
As emendas de relator, identificadas como RP9 nos dados do Congresso Nacional, s�o uma ferramenta que permite aos parlamentares o requerimento de verba da Uni�o sem detalhes como identifica��o ou mesmo destina��o dos recursos.
A partir desta quarta-feira (7), os ministros do Supremo Tribunal Federal dever�o se concentrar sobre tr�s quest�es no julgamento das a��es que questionam a legalidade dessas bilion�rias emendas or�ament�rias controladas pela c�pula do Congresso.
A mais simples de resolver � a falta de transpar�ncia, origem das primeiras cr�ticas feitas ao obscuro mecanismo criado pelos l�deres do centr�o no governo Jair Bolsonaro (PL) para azeitar barganhas pol�ticas e repassar verbas a bases eleitorais de deputados e senadores.
O esquema criado pelo centr�o permite que o relator-geral da Comiss�o Mista de Or�amento reserve uma parte das verbas no Or�amento da Uni�o para despesas indicadas pelos parlamentares e lhe d� poderes para definir quais despesas ser�o de fato executadas ao longo do ano.
O QUE S�O EMENDAS DE RELATOR?
A Constitui��o de 1988 permite a cria��o de emendas parlamentares, visando descentralizar a gest�o or�ament�ria e tornar os projetos federais mais acess�veis em escala local. Hoje, temos quatro tipos de emendas —individuais, de bancada, de comiss�o e de relator— algumas obrigat�rias, e outras optativas.
Entre as vinculativas, est�o as emendas individuais e de bancada: uma � destinada aos parlamentares, podendo ele decidir onde alocar o dinheiro, e outra � destinada �s bancadas estaduais, que tamb�m possui autonomia para deliberar sobre os investimentos.
J� entre as opcionais est�o as emendas de comiss�o e de relator —enquanto a primeira destina valores �s comiss�es tem�ticas do Congresso, a segunda permite ao relator-geral da Comiss�o Mista de Or�amento alterar ou incluir despesas nas finan�as p�blicas anualmente.
QUAL O PROBLEMA?
Os recursos separados pelo relator no Or�amento s�o distribu�dos durante o ano de acordo com indica��es dos parlamentares, sem transpar�ncia e sem crit�rios claros para divis�o do dinheiro.
Uma quest�o que os ministros do STF ter�o que enfrentar � a falta de crit�rio para distribui��o do dinheiro reservado pelas emendas do relator, que t�m sido usadas para favorecer parlamentares alinhados com o governo e a c�pula do Congresso, em detrimento de seus advers�rios.
Al�m disso, as regras das emendas estabelecem certos limites para aplica��o dos recursos, exigindo que a maior parte seja destinada a a��es na �rea de sa�de, e restringem os valores reservados para as emendas a uma fatia das receitas federais, para impedir sua expans�o sem controle.
Nada disso existe no caso das emendas do relator, que s�o reguladas por normas internas do Legislativo, alteradas todos os anos. Essas regras ampliaram muito o campo de atua��o do relator, autorizando o uso das suas emendas para financiar quase todo tipo de despesa.
QUANDO ESSAS EMENDAS FORAM CRIADAS?
A emenda de relator iniciou-se no Pal�cio do Planalto, no gabinete de Luiz Eduardo Ramos, o ent�o ministro da Secretaria de Governo, que resgatou um dispositivo inclu�do pelo Congresso na LDO (Lei de Diretrizes Or�ament�rias), mas que havia sido vetado por Bolsonaro tr�s semanas antes.
Em dezembro de 2019, o ministro assinou o documento que criou a emenda chamada RP9. A nova lei, que alterou o or�amento de 2020, foi aprovada e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro.
Durante as elei��es presidenciais, Bolsonaro, que concorria � reelei��o, disse ter vetado a emenda de relator. O que aconteceu, por�m, foi o veto de Bolsonaro a uma tentativa do Congresso de viabilizar a emenda de relator por meio da LDO.
