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Estado de Minas ENTREVISTA

Ministra das Mulheres: 'A sociedade precisa come�ar a se envolver'

Minist�rio das Mulheres, comandado por Cida Gon�alves, lan�ar� no 8/3, Dia Internacional da Mulher, um pacto nacional de enfrentamento ao feminic�dio no Brasil


05/03/2023 04:00 - atualizado 04/03/2023 22:24

retrato da ministra Cida Gonçalves
Cida Gon�alves, ministra das Mulheres (foto: Evaristo S�/AFP)

Com o Dia Internacional da Mulher, mar�o se tornou uma oportunidade para o novo Minist�rio das Mulheres mostrar a��es e o posicionamento que tomar� diante do aumento de todas os tipos de viol�ncia contra as mulheres, escancarado na quarta edi��o do levantamento Vis�vel e invis�vel: A vitimiza��o de mulheres no Brasil, divulgada pelo F�rum Brasileiro de Seguran�a P�blica na semana passada.

Em entrevista, a ministra das Mulheres, Cida Gon�alves, adianta que na data ser� lan�ado um pacto nacional de enfrentamento ao feminic�dio, com um conjunto de a��es para combater o tema. Al�m disso, ela defendeu um trabalho de abertura de di�logo com a sociedade para conseguir alcan�ar mudan�a de postura e a real tipifica��o do crime.

 

Na quinta-feira (2/3), estudo do F�rum de Seguran�a P�blica apontou aumento em todos os tipos de viol�ncia contra a mulher, sendo 23% ofensas verbais e 11,6% agress�es f�sicas. Sabemos que � um problema de longa data, mas por que que a gente est� vendo esses n�meros t�o altos hoje em dia?

Os n�meros est�o altos por alguns fatores. Eu acho que, primeiro, � a quest�o de que a gente est� vivendo em um pa�s em que aumentou a intoler�ncia. Ent�o, a toler�ncia � uma coisa muito forte. Dois, a quest�o do �dio que est� colocado, que est� repercutindo na sociedade, � um �dio muito forte e isso vai recair sobre as mulheres. E tr�s, � porque, na verdade, a gente est� vivendo um per�odo de misoginia. Eu sei que misoginia � a quest�o do �dio, mas ela est� muito vinculada � quest�o de que as pessoas est�o com muita raiva de quem tem lugar de fala, de quem est� na luta, de quem tem condi��es e principalmente as mulheres. Ent�o, eu acho que esses fatores juntos terminam por aumentar o �ndice de viol�ncia no pa�s. 


Poder�amos dizer que tamb�m h� um fundo de exposi��o que contribui, por antes ser um assunto mais velado? 

�, pode at� ser que tenha esse fundo, mas n�s n�o podemos comprovar, porque a gente terminou nesses �ltimos anos tendo muito pouco investimento efetivo em pol�ticas p�blicas que eliminassem a viol�ncia contra as mulheres nesses �ltimos seis anos. Acho que esse � um ponto, porque o aumento da den�ncia ele vem quando as mulheres confiam efetivamente no Estado. E os pr�prios dados do F�rum de Seguran�a P�blica mostraram que as mulheres acreditam muito mais na m�e, na fam�lia, nos amigos que nos servi�os do Estado brasileiro. 


Um estudo do Instituto Patr�cia Galv�o diz que 85% dos homens sabem que est�o praticando uma viol�ncia contra as mulheres n�o acham que v�o ser punidos. Como combater esse pensamento da impunidade?

Primeiro, temos de acabar com o apadrinhamento. N�o significa prote��o individual, mas voc� tem um Estado que termina sempre autorizando e justificando o agressor. � quando a mulher vai numa delegacia, quando a algum lugar e os profissionais perguntam: ‘Tem certeza? Seu marido vai pra cadeia’. Ent�o, primeiro � uma mentira, n�o vai. O agressor s� vai preso no caso de viol�ncia dom�stica em dois casos: um � o flagrante e o outro � pelo descumprimento da medida protetiva.

Ent�o, tem que parar com isso, porque � um incentivo para as mulheres n�o denunciarem. Esse � um primeiro grande desafio que n�s vamos ter que enfrentar efetivamente. Segundo, n�s temos que trabalhar dentro de uma cultura de tipifica��o. Aconteceu o crime, � viol�ncia dom�stica, quando n�s temos na maioria das vezes uma les�o grave, quase uma tentativa de feminic�dio, se coloca como uma les�o grave e n�o como uma tentativa de feminic�dio.

