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Estado de Minas POL�MICA

Ministro de Lula defende descriminalizar drogas para reduzir popula��o carcer�ria

� BBC News Brasil, Silvio Almeida defendeu que STF julgue a��o sobre descriminaliza��o drogas, mas disse que n�o h� a��o do governo nesse sentido.


07/03/2023 07:14 - atualizado 07/03/2023 09:15
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Silvio Almeida
(foto: MICHAEL DANTAS/AFP via Getty Images)

Nos �ltimos 10 anos, o professor, advogado, fil�sofo, mestre e doutor em Direito Silvio Almeida se tornou um dos intelectuais mais conhecidos do Brasil. Sua escolha como ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, portanto, n�o chegou a surpreender quem acompanhava as discuss�es sobre o tema mais recentemente. Pouco mais de dois meses depois de sair da condi��o de "pedra" para a de "vidra�a", o agora ministro ainda mant�m a fala pausada e did�tica e a paci�ncia para explicar seus posicionamentos por mais que possam parecer controversos. Foi assim que ele recebeu a reportagem da BBC News Brasil na segunda-feira (7/03) na sede da pasta, em Bras�lia.

Ao longo de quase 50 minutos de entrevista, Almeida defendeu a cria��o de uma comiss�o para avaliar se o Estado brasileiro seguiu as recomenda��es da Comiss�o Nacional da Verdade (CNV), que apurou viola��es de direitos humanos durante a ditadura militar. A comiss�o j� � vista como uma esp�cie de "vespeiro" pol�tico com potencial para desagradar integrantes das For�as Armadas.

Almeida tamb�m defendeu que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue uma a��o que est� parada desde 2015 que analisa a descriminaliza��o das drogas. � BBC News Brasil, Almeida disse ser favor�vel � descriminaliza��o das drogas e afirmou acreditar que ela poderia diminuir a press�o sobre o sistema carcer�rio brasileiro.

Dados de junho de 2022 (os mais recentes) mostram que a popula��o carcer�ria do Brasil � de aproximadamente 837 mil pessoas, segundo o Levantamento Nacional de Informa��es Penitenci�rias (Infopen), feito pelo Minist�rio da Justi�a.

"Temos que tratar isso como uma quest�o de sa�de p�blica, como uma quest�o que n�o se resolve por meio do encarceramento, com pris�o e com puni��o", disse.

Isso aconteceria porque estudos indicam que a atual lei de drogas gerou uma "explos�o" no n�mero de pessoas presas por crimes relacionados ao tr�fico de drogas.

Apesar de se mostrar favor�vel � descriminaliza��o das drogas, Almeida afirmou que o governo n�o estaria se movimentando para que o Supremo julgue o caso.


Mãos de pessoa algemada atrás das grades
(foto: Getty Images)

O ministro tamb�m afirmou que o governo trabalha para criar um estatuto para v�timas de viol�ncia que incluiria policiais, numa resposta � cr�tica de que a chamada "turma dos direitos humanos" defenderia apenas criminosos.

O ministro tamb�m negou que o atual governo esteja politizando a crise humanit�ria que afeta o povo ind�gena Yanomami ao atribuir a responsabilidade pela situa��o � gest�o do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Um dos pontos controversos da entrevista foi a defesa que o ministro fez da posi��o do governo brasileiro de se abster e n�o assinar uma declara��o de mais de 50 pa�ses condenado viola��es de direitos humanos ocorridas na Nicar�gua, pa�s comandado por Daniel Ortega. Segundo Almeida, ao n�o assinar a declara��o, o Brasil n�o estaria se omitindo ou sendo leniente com o regime nicaraguense, mas mantendo canais de di�logo abertos para tentar encontrar alternativas.

"O Brasil nunca teve e n�o tem leni�ncia em rela��o a isso", disse o ministro.

Ao final da entrevista, Almeida deu a entender que � favor�vel � descriminaliza��o do aborto, outro tema pendente de julgamento no STF.

"Chega de homens dando opini�o sobre a vida, sobre o corpo e sobre a sa�de das mulheres [...] sou a favor de que elas (mulheres) decidam", disse.

