
Mas, apesar da inelegibilidade valer a partir de agora, independentemente de recursos, essa disputa judicial dificilmente se encerrar� por aqui.
Bolsonaro pode apresentar por meio de sua defesa recursos no pr�prio TSE e j� anunciou que poder� acionar o Supremo Tribunal Federal (STF). Tudo depende da estrat�gia que a defesa escolher, conforme explicam especialistas.
� BBC News Brasil, o advogado de Bolsonaro, Tarc�sio Vieira, afirmou nesta sexta ap�s o julgamento que vai esperar a publica��o oficial da decis�o para decidir qual caminho seguir�.
A inelegibilidade significa que, daqui pra frente, o ex-presidente n�o pode se candidatar a nenhum cargo eletivo at� outubro de 2030, mas ainda pode continuar filiado ao seu partido e receber sal�rio da sigla.
Essa puni��o tampouco traz restri��es � express�o de opini�es por Jair Bolsonaro, de acordo com os entrevistados.
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Por outro lado, segundo o cientista pol�tico Jefferson Barbosa, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), a inelegibilidade n�o deve interromper a influ�ncia e a carreira pol�tica de Bolsonaro, que se tornou uma figura central na direita brasileira e tem herdeiros pol�ticos pr�ximos, a come�ar pelos seus pr�prios filhos: Carlos Bolsonaro (Republicanos) � vereador no Rio de Janeiro; Eduardo Bolsonaro, deputado federal (PL-SP); e Fl�vio Bolsonaro, senador (PL-RJ).
Ao mesmo tempo, o caso julgado no TSE — referente a uma reuni�o em julho de 2022 com embaixadores e representantes de v�rios pa�ses transmitida pela TV Brasil, na qual ele colocou em d�vida a seguran�a do sistema eleitoral brasileiro — � apenas um de v�rios processos contra Bolsonaro n�o s� na Justi�a eleitoral, mas tamb�m na Justi�a comum.
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Al�m disso, ele � alvo de inqu�ritos no STF, que l� permaneceram mesmo ap�s a perda do foro privilegiado porque fazem parte de grandes investiga��es que j� estavam tramitando na Corte, como os chamados inqu�ritos das mil�cias digitais e das not�cias falsas.

Somente no TSE, h� um total de 18 a��es de Investiga��o Judicial Eleitoral (AIJE) contra Bolsonaro, incluindo a julgada agora. As AIJEs tratam de acusa��es de abuso de poder nas elei��es e t�m como pena a inelegibilidade - caso Bolsonaro venha a ser novamente condenado, no entanto, n�o haver� acr�scimo no per�odo em que ficar� ineleg�vel.
Segundo o Partido Democr�tico Trabalhista (PDT), que apresentou a a��o julgada desde a quinta-feira (22) da semana passada, a reuni�o com embaixadores fez parte de uma campanha sistem�tica do ent�o presidente para minar a credibilidade do sistema eleitoral, visando questionar o resultado da elei��o em caso de derrota.
O argumento foi endossado pelo Minist�rio P�blico Eleitoral (MPE) na a��o.
J� a defesa de Bolsonaro defendeu no tribunal que o ent�o presidente estava protegido pela liberdade de express�o e conduziu a reuni�o com a inten��o de "aprimorar o processo de fiscaliza��o e transpar�ncia do processo eleitoral”.
O relator da a��o no TSE, Benedito Gon�alves, acatou o argumento e foi acompanhado por 5 dos 7 ju�zes da corte.
A BBC News Brasil pediu entrevista para tr�s parlamentares do PL sobre a situa��o jur�dica e pol�tica de Bolsonaro, mas eles preferiram n�o se pronunciar.
Recursos no TSE e STF
O primeiro e mais �bvio recurso que a defesa de Bolsonaro tem � no pr�prio TSE, onde pode apresentar os chamados embargos de declara��o.
"Os embargos de declara��o servem pra voc� suprir uma omiss�o, uma lacuna no voto, uma obscuridade, uma d�vida, ou para corrigir um erro material... � um recurso dirigido ao pr�prio �rg�o que julgou", explica Jamile Coelho, advogada especializada em Direito Eleitoral, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Pol�tica (Abradep) e desembargadora eleitoral substituta no Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL).
Os embargos de declara��o devem ser apresentados no prazo de tr�s dias ap�s a publica��o da decis�o a ser contestada.
A princ�pio, o plen�rio do tribunal teria que avaliar o recurso dentro de cinco dias. Este prazo para os ju�zes, por�m, n�o costuma ser seguido na pr�tica, afirma a especialista.
