
A testosterona � o horm�nio respons�vel pelo desenvolvimento de caracter�sticas sexuais masculinas. Os esteroides anabolizantes e similares (EAS) foram criados atrav�s da modifica��o da mol�cula de testosterona na tentativa de ampliar seus efeitos anabolizantes e reduzir seus efeitos virilizantes.
A reposi��o terap�utica de testestorona est� indicada em situa��es de defici�ncia diagnosticada em homens, quadro cl�nico denominado hipogonadismo, cujos crit�rios diagn�sticos s�o bem estabelecidos por diretrizes de v�rias sociedades m�dicas publicadas na literatura. O uso da testosterona tamb�m est� indicado para terapia hormonal cruzada no cuidado � pessoa com incongru�ncia de g�nero ou transg�nero. Tanto a testosterona quanto os EAS t�m sido estudados com fins terap�uticos em outras condi��es cl�nicas espec�ficas, mas ainda sem comprova��o de efic�cia e, especialmente, trazendo in�meras preocupa��es dos especialistas com rela��o � seguran�a de seu uso no longo prazo. O uso dessas subst�ncias para fins de ganho de desempenho no esporte amador, para fins est�ticos ou como agentes anti-envelhecimento � desprovido de qualquer base cient�fica e � acompanhado de riscos bem descritos na literatura, justificando a proibi��o de seu uso nestes casos pelo Conselho Federal de Medicina atrav�s da Resolu��o no 1999/2012.
O uso dos EAS por atletas de competi��o � proibido pelo Comit� Ol�mpico Internacional desde a d�cada de 1970. O uso disseminado de EAS dentro e fora do esporte de elite, especialmente em fitness, por aqueles que desejam melhorar a apar�ncia e o condicionamento f�sico, tornouse uma verdadeira epidemia mundial e deve ser considerado um grande problema social e de sa�de p�blica tamb�m no nosso pa�s.
O culto atual ao "corpo perfeito", frequentemente estimulado pela m�dia e por algumas celebridades, blogueiros, atletas e profissionais da sa�de, estimula o uso de EAS, independente de sexo, idade e condi��o cultural e social. Os v�rios riscos resultantes da abusiva aplica��o off label e anti-�tica desses agentes s�o desconsiderados em prol de um mercado extremamente lucrativo, que guarda similaridades com o com�rcio e tr�fico de drogas il�citas e armas, envolvendo inclusive contrabando e manipula��o em laborat�rios clandestinos. Por essa raz�o, a preval�ncia de uso de EAS n�o � totalmente conhecida, mas estima-se que 3,3% da popula��o (homens 6,4%, mulheres 1,6%) seja usu�ria ocasional ou frequente, sendo que esse percentual pode chegar a 18,4% entre esportistas recreacionais, 13,4% entre atletas, 12,4% entre prisioneiros, 8% entre t�xico-dependentes e 2,3% entre estudantes do ensino m�dio. A depend�ncia de EAS pode atingir cifras de at� 57,1% dos usu�rios, e � muito mais frequente neste grupo o abuso de outras subst�ncias como �lcool, nicotina e coca�na, assim como a preval�ncia de hepatite B, hepatite C e infec��es pelo HIV.
Os efeitos adversos da testosterona normalmente s�o leves e facilmente trat�veis nas doses terap�uticas utilizadas na reposi��o hormonal do hipogonadismo, mas, nos casos de abusos e utiliza��o off label da testosterona e EAS, esses efeitos adversos podem ser severos, irrevers�veis e potencialmente fatais, uma vez que s�o usadas doses 5-15 vezes maiores que as doses cl�nicas preconizadas, muitas vezes em prepara��es manipuladas sem qualquer controle sanit�rio e at� mesmo indicadas para uso veterin�rio.
Os usu�rios de EAS acreditam que podem evitar tais efeitos colaterais indesejados ou maximizar os efeitos das drogas utilizando-as de maneiras que incluem: (a) ciclos: aplica��es intercaladas com per�odos vari�veis de interrup��o do uso; (b) associa��es: combina��o de dois ou mais tipos diferentes de EAS; (c) pir�mides: aumento progressivo nas doses e/ou frequ�ncia de uso seguido de redu��es graduais. N�o h�, obviamente, nenhuma evid�ncia cient�fica de que qualquer uma dessas pr�ticas reduza as consequ�ncias nocivas do abuso dessas subst�ncias, sendo ainda mais preocupante a associa��o de EAS com outros agentes que elevam substancialmente o risco de efeitos adversos s�rios para a sa�de dos usu�rios. Neste sentido, � comum o uso combinado de EAS com o horm�nio do crescimento para potencializar o efeito anab�lico, horm�nio tiroidiano para acelerar o metabolismo, gonadotrofina cori�nica humana para impedir e neutralizar a redu��o no tamanho testicular, inibidores da aromatase para evitar ginecomastia, inibidores da 5 α redutase para prevenir a acne e a calv�cie e diur�ticos para evitar reten��o h�drica.
Os efeitos colaterais do abuso com EAS incluem a supress�o gonadal, infertilidade, ginecomastia, acne, calv�cie, hepatotoxicidade, perturba��es psiqui�tricas (comportamento agressivo e suicida, depress�o, risco de crimes aumentado), depend�ncia, abscessos cut�neos e musculares e les�es ortop�dicas. Nas mulheres, al�m de v�rios desses eventos adversos, s�o comuns as manifesta��es de hiperandrogenismo que incluem hirsutismo, engrossamento da voz, clitoromegalia e alopecia androg�nica. O abuso pr�vio de EAS � a causa mais frequente de hipogonadismo entre homens jovens, sendo respons�vel por 43% dos casos. Com o uso prolongado de EAS, ocorre redu��o do volume e afilamento do c�rtex cerebral e aumento nas dimens�es do n�cleo accumbens, les�es essas implicadas como substrato anat�mico para o desenvolvimento de comportamentos de depend�ncia de drogas. No sistema cardiovascular, o abuso prolongado de doses suprafisiol�gicas de EAS exerce efeitos delet�rios na fibra mioc�rdica provocando apoptose e/ou hipertrofia e consequentemente hipertens�o, disfun��o diast�lica e sist�lica, arritmias e morte s�bita. Al�m disso, os EAS promovem efeitos delet�rios sobre fatores de risco para doen�a cardiovascular ateroscler�tica, como eleva��o de LDL, redu��o de HDL, aumento da eritropoiese e da agrega��o plaquet�ria, hipercoagulabilidade, que resultam numa taxa de mortalidade tr�s vezes maior entre os usu�rios de EAS.
Diante de todas essas evid�ncias cient�ficas e do grave problema de sa�de p�blica relacionado a este tema, a SBEM vem atrav�s deste posicionamento cobrar atitudes urgentes das autoridades competentes, com a ado��o de medidas mais efetivas no intuito de coibir e vedar o uso anti-�tico, off label e ilegal de EAS, atrav�s da regulamenta��o e controle da prescri��o m�dica dessas subst�ncias, preservando os tratamentos previstos para as indica��es que s�o amplamente estabelecidos na literatura m�dica.