Confira os principais trechos da entrevista:


O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida
O ministro defendeu que STF julgue a��o sobre descriminaliza��o drogas, mas disse que n�o h� a��o do governo nesse sentido (foto: Jos� Cruz/Ag�ncia Brasil)

BBC News Brasil - O senhor anunciou h� alguns dias que criaria uma comiss�o para avaliar como o governo brasileiro seguiu as recomenda��es feitas pela Comiss�o Nacional da Verdade, que apurou viola��es de direitos humanos durante a �poca da ditadura militar. Por que isso � necess�rio?

Silvio Almeida - Quando se fala de justi�a e de direitos humanos, temos que falar daquela trinca: mem�ria, justi�a e verdade. A verdade � um elemento fundamental, porque o esclarecimento de todos os fatos, principalmente os que foram praticados em per�odos sombrios como o que o Brasil atravessou entre 1964 e 1985, t�m que vir � luz at� para que n�s n�o repitamos os mesmos erros.

BBC News Brasil - Uma das recomenda��es feitas pela CNV era de que as For�as Armadas devessem assumir a culpa por viola��es de direitos humanos praticadas por militares durante a ditadura. O senhor n�o teme que isso, de alguma forma, crie mais tens�o nas rela��es j� tensas entre o governo e as For�as Armadas?

Silvio Almeida - H� todo um trabalho que � feito pelo Minist�rio da Defesa e por outros minist�rios, sob condu��o do presidente Lula [...] eu n�o tenho esse temor porque se eu tivesse o temor de que discuss�es como essa pudessem causar qualquer abalo � democracia, n�o faria sentido apostar na democracia [...] essa recomenda��o n�o vem apenas de um trabalho do minist�rio, mas � um reclamo da sociedade e tamb�m do pr�prio governo e da comunidade internacional. A gente est� num momento muito prop�cio para estabelecer uma forma democr�tica de discutir o futuro presente, passado e o futuro do pa�s.

BBC News Brasil - O presidente Lula deu aval ao senhor para que seja criada essa comiss�o e para que se reveja as recomenda��es, em especial no que se refere �s For�as Armadas assumirem alguma culpa?

Silvio Almeida - Essa comiss�o n�o vai impor ou determinar aquilo que vai ser feito. � uma comiss�o que vai olhar para as possibilidades de a gente estabelecer um di�logo. Todas as decis�es passam pelo presidente Lula, passam pelo Minist�rio da Defesa, passam por todos os outros minist�rios. N�o h� possibilidade de a gente pensar que qualquer decis�o seja tomada sem pensar em todas as consequ�ncias pol�ticas, sem pensar nas tens�es e nos conflitos [...] Nada do que for decidido nesse �mbito (da comiss�o) deixar� de ser objeto de uma avalia��o criteriosa do Presidente da Rep�blica.

BBC News Brasil - Esse reclamo que o senhor diz existir, n�o seria de uma parte da popula��o, de uma bolha mais � esquerda? O senhor acredita que essa � uma pauta da sociedade brasileira como um todo?

Silvio Almeida - Essa discuss�o n�o atende a uma bolha da sociedade brasileira porque estamos falando de democracia. E nem se trata s� de falar de culpa das For�as Armadas. N�o � disso que se trata. O grande pensamento �: como fazemos para consolidar a democracia, para impedir que atos como esse ato de 8 de janeiro se repitam? [...] n�o h� interesse nenhum de que os saudosos de per�odos ditatoriais se apresentem como alternativa.

BBC News Brasil - A Comiss�o tamb�m prev� que o Estado devia perseguir a puni��o dos envolvidos nas graves viola��es cometidas durante a ditadura. O governo vai entrar com alguma a��o questionando a Lei da Anistia?

Silvio Almeida - N�o. Isso n�o foi discutido. Essa � uma discuss�o que exige um processo muito mais apurado. Muito mais concertado. Mas isso n�o foi discutido.


Pernas de soldados marchando
Comiss�o vai avaliar se o Estado brasileiro seguiu as recomenda��es da Comiss�o Nacional da Verdade (CNV), que apurou viola��es de direitos humanos durante a ditadura militar (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - Na sua opini�o, a Lei da Anistia foi um erro?

Silvio Almeida - Eu acho que a Lei da Anistia, de alguma maneira, permitiu que graves crimes contra a humanidade n�o tivessem a puni��o devida no tempo devido.