"O Minist�rio P�blico, os advogados t�m que entrar [com o recurso] no prazo, sob pena de n�o acessar aquele direito. Mas os prazos dos ju�zes s�o sempre impr�prios, ou seja, n�o tem nenhuma puni��o se n�o forem seguidos."
Mas tanto Coelho quanto o professor de Direito da Funda��o Get�lio Vargas (FGV) Wallace Corbo afirmam que os embargos normalmente s�o julgados rapidamente e dificilmente alteram o resultado de um julgamento — ainda mais no caso em quest�o.
"� muito dif�cil que, em um caso t�o complexo, que demandou tanta an�lise do TSE, que haja uma mudan�a de entendimento por conta desse recurso", aponta Corbo, doutor em Direito P�blico pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Mesmo que n�o mude o resultado, � esperado que a defesa de Bolsonaro acione esse recurso porque � um caminho natural dentro do pr�prio TSE e porque protelar essa disputa judicial pode dar margem para Bolsonaro continuar se apresentando como um candidato vi�vel at� que n�o haja mais recursos poss�veis.
Outra alternativa jur�dica � disposi��o de Bolsonaro � o recurso extraordin�rio no Supremo Tribunal Federal (STF), que seria julgado pelo plen�rio da Corte.
Assim como o embargo de declara��o, este recurso n�o suspenderia a inelegibilidade do ex-presidente.
"� um recurso em que se alega algum tipo de viola��o � Constitui��o, e a� o Supremo seria o respons�vel por julgar esse recurso e manter a decis�o do TSE, ou mudar em algum aspecto a decis�o", diz Corbo.
"Em um caso, por exemplo, que envolva o Direito Eleitoral, uma parte pode alegar que o entendimento do TSE violou seus direitos pol�ticos previstos na Constitui��o, que violou o devido processo legal."

Corbo explica que a defesa s� pode apresentar um recurso por decis�o judicial, portanto, dever� escolher se acionar� os embargos de declara��o no TSE ou o recurso extraordin�rio no STF.
Mas Coelho lembra que h� uma ordem pra isso: os embargos de declara��o precedem o recurso extraordin�rio — ou seja, n�o pode ocorrer a ordem contr�ria, com recurso primeiro no STF e depois voltando para o TSE. Ent�o os caminhos poss�veis s�o a defesa entrar com um recurso primeiro no TSE e depois no STF, ou acionar direto o STF.
Coelho acredita que a defesa de Bolsonaro vai seguir com o recurso primeiro no TSE.
"Em regra, se entra com os embargos de declara��o, at� para voc� delimitar o que voc� quer jogar para o Supremo Tribunal Federal", diz a advogada.
Ela acrescenta que o recurso extraordin�rio n�o analisa mais provas, apenas a quest�o da constitucionalidade.
A advogada avalia que as pr�prias diverg�ncias no julgamento do TSE devem ser aproveitadas no recurso — como a pol�mica inclus�o da chamada minuta golpista no processo, j� que esse fato vai al�m do escopo principal da AIJE julgada no TSE, referente � reuni�o com embaixadores em julho de 2022.
O futuro pol�tico de Jair Bolsonaro ap�s a inelegibilidade
Em um encontro do PL na semana passada, Jair Bolsonaro falou que est� pensando em se candidatar a vereador pelo Rio de Janeiro em 2024 e depois, "se estiver vivo at� l� e tamb�m eleg�vel", tentar a Presid�ncia em 2026.
Ele minimizou a inelegibilidade determinada pelo TSE afirmando que o contexto poderia mudar.
"S� por curiosidade, o presidente do TSE em 2026 ser� o Kassio Nunes, que eu indiquei. O vice-presidente do TSE em 26 [2026] ser� o terrivelmente evang�lico Andr� Mendon�a, que eu indiquei. As coisas mudam", disse o ex-presidente.
Dias depois, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo publicada segunda-feira (26), Bolsonaro admitiu que poderia ficar ineleg�vel, mas afirmou que pretendia seguir na vida p�blica. J� nesta sexta ele falou em recorrer ao STF contra decis�o j� esperada.
Quando perguntado sobre poss�veis sucessores, ele demonstrou timidamente que poderia apoiar alguns nomes que t�m sido apontados para esse posi��o — como sua pr�pria mulher, Michelle Bolsonaro, e o atual governador de S�o Paulo, Tarc�sio de Freitas (Republicanos).
