Sa�de f�sica e mental foram impactadas pela covid-19
O acesso ao ciclo vacinal completo e o fim do isolamento social pareciam indicar a especialistas melhora na sa�de mental, deteriorada pela pandemia de coronav�rus. O pa�s chega aos 700 mil mortos, por�m, com poucas perspetivas de superar os danos causados por doen�as como ansiedade, depress�o e transtorno do estresse p�s traum�tico, segundo m�dicos e estudos.
Trabalhos conduzidos no Brasil e no exterior sobre efeitos da Covid-19 mostraram um aumento expressivo da incid�ncia de doen�as mentais em todas as popula��es. De acordo com o m�dico e pesquisador Rodolfo Furlan Damiano, doutorando do IPq (Instituto de Psiquiatria) da USP (Universidade de S�o Paulo), a sa�de f�sica impacta o bem-estar mental e socioambiental.
Outros 13,6% desenvolveram TEPT (transtorno de estresse p�s-traum�tico), enquanto 15,5% apresentaram transtorno de ansiedade generalizada e 8% depress�o. Situa��es que, mesmo quando acompanhados por profissionais, podem levar anos de tratamento, al�m de serem somadas a outros obst�culos pessoais.
"Ao longo do tempo, com as medidas [sanit�rias restritivas] sendo retiradas, as pessoas voltam a entrar em contato com os problemas da vida cotidiana delas, s� que somados �s novas dificuldades que o mundo pand�mico colocou, como falta de emprego, preju�zos financeiros, preju�zos nos casamentos e nas rela��es", indica Damiano.
A associa��o entre perda de paladar e olfato com a morbidade de doen�as neuropsiqui�trica na pandemia tamb�m foi investigada por pesquisadores do IPq. Publicado no European Archives of Psychiatry and Clinical Neuroscience, o estudo, feito com dados de 701 adultos hospitalizados em estado moderado a grave, confirmou a forte rela��o entre os quadros f�sicos e mentais dos pacientes com a doen�a.
A inf�ncia � outra �rea que exigir� aten��o. "A sociedade foi mudada de diversas formas. O contato n�o � mais o mesmo, a proximidade entre as pessoas n�o � mesma, e os mais jovens s�o os que mais v�o sofrer com isso. Vai ter um impacto no desenvolvimento mental das crian�as, que perderam um per�odo muito importante de socializa��o", pontua Damiano.
Dificuldade para fazer amigos e lidar com conflitos interpessoais s�o, portanto, alguns dos pontos que ter�o de ser abordados pela sociedade com frequ�ncia nos pr�ximos anos, segundo o pesquisador. A falta de um sistema de sa�de mental mais eficaz e acess�vel pela rede p�blica, por sua vez, agrava a situa��o do quadro brasileiro.
"Sabemos que os pa�ses que lidaram melhor com a pandemia foram consequentemente os que tamb�m tiveram menores �ndices de transtornos mentais ao longo do tempo. Como o Brasil n�o lidou muito bem com o per�odo pand�mico, podemos esperar essa resposta um pouquinho mais retardada da melhora", afirma.
Para o psiquiatra Ant�nio Geraldo, presidente da ABP (Associa��o Brasileira de Psiquiatria), o pa�s possui um sistema privado de sa�de mental entre os melhores do mundo, mas isso n�o chega a uma parte expressiva da popula��o que depende da rede p�blica.
"Desinteresse, falta de prazer, de alegria, transtornos de ansiedade, de estresse p�s-traum�tico, luto, � tudo muito presente e n�o temos nenhum trabalho espec�fico nessa popula��o que passou por esse estresse e convive com tudo isso", pontua.
Geraldo afirma que a Covid n�o deve desaparecer e que, nos hospitais, o medo ainda � presente entre pacientes e profissionais de sa�de. Estudos publicados na Revista Brasileira de Psiquiatria, da ABP, em 2020, apontavam que a neglig�ncia com a sa�de mental durante a pandemia poderia trazer problemas econ�micos e sociais, afetando diretamente o sistema p�blico de sa�de.
No primeiro ano da pandemia, os pesquisadores monitoraram equipes que estavam na linha de frente nos hospitais e alertaram para a necessidade de prevenir o surgimento de transtornos mentais no ambiente de trabalho, especialmente os ligados � sa�de.
"� preciso cuidar do cuidador. Ver um plano de carreira para esse profissional, m�dico, enfermeira, porque continuam trabalhando em mais de um emprego, �s vezes tr�s ou quatro, expostos nas UTIs [unidades de terapia intensiva] e em situa��o de inseguran�a", diz o psiquiatra.
Outro estudos sobre os efeitos da doen�a na sa�de mental realizados pela associa��o, tamb�m publicados na BJP, apontam que, no Brasil, o sofrimento ps�quico foi alto ou muito alto em 13,4% dos profissionais de sa�de e em 31,4% da popula��o geral, sendo que no primeiro grupo 36% relataram hist�rico anterior � pandemia, contra 44,7% do p�blico mais abrangente.
Para a empres�ria Giselle Cristina da Silva, 35, em 2023 o luto ainda � forte. Ela perdeu o marido em novembro de 2020 em decorr�ncia de complica��es da Covid-19.
"Foi um momento que parece que foi congelado. N�o sei dizer como consegui chegar at� aqui, foi uma sobreviv�ncia e ainda n�o lido bem com isso. O Ricardo foi arrancado de n�s de forma abrupta, era uma pessoa saud�vel", diz. "Fui obrigada a suportar o insuport�vel e assim vem sendo at� hoje."
Silva, que tem dois filhos frutos do relacionamento, afirma que n�o buscou tratamento psicol�gico, apesar da insist�ncia dos familiares. "Sempre tinha a impress�o de que quando tentava fazer uma terapia, a pessoa estava tentando tirar o Ricardo do meu cora��o", relata.
Ela buscou apoio em grupos nas redes sociais com pessoas que tamb�m perderam entes queridos e desabafa escrevendo em um perfil no Instagram.
"A quest�o da Covid afetou drasticamente a minha fam�lia. Quando as pessoas estavam voltando �s suas rotinas, eu senti uma grande revolta, porque na minha cabe�a ningu�m tinha tido o impacto que teve na minha casa. A Covid veio, passou por muitas pessoas, mas ela fez um estrago grande em algumas", diz.
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