BBC News Brasil - Mas s� para ficar claro na sua avalia��o, a Lei da Anistia foi um erro ou n�o?

Silvio Almeida - Acho que a maneira como ela foi conduzida n�o foi a mais apropriada. O Judici�rio brasileiro teve a chance de limitar os efeitos da Lei da Anistia. Ap�s isso, a Lei de Anistia n�o foi um erro, mas a maneira com que a lei inicial foi aplicada, permitindo que torturadores assassinos pudessem se recolocar no espa�o p�blico brasileiro, isso, sem d�vida nenhuma, foi um equ�voco.

BBC News Brasil - Parte significativa da popula��o que apoiou o agora ex-presidente Jair Bolsonaro comumente argumenta que se for para revisitar a Lei de Anistia para punir agentes do Estado que cometeram crimes naquela �poca, tamb�m deveria se punir guerrilheiros e militantes que cometeram crimes na mesma �poca. Como � que o senhor responde esse tipo de argumento?

Silvio Almeida - Essa ideia de de colocar aqueles que lutaram contra a ditadura e aqueles que perpetraram e apoiaram a ditadura � uma falsa equival�ncia que tem o cond�o (inten��o) de simplesmente tentar colocar do mesmo lado aqueles que de alguma maneira resistiram � viol�ncia, aqueles de alguma maneira que perderam sua vida, que foram torturados, que tiveram a sua exist�ncia totalmente comprometida, com aqueles que se refestelaram no sangue, no �dio e tamb�m na destrui��o da situa��o democr�tica no Brasil.

BBC News Brasil - O senhor acredita que nesse governo as For�as Armadas reconhecer�o sua culpa em rela��o �s viola��es cometidas durante a ditadura?

Silvio Almeida - N�o sei se isso vai acontecer ou se isso vai ser resultado de um longo processo hist�rico. Mas a quest�o toda � que a palavra "culpa" tem que ser substitu�da por uma outra palavra: responsabilidade. Quando falo de responsabilidade, se trata n�o apenas do reconhecimento. E a� � mais do que simplesmente dizer o que foi feito, mas tamb�m orientar e estruturar no sentido de garantir que isso n�o mais aconte�a.

BBC News Brasil - O senhor acaba de voltar de Genebra, na Su��a e, recentemente, o Brasil se absteve de assinar uma uma declara��o que condenava as viola��es de direitos humanos que est�o acontecendo neste momento na Nicar�gua. O atual governo diz defender os direitos humanos. Qual � a sua opini�o sobre o cen�rio vivido hoje na Nicar�gua?

Silvio Almeida - O cen�rio � preocupante. � um cen�rio no qual os relat�rios demonstram que h� viola��o de direitos humanos. Mas qual � a posi��o do Brasil? [...] � que o Brasil quer sempre manter uma posi��o de di�logo e n�o caminhar no sentido de condenar viola��es de um lado e n�o condenar de outro lado, no sentido de que n�o queremos apontar o dedo para determinados pa�ses e n�o a outros que tamb�m cometem viola��es.

BBC News Brasil - Mas isso n�o d� a impress�o de que o governo tem uma certa leni�ncia com esse regime?

Silvio Almeida - O Brasil nunca teve e n�o tem leni�ncia em rela��o a isso [...] O Brasil n�o deixa e n�o deixar� de reconhecer quando se est� diante de viola��o de direitos humanos. Mas leni�ncia, e eu acho que at� uma irresponsabilidade, seria fechar as possibilidades de que a gente possa dar um tratamento necess�rio para isso.

BBC News Brasil - Entendo que o senhor coloca a quest�o da manuten��o do di�logo como o motivo pelo qual o Brasil evita condenar frontalmente as viola��es que est�o acontecendo na Nicar�gua. Mas ao n�o faz�-lo, o governo n�o abre m�o de liderar?

Silvio Almeida - N�o, pelo contr�rio. O Brasil, diante de uma posi��o que privilegia o di�logo, ganha a possibilidade, inclusive, de liderar. Por que? Justamente porque fomenta o di�logo [...] O Brasil n�o ir� se calar diante de viola��o de direitos humanos.

BBC News Brasil - Mas ao n�o assinar (a declara��o), o Brasil n�o se cala?