Esses elementos � que v�o garantir a quest�o da impunidade. Ent�o, o agressor sabe que quando a mulher chega l� o pr�prio estado vai dizer n�o denuncia. E depois, na tipifica��o mais uma vez n�o se coloca como esse crime. E mesmo nos crimes de feminic�dio, os �ndices que s�o colocados nos dados na maioria das vezes est�o encobertos, porque se coloca assassinato de mulheres e n�o tipifica como feminic�dio.

"O agressor s� vai preso no caso de viol�ncia dom�stica em dois casos: um � o flagrante e o outro � pelo descumprimento da medida protetiva"

 


Como combater as viol�ncias sutis e que indicam o in�cio do ciclo, como a psicol�gica, por exemplo? E, principalmente, instruir as institui��es para atender? 

A gente tem o desafio que � da sociedade. A gente precisa estabelecer no pa�s uma cultura de respeito e de solidariedade com as mulheres. A gente j� tinha voltado que em briga de marido e mulher se mete a colher. A gente retrocedeu um pouco nesses �ltimos anos. Voc� vai ver pela pesquisa que tem muita gente que diz que conhece, mas que n�o fez nada, ent�o isso precisa efetivamente ser posto.

A sociedade precisa come�ar a se envolver e se posicionar em todas as formas de viol�ncia. Voc� ver algu�m chamando uma mulher de burra, de gorda, de feia, ou uma piada, a sociedade precisa se posicionar, dizer que isso n�o d� e que, segundo a Lei Maria da Penha, � crime. Eu acho que isso n�s precisamos estabelecer como um crit�rio, um par�metro para ajudar a enfrentar a viol�ncia contra as mulheres. 


Quais s�o as prioridades do Minist�rio das Mulheres para enfrentar o cen�rio de combate � viol�ncia contra a mulher?

A prioridade �, na verdade, a gente capilarizar o servi�o de atendimento �s mulheres, estabelecer um pacto nacional de enfrentamento ao feminic�dio, que ser�o algumas a��es anunciadas no dia 8, reestruturar o servi�o do 180 para ele volte a prestar informa��o e orienta��o pras mulheres e n�o ser s� um disque den�ncia.

A gente deve correr nesse pa�s, como o presidente Lula pediu para os ministros, que n�o fiquem no gabinete e andem no pa�s. Ent�o, � correr com uma miss�o minha e de todos os ministros garantindo as informa��es, trabalhando, rediscutindo, negociando com o governador, com o prefeito a implanta��o de servi�os, a discuss�o da educa��o, como � que n�s vamos trabalhar por dentro. N�o � educa��o pura e simplesmente formal, � educa��o tamb�m formal, mas tamb�m que deve acontecer na sociedade brasileira.

"A sociedade precisa come�ar a se envolver e se posicionar em todas as formas de viol�ncia"

 

 

Qual seria o papel do Estado brasileiro nesse problema? 

Eu acho que o Estado tem um papel estrat�gico e fundamental. E o Estado enquanto estado, o poder executivo federal, poder executivo estadual, o poder executivo municipal, o sistema de justi�a na composi��o do poder judici�rio, do Minist�rio P�blico e Defensoria P�blica, que � implementar primeiro a lei Maria da Penha e garantir, dentro da quest�o da lei do feminic�dio, o julgamento justo para as mulheres.

Na quest�o da viol�ncia sexual, n�s temos protocolos, n�s temos v�rios encaminhamentos que tamb�m pode ser feito. Ent�o, precisamos que o estado fa�a, primeiro, a implementa��o da Lei Maria da Penha, fa�a a quest�o da investiga��o e do julgamento, combata a impunidade para que n�o aconte�a o feminic�dio e que execute os protocolos de atendimento �s v�timas de viol�ncia sexual no pa�s. Ent�o, o estado precisa cumprir , na verdade, a sua fun��o que � de acolher, atender e combater a impunidade para que efetivamente isso n�o aconte�a. 

 

Por que as pol�ticas existentes hoje n�o est�o tendo um n�vel eficiente diante do problema? O est� errado? 

