
Lisboa — A despeito de todas as pol�micas em torno de declara��es referentes � guerra da R�ssia com a Ucr�nia e dos protestos da extrema-direita, o embaixador do Brasil em Portugal, Raimundo Carreiro, acredita que o presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT) saiu maior do que � de sua visita de cinco dias ao pa�s europeu. "Houve ganhos tanto do ponto de vista econ�mico, com o fechamento de v�rios acordos, quanto do pol�tico, pois resultou na reinser��o do Brasil como pot�ncia no debate internacional. O Brasil voltou a ter voz", afirma.
Para Carreiro, os desafios a partir de agora s�o manter as conquistas. "� preciso acompanhar todos os acordos assinados, para que, efetivamente, passem a valer e, claro, avan�ar em outros pontos relevantes, como o pacto entre o Mercosul e a Uni�o Europeia", diz. O primeiro-ministro de Portugal, Ant�nio Costa, assumiu a posi��o de ponta de lan�a para que a parceria entre os dois blocos econ�micos, cujas negocia��es se arrastam por mais de 20 anos, finalmente saia do papel. Na Espanha, que assumir� a presid�ncia da UE a partir de julho, o primeiro-ministro, Pedro S�nchez, definiu o acordo comercial como prioridade.
O embaixador assinala que o estreitamento dos la�os entre Brasil e Portugal � fundamental, dado o crescimento do n�mero de brasileiros em territ�rio luso. Com a concess�o autom�tica das autoriza��es de resid�ncia, processo que passou a vigorar em 13 de mar�o �ltimo, a comunidade de cidad�os legalizados do Brasil vivendo no pa�s europeu saltou de 233 mil, em dezembro de 2022, para quase 340 mil. "Temos muitos projetos em comum, seja na economia, seja na educa��o, na sa�de e na cultura", destaca.
Carreiro enfatiza que, com a viagem de Lula, recebido em Portugal com todas as honras de chefe de Estado, d� por cumprida a sua miss�o como embaixador, iniciada h� quase um ano e meio. Ele ressalta o desejo de retornar ao Brasil para contribuir com o governo. "Disse isso ao presidente, mas, caso a op��o seja pela minha continuidade � frente da embaixada, o trabalho continuar� da mesma forma, sempre priorizando os interesses brasileiros", ressalta. A seguir, os principais trechos da entrevista ao Correio.
Como o senhor avalia a visita do presidente Lula a Portugal?
Com certeza, foi vitoriosa. Brasil e Portugal sempre foram pa�ses muito pr�ximos, mas que andavam afastados nos �ltimos anos. Tenho certeza de que, com todos os acordos que foram fechados entre os dois pa�ses — foram 13 — e com a retomada do di�logo pol�tico, o presidente saiu muito maior do que j� era quando chegou em Portugal. O Brasil recuperou o seu papel de pot�ncia dentro do debate internacional.
Mas houve percal�os, com cr�ticas �s declara��es do presidente de que a Ucr�nia � t�o culpada pela guerra quanto a R�ssia e os protestos organizados pelo Chega?
O presidente Lula refor�ou que o Brasil � contra a invas�o da Ucr�nia pela R�ssia e que est� disposto a liderar um grupo de pelo menos 20 pa�ses para negociar a paz na regi�o. Isso ficou claro. Nos reunimos, na embaixada, com representantes da comunidade ucraniana que vive em Portugal. Ali foi anunciado que o ex-chanceler Celso Amorim, assessor internacional da Presid�ncia da Rep�blica, ir� � Ucr�nia para uma conversa com o presidente daquele pa�s (Volodimir Zelenski). Com rela��o aos protestos do Chega, houve apoio maci�o ao presidente e condena��o aos deputados que desrespeitaram um chefe de Estado estrangeiro, convidado para falar no Parlamento. Do lado de fora da Assembleia, havia pouco mais de 500 pessoas protestando, muito longe da maior manifesta��o da hist�ria de Portugal prometida pela extrema-direita. Vimos, ainda, um presidente Lula tranquilo, preocupado em acalmar o presidente do Parlamento (Augusto Santos e Silva). O presidente cumpriu seu papel como l�der que sempre foi.