Silvio Almeida - N�o, n�o se cala. O Brasil diz : "Vamos conversar. Vamos entender o que est� acontecendo, vamos chamar aqui as pessoas para falarem a respeito do que est� acontecendo e vamos tentar dar uma solu��o do problema que preserva, inclusive os direitos do povo nicaraguense".

BBC News Brasil - Nos governos do PT, a popula��o carcer�ria saiu de aproximadamente 300.000 pessoas para algo em torno de 622.000, segundo os dados oficiais. E essa maioria dessa popula��o, o senhor sabe, � composta, em sua maioria, por jovens negros. Os governos do PT erraram em sua pol�tica carcer�ria?

Silvio Almeida - Eu acho que n�o s�o apenas os governos do PT. A din�mica do Estado brasileiro se desenvolveu a partir de uma falsa ideia de que a puni��o seria, de alguma forma, o elemento fundamental do combate � criminalidade. Eu acho que isso � uma t�nica de praticamente todos os governos do Brasil e que certamente se d�, tamb�m, at� mesmo por in�rcia [...] O presidente Lula falou especificamente comigo sobre isso e me pediu que n�s pud�ssemos pensar no �mbito em formas de se fazer com que as pessoas que est�o presas e que n�o deveriam mais estar possam sair do sistema carcer�rio.


Mãos para trás de pessoa algemada
A popula��o carcer�ria do Brasil hoje � de aproximadamente 837 mil pessoas (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - O presidente pediu um plano para diminuir o encarceramento?

Silvio Almeida - Isso. Ele tem uma preocupa��o especial porque ele sabe os efeitos que isso provoca na sociedade.

BBC News Brasil - Como comunicar uma pol�tica p�blica nesse sentido para uma popula��o que sente um problema grave de seguran�a p�blica?

Silvio Almeida - Acho que isso � fundamental [...] A gente entende que n�o � uma discuss�o f�cil, mas ao mesmo tempo a gente entende tamb�m que o c�rcere n�o � uma solu��o e que os n�veis de encarceramento que o Brasil tem hoje n�o s�o uma solu��o para a seguran�a p�blica.

BBC News Brasil - H� uma a��o que tramita no STF parada h� alguns anos em que se discute a descriminaliza��o das drogas. O governo, de alguma forma, pretende conversar com o STF para que essa a��o seja julgada logo?

Silvio Almeida- Eu, particularmente, sou favor�vel a que essa a��o seja julgada e que essa quest�o seja resolvida no Brasil.

BBC News Brasil - O senhor � a favor da descriminaliza��o das drogas?

Silvio Almeida - Sou a favor. A guerra �s drogas � um preju�zo mortal. Ela (a guerra) � muito pior do que qualquer outro efeito que se possa pensar. N�s temos que pensar seriamente nisso, com responsabilidade, com cuidado. Mas eu acho que a guerra �s drogas, a forma com que se combate �s drogas, causa um preju�zo irrepar�vel na sociedade brasileira.

BBC News Brasil - O governo est� se mobilizando para conversar com o STF para que essa a��o seja pautada?

Silvio Almeida - N�o existe nenhuma quest�o relativa a isso, at� porque isso � parte do Minist�rio da Justi�a e Seguran�a P�blica [...] o que o Minist�rio dos Direitos Humanos e Cidadania faz, de fato, � pensar nos efeitos disso e pensar em como pode ser feita uma pol�tica nacional que envolva um debate s�rio a respeito dos efeitos perversos do encarceramento.

BBC News Brasil - Na sua opini�o, a descriminaliza��o das drogas contribuiria positivamente para o problema do encarceramento?

Silvio Almeida - Sim. Pautado na experi�ncia, na experi�ncia de outros pa�ses, temos que tratar isso como uma quest�o de sa�de p�blica, como uma quest�o que n�o se resolve por meio do encarceramento, com pris�o e com puni��o. Eu acho que as pesquisas mostram isso. Mas como eu falei, � um debate que tem que se fazer. � um debate muito s�rio e muito complexo que tem que ser feito com o Estado brasileiro em termos educacionais e pedag�gicos.

BBC News Brasil - A sociedade brasileira, hoje, est� preparada para isso?

