
“A vida � sempre mudan�a e, no balan�o entre n�s e o mundo, se n�o acompanharmos esse compasso, ficamos defasados. Ent�o, � sempre fundamental uma mudan�a na nossa rela��o com o mundo, com os outros e com n�s mesmos.” O pensamento � da psiquiatra e psicanalista Gilda Paoliello. Ela explica que, �s vezes, isso ocorre de forma natural, em outras, as mudan�as se imp�em, seja sobre a forma de desejo seja por necessidade. “Quando n�o conseguimos acompanhar ou provocar essas mudan�as, elas acabam se impondo e at� nos atropelando, sob a forma do inesperado, que, muitas vezes, � uma cr�nica anunciada, evidente para todos, menos para n�s mesmos. Seja porque nos negamos a enxerg�-la, seja porque nos acomodamos a uma suposta garantia.” Exemplos? Relacionamentos falidos que s�o sustentados pelo medo do novo, seja no �mbito amoroso, seja no social ou profissional. “Amar e trabalhar s�o as duas coordenadas que definem nossa vida, temos que saber cuidar bem delas e esse cuidado inclui tamb�m coragem para rompimentos e reinven��es.”
H� sempre os dois lados da moeda, quem gosta e quem detesta mudar. Gilda Paoliello lembra que todos conhecemos pessoas inquietas, que est�o sempre se movimentando, se inovando, se recriando. E outras inflex�veis, que sofrem com as m�nimas mudan�as, at� com a troca do lugar habitual num restaurante. “Lembram-se de Melvin, personagem de Jack Nicholson no filme Melhor imposs�vel? Essas pessoas parecem querer congelar o mundo para n�o ser surpreendidas por nada, mesmo quando percebem que algo est� errado, preferindo continuar na suposta garantia da previsibilidade. Entretanto, “nada � permanente, exceto a mudan�a”, como nos ensina, h� mil�nios, Her�clito de �feso.”
Gilda Paoliello diz que viver � muito perigoso, � preciso correr riscos, pois as surpresas n�o mandam aviso pr�vio. “� nos desgarrando das garantias que aprendemos a reconhecer a hora certa de nos lan�ar, deixando de lado os velhos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. Alguns trazem essas caracter�sticas no DNA, outros, a duras penas, aprendem a romper com velhos padr�es, enquanto outros resistem �s mudan�as, pois a tend�ncia do ser humano � a repeti��o. Ningu�m encontra um caminho pronto e nossa �poca � de caminhos sinuosos, j� que as tradi��es lineares foram quebradas. � sempre melhor nos mexermos!”
Conforme a psiquiatra, a decis�o de mudar implica cis�o, corte, o que pode ser doloroso. “Significa deixar pra tr�s partes de nossa vida que estavam emperradas, que mantinham abertas feridas ou que estavam presas em repeti��es desgastantes e improdutivas, mas �s quais nos acomod�vamos por nos serem familiares e, aparentemente, c�modas. Tentar de novo sempre � importante, mas se tentarmos da mesma forma, permanecendo na repeti��o malsucedida, estaremos nos condenando ao fracasso. Ent�o, a sa�da � tentar o novo. Inven��o � a palavra-chave para a mudan�a.”
ARTE DAS ESCOLHAS
Gilda Paoliello enfatiza que decidir cortar fora o que n�o est� dando certo implica tamb�m eliminar outras possibilidades. “Mudar � escolher e toda escolha implica perdas. Quantas vezes ouvimos “ruim como estava, pior como ficou!”. Assim s�o nossas escolhas que definem a vida. Contam que um poeta nada talentoso pediu a Bocage que lhe corrigisse um poema. Este o devolveu intacto, dizendo: “Seria pior a emenda que o soneto...” Ent�o, vamos caprichar nos versos com que escrevemos nossas vidas, para n�o precisar de emendas. Drummond dizia que “escrever � a arte de cortar palavras”, pois bem, viver � a arte de fazer escolhas.”
Sem meias palavras, a psicanalista enfatiza que lutar contra a mudan�a � permanecer no sofrimento: “Errar � humano, mas permanecer no erro � burrice! Reinvente-se! O mundo � muito mais do inventor que do doutor.”