"Se ela quiser, ela pode sair candidata. Mas o que eu converso com a Michelle � que ela n�o tem experi�ncia", disse sobre a ex-primeira dama.
Sobre o governador de S�o Paulo, Bolsonaro o descreveu como um "excelente gestor" e, perguntado sobre se o apoiaria como candidato � Presid�ncia, respondeu: "Pode ser. Teria que conversar com ele".
Para o cientista pol�tico Jefferson Barbosa, independente do resultado no TSE e da manuten��o ou n�o da inelegibilidade ap�s recursos, Bolsonaro capitalizaria sobre a situa��o.
"Como her�i ou como m�rtir, a imagem vai trazer seus dividendos. � claro que, para o partido [PL] � muito melhor o ex-presidente como candidato. Entretanto, se n�o ocorrer, toda esta simbologia e esse peso do mito pol�tico vai render cr�ditos para aquele que se al�ar a herdeiro para o pr�ximo processo eleitoral”, aponta Barbosa, doutor pela Unesp e professor na institui��o.
O cientista pol�tico destaca que, mesmo antes do julgamento, a imagem de Bolsonaro como uma v�tima do sistema j� estava sendo impulsionada nas bases sociais — online e offline — de seus apoiadores.
"Toda a sua base eleitoral, seus militantes mais aguerridos, os chamados bolsonaristas, ter�o muni��o para trabalhar a imagem da condena��o do ex-presidente. A ideia do mito Bolsonaro ganha ent�o novos ingredientes: o m�rtir, aquele que foi atacado por for�as que est�o trabalhando contra o que eles colocam como o 'povo brasileiro'".

Para o especialista, a inelegibilidade de Bolsonaro n�o o torna um peso morto para o PL — pelo contr�rio, porque o ex-presidente vai mais uma vez, com este novo epis�dio, “aglutinar for�as” da direita e da direita radical.
“� curioso o pr�prio p�ndulo do Partido Liberal: ele esteve na alian�a governamental petista e, agora, est� com o bolsonarismo, simplesmente pela rentabilidade da imagem deste e deste movimento”, diz Barbosa.
"Parece que o Partido Liberal e os seus congressistas est�o aderindo cada vez mais a esta pauta da moral, dos costumes, da religi�o. Porque isto garante votos.”
Para o cientista pol�tico, a inelegibilidade de Bolsonaro tem dura��o incerta n�o s� pela possibilidade de recursos judiciais, mas tamb�m pela pr�pria instabilidade do contexto pol�tico e social do Brasil.
"Podemos lembrar, por exemplo, que um [ex-]presidente ser condenado hoje nada garante que ele ficar� ineleg�vel pelos pr�ximos oito anos. Afinal, os rumos pol�ticos brasileiros t�m sido muito inst�veis nos �ltimos anos. O pr�prio atual presidente Lula teve seus direitos pol�ticos cassados, foi preso, e a base de apoiadores de Bolsonaro n�o levava em conta a possibilidade da sua candidatura, muito menos sua vit�ria eleitoral.”
Barbosa diz que, com base em fatos ocorridos na pol�tica brasileira nos �ltimos anos, elementos como a press�o social e do Legislativo podem eventualmente afetar os rumos da inelegibilidade de Bolsonaro — uma combina��o complexa de fatores como a que levou ao impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016 e � pris�o e absolvi��o de Lula.
Um exemplo j� vis�vel dessa press�o via Legislativo � a mobiliza��o liderada pelo deputado federal Sanderson (PL-RS), o qual anunciou que pretende apresentar um projeto de lei para anistiar todos os crimes eleitorais que n�o tenham envolvido viol�ncia e corrup��o no pleito de 2022 — algo que poderia beneficiar diretamente Bolsonaro.
Barbosa lembra que o governo atual do PT foi formado por uma frente ampla heterog�nea e tem dificuldades de articula��o com o Congresso, o que pode contribuir para instabilidades.
Ele destaca tamb�m a poss�vel influ�ncia no Brasil do cen�rio internacional, sobretudo nos Estados Unidos, onde o republicano Donald Trump pretende se candidatar novamente � Presid�ncia em 2024 em meio a diversas investiga��es e processos judiciais, inclusive pelo ataque ao Capit�lio em janeiro de 2021 — semelhante em v�rios pontos ao ocorrido em 8 de janeiro em Bras�lia.
"Temos ent�o, um momento de incertezas. Desde a situa��o do trumpismo, se ele vigorar�, aos rumos da economia brasileira", diz o cientista pol�tico.