No entanto, o presidente, temendo a perda de governabilidade, recuou da decis�o e mandou ao Congresso um texto pr�prio sobre a emenda, aprovado e sancionado.
Com o mecanismo existente hoje, o relator do Or�amento continua trabalhando depois que a lei or�ament�ria � sancionada pelo presidente da Rep�blica, interferindo o ano inteiro na execu��o das despesas ao definir onde os recursos reservados por suas emendas ser�o gastos.
QUAL O VALOR DAS EMENDAS?
Quando implementada, em 2020, as emendas de relator custaram aos cofres p�blicos um total de R$ 7 bilh�es. No ano seguinte, foram empenhados R$ 10,5 bilh�es para a modalidade.
J� neste ano, R$ 16,5 bilh�es foram aprovados e destinados ao uso de deputados e senadores por meio das emendas RP9.
A proposta do Executivo para o Or�amento de 2023, ainda em discuss�o, reserva R$ 19,4 bilh�es para emendas individuais e de bancadas estaduais e separa outros R$ 19,4 bilh�es para as emendas do relator.
QUEM QUESTIONA A LEGALIDADE DAS EMENDAS NO STF?
Quatro partidos pol�ticos moveram a��es em 2021, sendo eles o Cidadania, PSB, PSOL e PV.
Segundo as a��es, as emendas do relator violam os princ�pios constitucionais que exigem publicidade, impessoalidade e moralidade na administra��o p�blica.
As tr�s primeiras siglas entraram com peti��es contra a ferramenta no ano passado e questionavam o uso dos recursos em tratativas do governo Bolsonaro com o Congresso. A quarta a��o, do PV, foi apresentada neste ano, e refor�ava os argumentos anteriores.
J� a a��o do PSOL � mais ampla. A legenda afirma que as emendas de relator em si s�o inconstitucionais porque permitiram "o uso da execu��o or�ament�ria como instrumento de barganha e troca de apoio pol�tico".
COMO SER� O JULGAMENTO?
O julgamento em plen�rio pelos ministros do STF est� previsto para come�ar nesta quarta-feira (7), e todas as quatro a��es de inconstitucionalidade ser�o analisadas conjuntamente.
Reportagem da Folha de S.Paulo mostrou haver receio de petistas de que eventual decis�o do Supremo contra as emendas prejudique a rela��o dos aliados do presidente eleito Luiz In�cio Lula da Silva (PT) com o presidente da C�mara, Arthur Lira (PP-AL).
Uma das possibilidades � que a corte declare a legalidade das emendas, mas impondo limita��es a ele –por exemplo, determinando mais transpar�ncia e menos direcionamento pol�tico aos recursos, em conson�ncia com a decis�o do ano passado.
N�o ser� surpresa, por�m, que um dos ministros pe�a vista (mais tempo para an�lise) e suspenda o julgamento por tempo indeterminado.
O QUE O STF J� DECIDIU?
Em 2021, o STF determinou que o Congresso criasse um sistema para divulga��o dos patrocinadores e dos benefici�rios das emendas do relator. O sistema criado deu mais transpar�ncia �s emendas, mas ainda oculta muitas informa��es.
H� DESVIOS?
As emendas t�m sido usadas para barganhas pol�ticas entre o governo e a c�pula do Congresso, favorecendo aliados da base aliada do Planalto. H� suspeitas de fraude na execu��o das despesas, mas a falta de transpar�ncia dificulta o controle.
Como a Folha de S.Paulo revelou, a gest�o Bolsonaro passou a usar em larga escala uma manobra licitat�ria para dar vaz�o aos recursos bilion�rios das emendas parlamentares.
A estrat�gia deixou em segundo plano o planejamento, a qualidade e a fiscaliza��o, abrindo margem para servi�os prec�rios, desvios, superfaturamentos e corrup��o.
A ess�ncia do emendoduto � o afrouxamento do controle sobre obras de pavimenta��o da estatal federal Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do S�o Francisco e do Parna�ba), hoje sob o comando do centr�o.