Apesar do avan�o das discuss�es sobre a divis�o das tarefas do lar, os afazeres dom�sticos ainda recaem em larga escala sobre as mulheres e as afastam do mercado de trabalho
RIO DE JANEIRO, RJ, E S�O PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Apesar do avan�o das discuss�es sobre a divis�o das tarefas do lar nos �ltimos anos, os afazeres dom�sticos ainda recaem em larga escala sobre as mulheres e afastam do mercado de trabalho principalmente as m�es com mais filhos.
Enquanto isso, somente 0,62% dos homens em casais com tr�s ou mais filhos (o equivalente a 11,9 mil) estavam fora da for�a de trabalho em raz�o dos afazeres dom�sticos ou do cuidado dos dependentes no quarto trimestre de 2022.
Trata-se do maior percentual para o per�odo de outubro a dezembro desde o in�cio da s�rie hist�rica, em 2012, mas o abismo em rela��o �s m�es persiste.
� o que indica um levantamento do laborat�rio de estudos PUCRS DataSocial a partir de microdados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domic�lios) Cont�nua, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica).
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A an�lise abrange homens e mulheres de 25 a 50 anos que fazem parte de casais heterossexuais com ou sem filhos de 0 a 15 anos.
A popula��o fora da for�a de trabalho � composta por profissionais que n�o est�o empregados nem procurando oportunidades no setor formal ou informal.
Diferen�as tamb�m com casais com menos filhos
Segundo o levantamento do PUCRS DataSocial, as diferen�as tamb�m s�o marcantes entre os casais com menos filhos.
Entre as mulheres com dois filhos de 0 a 15 anos, o percentual fora da for�a em raz�o dos afazeres dom�sticos ou do cuidado de dependentes alcan�ou 28,83% no quarto trimestre de 2022. � o maior patamar desde 2016.
Entre os homens com dois filhos, a marca foi de apenas 0,45% nos tr�s meses finais de 2022. Ainda assim, � a maior da s�rie para o quarto trimestre.
No recorte dos casais com um filho de 0 a 15 anos, o percentual de m�es fora da for�a por motivos dom�sticos foi de 21,89%, o maior desde 2020. Entre os homens com um filho, a marca foi de 0,55%, o maior da s�rie.
Pandemia agrava cen�rio: mais mulheres fora do mercado de trabalho
Andr� Salata, pesquisador do PUCRS DataSocial e um dos respons�veis pelo levantamento, destaca que a parcela das m�es fora da for�a vinha caindo antes da pandemia de COVID-19. Com a crise sanit�ria, que paralisou escolas e empresas, esse grupo voltou a subir.
"� um dado bastante chocante. Apesar de algumas mudan�as que estamos acompanhando na sociedade, e que s�o muito positivas, ainda h� uma divis�o de g�nero muito forte. Os resultados expressam isso", afirma Salata.
Entre os casais sem filhos, o percentual de mulheres fora da for�a devido a afazeres dom�sticos ou cuidado de dependentes foi de 14,87% no quarto trimestre de 2022. A propor��o entre os homens foi de 0,47%.
O levantamento ainda traz dados sobre m�es e pais fora da for�a de trabalho por motivos diversos, que v�o al�m dos afazeres dom�sticos e do cuidado de dependentes. As diferen�as seguem intensas.
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Nesse recorte, o percentual de mulheres que faziam parte de casais com pelo menos tr�s filhos e que estavam fora da for�a de trabalho no quarto trimestre de 2022 foi de 50,05%. Entre os homens com tr�s filhos ou mais, a propor��o foi de 6,16%.
Em casais com dois filhos, o percentual fora da for�a por motivos diversos foi de 35,88% para as m�es e de 4,87% para os pais no quarto trimestre de 2022.
Casais com um filho
Em casais com um filho, a porcentagem baixava para 30,18% entre elas e 4,72% entre eles. Nos casais sem filhos, a parcela era de 27,41% e de 6,15%, respectivamente.
Para Ely Jos� de Mattos, pesquisador do PUCRS DataSocial e um dos respons�veis pelo levantamento, os dados mostram que a desigualdade de inser��o no mercado de trabalho tem car�ter estrutural.
Na vis�o de Mattos, o combate a essa disparidade depende de a��es de longo prazo. De maneira mais imediata, uma medida recomendada seria a amplia��o da licen�a para os pais ap�s o nascimento dos filhos, diz o pesquisador.
A iniciativa buscaria equilibrar os afazeres do lar, mas n�o resolveria por si s� os problemas, segundo Mattos. "� algo estrutural. Precisa ser pensado para o longo prazo."
Salata vai na mesma linha. Para ele, uma "melhora substantiva" passa por "mudan�as geracionais", que n�o acontecem do dia para a noite.
"O governo n�o pode simplesmente dar uma canetada e obrigar as pessoas a seguirem determinado estilo de vida, mas existem medidas importantes que podem ser adotadas, como a licen�a paternidade de maior f�lego", afirma Salata.
"Expandir a rede de creches e escolas em tempo integral � uma a��o que tamb�m poderia ser adotada para tornar a situa��o melhor", acrescenta.
Plataforma tenta ajudar
Enquanto o pa�s n�o assiste a uma mudan�a profunda nessas rela�� es, h� iniciativas que buscam mitigar a desigualdade de oportunidades. � o caso do projeto da empreendedora Renata Lino, 41, que criou a plataforma de empregos para m�es MommyTech.
A startup firma parcerias com empresas interessadas em promover diversidade e recebe curr�culos de m�es e mulheres gr�vidas. "Temos uma base de dados com [20 mil] m�es t�picas e at�picas --100% de mulheres", diz Renata.
A plataforma filtra essas informa��es a partir do perfil buscado pela empresa e das prefer�ncias das m�es e gestantes, para fazer uma pr�-triagem.
A startup ajudou mais de 675 m�es a se recolocarem de forma direta e indireta no mercado de trabalho, de acordo com a fundadora.
"Contamos como vagas indiretas os casos das m�es que receberam consultoria da MommyTech para se aprimorar em habilidades desejadas pelo mercado ou tornar o curr�culo mais atraente", diz.
A profissional de marketing digital Karin Hetschko, 40, conseguiu se recolocar ap�s manter conversas com Renata e ter seu curr�culo enviado pela MommyTech � startup Racoon, recentemente adquirida pela multinacional Media Monks.
Karin ficou cinco meses sem trabalho ap�s ser demitida de uma empresa estrangeira de desenvolvimento de software em mar�o de 2022. Ela era m�e de uma crian�a de pouco mais de um ano.
Reclama��es sobre o tempo que Karin gastava com o filho se somaram a uma gest�o via emails enviados pelo chefe, diz a profissional. Karin afirma que queixas sobre atrasos salariais para sua equipe foram o estopim para a demiss�o.
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Desde ent�o, ela passou a informar que era m�e nas entrevistas de emprego, mesmo quando n�o era questionada sobre o tema. "N�o me perguntaram na minha antiga empresa, e percebi que foi um erro n�o deixar isso claro na rela��o, embora n�o seja uma estrat�gia indicada por especialistas em carreira."
O emprego na Racoon como supervisora de uma equipe de desenvolvedores veio na s�tima entrevista. Desde essa contrata��o, Karin trabalha de forma remota, o que amplia o tempo dedicado ao cuidado com a fam�lia, segundo ela.
Para Renata, a licen�a parental independente de g�nero � a �nica forma de colocar homens e mulheres em condi��es iguais ante os empregadores e gestores. A fundadora da MommyTech diz que, at� hoje, n�o conseguiu emprego para mulheres gr�vidas. "� um estigma muito grande."
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