Stany Rodrigues Campos de Paula, sexóloga e ginecologista

Stany Rodrigues Campos de Paula, sex�loga e ginecologista

Marcos Vieira /EM/DA Press

"Sexo vende e divide opini�es, e assim cresce o assunto nas redes sociais, gerando likes e repostagens"

Stany Rodrigues Campos de Paula, sex�loga e ginecologista



Como explicar corpos expostos, quase nus no carnaval, mas, por outro lado, o topless condenado na praia, sendo crime, um ato obsceno? Como entender o alto consumo de produtos er�ticos, mas n�o se falar a respeito? E o acesso a sites fechados de conte�do adulto e um “sil�ncio ensurdecedor” sobre o tema? Para Stany Rodrigues Campos de Paula, sex�loga e ginecologista do Hospital Vila da Serra, “existe uma contradi��o do que � poss�vel no carnaval como sendo um momento de permiss�o social para o exerc�cio da sexualidade e do prazer sexual, e as redes sociais, por sua vez, que estimulam um erotismo sem identidade que se contradiz com a religiosidade? As transgress�es s�o a forma de manifesta��o dessa sexualidade e o consumo de pornografia vem, como esse exemplo, chocando aqueles que n�o conseguem ter um discurso de educa��o e de questionamento, trazendo a pauta de forma distorcida para a sociedade julgar. N�o tem lado correto. Os dois extremos est�o fazendo um desservi�o para a sociedade”.
 
 
Ao pensar nas contradi��es entre o conservadorismo e a liberdade de express�o, para a sex�loga, as pessoas est�o falando mais de sexo, mas os tabus continuam sendo uma movimenta��o social nas redes, onde as opini�es se dividem. “Ainda assim, as pessoas t�m a figura da m�e como virgem sem pecado, e n�o conseguem interpretar o direito de homens e mulheres de buscar seu prazer, alimentando a ideia de que as pessoas acima de 40 anos n�o podem ter vida sexual. Sexo vende e divide opini�es, e assim cresce o assunto nas redes sociais, gerando likes e repostagens”.
 

Com tantas amarras, interpreta��es equivocadas e cren�as ainda s�o comuns comportamentos vivenciados com outras pessoas que n�o os parceiros. Assim, fantasias e fetiches permanecem como tabus na hora de apimentar a experi�ncia sexual e o que se ouve � “com a minha mulher, n�o”: “Acho que a falta de di�logo e as fantasias ainda est�o no pecado, no n�o permitido, mas cada vez que esse assunto vem � tona � poss�vel utilizar a educa��o sexual para lev�-lo de uma forma mais adequada, e com isso permitir que “a minha mulher” acesse os direitos ao prazer que as “que n�o s�o minha mulher” t�m direito”, acredita a sex�loga.

Nova gera��o

E n�o � s� no sexo, mas o mundo vive um movimento conservador, com �nfase na exalta��o dos pap�is dos g�neros tradicionais. No s�culo 21, a sexualidade ainda � um tema que carrega preconceitos e estere�tipos. O programa da TV Globo, “Amor e Sexo”, comandado por Fernanda Lima, fez sucesso em 2009 (ficou 10 anos no ar), mas em um nicho. Ao sair do ar, f�s culparam o “ultraconservadorismo” do brasileiro, que rejeitou pautas progressistas. 
 
Duas mulheres cochicando

Fantasias e fetiches permanecem como tabus na hora de apimentar a experi�ncia sexual

Cotton Bro Studio/Pexels
 
 
“De todas as taras sexuais, n�o existe nenhuma mais estranha do que a abstin�ncia”, disse o escritor e cronista Mill�r Fernandes na d�cada de 1970, naquela que se tornaria uma de suas frases mais conhecidas. E, hoje em dia, o que se v� � uma nova gera��o com pouca disposi��o para o ato sexual. Uma nova onda n�o marca o retorno dos jovens a velhos preconceitos. E, em outro cen�rio, com a tecnologia a favor e o f�cil acesso ao sexo � dist�ncia, muitos preferem a onipresen�a das redes sociais do que o contato presencial e f�sico, o que seria algo novo, nada conservador”, explica a especialista.