Por outro lado, a mudan�a tem de partir de cada um. Gilda Paoliello lembra que � uma tend�ncia demasiadamente humana querer mudar o outro em vez de mudar a si mesmo. “Os defeitos alheios nos incomodam mais que os nossos pr�prios, mas corrigi-los n�o depende de n�s, corrigir os nossos sim! Achar sempre que a mudan�a deve estar no outro � acreditar que temos uma verdade universal. Respeitarmos os diferentes pontos de vista � essencial para sair de um apego ego�sta. Muitas vezes, nosso maior inimigo, que nos mant�m na ignor�ncia e numa posi��o equivocada, somos n�s mesmos. Outra tend�ncia � esperar que o tempo resolva nossa pr�pria vida, o que seria nos desresponsabilizar do nosso pr�prio destino. A transforma��o do mundo come�a a partir de cada um de n�s. E toda mudan�a acaba por provocar um “efeito domin�”, desacomodando os que est�o por perto.”
Com a chegada de 2019, Gilda Paoliello destaca que “o ano novo nos traz a oportunidade de pegar carona na mudan�a de tempo, refor�ando nossa fantasia de que mudamos com ele. A zerada no calend�rio nos possibilita o “pensar daqui pra frente”, zerando tamb�m as disc�rdias, as diferen�as e estabelecendo esperan�as: teremos a chance de mais um ano para concretizar as mudan�as. Por outro lado, o fim de ano, por ser uma virada, apontando o que acaba e o que nasce, � tempo de balan�o: pesar o que planejamos e o que foi feito, o que desejamos e o que conquistamos. Na maior parte das vezes, ficamos presos ao que faltou e, com isso, deixamos de festejar ou de usufruir o que conquistamos e a balan�a vai pender para o negativo. Devemos, ent�o, festejar as conquistas. � importante essa esperan�a e oportunidade de transforma��o. Estar em dia com o pr�prio desejo, querer realiz�-lo, usar a esperan�a para construir a oportunidade de transforma��o � uma medida de nossa sa�de mental.”
quatro perguntas para...
Channa Vasco
especialista em carreira e sucesso profissional
Qual o poder da mudan�a sobre as pessoas?
� uma oportunidade de reflex�o sobre onde est� o caminho a seguir. Muitas vezes, ela simplesmente ocorre e o primeiro passo � aceitar, depois refletir e, em seguida, planejar como seguir. Os sonhos devem ser altos, aprendi com meu pai. O grande desafio na vida � construir os degraus para alcan��-los de maneira segura e s�lida. Deve ser por isso que escolhi a carreira que tenho, largando uma posi��o executiva, onde liderava mais de 1.500 pessoas e administrava um or�amento milion�rio, para fazer com que as pessoas alcancem seus sonhos.
Toda mudan�a, obrigatoriamente, � para melhor?
Nem toda mudan�a � para melhor, mas toda mudan�a o aproxima de uma melhoria. Quando uma crian�a est� aprendendo a andar, ela cai. Isso n�o � melhor do que ficar engatinhando, mas, se n�o cair, n�o vai aprender a se equilibrar e n�o vai conseguir andar, nem correr. Por isso, � importante interpretar o erro como aprendizado, assim, crescemos a cada tentativa. Ent�o, no fim das contas, a longo prazo, as mudan�as de hoje, quando superadas, o levar�o a uma melhoria na vida.
� poss�vel saber a hora certa de mudar?
Sim, a hora certa de mudar � agora! Se voc� j� criou em sua mente uma nova realidade, � o momento de voc� analisar os recursos necess�rios (emocionais, f�sicos, de a��o, apoio etc.) e criar um plano para transformar o sonho em realidade. N�o quer dizer que voc� vai terminar de ler aqui e j� ir pedindo demiss�o para seguir seus sonhos e ter sucesso e felicidade no trabalho, se esse for o prop�sito. Mas a grande pergunta �: o que voc� pode fazer agora mesmo para alcan�ar a mudan�a desejada?. Mesmo que pare�a ser algo pequeno e simples, vai ser mais um passo para aproxim�-lo do objetivo. Todos os dias, atendo pessoas que desejam mudar e conquistar uma vida com mais sucesso e felicidade. Todas elas t�m em comum uma certeza: n�o de que vai dar certo, afinal, n�o d� para controlar isso, mas de que desejam uma vida diferente e melhor.
