
Por Renato de Faria*
N�o � dif�cil formar um fascista. Basta apenas deixar aflorar o instinto, o narcisismo, o dever eg�ico de sempre ter certeza e hostilizar todo apre�o pelo di�logo, pela interlocu��o democr�tica e pela constru��o de uma subjetividade que se sabe incompleta, pass�vel de caminhos errantes ao longo da vida.
O fascista tem uma autoimagem infantil de si, cheio de vil�es e her�is, acreditando que o mundo � dividido entre bem e mal, estando a maldade sempre fora dele e a bondade sempre como posse si mesmo.
O fascista tem uma autoimagem infantil de si, cheio de vil�es e her�is, acreditando que o mundo � dividido entre bem e mal, estando a maldade sempre fora dele e a bondade sempre como posse si mesmo.
O mundo fascista � simplista e simpl�rio. N�o h� complexidade intelectual, interpreta��es de texto ou musculatura conceitual que sustente um debate por mais de uma hora. � por isso que � sempre mais f�cil educar para o fascismo, pois basta deixar o instinto aflorar, compensando tudo com falas de autossupera��o, desejo salvacionista, resili�ncia, supera��o masculina e outras bobagens que gente fraca inventa quando n�o d� conta dos caminhos tortuosos da exist�ncia. Por isso, o contr�rio � sempre mais dif�cil. Investir em um sujeito disposto � vida em sociedade � sempre mais �rduo. N�o � � toa que o soco exige uma mec�nica mais pueril que o ato de pensar.
N�o se trata de pensar a educa��o p�s-pandemia, p�s-anal�gica, p�s-adulta, p�s-verdade ou p�s-conhecimento. O neg�cio � muito mais s�rio que isso. A proposta � pensar um processo formativo que ensine ao homem que ele precisa se humanizar para receber essa alcunha. E isso consiste, basicamente, em reprimir seu desejo origin�rio e natural de eliminar qualquer outro que pretenda se interpor diante de seu desejo e seu caminho.
Se conseguirmos, ao longo de nossa curta exist�ncia, formar sujeitos que n�o deem vaz�o ao desejo de eliminar o outro, j� cumprimos a maior parte de nosso papel de professores, pais, m�es, tios, amigos, av�s e av�s. A tarefa de n�o formar um fascista exige de n�s aten��o constante, dizendo, muitas vezes, muito mais n�o do que sim.
Por isso essa � uma constru��o �rdua, incompleta e n�o pode ser assumida somente pela escola. Todo o tecido social deve se comprometer para que Auschwitz (e seus cong�neres tupiniquins) seja apenas uma refer�ncia hist�ria de um passado triste que n�o deve se repetir.
Por isso essa � uma constru��o �rdua, incompleta e n�o pode ser assumida somente pela escola. Todo o tecido social deve se comprometer para que Auschwitz (e seus cong�neres tupiniquins) seja apenas uma refer�ncia hist�ria de um passado triste que n�o deve se repetir.
Para isso, algumas humildes dicas:
1. Fa�a uma previd�ncia para seus pequenos. Mas uma previd�ncia de livros. S� os textos nos previnem do mal. Tem muita gente a� juntando dinheiro para investimento da prole. Isso � bom e razo�vel, mas n�o basta. Tenha uma biblioteca. Sem essa de ficar culpado em comprar livros que n�o leu ainda. Voc� est� se prevenindo para um dia de solid�o em que precisa dialogar com algu�m que aponte caminhos simb�licos. Caso voc� n�o consiga us�-los, n�o se chateie, seus filhos ter�o a oportunidade de herdar uma biblioteca. Geralmente, esse tipo de heran�a salva vidas.
2. Valorize sempre o di�logo. Somente uma cultura fundamentada na palavra � capaz de interromper a viol�ncia f�sica. O elemento da fala, a constru��o de conceitos, a interpreta��o das vozes, nos faz tolerantes e toler�veis.
3. Convide amigos que pensam diferente de voc�, vestem-se de outra forma e tenham outra op��o ideol�gica. Os filhos, quando percebem que a diversidade n�o � um problema, mas ao contr�rio, que ela se transforma em elemento de alegria e boas conversas, n�o vai crescer como um sujeito obtuso e ignorante, pronto para ser o dono da raz�o, apontando armas e verdades para algu�m.
4. Fa�a festas em sua casa. Coloque m�sicas e dance com os ritmos mais variados. Um ambiente alegre e mel�dico � um �timo lugar para crescer gente do bem, disposta a encarar a vida com coragem e arte, valorizando a cultura como forma de express�o humana. Nessas casas, a ang�stia sempre � criativa e promove boas conversas, poesias e partilhas profundas.
5. Permita que as crian�as se interessem por um time de futebol, uma atividade esportiva, uma cole��o de cascas de cigarra ou qualquer outra coisa que mostre a elas a bondade em se constituir como um ser desejante, e que a vida � um eterno convite a bancar a �nsia por um interesse que nos move.
6. E deixe bem claro, com firmeza e cuidado, para aqueles que chegam ao mundo: s� o afeto salvar� uma pessoa de uma vida vazia e sem sentido, pois somos constru�dos por hist�rias, contatos, rela��es, acertos e desacertos. E que nenhum algoritmo ser� capaz de medir a intensidade de um beijo apaixonado, a emo��o de um telefonema de desculpas, a beleza de um encontro ap�s anos de dist�ncia e a saudade que temos daqueles que partiram.
Por que escrevi esse texto? Na semana passada presenciei duas crian�as brigando, de soco e tudo. Elas tinham cerca de oito anos e entraram em conflito por motiva��o pol�tica. O que aconteceu? De repente, algu�m falou do candidato alheio e o outro n�o gostou. No mesmo instante ambos estavam no ch�o, trocando improp�rios e pancadas.
Qualquer adulto, independentemente do espectro pol�tico, que n�o se assustar com essa cena e n�o desejar uma educa��o que interrompa esse tipo de comportamento, j� ultrapassou todas as barreiras da civilidade e deve ser visto como uma amea�a � constru��o de um mundo cada vez mais humanamente fraterno, consistentemente livre e socialmente igual.
*Professor e fil�sofo, buscando as problem�ticas da vida diante das solucion�ticas do mundo
*Professor e fil�sofo, buscando as problem�ticas da vida diante das solucion�ticas do mundo