“A gera��o millenium transa menos que as outras e tamb�m se envolve menos em v�rios outros assuntos, n�o tem um enfrentamento e a toler�ncia que as outras gera��es t�m. De um lado, as redes sociais aproximam e reencontram, mas por outro, diminuem as intera��es sociais. O toque � necess�rio para aflorar os desejos, os instintos e as sensa��es que n�o podem ser replicadas por uma tela ou um emoji”, diz..

No fim, a liberdade, a quebra de tabus e a naturalidade para falar sobre sexualidade e vivenciar o sexo seriam mais f�ceis com a educa��o sexual. Para a sex�loga, a educa��o sexual come�a desde quando os filhos nascem, no toque do corpo, na impress�o dos sentidos, na fala natural, na valoriza��o do prazer n�o er�tico, das car�cias e dos afagos, na permiss�o do beijo, na educa��o quanto ao abuso. “Se n�o conversamos com os filhos desde o come�o sobre as sensa��es que temos no corpo, sobre a import�ncia de se cuidar e n�o permitir que outros nos toquem de forma inadequada, n�o conseguiremos educar de forma n�o preconceituosa, ao n�o diferirmos os direitos e deveres de meninas e meninos devido ao g�nero, responder as perguntas feitas nas idades adequadas, explicarmos sobre higiene e prote��o.”

Conforme Stany, tudo isso se faz na tenra idade, e a escola deve ser uma fonte de educa��o. Em nenhum momento, acrescenta, ela incentivar� a inicia��o sexual precoce, e sim falar� dos limites e das responsabilidades que o indiv�duo tem em rela��o ao seu corpo e ao do outro. “Trazer o afeto para a rela��o e n�o apenas um jogo sexual. Descobrir como � importante a educa��o sexual e reprodutiva nas escolas como aliada dos pais e da fam�lia para diminuir as viol�ncias e a gravidez na adolesc�ncia.”

Para ler...


A psiquiatra Carmita Abdo, professora da Faculdade de Medicina na Universidade de S�o Paulo, � refer�ncia na medicina quando o assunto � a vida sexual dos brasileiros - em 2003 ela coordenou o maior estudo sobre sexualidade do pa�s, o Prosex e at� hoje refer�ncia para pesquisas de comportamento - em seu mais recente livro, de 2021, “Sexo no cotidiano“, pela editora Contexto, o primeiro escrito para o p�blico em geral, e n�o s� para m�dicos, onde discorre sobre o tema de maneira simples e sem preconceitos. Entre as falas do livro, que faz parte da Cole��o Cotidiano, que busca explicar temas complexos do dia a dia de maneira din�mica, sem perder a profundidade e relev�ncia, tem: "O conceito de sexo saud�vel muda com o tempo. O que ontem era aberra��o, hoje pode ser extravagante, incomum ou at� uma forma de ‘apimentar’ a vida sexual e ‘sair da rotina’"; E: "Sexo � a boca, a m�o, o p�nis e a vagina. No entanto, sexo tamb�m � obsess�o, prazer, desejo ou repulsa. Pris�o ou liberdade. Fome ou saciedade. Sexo � a for�a que nos p�e na cama e a energia que nos tira dela. Sem a qual voc� n�o deita nem levanta, n�o vira a noite nem relaxa e dorme. � funcional ou disfuncional; convencional ou inusitado. � a primeira vez com virgindade e a �ltima como despedida. Sexo � tudo o que existe e o que n�o existe sexo tamb�m �. Por isso, sexo � um fantasma que assombra a mem�ria de quem j� o teve e perdeu, vendeu, comprou ou emprestou. � a devo��o de quem nunca rezou.”