Silvio Almeida - N�o est� preparada, mas � tarefa do Estado brasileiro, do governo brasileiro, preparar a sociedade para isso, uma vez que estamos falando de ci�ncia. N�o � uma quest�o de achismo. N�o � uma opini�o.

BBC News Brasil - Para fazer um contraponto, tamb�m h� estudos que mostram que a utiliza��o indiscriminada de drogas causa preju�zos � sa�de das pessoas…

Silvio Almeida - Descriminaliza��o de drogas n�o significa que n�o possa haver um controle sobre isso. A gente n�o pode confundir controle e regula��o com a quest�o criminal.

BBC News Brasil - Uma parte significativa da popula��o brasileira critica defensores de direitos humanos utilizando uma frase que j� ficou conhecida que diz: direitos humanos para humanos direitos. Como o senhor reage a esse tipo de alega��o?

Silvio Almeida - Falar de direitos humanos � falar, por exemplo, de como � poss�vel cuidar das crian�as, adolescentes, das mulheres, das pessoas idosas, das pessoas que est�o encarceradas e impedir que elas sejam submetidas a situa��o de tortura e de sev�cias. Esse � o ponto.

BBC News Brasil - Por que, ent�o, parte da popula��o brasileira n�o tem esse entendimento? Boa parte da popula��o brasileira reclama que s� ouve falar de direitos humanos quando o que eles chamam de a "turma dos direitos humanos" vai defender criminosos…

Silvio Almeida - Em primeiro lugar, h� um processo profundo de desinforma��o por parte de certos setores da vida pol�tica que se alimentam justamente dessa viol�ncia. Em segundo lugar, eu acho que h� tamb�m todo um hist�rico de um pa�s como o nosso que foi forjado no autoritarismo. Um pa�s em que a democracia e o respeito � vida tem uma densidade muito baixa [...] Em terceiro lugar, n�s somos um pa�s profundamente desigual.


Mulher indígena com bebê em frente ao Hospital de Campanha Yanomami montado na Casa de Saúde Indígena - Casai
Ministro negou que o governo esteja politizando a crise humanit�ria que afeta o povo ind�gena Yanomami ao atribuir a responsabilidade pela situa��o � gest�o de Bolsonaro (foto: Rovena Rosa/Ag�ncia Brasil)

BBC News Brasil - Um dos argumentos de quem critica a chamada "turma dos direitos humanos" � que o governo e a esquerda n�o se pronunciam quando h� viola��es de direitos humanos praticadas contra agentes de seguran�a. Minha pergunta objetiva para o senhor �: este minist�rio pensa em pol�ticas para defesa de agentes de seguran�a?

Silvio Almeida - Eu gosto muito de lembrar da Marielle Franco (vereadora pelo Rio de Janeiro que foi assassinada a tiros em 2018 junto com o motorista Anderson Gomes) porque quando ela foi assassinada, falou-se muito que ela n�o se preocupava com os policiais. � curioso que na disserta��o de mestrado dela, ela fala justamente de duas mulheres negras que tiveram sua vida ceifada e que eram policiais.

Ou seja, o pessoal dos direitos humanos tamb�m se preocupa com a vida dos policiais [...] Quando n�s assumimos, tivemos a ideia de criar o estatuto das v�timas de viol�ncia, que � justamente um regramento que n�s esperamos que se converta num plano nacional e tamb�m em um anteprojeto de lei, a ser avaliado tamb�m pelo Presidente da Rep�blica.

Ele visa, justamente, dar acolhimento e prote��o para as pessoas que s�o v�timas de viol�ncia, sejam elas cidad�os comuns, civis ou sejam policiais. � fundamental que se pense nos policiais.

BBC News Brasil - O senhor afirmou recentemente que o ex-presidente Bolsonaro "normalizou" a morte. Entretanto, no mandato dele, houve uma queda significativa no n�mero de homic�dios no pa�s. N�o � uma contradi��o dizer que o presidente Bolsonaro normaliza a morte, quando, na realidade, a gente percebe uma redu��o na taxa de homic�dios no pa�s?

Silvio Almeida - � s� a gente pensar, por exemplo, no que foi a pandemia (de Covid-19). Eu acho que � s� a gente pensar no que foi o discurso de �dio. Veja s�: a queda na taxa de homic�dios n�o quer dizer que haja tamb�m uma redu��o na viol�ncia [...] Acho que h� outros elementos que levaram a essa redu��o das taxas de homic�dio.

