioria faz vista grossa por ocorrerem em momentos transit�rios. O problema, diz ele, � que em meio a elei��es polarizadas como as deste ano o ato de estender bandeiras partid�rias pode gerar brigas entre os cond�minos.
"Isso n�o deve acontecer. O condom�nio n�o deve ser palco de objetifica��o ou problema. O objetivo deve ser manter a paz entre os moradores", diz ele, que explica que, quest�es como essas, podem ser decididas em assembleia com objetivo de atender o interesse da maioria.
"O s�ndico tem poder de deliberar essa quest�o mesmo sem assembleia, mas responder� por excessos se o caso for judicializado e houver, por exemplo, o entendimento de que n�o agiu da forma correta", acrescenta Karpat.
Luciano Godoy, da FGV, ressalta que quest�o deve ser tratada com bom senso. "� sobre liberdade de express�o, ent�o, caso um morador levante o tema, sempre h� de se deliberar. As pessoas t�m deveres, mas tamb�m t�m direito de se manifestar", afirma o docente.