N�o est�o erradas n�o, o problema da pol�tica [de combate a viol�ncia da mulher] existente hoje � que elas n�o est�o dando conta. O problema � que n�s temos Delegacia Especializada, que se voc� for ver no relat�rio do f�rum a maioria das mulheres, cerca de 21%, procura as delegacias especializadas. Elas existem em menos de 10% dos munic�pios brasileiros, ent�o se n�s temos 5,6 mil munic�pios s�o 500 munic�pios que tem delegacia especializada. Ent�o, n�s temos uma grande parcela da popula��o que n�o tem o servi�o.


Se voc� pegar as Casas da Mulher Brasileira, n�s temos 11 munic�pios com o servi�o. Se voc� for pegar os Centros Especializados, n�s temos menos de 6% dos munic�pios com esses locais para atender as mulheres. Ent�o, na verdade, n�o � oferecido servi�os para que essas mulheres possam buscar o atendimento. Ent�o, para mim � essa a grande quest�o do v�cuo que est� colocado.

N�s temos a melhor lei do mundo, que � a lei Maria da Penha, n�s temos a lei do feminic�dio, agora n�s precisamos implementar. Se pensar em juizados, n�s temos quantos? Ent�o precisa ser instaurados mais juizados, mais promotorias p�blicas da mulher, mais defensoria, mais servi�os para que as mulheres possam buscar ajuda. 

 

Como podemos pensar diferente dentro do que j� tem sido feito em termos de pol�ticas p�blicas? Poderia citar exemplos?

Acho que a gente precisa pensar uma reeduca��o da popula��o, quando falo isso me refiro � sociedade e �s institui��es. N�s precisamos reorganizar toda forma organizacional, rela��es sociais estabelecidas para que a gente tenha outros par�metros. Para que a viol�ncia n�o seja o principal e sejam outros como o do respeito, da solidariedade, da valoriza��o e pra isso n�s precisamos investir numa mudan�a de valores e comportamentos, porque sem mudar isso na sociedade n�s n�o vamos conseguir mudar muita coisa.

N�s precisamos estabelecer novos di�logos, precisamos que a imprensa, �rg�os nos ajudem a enfrentar, por exemplo, a quest�o da misoginia que est� colocada, que o lugar de fala das mulheres est� amea�ado, n�s precisamos que as igrejas se envolvam. Precisamos ter um movimento na sociedade e no Estado de repensar tamb�m uma forma de comunica��o, como vamos comunicar com as pessoas que n�o tem muito acesso a informa��o e que n�o tem informa��o? 

 

Sempre � falado que o grande desafio das mulheres para sa�rem da situa��o de viol�ncia � a quest�o da falta de autonomia econ�mica. � verdade, n�o estou negando isso, mas tem a quest�o da rela��o afetiva. Ent�o, n�o � s� a depend�ncia financeira, � a depend�ncia afetiva, junto a outra quest�o que � a falta de informa��o.

�s vezes, ela n�o sai de casa, n�o sai da rela��o de viol�ncia porque ela tem medo de perder a casa, de perder a guarda dos filhos, porque ela n�o tem conhecimento sobre os seus direitos. Ent�o, precisamos pensar de forma diferente. N�s temos que come�ar a pensar como �, de fato, que a maioria das mulheres que vivem e que tipo de conhecimento elas t�m para a� sim mudar a realidade do Brasil. 

 

Outra complexidade do problema � ele ser de foro �ntimo, envolver o emocional. Como enfrentar uma depend�ncia emocional para quebrar um ciclo de viol�ncia? O que o estado pode fazer?  

Acho que a gente vai enfrentar na medida em que voc� cada vez mais se conscientiza do direito, da quest�o que est� colocada. A mulher precisa se sentir apoiada, ela precisa saber que vai ter outro lugar de seguran�a na sociedade. A depend�ncia afetiva se d� porque ela [a mulher] acredita que ama, �s vezes at� ama, mas ela n�o tem for�a suficiente para sair disso.

Essa for�a vai vir do apoio da fam�lia, dos amigos, da sociedade ou apoio dos servi�os especializados para que ela possa ir rompendo esse ciclo da depend�ncia afetiva. Porque mesmo que ela ame, a hora que ela vencer a depend�ncia afetiva, ela pode estabelecer um novo tipo de rela��o com o pr�prio parceiro que ela diz que ama, mas � ela que vai ter que dizer n�o para a quest�o da viol�ncia. Ela que vai ter que colocar limite nessa nesse n�vel de rela��o.


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