Mudar � sempre correr risco?
Claro. Ao mudar voc� est� trocando o certo pelo duvidoso, o que voc� j� conhece por algo novo. E � exatamente isso que paralisa muitas pessoas numa situa��o desconfort�vel, mas conhecida. O que se pode fazer � reduzir as d�vidas e as novidades. Se quer mudar de emprego, voc� pode pesquisar outras empresas; se quer mudar de profiss�o, busque conhecer melhor outras �reas de atua��o; ou, se preferir empreender, voc� pode conversar com empres�rios, para diminuir as d�vidas e correr menos riscos. � o que falo para meus clientes, �s vezes d� medo de fazer algo novo, ent�o, a gente bota a fralda e vai com medo mesmo. Se der algum problema, a fralda protege. � preciso conhecer os riscos e se proteger deles. Esta � a ess�ncia do meu trabalho: conquistar sucesso e felicidade apesar do medo do incerto, de se expor, de arriscar etc. O segredo para lidar com os riscos n�o � se jogar de maneira inconsequente, mas de calcular os pr�s e os contras antes de fazer algo. Afinal, o seu sonho pode ser sempre maior do que o seu medo. E isso � uma escolha.
depoimento
Prof. Me. Renato Collyer
soci�logo, jurista e professor
nas �reas de �tica e sociologia
Virtudes e valores incorrupt�veis
“A �nica coisa que n�o muda � que tudo muda.
A ideia do devir na filosofia de Her�clito”
“Mais um ano j� surge no calend�rio e, novamente, muitas pessoas come�am a fazer novos planos e, com eles, novas promessas. Talvez, de come�ar uma faculdade, levar a s�rio a academia, cuidar da alimenta��o ou, simplesmente, de ser uma pessoa mais toler�vel e amig�vel com os outros. Ainda que a linearidade da vida cotidiana nos coloque em uma esp�cie de c�rculo de habitualidade, a verdade � que nada na vida permanece para sempre. Tudo muda e isso � a �nica coisa que n�o muda. Os fil�sofos que antecederam o famoso pensador S�crates, por isso chamados de pr�-socr�ticos, tinham uma ideia bastante refinada da inconst�ncia da natureza. Em especial, Her�clito (540 a.C.), que dizia que tudo que existe est� em transforma��o. Para ele ‘nada � permanente, exceto a mudan�a’. Mas n�o pense que isso � algo ruim. Embora Her�clito n�o fosse muito simp�tico (o que lhe custou o apelido de ‘Obscuro’), � na mudan�a que encontramos o equil�brio. Para ele, o fluxo permanente entre os opostos produz a harmonia do universo. Basta pensarmos que, mesmo algo ruim, como ficar longe de quem amamos, pode representar uma coisa boa, j� que passamos a valorizar mais sua presen�a, pois a saudade (valoriza��o da presen�a) s� pode existir diante da dist�ncia (fato ruim). Por�m, n�o se sinta culpado por querer que nada mude. Muitas pessoas n�o gostam de mudan�as. Entenda, por�m, que as mudan�as fazem parte da vida, voc� as querendo ou n�o. Semelhante a uma esfera, que n�o sabemos onde come�a ou termina, os opostos da vida ocupam o mesmo lugar, em perfeita harmonia. E, nessa harmonia, os opostos se coincidem do mesmo modo que o come�o e o fim, subir e descer um caminho, a partida e a volta, o gelo e a �gua (j� que o gelo � a mesma �gua quando exposta a baixa temperatura). Nas palavras de Her�clito, ‘o caminho que desce e o caminho que sobe s�o os mesmos’. O que importa � que a ess�ncia seja a mesma. Embora mudemos de acordo com o passar do tempo, nossa ess�ncia, virtudes e valores devem permanecer incorrupt�veis.”