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Estado de Minas ELEI��ES 2022

A origem do uso do vermelho pela esquerda que incomoda aliados de Lula

Esfor�o de usar branco em vez de vermelho vale mais como aceno para a frente ampla do que para conquistar votos, avaliam especialistas.


18/10/2022 09:36 - atualizado 18/10/2022 10:36


Lula oferece sua mão a apoiadores em ato em Belford Roxo, no Rio de Janeiro, em 11 de outubro.
Lula oferece sua m�o a apoiadores em ato em Belford Roxo, no Rio de Janeiro, em 11 de outubro. (foto: Carl de Souza/Getty Images)

Um esfor�o recomendado pela senadora Simone Tebet fez com que o PT (Partido dos Trabalhadores) pedisse aos apoiadores que usassem branco em vez do cl�ssico vermelho que representa o partido em ato que ocorreu em 11 de outubro em Belford Roxo (RJ).

Para Tebet, � preciso "tirar o vermelho da rua", pois as imagens assustariam eleitores do "interior de SP" e de "Estados no Centro-Oeste, Sul e Norte", conforme noticiado pela coluna da M�nica Bergamo, no jornal "Folha de S.Paulo".

A BBC News Brasil questionou o Partido dos Trabalhadores sobre se h� uma orienta��o clara de mudan�a dentro do partido, mas a assessoria de imprensa n�o respondeu at� a publica��o desta reportagem.

Adotado pelo PT como a principal cor, o vermelho, em diferentes tons, foi utilizado por partidos comunistas, socialistas, trabalhistas e sociais democratas em uma origem que remonta ao s�culo 19.

O uso inicial do vermelho pela esquerda se deu quando a cor passou a estampar a bandeira do Partido Comunista — e por isso ainda � ligada � uma esquerda radical, embora j� tenha sido incorporada por partidos socialistas e sociais-democratas.

Em 1789, no epis�dio que culminou na Revolu��o Francesa, a assembleia constituinte francesa colocou bandeiras vermelhas nos cruzamentos das ruas para mostrar que as manifesta��es p�blicas estavam proibidas.

Quebrando a regra, milhares de parisienses se reuniram para exigir a destitui��o do rei Lu�s 16, no Campo de Marte em 1791. O ent�o prefeito de Paris, Bailly, ordenou que uma grande bandeira vermelha fosse colocada no alto para reiterar a ordem. Mas uma multid�o tomou a pra�a e a pol�cia entrou em conflito com os manifestantes, matando mais de 50 pessoas.

Em seu livro Le petit livre des couleurs ("Pequeno livro das cores"), o historiador e antrop�logo franc�s Michel Pastoureau afirma que a mesma bandeira vermelha que era usada para impedir que o povo franc�s se manifestasse, passou desde ent�o a ser o emblema do povo oprimido e da revolu��o em marcha. Ele diz que isso � uma "surpreendente invers�o simbol�gica".

"Temos v�rios outros epis�dios hist�ricos, como Primavera do Povos [revolta contra regimes autocr�ticos em diferentes pa�ses europeus] e a Revolu��o Russa de 1917, onde a bandeira vermelha tamb�m foi usada como s�mbolo de luta", diz o professor de hist�ria contempor�nea Lincoln Secco, que leciona na Universidade de S�o Paulo (USP).

"Mas com o passar dos anos, os partidos oper�rios e sociais democratas que existem at� hoje aderiram � bandeira vermelha."

PT j� usou outras cores antes

Secco, que � autor do livro A Hist�ria do PT, explica que o uso de outras cores na campanha do partido n�o � exatamente uma novidade.

Oficialmente, o PT tem uma bandeira vermelha com uma estrela branca, que �s vezes aparece tamb�m em amarelo.

"A cor do partido foi escolhida pelo grupo ter surgido no campo da esquerda, como resultado de uma conflu�ncia de v�rios grupos socialistas, trabalhistas, comunistas, mas tamb�m com setores da igreja… � um partido bastante plural."

Parte do eleitorado de Bolsonaro propaga agora a narrativa de que a bandeira do Brasil seria substitu�da por uma "bandeira vermelha", e que o pa�s se tornaria comunista caso o PT fosse eleito.

"Esse � um discurso j� bastante antigo, muito mais antigo do que o pr�prio PT. Durante a ditadura militar, por exemplo, era muito comum falar, pejorativamente, que algumas pessoas eram 'verde e amarelo por fora e vermelho por dentro' — o que significava que eram traidores da p�tria. � uma alegoria que tem l� a sua efic�cia em determinados grupos", diz o cientista pol�tico Cl�udio Couto, coordenador do Mestrado Profissional em Gest�o e Pol�ticas P�blicas da FGV.


Em ato em Belford Roxo (RJ), Lula e parte dos apoiadores usaram branco, mas bandeiras vermelhas também ocupavam espaço
Em ato em Belford Roxo (RJ), Lula e parte dos apoiadores usaram branco, mas bandeiras vermelhas tamb�m ocupavam espa�o (foto: Buda Mendes/Getty Images)

A ditadura militar passou a usar s�mbolos nacionais, como a camisa da sele��o brasileira de futebol.

"Fizeram isso tentando forjar uma unidade nacional que era falsa, porque � claro que todas as pessoas s�o brasileiras e comp�em o mesmo pa�s, mas elas n�o t�m que ter a mesma opini�o pol�tica", avalia Secco.