Mas nem toda viol�ncia se resume �s taxas de homic�dio. Nem toda morte se reduz a esse n�mero. E quero lembrar tamb�m dos 700 mil mortos na pandemia.

BBC News Brasil - O governo e o senhor afirmam que encontraram ind�cios de genoc�dio contra o povo Yanomami. Mas a crise humanit�ria que afeta os yanomami � anterior a esse governo. Atribuir o atual cen�rio apenas ao governo Bolsonaro n�o � politizar essa crise?

Silvio Almeida - N�o, n�o � politizar essa crise. Por certo se trata de um problema de car�ter hist�rico. � hist�rico essa aus�ncia de pol�ticas estatais de prote��o �s popula��es ind�genas, s� que nunca se viu, em tempos recentes, esse tipo de a��o deliberada para permitir que isso aconte�a.

BBC News Brasil - Isso o que? Genoc�dio?

Silvio Almeida - A Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 2022, proferiu uma decis�o que reconhecia que havia gravidade, urg�ncia e perigo de dano irrepar�vel em rela��o � situa��o dos direitos humanos (dos yanomami).

O que fez o governo? Primeiro, negou que houvesse esses tr�s requisitos e nada fez [...] ent�o eu n�o vejo no per�odo recente nem nada parecido com esse tipo de omiss�o. E outra: tivemos o incentivo � atividade do garimpo.

BBC News Brasil - No Congresso, est� se formando uma comiss�o para investigar e avaliar o que aconteceu na terra ind�gena Yanomami. Uma das senadoras que j� demonstrou interesse em participar � a ex-ministra dos Direitos Humanos Damares Alves. O senhor disse ver com preocupa��o essa possibilidade. Por que?

Silvio Almeida - Porque a Damares foi minha antecessora na antiga configura��o do minist�rio. E me parece que alguns dos pareceres, e o relat�rio vai mostrar(o minist�rio prepara um relat�rio final sobre a situa��o do povo yanomami), foram feitos durante a gest�o dela.

Vejo com preocupa��o diante do fato de que era uma ministra dos Direitos Humanos e que nada fez mesmo sabendo a situa��o. Acho que � natural que eu veja com preocupa��o o fato de que algu�m que pode ter se omitido gravemente em rela��o aos fatos que aconteceram esteja agora em uma comiss�o justamente para olhar para esse problema.

BBC News Brasil - O senhor acha, ent�o, que Damares � suspeita e, por isso, n�o deveria participar da comiss�o?

Silvio Almeida - A ministra Damares foi uma das principais respons�veis por conduzir o minist�rio justamente no per�odo em que o minist�rio tinha o dever de se pronunciar e de agir diante de fatos de alt�ssima gravidade. Ent�o, uma vez estando implicada nesses fatos, seria interessante (que ela n�o participasse da comiss�o). Mas, isso � o Senado que vai ter que resolver se esses fatos v�o ser olhados por quem n�o participou diretamente ou indiretamente das quest�es envolvidas.

BBC News Brasil - Conservadores e militantes contra o aborto afirmam que eles defendem os direitos humanos do nascituro. H� uma discuss�o sobre o Estatuto do Nascituro no Congresso. Queria saber se o senhor concorda com essa alega��o. Os direitos dos direitos humanos do nascituro devem prevalecer sobre os direitos da mulher?

Silvio Almeida - Eu vou responder de uma maneira bastante espec�fica, porque acho que essa � uma discuss�o que deve ser feita primordialmente pelas mulheres, que s�o as mais afetadas pelas pol�ticas de sa�de p�blica. Ou melhor: pela falta de pol�ticas de sa�de.

BBC News Brasil - Significa que, na sua avalia��o, o aborto no Brasil deveria ser legalizado?

Silvio Almeida - Significa que, na minha avalia��o, s�o as mulheres que devem decidir sobre isso. Elas devem ser livres para decidir sobre isso. Chega de homens dando opini�o sobre a vida, sobre o corpo e sobre a sa�de das mulheres.

BBC News Brasil - O senhor � favor da legaliza��o do aborto?

Silvio Almeida - Sou a favor de que as mulheres decidam.

Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/articles/c036d04n6ezo


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