Dos 13 acordos assinados entre Brasil e Portugal, quais o senhor destacaria?
Na educa��o, finalmente, chegou-se a um entendimento para que diplomas de estudantes brasileiros e portugueses sejam reconhecidos automaticamente nos dois pa�ses. Esse tema se arrastava desde 2018. No nosso caso, t�nhamos mais de 5 mil processos pendentes, dificultando a vida de trabalhadores e estudantes. Na sa�de, ficou acertado, por exemplo, que a Fiocruz construir� uma f�brica de medicamentos e vacinas em Portugal, movimento que pode se estender aos pa�ses da Comunidade da L�ngua Portuguesa. Nos direitos humanos, houve acordos para prote��o de testemunhas e de respeito �s pessoas com defici�ncias. H� que se destacar, ainda, o acordo operacional entre a Embraer e a Ogma, empresa portuguesa, para a produ��o e manuten��o dos avi�es de defesa Super Tucano, j� seguindo os par�metros da Organiza��o do Tratado do Atl�ntico Norte (Otan).
Mas ainda h� muito a avan�ar, em especial no acordo Mercosul-Uni�o Europeia...
Portugal e Espanha, ressalte-se, defendem que o acordo seja fechado rapidamente. O presidente Lula disse que h� poucos detalhes a serem definidos. Creio que tudo est� muito bem encaminhado nesse sentido. Al�m disso, nos pr�ximos 30 dias, devemos finalizar o acordo com Portugal para reconhecimento das carteiras de motoristas dos dois pa�ses. Estava quase tudo certo isso ser assinado durante a visita do presidente Lula, mas acabou n�o saindo.
A comunidade brasileira n�o para de crescer em Portugal. O que esperar desse movimento?
Temos trabalhado incansavelmente para que todos os problemas � comunidade sejam sanados. Nos empenhamos muito para que Portugal seguisse o acordo de mobilidade que havia assinado com o Brasil e a CPLP. Isso permitiu que, em mar�o �ltimo, fosse lan�ada a plataforma para a concess�o autom�tica de resid�ncia a brasileiros que estavam esperando pelo documento h� dois anos. Desde ent�o, mais de 100 mil brasileiros foram regularizados. Tenho que ressaltar que o governo de Portugal tem sido muito sens�vel em rela��o �s nossas demandas. Durante as elei��es brasileiras, no ano passado, o metr� anunciou que fecharia a esta��o que d� acesso � Universidade de Lisboa, onde a vota��o aconteceria, para obras. Liguei para o presidente da empresa e, imediatamente, o fechamento foi suspenso. E assim tem sido em todas as nossas demandas, sempre que poss�vel.
A estrutura para a visita de Lula a Portugal foi enorme…
Com certeza, mas tudo transcorreu da melhor forma poss�vel. A comitiva tinha mais de 60 pessoas e tudo seguiu como o previsto, na seguran�a e no suporte ao presidente. Parlamentares realizaram os encontros pretendidos. Ministros cumpriram todas as agendas. A entrega do Pr�mio Cam�es ao cantor Chico Buarque foi um sucesso. Na recep��o ap�s o recebimento do pr�mio, houve um fato in�dito: as presen�as do presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, e do primeiro-ministro na festa. Esper�vamos 60 pessoas e compareceram 160.
O senhor tem demonstrado desejo de retornar ao Brasil…
Sim, como embaixador, receber o presidente da Rep�blica no pa�s onde se est� acreditado � a maior das miss�es. J� expressei ao presidente Lula o meu desejo de retornar ao Brasil para uma fun��o no governo que contribua para o pa�s. Mas se o desejo dele for o de que eu continue como embaixador em Portugal, permanecerei executando meu trabalho com toda a dedica��o.