Em 1989, o ex-presidente Fernando Collor de Mello, durante a primeira elei��o presidencial p�s-ditadura, seguiu essa tend�ncia, mas usando uma narrativa mais espec�fica: era a bandeira verde e amarela contra a bandeira vermelha do PT.

Para contrapor-se � ideia de um governo de esquerda radical, como os advers�rios tentavam pregar, Secco explica que o PT procurava moderar o tom dos discursos e acrescentar outras cores e simbologias �s campanhas, o que vemos acontecer de novo agora.

"O partido nunca aboliu o vermelho completamente das campanhas, mas durante algumas elei��es, houve a produ��o de camisetas do Lula sem nenhum tom de vermelho", diz o historiador.


Camisetas usadas nas campanhas presidenciais de Lula em 1989, 1994, 1998, 2002 e 2006.
Camisetas usadas nas campanhas presidenciais de Lula em 1989, 1994, 1998, 2002 e 2006. (foto: Brusinhas/Divulga��o)

Outro exemplo dado pelo professor � a campanha de Luiza Erundina, do PT, para o cargo de prefeita da cidade de S�o Paulo em 1996.

"Dentro do partido, ela estava em uma posi��o mais moderada, sutilmente mais � direita. Ent�o ela passou a usar um slogan que dizia 'Diga sim', contrapondo a ideia de que o PT seria um partido de grande rejei��o. Historicamente, o partido misturou cores e slogans para se aproximar do eleitor de centro."

Que efeito a troca de cores tem?

Na avalia��o de Cl�udio Gon�alves Couto, a orienta��o de troca de cores nesta altura da disputa, h� poucos dias do segundo turno, tem mais rela��o com o envolvimento de aliados de Lula do que com a inten��o de angariar novos votos.

"Se formou, ao lado de Lula, uma frente ampla. Acredito que [o uso do branco] seja muito mais uma quest�o de acenar a eles. V�rias lideran�as, economistas, Simone Tebet, e o pr�prio vice, Geraldo Alckmin, est�o historicamente fora do espectro de esquerda. As cores da campanha, para os eleitores, � mais um detalhe, mas � representativo para essa frente ampla. Avalio que � nesse caminho que essa mudan�a tenha peso. "

Assim como Couto, Lincoln Secco acredita que a estrat�gia tenha efeito muito limitado na conquista de novos votos.

Para os analistas, eleitores "mais impression�veis" com a narrativa de que o vermelho representa comunismo ou parte do eleitorado de Tebet, que teve 4,16% dos votos no primeiro turno, podem se agradar com a mudan�a.

"N�o existe pesquisa cient�fica que comprove que uma mudan�a do tom de cor na campanha resultaria em muitos novos votos. No caso da esquerda, ela serve como uma identifica��o de grupo dos pr�prios militantes, ent�o n�o deixar� de ser usada, e quem j� � antipetista n�o vai mudar o voto porque mudou a cor", aponta Secco.


Lula usando as cores do Brasil e a estrela vermelha do PT em 2002, durante sua quarta campanha para a presidência
Lula usando as cores do Brasil e a estrela vermelha do PT em 2002, durante sua quarta campanha para a presid�ncia (foto: MAURICIO LIMA/Getty Images)

O aceno moderado do PT

Os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil acreditam que, caso eleito, o PT transforme esse aceno ao centro em uma forma mais moderada de governar.

"A figura do Alckmin como vice j� � um indicativo disso, e o movimento n�o fica s� na campanha. Uma das raz�es para isso � que o PT � um partido com pouca representatividade no Congresso Nacional, o que requer que fa�am alian�as com lideran�as que hoje chamamos de 'centr�o', mas que s�o historicamente de partidos de direita ou centro-direita", afirma Couto.

"Ent�o ser� um governo de centro, social-democrata, e podemos dizer que em certos pontos, � de se esperar at� que seja social-liberal, em termos de pol�ticas p�blicas."

Para Lincoln Secco, h� uma grande parcela do espectro pol�tico central que est� comprometida com a democracia, e embora alguns desaprovem as pol�ticas do PT, essa parcela se "assustou mais" com o governo Bolsonaro.

Historicamente, o professor Secco avalia que, embora o PT tivesse um discurso mais pr�ximo � esquerda radical nos primeiros anos de exist�ncia e quando chegou ao poder, as pol�ticas foram mais voltadas ao centro, e em alguns casos, at� mesmo liberais.

"At� o per�odo de 2016, que os historiadores chamam de Nova Rep�blica, havia um jogo de oposi��o entre o PT e o PSDB e os aliados de ambos para conquistar cargos, mas na realidade havia muita converg�ncia especialmente no modelo econ�mico."

Como exemplo, ele cita que o Partido dos Trabalhadores n�o aboliu o trip� de pol�tica econ�mica do governo de Fernando Henrique Cardoso e manteve o governo de responsabilidade fiscal, mas deu mais peso para as pol�ticas sociais.

"O PT n�o � um partido de esquerda radical. Pelo contr�rio, se tornou cada vez mais moderado exatamente por causa da crise pol�tica e para conquistar o espa�o onde n�o coube a extrema direita, que est� cada vez mais radicalizada."

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/geral-63260840


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